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2 REVISÃO DA LITERATURA

5.3 Novatos e Experts no processo de inovação

5.3.2 Novatos em inovações incrementais

Os novatos incrementais possuem uma visão mais abstrata do processo de inovação. Isso pode ser percebido na fala dos novatos entrevistados. Todos usaram termos gerais para definir inovação. O analista A9 da Empresa A definiu inovação como “fazer coisas novas” e o estagiário A10, também da Empresa A, conceituou inovação como oferecer “produtos ou serviços novos”. Os bolsistas da Inova/UFMG Estagiário 1, “soluções tecnológicas novas para o mercado”, e Estagiário 2, “novas tecnologias que darão origem a novos produtos, serviços ou modelos de negócios”, compartilham também visões semelhantes acerca do conceito de inovação. Todos conceituaram inovação a partir de uma visão clássica fortemente influenciada pela literatura clássica de inovação. Eles percebem a inovação pelo grau de novidade introduzida por ela. Pelos seus relatos demonstraram dificuldade em perceber que estavam inovando incrementalmente, exatamente, por visualizarem nenhuma ruptura ou grande novidade no que estão desenvolvendo. Para eles, suas iniciativas não implicam em inovações. Não conseguem perceber as melhorias sugeridas por eles nos produtos desenvolvidos como inovações.

Os modelos de gestão se mostraram muito importantes para os novatos no processo de inovação incremental. Essa inferência emergiu da análise dos relatos obtidos. Tais modelos são um instrumento importante para direcionar as ações dos novatos no processo de inovação. Os dois analistas novatos da Empresa A relataram em suas entrevistas sentirem falta de existir um modelo que direcionasse as suas ações. Segundo eles, existem muitas ações rotineiras que poderiam ser formalizadas através de um modelo. O analista A9 relatou:

“certa vez demorei quase dois dias para tirar uma dúvida com o meu líder de projeto. Fiquei com vergonha de perguntar para o pessoal, pois todos os outros já tinham me explicado aquele procedimento”.

Na empresa B foi possível observar claramente essa aplicação dos modelos para os novatos B4 e B5. Existe, no fundo, uma rotina que está formalizada no modelo adotado pelo grupo. Ambos relataram que, ao iniciarem suas atividades, bastava eles seguirem os passos determinados pelos modelos. Todas as etapas já estavam bem definidas e isso possibilitou que eles soubessem o que deveria ser feito em cada etapa do processo de captação, avaliação e seleção das empresas. O estagiário B5 relatou: “poucas vezes precisei procurar o B2 ou o B1 para tirar alguma dúvida. Estava tudo no modelo. Basta segui-lo”. O estagiário B5 atuou nas três primeiras etapas do modelo adotado pela Empresa B. Ele aplica o questionário para as empresas e seleciona todas as que obtiveram uma nota superior ao ponto de corte. Depois disso, ele auxilia, fazendo o papel de coaching, o empreendedor a elaborar o sumário executivo para ser apreciado pelo primeiro comitê. Caso a empresa seja aprovada, ele volta a auxiliar o empreendedor na construção de um plano de negócio para ser submetido ao segundo comitê. Observa-se que há uma sequência lógica no seu trabalho e também uma rotina. Por isso o modelo é usado por ele como uma referência na execução de suas funções. A previsibilidade das inovações incrementais possibilita essa função dos modelos para os novatos.

O ambiente das inovações incrementais também é marcado que um grau maior de previsibilidade que permite a formalização de uma série de rotinas por meio da adoção dos modelos. O expert ao aplicar o modelo no processo de inovação incremental acredita que será possível o novato tomar várias das decisões que ele tomaria. Para isso basta o novato usar o modelo em suas decisões. Essa crença pode ser percebida na fala do diretor B1 da empresa B: “Todas as nossas decisões são baseados no nosso modelo de avaliação. Ele é a base de toda análise nossa. A gente não foge do modelo. Ele foi montado pelos sócios. Esse modelo que sustenta e orienta as nossas decisões. (...) O modelo é soberano”.

O diretor e sócio B1 é um dos responsáveis pela elaboração do modelo usado pelo fundo. De sua fala surgiu uma pergunta a respeito da possibilidade do novato decidir descartar uma empresa na primeira etapa por julgar que ela não é interessante ao fundo mesmo ela obtendo uma nota igual ou superior ao ponto de corte. A sua resposta foram as palavras mencionadas acima. A sua fala representa a expectativa dos experts em relação ao uso dos modelos pelos novatos. A organização espera que o novato utilize o modelo para tomar as suas decisões. Dessa forma o expert cria a expectativa de que o novato irá tomar decisões semelhantes às suas ao utilizar o modelo. Ao serem questionados sobre o uso do modelo em suas decisões o trainee B4 e o estagiário B5 relataram:

“O modelo ao ser aplicado avalia a empresa e dá uma nota. Para selecionar uma empresa basta olhar a nota de corte do modelo. Na dúvida se a empresa deve ou não ser escolhida é só olhar para nota de corte” (B4 da Empresa B).

