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Fatores de Degradação das Formações Florestais

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CAPITULO II: A DESCENTRALIZAÇÃO FLORESTAL NO SENEGAL

II. 2 ESTADO DAS FORMAÇÕES FLORESTAIS NO SENEGAL

II.2.1 Fatores de Degradação das Formações Florestais

O estado de degradação das florestas senegalesas é resultado de diversas pressões e constrangimentos de origem natural, humano e institucional.

a) A seca

O persistente déficit pluviométrico do Senegal constitui uma grande ameaça à redução da biodiversidade. As mudanças sobre ecossistemas florestais são em parte, resultantes dos efeitos da seca, que causaram uma redução do lençol freático, uma salinização e acidificação dos solos (Ndione, 1998). A redução do nível das águas da superfície

prejudica a vegetação e favorece a salinização dos solos e águas, um dos maiores problemas das formações florestais próximas ao oceano. As secas favorecem também a freqüente ocorrência de incêndios florestais. O tapete herbáceo das savanas arbustivas quando associadas às temperaturas elevadas e secas, favorece a propagação dos fogos. Estes devastam cada ano extensas áreas de vegetação. Eles têm uma incidência negativa sobre a composição da flora, a produtividade do estrato herbáceo pela destruição das sementes e a eliminação da palha (PENNING de VRIES et al, 1982). Eles também podem eliminar os refúgios da fauna, a folhagem jovem, e a regeneração natural, além de destruir os frutos selvagens, fontes de alimentos e de rendas para populações. Mesmo que a ocorrência das queimadas aumente com a falta de chuvas, o pastor e o agricultor são agentes causadores não negligenciáveis. Acidentes acontecem, por exemplo, quando o pastor acende um pequeno fogo para se aquecer ou cozinhar no meio da mata, e esquece de apagá-lo. Também a prática agrícola que consiste em limpar os campos agrícolas antes do início das chuvas e depois queimar os resíduos agrícolas do ano precedente causa o início de um incêndio que pode se propagar até as florestas. Sessões informativas e de sensibilização sobre os incêndios florestais foram freqüentemente organizadas pelos agentes estatais e pelas organizações não governamentais, mas essas sessões não conseguiram os resultados almejados em termos de redução das queimadas.

b)- Causas de origem Humana

O país depende de mercados de produtos primários agrícolas para a geração de divisas externas e o pagamento da dívida. Então para assegurar ganhos econômicos em curto prazo, novas fronteiras agrícolas são abertas, a custo do desmatamento (figura 4). A extensão das terras cultivadas fez também com que os pastores se focalizem cada vez mais nos espaços florestais. Estes cortes excessivos levam a rarefação progressiva de numerosas espécies de forragens, herbáceas e arbóreas. No entanto, o pastoralismo depende muito das florestas quando os recursos florestais estão se tornando escassos. Dentro das florestas, estes pastores cortam ramos de árvores para alimentar seus animais. A pressão sobre as florestas ficou mais acentuada com o número do gado que não para de aumentar devido à

redução da mortalidade animal27. Esta situação levou a mais um deslocamento dos pastores, mais especificamente na parte sul do país à procura de pastagens verdes. Esta pecuária extensiva e da migração dos rebanhos praticada primeiramente pela etnia peulh está na origem de muitos conflitos entre pastores e agricultores. Acontecem casos em que o gado entra numa plantação agrícola de um individuo, gerando conflitos que muitas vezes tornam-se violentos entre os agricultores e pastores.

Além da redução das produções florestais não madeireiras pela exploração massiva dos pastores, a coleta excessiva de frutas selvagens antes do amadurecimento, a coleta das raízes, de folhas e da casca para a farmacopéia, são outras formas de pressão nas florestas. Entretanto segundo estudos, as duas maiores causas de desflorestamento no Senegal são a exploração florestal para a extração de energia lenhosa e, sobretudo a expansão agrícola (REBUPLIQUE SENEGAL, 2005).

Figura 4: Expansão das áreas agrícolas.

