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2 PENSAR E COM (SENTIR) UMA PROPOSTA DE INSERÇÃO

2.1 Falando de inclusão

Notadamente, a partir da década de noventa do século XX, a palavra inclusão passou gradativamente a ser utilizada no dia-a-dia das pessoas, na política, em diferentes documentos ou nas pesquisas acadêmicas. Contudo, quando Bondezan (2012), afirma que a exclusão é a prática que permeia a sociedade capitalista e que, por isso, se faz necessário questionar o que é a exclusão para podermos entender e dar sentido à inclusão compactuamos com o entendimento da autora. Isto para evidenciar que a produção da exclusão na sociedade capitalista, é histórica, e já atinge seu paroxismo nesta sociedade, como bem expressou o cantor Zé Ramalho, em “Meu país”. Representando uma categoria de muitos, a exclusão, nesta sociedade, é evidenciada pela citada autora quando afirma que,

“O não ter acesso aos bens produzidos, à educação, à saúde, ao trabalho, dentre outros aspectos, é fato no cenário atual, no entanto podemos observar um quadro pior que a exclusão, ou seja, uma inclusão marginal” (BONDEZAN, 2012, p.62).

Assim, podemos afirmar que o sentido e o significado da inclusão são construídos historicamente. Na sociedade capitalista é proposta a partir de contradições sociais, tendo como ênfase a necessidade de reorganização do modelo produtivo quando este dá pistas de esgotamento como bem demonstram alguns documentos internacionais: a Declaração Mundial de Educação para Todos (1990); a Declaração de

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A música de nome "O Meu País" foi composta por Livardo Alves, Gilvan Chaves e Orlando Tejo, e gravada em 1994, por Flávio José e por Zé Ramalho, em 2000, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. http://dilurdis.blogspot.com.br/2010/09/o-meu-pais-orlando-tejo-gilvan-chaves-e.html.

Salamanca (1994); a Declaração de Dakar (2000); a Declaração Internacional de Montreal sobre Inclusão (2001); a Declaração de Madrid (2002); a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência (2006). Tal proposta é ainda apoiada por algumas agências financeiras internacionais, tais como o Banco Mundial (BM); o Fundo Monetário Internacional (FMI); o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID); a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), com ações para a educação, firmando o compromisso de conceder cooperação financeira externa, bilateral e multilateral”. Estas foram algumas das agências que a partir do Consenso de Washington (1989) auxiliaram a expansão do modelo neoliberal nos países latino-americanos.

Portanto, vemos a defesa da escola pública, para todos, como um discurso que predomina em não poucas leis, programas governamentais, declarações e políticas de ordem nacional e internacional. Voltado, principalmente, para países periféricos, temos observado que o processo de inclusão, na realidade escolar no século XXI, está assentado, principalmente, segundo bases sociais capitalistas, mesmo seguindo “uma orientação política”, segundo a qual, “toda criança, adolescente e jovem deve estar na escola” (BRASIL, 2008, p. 03). Diante disso, temos o grande desafio de aguçar nossos sentidos e, de forma criativa, a partir desses discursos com seus instrumentos, irmos rompendo com a hegemonia dessa escola nos moldes neoliberais onde,

[...] o barateamento do ensino público é palavra de ordem, com escolas sucateadas, professores desmotivados e com baixos salários; salas de aula superlotadas. Neste cenário, podemos nos indagar: como realizar a real inclusão escolar de pessoas com deficiência, participantes do processo educativo? (BONDEZAN, 2012, p.63).

Este é o quadro estrutural, da sociedade mundial, onde está situada a escola brasileira que aposta na “inclusão” como uma alternativa à exclusão, que tem alienado tantas pessoas da condição de existência histórica e humana. Apresentado por Caiado (2003), este quadro é revelador de prioridades políticas em nosso país. Dele, é possível extrair elementos subjacentes às relações macro dinâmicas e que provocam impactos negativos nas possibilidades de desenvolvimento.

Estes são sentidos não somente pelo sujeito com deficiência intelectual, priorizado neste estudo. Para esta autora, as decisões políticas, concernentes à educação, em nosso país ainda priorizam as demandas para o prolongamento do modelo produtivo capitalista. Desta forma, a educação, para humanização dos indivíduos como produtores

da história e sujeitos na superação das formas excludentes do ser humano, pode acirrar um processo de inclusão, com outro significado, na contramão de uma realidade que demonstra o tipo de compromisso da política nacional com a sociedade, uma vez que,

[...] em dez anos de existência, a Constituição de 1988 sofreu 25 emendas, o que lhe tirou toda a força interior. Nossa história recente ilustra o movimento com o qual o Brasil vai se alinhando, cada vez mais, com a nova ordem econômica. Fernando Henrique Cardoso (FHC) assume as regras do Consenso de Washington e conduz seu governo na lógica da reestruturação capitalista: desregulamentação, privatização, desuniversalização (CAIADO, 2003, p.20).

Uma questão, talvez muito debatida, se traduz neste momento como o elemento desencadeador de algumas análises que convergirão para o objetivo deste trabalho. As sociedades, os grupos, os indivíduos, e até mesmo as próprias escolas – no mundo todo – a respeito da educação escolar deveriam indagar: o que representa a educação nesta sociedade, e a partir dela, que demandas podem ser atendidas na satisfação de necessidades humanas?