“O modelo apresenta uma série de pontos a serem preenchidos. São bem simples e basta a empresa atingir a nota de corte. Como o modelo é baseado em uma série temporal com um grande número de empresa avaliadas a sua precisão é muito grande. No passado todas as empresas que ficaram abaixo dessa nota de corte foram reprovadas” (B5 da Empresa B).

Existe uma crença de que todas as respostas estarão no modelo e os novatos incrementais, como foi percebido por meio de seus relatos, compartilham desse pensamento. Isso só é possível devido a baixa incerteza existente no processo de inovação incremental e, consequentemente, o alto grau de previsibilidade das ações e processos. No caso da empresa B o modelo responde bem, ao utilizar a série temporal para calcular as notas de corte para empresas cujas inovações são classificadas como incrementais. Em inovações radicais, como poderá ser observado no tópico a respeito dessa competência, o modelo adotado pela Empresa B apresentou bastantes limitações. De acordo com os irmãos Dreyfus a performance do novato é medida pela sua capacidade de seguir as regras. As suas decisões são tomadas baseadas nessas regras contidas nos modelo. Tanto o trainee B4 quanto o estagiário B5 usam a nota de avaliação do modelo para decidirem se a empresa possui ou não o perfil buscado pelo fundo. Isso está de acordo com Zarifian (2001) que afirma existir uma relação entre a capacidade de decidir e a competência. Quanto mais competente o individuo maior será sua capacidade de decidir e menos necessidade ele terá de recorrer aos modelos. Outro ponto importante é a associação que Zarifian (2003) faz entre competência, autonomia e iniciativas. O novato tem pouca experiência e competência no processo de inovar incrementalmente. Isso irá refletir na sua falta de autonomia para tomar iniciativas e decidir. O novato precisa então fazer uso dos modelos de gestão para conduzir suas ações e decisões dentro do processo de inovação.

Em todo processo de inovação existem incertezas e foi possível pelos relatos entender como os novatos incrementais lidam com elas. Os novatos entrevistados relaram o uso da intuição para lidarem com a incerteza e a falta de conhecimento. Essa intuição mencionada por eles é diferente da intuição usada pelo expert e definida pelos irmãos Dreyfus. Ela está associada a um processo de adivinhação e não propriamente ao uso da experiência. No caso do novato incremental foi possível inferir pela análise das entrevistas que a intuição tende a

ser usada devido à falta de conhecimento como relata o Professor do DQ/UFMG ao relembrar o seu início:

“Quando não há muita informação usa-se muito a intuição [adivinhação]. No início eu usava muito a minha intuição [adivinhação]. Fui aprendendo a desconsiderá-la pela minha falta de conhecimento do mercado”.

É possível perceber pela fala que ele não se sentia seguro ao usá-la e foi cada vez mais procurando usá-la menos devido à experiência que adquiriram com o tempo. Essa insegurança leva o novato a recorrer aos modelos. Pelos relatos é possível perceber que o novato utiliza as regras presentes no modelo para orientar as suas ações e fundamentar as suas decisões.

Percebeu-se dos relatos a aplicação dos modelos pelos novatos incrementais como um instrumento de aprendizagem. Para aprender o processo de inovação da organização na qual se encontram eles utilizam os modelos como um mecanismo formal de aprendizado. Esse pensamento está alinhado com Zarafian (2001, 2003) e Dreyfus e Dreyfus (1986). O professor da PRO/USP também reforça essa função dos modelos para os novatos:

“O modelo é uma fonte de aprendizado para o novato. E se ele tiver as melhores práticas e lições aprendidas ele ainda ajuda na transformação de conhecimento explicito em tácito”.

O ambiente estável das inovações incrementais e o processo mais rotineiro favorecem o uso dos modelos para essa finalidade. O Professor do DQ/UFMG possui uma empresa que atua desde o seu início com inovações num grau mais incremental. Ele ressaltou a importância que os modelos tiveram no inicio da sua trajetória: “O uso do modelo foi muito importante no início como um processo de aprendizado”. Refletindo sobre o passado ele reconhece a importância que os modelos tiveram como instrumento de aprendizagem. O Professor do DQ/UFMG acrescenta ainda que:

“O modelo no início foi importante para o processo de aprendizado. A montagem do modelo foi um momento de muita reflexão e amadurecimento. O processo de elaborar foi muito importante na minha formação”.

A aprendizagem por meio do uso do modelo está na sua elaboração e na aplicação de suas ferramentas. Pelas rotinas contidas no modelo, o novato, que não consegue distinguir o contexto e a sua influência sobre os resultados como colocaram Dreyfus e Dreyfus (1986), irá visualizar as atividades a serem executadas em cada etapa e acumular experiência e conhecimento acerca daquela situação. Como se trata de um ambiente mais estável e previsível isso se torna possível, pois situações semelhantes se repetem ao longo do tempo

permitindo que ele replique ações e decisões praticadas no passado. O novato incremental irá usar os modelos de gestão da inovação para adquirir experiência no processo de inovação. Essa experiência será acumulada pelo número de situações que ele irá aplicar ao modelo. Há uma expectativa de que essa experiência adquirida ao longo do tempo lhe permita se tornar um expert em inovações incrementais. No próximo tópico, será descrito como esse expert em inovações incrementais é formado e suas características.