Fonte: Centre de Suivi Ecologique, www.cse.sn, 1997

A forte demanda de lenha continua sendo uma outra causa importante para o desmatamento. No Senegal, a energia doméstica é basicamente constituída pelos combustíveis lenhosos (lenha e carvão) provindos das formações florestais naturais. A lenha representa geralmente o principal combustível doméstico utilizado pelas populações rurais e pelos citadinos com baixa renda que não podem procurar outras fontes de energia. Os combustíveis lenhosos representam 60% do balanço energético do Senegal e mais de 80% do consumo total energético das famílias. As necessidades de madeira por pessoa anualmente, estão estimadas em 1,1 m3 no meio urbano e 1,25 m3 no meio rural (CSE, 2006). Estes dados explicam evidentemente os numerosos abates de árvores, causa principal do desflorestamento. Mais de quatro milhões de m3 de madeira são coletados todos os anos para satisfazer as necessidades de energia lenhosa das populações. A

produção de carvão leva ao desmatamento de 18 000 a 33 000 hectares por ano, ou seja, 11 a 20% do total estimado do desflorestamento anual (CSE, 2006). A grande parte da produção de carvão destina-se aos centros urbanos. Dacar já representa 15% do consumo total de carvão. Com as crises energéticas que afligem Senegal desde 2005, o preço do gás de cozinha aumentou, resultando numa maior demanda de carvão, dando mais impulso à produção de carvão nas florestas. Não é nada surpreendente que as regiões de Tambacounda, Kolda e Kaolack, que foram respectivamente as regiões mais ativas na produção de carvão, tenham as áreas florestais mais devastadas. Relatórios sobre a percepção da pobreza no país, revelaram também que estas três regiões são as mais pobres do país, mostrando mais uma vez a correlação entre pobreza e meio ambiente degradado. Muitos trabalhos já demonstraram que áreas com nível elevado de pobreza sofrem maior pressão sobre os recursos naturais. Hoje a produção de carvão está proibida na região de Kaolack; todavia esta atividade permanece legal em Kolda e Tambacounda.

c) - Causas de Ordem Institucional e Política

A degradação florestal foi também resultante da falta de efetividade das políticas públicas. A corrida para o crescimento econômico rápido, tem causando a redução das áreas florestais. Como já mencionei os projetos nacionais de modernização desde a independência, deram prioridade à valorização das terras para o uso agrícola mais do que outras formas de uso. Estes projetos sempre incentivaram a promoção de culturas comerciais e a extensão das áreas para uma agricultura intensiva. Portanto o avanço das terras agrícolas sobre as áreas florestais deu-se por parte das opções políticas de desenvolvimento. Assim vê-se com freqüência a desclassificação de ‘florestais classificadas’, sendo alocadas aos interesses privados para a produção agrícola em grande escala. Os ‘marabu’ foram que mais se beneficiaram destas concessões para a produção intensiva do amendoim e outros produtos de exportação. Os ‘marabu’ são guias religiosos muçulmanos que desde o período colonial investiram na cultura do amendoim. Assim em 1991, 45.000 hectares da reserva de Mbégué, na região de Kaolack foi desclassificada em proveito de um chefe religioso: 5 milhões de árvores e arbustos foram eliminadas. Em 1992, 75 000 hectares da floresta de Khelcom, na região de Diourbel foram atribuídos a

um chefe religioso. O caso mais recente aconteceu em 2007 com a desclassificação de 10.000 hectares de florestas na região de Thies aos benefícios de ‘marabu’.28

