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2 REVISÃO DA LITERATURA

5.3 Novatos e Experts no processo de inovação

5.3.6 Experts em inovação radical

Foi possível perceber pelas entrevistas realizadas que o expert radical será identificado pelo número de tentativas em inovar radicalmente, seja por meio de projetos, seja por meio de startups. A taxa de sucessos em relação às iniciativas de inovar radicalmente é que lhe permitirá ter o status de expert radical. Por meio dos relatos identificou-se que os indivíduos, nesse nível de habilidade, por possuírem uma compreensão maior do mercado no qual estão inseridos, focam suas iniciativas de inovar na identificação de oportunidades e lacunas existentes nesse mesmo mercado. O entendimento deles por inovação está mais voltado para a prática. Percebe-se, pelas suas definições que, muito mais do que na ideia, eles acreditam na força do processo. Seus esforços são direcionados para mapear as demandas existentes no mercado e responder a elas. O sócio fundador da Empresa A , A3, expressa exatamente isso na sua definição de inovação: “Maneira diferente de fazer as coisas obvias. A inovação está na simplicidade. É transformar coisas que você não dava nenhum valor em coisas de grande valor”. A fala de A2, sócio fundador da Empresa A, expressa a mesma ideia: “Acredito que inovar está muito mais na área de negócio, na capacidade de estabelecer relacionamentos e

de identificar oportunidades, do que necessariamente criar produtos ou tecnologias por si só”. Ao invés de buscarem, inicialmente, uma ideia original ou uma tecnologia de ruptura e gerar uma demanda eles direcionam, primeiramente, seus esforços em responder às oportunidades identificadas por eles no mercado.

Foi possível, pelos relatos obtidos, perceber que os modelos de inovação também apresentam algumas funcionalidades para os experts radicais. Eles utilizam os modelos como uma forma de validar suas decisões para os conselhos ou acionistas da empresa. O sócio fundador A3 da Empresa A descreve a sua decisão como:

“As nossas decisões hoje tem um cunho estratégico, ela tem um cunho financeiros, ela tem um cunho perpetuidade, ela tem um cunho legal, ela tem um cunho de análise dos concorrentes (...) ou seja, as nossas decisões são extremamente bem estruturadas em tornos dos critérios dos modelos utilizados”.

E Acrescenta:

“No primeiro momento o uso da intuição [adivinhação] era altíssima. Hoje baixíssima. Hoje eu não posso usá-la [experiência]. Eu não posso fazer essa aposta. Preciso fundamentar a minha decisão. E por isso às vezes a gente pode estar perdendo grandes oportunidades”.

Essa intuição citada por ele refere-se ao estágio inicial no qual era ainda um novato. Na verdade o seu significado está associado a um processo de adivinhação ou “chute”. A intuição que ele usa, hoje, em suas decisões e precisa justificar está relacionada com a sua experiência no processo de inovar radicalmente. Apesar dele afirmar que não a usa, ela está presente em suas decisões, pois é o seu uso que o diferencia de um novato. O problema está no fato de ele não ser capaz de explicitar em palavras ou critérios no que se baseou para tomar sua decisão. Por isso, precisa recorrer aos modelos e chegar ao ponto de dizer que não faz uso da intuição/experiência em suas decisões. O modelo passa a ser um instrumento que lhe possibilitará usar critérios para validar a sua intuição/experiência. Existe uma aversão no ocidente, como foi colocado por Dreyfus e Dreyfus (1986), para o uso de aspectos tácitos nos processos decisórios. Apesar de serem experts há uma pressão grande sobre eles para que fundamentem suas decisões a partir de critérios objetivos que possam ser avaliados e medidos. Essa pressão pode ser observada na fala do sócio fundador A4 a respeito do seu processo decisório: “A minha decisão hoje utiliza uma série de critérios. É preciso pensar em questões jurídicas... no cliente... no mercado... concorrentes...viabilidade técnica...retorno financeiro. Geralmente eu sigo esse fluxo nas minhas decisões”. Todas as decisões precisam ser estruturadas, justificadas e avaliadas a partir dos critérios utilizados. Com essa finalidade os experts radicais acabam utilizando os modelos.

