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3 A EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO SUPERVISIONADO EM SERVIÇO SOCIAL NO

3.2 Experiências e demandas atendidas

O Serviço Social atua frente às mais variadas demandas individuais e coletivas, que são manifestações da questão social que se apresentam nas formas mais diversas, tais como: o desemprego, a miséria, drogadição, problemas de saúde, vulnerabilidade econômica e social, habitação, conflitos familiares entre outros.

O Estágio Supervisionado em Serviço Social desenvolvido no NAPJ visa, através do atendimento aos segmentos sociais vulnerabilizados e/ou excluídos, o acesso aos seus direitos individuais e sociais. A exclusão social é reflexo de uma sociedade capitalista e globalizada, deixando as famílias empobrecidas em situação de desemprego, moradia precária e sem acesso aos bens e serviços. Os impactos destrutivos do sistema deixam marcas sobre a população depauperadas, o desemprego, a alimentação insuficiente, a ignorância, a moradia precária são alguns

sinais dos limites da condição de vida dos excluídos e subalternizados da sociedade (YAZBEK, 2006).

Iniciou-se as atividades com o reconhecimento do espaço, os critérios para o atendimento, rotina de trabalho, perfil dos usuários para conhecer a realidade dos que procuravam o atendimento do Serviço Social, o que dá suporte para atuar de forma qualificada e construir alternativas às demandas dos usuários. A procura da assistência jurídica, do Estado, por parte de um sujeito e/ou família tem início com um conflito no seu meio familiar, que possuem direitos e deveres, mas que por muitas vezes assumem posições diferentes em face dos próprios interesses em jogo, não possibilitando a resolução do problema através do consenso (CHAUÍ, 2001).

O acesso à instituição consiste na busca de assistência jurídica por parte da população e em alguns casos, especificamente, do Serviço Social. Nesse sentido podem-se citar demandas relacionadas à ausência ou insuficiência de políticas públicas ligadas à saúde, educação, habitação, orientação sobre programas de auxílio, benefícios previdenciários, acolhimento de crianças e adolescentes, drogadição, etilismo, violência, vulnerabilidade econômica e social e conflitos familiares.

O profissional Assistente Social deve estar atento às demandas que se metamorfoseiam em consonância com as transformações sociais, econômicas e culturais em diferentes momentos históricos. Significa que novas expressões da questão social vão surgindo e os Assistentes Sociais têm condições de formular propostas de trabalho, através da pesquisa da realidade social sobre os sujeitos para enfrentá-las.

As demandas relacionadas a conflitos familiares eram frequentes nos atendimentos realizados pelo Serviço Social sendo que em grande parte destes percebia-se a existência de uma “nova demanda”, as situações envolvendo a alienação parental. Não se trata de um assunto novo, pois sempre esteve presente nas questões que envolvem a dissolução conjugal, guarda, ou até mesmo quando o casal permanece unido, porém em permanente conflito.

No Brasil, a questão da alienação parental tornou-se mais debatida com a promulgação da Lei n 12.318/2010, que discorre sobre o tema, levando profissionais Assistentes Sociais, do Judiciário, Psiquiatras, Psicólogos a ter um olhar mais atento ao tema. Baseando-se no que diz a Lei, durante os Estágios Supervisionados em

Serviço Social procurou-se desvendar casos envolvendo situações de alienação parental. A Lei elenca de forma explicativa as diversas formas de alienação parental:

Parágrafo Único: São formas exemplificativas de alienação parental, além dos atos assim declarados pelo juiz ou constatados por perícia, praticados diretamente ou com auxílio de terceiros:

I - realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade;

II - dificultar o exercício da autoridade parental;

III - dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;

IV - dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; V - omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;

VI - apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;

VII - mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou com avós (RIEZO, 2012, p.1134).

A experiência de estágio oportunizou acompanhar e/ou atender demandas nas quais, conforme caracterizado no exposto acima, identificaram-se situações de alienação parental, e que, inicialmente, se apresentavam de outras maneiras. Para exemplificar essa afirmação, os relatos a seguir são resultados de observações anotadas nos diários de campo no qual se registraram as atividades realizadas durante o processo de estágio.