Políticas energéticas inadequadas contribuíram também para a degradação destes recursos lenhosos. Até 1994, as taxas florestais eram estabelecidas sobre a quantidade de carvão produzido, não sobre o número de árvores derrubadas para obter o carvão. Quanto às técnicas tradicionais de carbonização, nem sempre foram sinônimos de eficácia energética, pois se necessita de 5 kg de lenha para produzir 1 kg de carvão. Além disso, instaurou-se uma política de ‘quota nacional de carvão29’ na qual o governo autoriza aos profissionais de carvão uma quantidade limitada de árvores por ano que poderiam ser transformadas em carvão. Se no final do ano, os profissionais não davam conta de derrubar e carbonizar esta quantidade de árvores, no ano seguinte, eles seriam sancionados por uma redução de sua quota. Evidentemente esta regulamentação nada incitou os profissionais de carvão ao uso eficiente e racional das florestas, mas favoreceu o desperdício. Enquanto que as populações adjacentes das florestas assistiam à pilhagem por indivíduos não residentes nos vilarejos, dotados de licença de corte de árvores. Estes indivíduos não deixaram de cortar mesmo as árvores mais importantes para a alimentação das populações, sendo que estas últimas não tinham nenhuma legitimidade para frear a produção do carvão. A situação atual das florestas é ainda mais preocupante quando se nota que apesar do processo contínuo de degradação florestal, as ações de reflorestamento ao longo dos anos foram pouco satisfatórias. As quantidades coletadas são bem maiores que a reposição.

O controle sobre a aplicação dos textos regulamentares é deficiente devido à preeminência das leis modernas, as regras tradicionais de uso das florestas perderam gradativamente sua legitimidade. Nos tempos antigos, o ‘chefe do vilarejo’ ou o ‘guardião dos cultos ancestrais’ tinham certa autoridade sobre a proteção das florestas. Naquele tempo, o chefe do vilarejo era uma função herdada pela descendência do primeiro ocupante do vilarejo. O

28 Informações publicadas no jornal Sud Quotidien do dia 10 abril 2007

29 A quota representa a quantidade de madeira autorizada pelo Estado, a ser explorada pelas

organizações de empresários aprovados. Tal sistema de produção de carvão foi instaurado desde 1980.

fundador do vilarejo, antes de limpar uma floresta para se instalar com sua família, pedia autorizações aos espíritos que habitam neste espaço. Ele entrava em acordo com os espíritos e com seus ancestrais pedindo proteção à sua família e a seus descendentes. Em contrapartida, os residentes do vilarejo preservavam a floresta através de regulamentação, de tabus e da interdição de abates de certas árvores essenciais. Alguns animais ou árvores da floresta se tornavam sagrados representando totens ou deuses protetores do vilarejo. A floresta se tornava a um patrimônio cultural coletivo, sendo praticada assim uma forma de conservação in situ. Ela era submetida à autoridade de um chefe ou do descendente do primeiro ocupante do vilarejo. A esta autoridade devia-se demandar autorização antes de qualquer coleta. Com a colonização e depois com a criação do estado moderno, a função de ‘chefe de vilarejo’ não pertencia mais a uma família, passou a ser uma função administrativa. Nos tempos atuais, o chefe do vilarejo é nomeado pelo vice-prefeito e tem a principal tarefa de arrecadar os impostos. Alem disso, com o avanço do islã e do cristianismo, a importância espiritual do chefe de vilarejo começou a desaparecer, sem contar que existe uma pluralidade de atores econômicos que usam a floresta cujos tabus e crenças locais não fazem nenhum sentido. Isto tudo contribui ao fim da representação ethno – mitológica da floresta e ao abandono das regras costumeiras.

O Estado se mostrou ineficiente com a gestão das florestas. Os recursos financeiros alocados são insuficientes para a reabilitação e conservação, e os recursos humanos restritos não podem assumir a supervisão de todas as florestas. Os poderes públicos trouxeram respostas variadas como políticas de reflorestamento repressivas com a interdição de explorar algumas espécies e algumas áreas, e a promoção de fontes energéticas em substituição ao carvão e lenha. Estas respostas não foram bem sucedidas, pois os recursos florestais continuaram a se degradar. Nesta perspectiva, a legitimação das populações locais para manejar e proteger as florestas através da descentralização, apresenta uma oportunidade para que formas de manejo mais adequadas sejam fomentadas.

II. 3 HISTÓRIOCO DO PROCESSO DA DESCENTRALIZACAO NO

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