Buscando se aproximar dessa questão, Perez (2008, p.22) expressa que,

[...] a educação em nível mundial se reveste de importância e se torna o centro de atenção dos interesses de governos e de demandas da população. O governo concentra-se na educação porque somente ela pode ser o substrato de excelência para o desenvolvimento de saberes e competências para a implementação das políticas desenvolvimentistas. Para a população, ela se configura como a única possibilidade de ascensão social e de acesso às condições básicas de igualdade humana.

Diante dessa abrangência da educação é interessante comentar que a pergunta sobre o sentido da educação, se elabora e se manifesta na diversidade das relações de muitas maneiras – através de orientações políticas gestos, discursos, comportamentos, leis, diretrizes [...] – em convergência ou não com a realidade dos sujeitos sociais.

No que tange à realidade escolar, do Público Alvo da Educação Especial - PAEE, diante da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva - PNEEPEI/2008 temos participado de um momento histórico em que as contradições sociais e escolares sinalizam para a emergência da ruptura com o modelo educacional, segregador, excludente e descontextualizado em sua função social e cultural. Isto sem incorrer no equívoco de separar essa realidade da abrangência das relações sociais mais amplas, em torno do tema educação, cuja perspectiva de

universalidade tem sido retratada como central na noção de qualidade da educação. Assim a qualidade teria a quantidade como condição (GUSMÃO, 2010). Não que a ideia de qualidade, categoricamente, exclua aspectos quantitativos, mas é que a noção de qualidade tem um caráter polissêmico, não se traduz em termos essenciais e absolutos e não encerra um conceito neutro. No caso do Brasil,

[...] ainda que a noção de qualidade, da educação esteja presente, na legislação brasileira, ela é abordada de maneira pouco precisa. Duas principais abordagens podem ser identificadas. A primeira, que parece ser principal, refere-se à “garantia do padrão de qualidade”. O dispositivo não explicita do que seria composto esse padrão; no entanto, infere-se com base no tratamento dado pelo conjunto de leis que o enfoque primordial contempla os insumos necessários ao processo educativo, atrelados ao que se convencionou chamar de custo aluno-qualidade. A segunda é a que coloca a avaliação da qualidade como uma das condições para o ensino ministrado pela iniciativa privada. [...], não se define também no que consiste a qualidade a ser avaliada. No mais, as referências à noção são ainda mais genéricas, tal como no enunciado objetivo do PNE de melhorar a “qualidade de ensino em todos os níveis” ou quando se mencionam “pesquisas visando o aprimoramento da qualidade” (GUSMÃO, 2010, p.49).

No contexto da educação brasileira, a PNEEPEI/2008, evidencia o Atendimento Educacional Especializado - AEE. Este é destacado como apoio no processo de inclusão orientado pelas políticas educacionais em nosso país. Tal apoio, consideramos pertinente numa sociedade excludente e, se encontra no contexto escolar, diante do desafio de superação cultural do individualismo, seletismo, do preconceito, do desrespeito à diversidade, das relações mercadológicas em detrimento do direito de frequentar e tirar proveito de seu ensino.

É neste panorama social, evidentemente incompatível com a essência humana, que se põe em evidência o AEE proposto pela PNEEPEI/2008. Conforme (MANTOAN, 2014, p.46) compartilhando o depoimento de uma professora do AEE, em uma das escolas no País, temos uma dentre tantas formas de expressar esse apoio à inclusão:

[...] é um serviço que ajuda a identificar, elaborar e organizar recursos pedagógicos e disponibiliza as salas que atendem alunos de inclusão de todas as unidades concentradas nas escolas municipais. Mesmo sendo leigos, não sendo profissionais da área de Medicina, a gente já observa algumas síndromes e encaminha para um profissional em saúde e, detectado o problema, a gente já começa a atender. [...], a partir da dificuldade que o professor tem na sala de aula, ver o estudo de caso, verificar essa criança, tanto na sala de aula, quanto a questão da família para poder fazer o plano para iniciar o atendimento [...]. A gente vai procurar maneiras de fazer com que essa criança se desenvolva. [...], porque o professor dá esse suporte de

acordo com o que o professor da sala de aula comum pede e o aluno retorna cada vez mais seguro para participar com seus pares em sala de aula. Então [...] o AEE vem dar um suporte aos professores do ensino comum no que se refere a adaptação de atividades, à interação dos alunos no ambiente social da escola. [...] é uma coisa muito boa porque o AEE trabalha especificamente as dificuldades que cada um tem para ele conseguir trabalhar, ser incluído. Enfim o AEE é [...]. [...] é fundamental essa sala nas escolas porque não trabalha só a questão pedagógica, papel, lápis, borracha, trabalha o pedagógico como um todo. Então, se nós localizamos hoje uma dificuldade na motricidade dentro daquilo que é pedagógico, que é necessário para o aluno, a gente vai trabalhar as questões motoras, questão de lateralidade, organização espacial, e também trabalhamos a dificuldade na escrita. Não é reforço, dá o suporte ao professor, à gestão, aos funcionários da escola, e complementa a educação desses alunos no contra turno (Professora do AEE).

Nosso entendimento é que, neste contexto, a escola pode lançar mão do AEE previsto na política do Governo Federal, utilizando-o como ferramenta no desafio de construção de uma proposta de educação, fundamentada em uma ética, inspirada na certeza de que as formas de ser são infinitas. Neste sentido, é necessário, então, ir superando as relações escolares excludentes, que reproduzem o modelo produtivo capitalista que atribui um valor mais ou menos humano às pessoas, reduzindo-as.

2.2. O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO (AEE) E A POLÍTICA