Situação I - Embora a demanda inicialmente apresentada se tratasse de pedido de guarda de um dos filhos, o genitor que procurou o Serviço Social, passou a desqualificar a outra parte na presença da criança que o acompanhava. A criança mantinha uma rejeição muito grande em relação ao genitor/a que fora afastado, não querendo qualquer tipo de aproximação. O casal tinha outro filho/a adolescente que vivia com a outra parte, que também estabelecia sentimentos de rejeição ao genitor/a da qual fora separado. Os irmãos praticamente não estabeleciam convivência (AUTORA, 2013).

Na situação que envolvia essa demanda percebiam-se indícios de alienação parental, conforme previsto no inciso I sobre a desqualificação da conduta do genitor no exercício da maternidade ou paternidade e, também, o inciso IV sobre dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar, são formas de alienação parental (RIEZO, 2012, p.1134).

Situação II - A demanda apresentada tratava-se da regularização de guarda por parte de um dos genitores do/a filho/a que estava em seu poder. Porém, em seu relato expôs que a situação estava complicada, pois aos finais de semana que o/a adolescente passava com o outro genitor eram permitidos comportamentos considerados inadequados pelo usuário, tais como saídas à noite, frequentar festas e também o uso de roupas que não condiziam com a sua faixa etária, o que gerava conflitos com o/a genitor/a guardião/ã. Segundo o relato, do/a genitor/a que procurou o Serviço Social, a situação estava se tornando insustentável, pois não conseguia mais exercer autoridade sobre o/a filho/a e que o/a mesmo/a manifestava o desejo de ir morar com a outra parte (AUTORA, 2013).

Pode-se perceber a caracterização de alienação parental nessa situação, conforme prevê o inciso II sobre dificultar o exercício da autoridade parental, o que também é uma forma de alienação (RIEZO, 2012, p.1134).

Situação III - A demanda tratava-se do pedido de cancelamento das visitas, pois o/a genitor/a que procurou o Serviço Social argumentava que a outra parte realizava as visitas alcoolizado/a causando transtorno em frente a sua casa e que a criança não queria mais ter contato com o mesmo/a. O Serviço Social solicitou a presença da outra parte, o/a mesmo/a relatou não serem verdadeiros os fatos descritos, pois não fazia uso de bebida alcoólica, podendo comprovar a sua fala e que o/a genitor/a guardião/ã não aceitava seu novo relacionamento, fazendo o uso do/a filho/a para atingi-lo/a, dificultando o contato com a criança (AUTORA, 2013).

Pode-se constatar que a situação relatada assume características de alienação parental, conforme o inciso I quanto à desqualificação da conduta do genitor no exercício da maternidade ou paternidade, o inciso III sobre dificultar contato de criança ou adolescente com genitor, como também no inciso IV sobre dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar, que são formas de alienação parental (RIEZO, 2012, p. 1134).

A partir das três (03) situações observadas em atendimentos realizados pelo grupo de estagiárias, sob a supervisão da assistente social, junto ao NAPJ constata- se que situações de alienação parental se fazem presentes nas diversas questões que envolvem conflitos familiares, que primeiramente se apresentava de forma oculta, estabelecendo concordância com a caracterização dada pela legislação. Tais situações envolvendo alienação parental remetem para demandas apresentadas aos profissionais Assistentes Sociais. O desvendamento da mesma torna-se possível

quando há o contato entre o Assistente Social e o sujeito, que conta a sua história de vida, o seu cotidiano, possibilitando identificar as contradições que envolvem a vida destes sujeitos.

A função da dialética é desvendar de onde decorrem os fenômenos, ir além das aparências, desvendar a realidade de forma não fragmentada para que os Assistentes Sociais possam realizar seu trabalho, efetuando a sua intervenção, considerando as categorias teóricas contradição, historicidade e totalidade.

[...] Fazem-se aproximações com a essência e a aparência do fenômeno – a aparência trazida pelo sujeito, ao expressar sua demanda individual, mostra a essência do fenômeno, gerando um movimento, então, que possibilita a apropriação dos processos sociais2 (essência) se expressando nos processos particulares (aparência) e se manifestando pelo sujeito (fenômeno) (TÜRCK, 2012, p.36).

