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Exportações, Investimentos Estrangeiros e Industrialização

Capítulo 2. Restrições de Financiamento e Capitais Estrangeiros

2.2. Exportações, Investimentos Estrangeiros e Industrialização

Na análise do processo de crescimento econômico dos países menos desenvolvidos, Prebisch (2000b), destaca que com assimilação de novas formas de produção, vindas de países mais desenvolvidos, surgem também mudanças na demanda dos países menos desenvolvidos no sentido de um comportamento similar. A explicação para esse comportamento se baseia no fato de que com o aumento da renda per capita, a partir de certos níveis mínimos, a demanda por produtos industrializados tende a crescer mais do que a de alimentos e outros produtos primários. Da mesma forma que na relação comercial entre centro e periferia, com o passar do tempo, os países mais desenvolvidos tendem a ter uma taxa de crescimento em suas importações menor do que a de países menos desenvolvidos, dado um aumento na renda interna desses países em igual proporção. Isso, não somente porque existe uma tendência natural, com o progresso técnico, de se substituir produtos naturais por produtos sintéticos e novos materiais, mas também porque produtos primários possuem uma elasticidade-renda da demanda menor do que a de produtos industriais.

A magnitude desta disparidade dinâmica entre as importações e exportações de países menos desenvolvidos12, conduziu Prebisch à defesa do processo de industrialização, através do qual, países menos desenvolvidos poderiam ter um ritmo de crescimento econômico superior ao ritmo de crescimento de suas exportações (de produtos primários), dado que a demanda por produtos industrializados cresce, pelo menos, em igual proporção ao aumento da renda. Ainda segundo Prebisch:

“ (...) é fato bastante conhecido que, através da industrialização, os países latino- americanos tendem a crescer com um ritmo superior ao de suas exportações. E, como sua capacidade de importar depende fundamentalmente dessas exportações, é evidente que a renda real desses países, de um modo geral, tende a crescer com mais intensidade do que a capacidade de importar. Daí se depreende, é claro, que esse volume considerável de importações, que aumenta com uma intensidade igual ou maior que a da renda real, não poderia realizar-se se outras importações não fossem comprimidas na medida necessária para que o conjunto não ultrapassasse de maneira persistente a capacidade de importar, a menos que o excesso fosse coberto por investimentos estrangeiros” (2000b, p. 186)13.

Com relação aos investimentos estrangeiros, apesar de seu fluxo reduzido como já mencionado por Prebisch (na nota de pé de pagina no 13), podemos deduzir, segundo a visão deste autor, que o investimento estrangeiro poderia gerar dois tipos de impacto: (i) seria um caminho direto de se substituir importações, caso o investimento estrangeiro viesse para a indústria na forma de IDE, inclusive com capacidade de gerar divisas pelas exportações realizadas a partir destas indústrias, e (ii) os investimentos estrangeiros poderiam atuar no relaxamento da restrição de divisas, o que daria a possibilidade de o país

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Bielschowsky (2000, p. 28) destaca a “tese da tendência à deterioração dos termos de troca (...) afrontava o postulado liberal das virtudes do comércio internacional livre. E que, ao contrário do que prometia a teoria das vantagens comparativas, durante o século XX a maior lentidão no progresso técnico dos produtos primários em relação aos industriais não estava motivando o enriquecimento dos primeiros em relação aos últimos”

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“Estes [capitais estrangeiros], na verdade foram muitos reduzidos desde a crise mundial. Daí o fato de que o crescimento dos países latino-americanos só ter-se podido realizar na medida em que, de um modo ou de outro, foram-se efetuando as transformações indispensáveis na estrutura das importações.” (Prebisch, op. cit., p. 186)

seguir no caminho de industrialização através da importação de bens de capital e intermediários.