As inovações radicais são marcadas pelas incertezas. Trata-se de um ambiente caótico difícil de ser previsto até mesmo pelos experts. Tanto o novato quanto o expert possuem grandes dificuldades de lidarem com as incertezas. A intuição/experiência do expert radical permite que ele identifique um número maior de incertezas se comparado com o novato. Grande parte das incertezas no processo de inovação radical não pode ser identificada nem mesmo pelos experts, pois pode se tratar de um novo produto, uma tecnologia de ruptura, ou até mesmo um segmento de mercado totalmente novo. O expert radical, diante dessa situação, usa a sua intuição/experiência para lidar com essas incertezas e aplica os modelos com a finalidade também de validar, por meio de critérios e regras, as suas decisões.

Dreyfus e Dreyfus (1986) já haviam tratado dessa tentativa de traduzir a intuição do expert. Eles afirmam que qualquer transcrição da decisão do expert para o nível de regras e modelos irá proporcionar uma da regressão complexidade do seu pensamento. O Professor da PRO/USP faz também essa colocação:

“Mas de uma forma geral intuição [experiência] a gente não consegue registrar de forma alguma no modelo de referência. De jeito nenhum. Tem certas coisas que não dá para ter no modelo de referência e intuição [experiência] é uma delas”.

O A2, sócio fundador da Empresa A, afirmou que hoje, no atual nível de competência em que se encontram, eles não fazem mais uso da intuição/experiência:

“Usava a intuição mais no início. Na verdade no inicio era só intuição [adivinhação]. Não tinha conhecimento nem modelo para seguir. Hoje é mais o conhecimento. As decisões hoje são bem mais técnicas e criteriosas”. (A2, sócio fundador da Empresa A).

Não há como ele deixar de usar a sua intuição/experiência. Essa fala demonstra apenas a pressão que ele sofre dentro da organização para estruturar, por meio dos critérios fornecidos pelos modelos, a sua decisão.

A intuição/experiência é uma das grandes competências de um expert radical. Não pode ser aprendida em livros e, como afirmou o Professor da PRO/USP, nem reduzida a regras e modelos. O relato dos sócios da empresa A demonstra a pressão que eles sofrem por usarem critérios para justificar e validar o uso de suas intuições. Eles fazem uso dela, pois faz parte das suas competências como experts radicais, mas acabam inibidos a não reconhecerem o seu uso e a sua importância. Em um processo tão incerto como inovação radical, marcado pela falta de informações e dados para apoiar as decisões, resta na maioria das vezes apenas ao expert radical a sua intuição/experiência. Por isso, por essa dificuldade, para não se dizer impossibilidade, de formalizá-la, os experts são estimulados pelos conselhos, investidores e acionistas a adotarem os modelos e estruturarem suas decisões a partir deles.

O expert radical precisa ter cuidado ao utilizar os modelos para estruturar a sua decisão. Caso não seja capaz de validar a sua decisão a partir dos modelos ele deve seguir a sua intuição/experiência. Ao ignorar a sua intuição/experiência o expert radical estará perdendo o que o diferencia de um novato radical e lhe permite um grau maior de assertividade em suas decisões nesse processo tão caótico. Por isso, os modelos não devem ser usados de forma a inibir o expert no processo de inovação radical, e sim permitir que ele use essa competência nas situações em que o modelo se revela limitado. Dreyfus e Dreyfus (1986) mencionaram na sua obra que um número muito reduzido de pessoas consegue alcançar o nível de expert. Poucos indivíduos no processo de inovação radical irão também atingir esse nível de habilidade. Abaixo está um quadro que resume as características do novato e do expert radical que emergiram da análise das entrevistas.

Constructo Novato Expert

Uso dos Modelos de gestão da

inovação

● Instrumento de aprendizagem.

● Organização das suas ideias e do que deve ser feito.

● Instrumento para seleção de ideias.

● Mecanismo de tradução e comunicação das suas ideias com possíveis investidores.

● Não reconhece as incertezas. Utiliza os modelos como uma forma de lidar com elas.

● Desconhecimento das incertezas permite que tenha maior liberdade em suas decisões.

● Adota a aprendizagem do tipo tentativa e erro para lidar e gerenciar as incertezas.

● Utiliza como forma de estruturar as suas

decisões.

● Fornece critérios para justificar e validar suas decisões diante dos membros da organização. ● Adota os critérios dos modelos no seu processo decisório como uma tentativa de justificar o uso da sua intuição/experiência. ● Usa a sua intuição/experiência para identificar e gerenciar as incertezas.

Quadro 10: Experts e Novatos em inovações radicais. Fonte: Elaborado pelo autor.