Nesse contexto, a ação profissional do Assistente Social ganha visibilidade, como forma de concretizar os direitos das crianças e dos adolescentes, com o intuito de evitar que estes tenham novamente seus direitos violados. Constatando-se situações de alienação parental, os profissionais envolvidos não deveriam imediatamente recorrer à justiça que, na busca da verdade, mediante a aplicação de medidas punitivas aos pais ou responsáveis, poderia levar ao afastamento do genitor causando, mais uma vez, a ruptura dos vínculos familiares, além de desencadear o sofrimento às crianças, aos adolescentes e demais envolvidos.

É importante ressaltar que a prática profissional, com base na constatação da possibilidade de alienação e respeitando o que está instituído nos Princípios Éticos Fundamentais da profissão, atenda o que estabelece o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) no seu artigo 4º, onde diz que:

É dever da família, da comunidade, da sociedade geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referente à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária (RIEZO, 2012, p. 23).

Em muitas situações, a melhora da comunicação entre os envolvidos, trabalhando a raiz do problema, permite que os mesmos, através de seus recursos

2 “Se: constituídos pelos espaços sociais em que os sujeitos vivem suas vidas, cujas inter-relações

ideológicas, políticas e econômicas estruturam a sociedade capitalista” (TÜRCK, 2012, p. 36). Nota da autora, disponível no original.

pessoais, superem a alienação parental. Considerando o bem estar da criança e do adolescente e o seu pleno desenvolvimento, na maioria das situações, restabeleceu- se o diálogo entre as partes envolvidas a partir do trabalho interdisciplinar e interinstitucional. Para tanto, envolveu-se a Rede Sócio Assistencial do Município de Ijuí, também escolas das crianças e/ou dos adolescentes na busca de informações com professores e equipe pedagógica, cujas informações foram de suma importância para a compreensão dos conflitos que envolviam as famílias e no direcionamento das ações.

A equipe do direito, através dos professores e estagiários, também foram aliados importantes na efetivação de uma orientação socioeducativa com qualidade. Conforme Yazbek (2006, p. 57):

As ações profissionais dos assistentes sociais apresentam duas dimensões: a prestação de serviços assistenciais e o trabalho socioeducativo, sendo que há uma tendência histórica a hierarquizar a ação educativa em face do serviço concreto. Na realidade, é pela mediação da prestação de serviços sociais que o assistente social interfere nas relações sociais que fazem parte do cotidiano de sua “clientela”.

A interdisciplinaridade tem relevante importância no desvendamento de questões que envolvem conflitos familiares, considerando sempre as atribuições de cada profissional, para a compreensão da totalidade das relações das partes, que reside na construção de alternativas às dificuldades enfrentadas pelos sujeitos e na garantia de direitos individuais e coletivos. Pode-se definir interdisciplinaridade como uma relação de reciprocidade, de mutualidade, que implica uma atitude diferente a ser tomada frente ao problema, isto é, substituir a concepção fragmentada pela unitária do ser humano (DE SÁ, 2000). A contribuição de leituras interdisciplinares e as parcerias interinstitucionais são reconhecidas como necessárias para maior efetividade das ações.

Entende-se que o Assistente Social, articuladamente com outros profissionais, encontra-se capacitado para atender às demandas que dizem respeito a conflitos familiares, especialmente às que implicam na proteção e efetivação dos direitos da criança e do adolescente.

Desse modo, aos assistentes sociais e psicólogos, cabe identificar, nos atendimentos, o grau de vingança dos pais, de forma a trabalhar preventivamente, avisando ao juiz da possibilidade de uma futura alienação

parental, esclarecendo aos pais que o desejo de retaliação vai prejudicar apenas e tão somente a criança/adolescente (COSTA, 2010, p. 68).

Raramente a sentença judicial tem o efeito apaziguador que a justiça espera, principalmente nos processos que envolvem vínculos afetuosos, sentimentos em que amor e ódio se confundem (DIAS, 2011). Questiona-se se o direito da criança e/ou do adolescente envolvidos nas disputas não estaria em segundo plano, uma vez que a busca da verdade estaria centrada na punição. É nesse contexto que se insere o trabalho do assistente social, a partir da utilização de todo um aparato técnico-operativo – sobre o qual versa o capítulo a seguir – em articulação com as dimensões: ético-política e teórico-metodológica que fundamentam o projeto ético político profissional.

4 O INSTRUMENTAL UTILIZADO PELO ASSISTENTE SOCIAL NO

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