Os argumentos de Prebisch sugerem, na verdade, que a industrialização seria a forma de se deslocar o eixo dinâmico da economia do setor exportador (externo) para a indústria (interno). O autor, certamente, estava consciente de que o esquema teórico de crescimento econômico (neo) clássico não contemplava a industrialização de novos países e que a industrialização seria o único meio dos países menos desenvolvidos (não industrializados) captarem parte do fruto do progresso técnico e elevarem progressivamente o padrão de vida da população. Prebisch afirmava ainda que o crescimento econômico de países menos desenvolvidos não deveria estar subordinado ao ritmo de suas exportações, o que não significa descartá-las. Ao contrário, as exportações deveriam fornecer os meios para que se pudesse pagar a importação de máquinas e equipamentos, diversificar estrutura produtiva, assimilar novas tecnologias e, de um modo geral, sustentar as mudanças capazes de impulsionar o crescimento econômico.

Contudo, como mencionado no capítulo 1, a partir da metade dos anos 50 ocorreu uma mudança no ritmo e na forma do movimento internacional de capitais e na organização das grandes empresas em busca de atuação no exterior. Com o advento das EMNs houve mudanças significativas no que se refere à intensificação dos investimentos industriais em todo o mundo, distorcendo, de certo modo, a relação centro-periferia vista por Prebisch. Segundo Bielschowsky (2000), frente a este movimento e a “dificuldades crescentes no balanço de pagamentos [de muitos países em desenvolvimento], determinadas pelo final de guerra da Coréia, a idéia do estrangulamento externo reaparece relacionada à discussão sobre a conveniência de estimular a entrada de capitais estrangeiros privados, ou seja, de não restringir-se à busca de capitais provenientes de recursos públicos” (p. 31). Ainda segundo autor, “Prebisch defendia este estimulo, mas chamava a atenção para o perigo de se expandir os passivos externos dos países e submetê-los exageradamente ao peso de seu serviço, pelo que seria mais prudente ampliar o financiamento de agências oficiais” (loc.

Em relação à idéia do estrangulamento externo, Prebish, mesmo reconhecendo a funcionalidade potencial do capital estrangeiro, via com cautela a contribuição desse tipo de capital. Em seu texto, O desenvolvimento econômico da América Latina e alguns de seus

problemas principais, ele defendia a tese de que se os investimentos estrangeiros fossem

bem encaminhados contribuiriam para o aumento imediato da produtividade por trabalhador, complementando a poupança nos esforços de formação do capital necessário à industrialização e ao progresso técnico da agricultura. Cardoso ao analisar o papel do capital estrangeiro no pensamento de Prebish, conclui que:

“Nas formulações iniciais de sua doutrina, ele aparece como recurso pró-tempore: é necessário aumentar a formação interna de capitais para elevar a produtividade e o Estado é o agente de aceleração deste progresso; como, entretanto, existem distorções (inflação, alta propensão ao consumo, etc.), recorrer-se-á ao capital estrangeiro” (Cardoso, 1995, pp. 57-58).

Logo, reconhecia-se sua importância como indutor de progresso técnico, embora fosse recomendada uma política seletiva de admissão, capaz de impedir a adoção de padrões de consumo incompatíveis com a necessidade de acumulação reprodutiva, e que orientasse um caminho de desenvolvimento envolvido pelo sentimento de autonomia nacional.

Por último, vale lembrar que os fluxos de financiamento externo para países em desenvolvimento mudaram significativamente a partir dos anos 60, quando instituições financeiras privadas passaram a dominar os fluxos de empréstimos internacionais. Da mesma forma que os fluxos de IDE mudaram, quando as EMNs passaram a fragmentar suas estruturas produtivas. Como o aumento do grau de endividamento, em geral, decorrente das crises do petróleo e do aumento da taxa de juros americana, muitos países da América Latina encontraram, no início dos anos 80, grandes dificuldades para garantir o serviço de seus passivos externos. Com está crise da dívida externa, a questão do financiamento do crescimento e o comércio internacional foram inscritos em uma nova perspectiva.

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