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Formação Discursiva (FD): O Mal-Estar Docente

No documento Sirlande Rodrigues final (páginas 112-115)

Capítulo VI: Apresentação, Análise e Discussão dos Resultados

6.2. Apresentação, análise e discussão dos resultados das entrevistas

6.2.7. Formação Discursiva (FD): O Mal-Estar Docente

A profissão docente é por natureza delicada e complexa e, por isso, certamente, nunca existiram épocas em que fosse fácil exercê-la. Temos de reconhecer, no entanto, que nos últimos cinquenta anos, graças às transformações de diversas naturezas que se verificaram nas sociedades industrializadas e estiveram na origem da globaização e da sociedade da informação, a profissão se foi tornando crescentemente complexa. E talvez nunca o fosse tanto como está a ser nos nossos dias, visto que hoje se pede tudo à escola e aos professores, mesmo aquilo que dificilmente poderão dar (Estrela, 2010).

Estudos realizados por Piñeyro (2009) Esteve (1999), Codo (1999) entre outros, apontam que múltiplas pressões: históricas, sociais, políticas e culturais do mundo globalizado, feitas ao professor, vêm causando a estes, grande mal-estar, comprometendo a saúde dos mesmos.

De acordo com Paschoalino (2007 apud Altoe, 2010) o mal-estar docente, nem sempre é manifestado e muitas vezes, é agravado por ser pouco perceptivo. “Há um silenciamento” dos professores a respeito de suas dificuldades, tensões e frustrações - É comum os professores calarem seus sentimentos de desilusão, insatisfação com o trabalho ou com escola onde trabalham. Alguns desempenham um trabalho intenso, com jornadas longas de trabalho e com pouco reconhecimento dos seus pares ou gestores. O mal-estar instala-se sempre em tais condições de trabalho.

Altoé (2011) explica que essa realidade acarreta falta de tempo para estudo, lazer e para a vida familiar, frequentemente, marcada por preocupações, relacionadas, principalmente, a problemas com os filhos e à administração do lar. Nesse “silenciamento”, matizado de emoções, as frustrações e o desencanto com o magistério vão minando as “forças” do docente, além de gerar um sentimento de culpa por não dar conta de concretizar o que havia sido planejado.

Na FD a seguir, buscamos analisar os extratos de depoimentos dos professores em exercício a respeito do mal-estar docente.

Quadro 9. Apresentação dos ED dos professores, agrupados na FD (Formação Discursiva): O mal-estar docente

FD: O mal-estar docente

Identificação do Professor

Excerto de Depoimento (ED)

PE1 “Você às vezes pensa ‘ o que é que eu estou fazendo aqui?” (...) Você fica

na sala de aula com aqueles alunos sem querer nada. “Muitas vezes causa esse mal-estar”.

PE2 “Eu creio que é assim, como alguns professores falam: ah, meu Deus, eu

tenho que ir pra aquea turma tal (...) acho que ai já é o mal-estar. (...) Acho que já é muito grave um professor pensar assim”.

PE3 “O mal-estar docente é a sua desvalorização na profissão, é você procurar

fazer um trabalho bem feito e de qualquer forma nem analisado como um bom trabalho; é você querer dar uma aula diferente e de repente, gestão ou o aluno mesmo acreditar que você está enrolando aula. (...) mal-estar é tudo aquilo que não lhe deixa à vontade nem na minha escola nem na minha sala de aula”.

PE4 “O mal-estar é a falta de reconhecimento do papel que o professor tem”.

O depoimento da PE1 ao posicionar-se sobre mal-estar questiona-se: ”o que é que eu estou fazendo aqui?” retratando os momentos em que seus alunos estão completamente alheios à aula, sem demonstrar qualquer interesse ao que é apresentado. É o momento em que sente mal- estar. Esse questionamento, sem dúvida, remete ao sentimento de inutiidade e incompetência que, nesses momentos, experimenta o professor. A problemática do desinteresse dos estudantes de educação básica na contemporaneidade é complexa e envolve fatores que não são o foco dessa pesquisa, mas que são relevantes e têm sido tema de diversas pesquisas e preocupações de muitos educadores (Jesus, 2004).

Entretanto, cabe-nos lembrar do que nos diz Jesus (2004) quando trata da democratização do ensino, atavés do alargamento da escolaridade, que massificou o ensino e contribuiu para que muitos alunos passassem a frequentar a escola. Porém, estes não encaram como um direito, nem como forma de desenvolvimento pessoal e interpessoal, mas como um dever, uma obrigação que não lhes agrada. Dessa forma, esses jovens não vêem a escola como responsável pela construção de seu futuro profissional. Essa incerteza acerca do futuro, “afeta o seu interesse pelo trabalho escolar”, afrima o autor (p. 195). Assim, o desinteressse e a indisciplina dos alunos causam reações nos professores como a relatada aqui pela PE1, numa constatação de sua impossibilidade de resolver o problema.

O PE2 considera que o mal-estar é quando um professor sente-se angustiado ao chegar a hora de entrar em determinada turma para dar aula. Nesse estágio de mal-estar, já podemos perceber, um agravamento: a angústia. As emoções e reações do professor já estão adoecidas. Quando não mais suporta estar em determinado lugar pelas circunstâncias geradas nesse espaço, já se perdeu a capacidade de relaçao harmônica (Esteve, 1999).

Codo e Vasques-Menezes confirmam que “o desgaste do vínculo afetivo leva a um sentmento de exaustão emocional, (...) um esgotamento da energia física e mental.” (Codo e Vasques-Menezes, 1999; p. 262-263) Nessas condições, não é de se estranhar o sentimento de angústia, que abate o ânimo do professor que já não se sente capaz de desenvolver um mínimo de empatia necessária para desenvolver o seu trabalho. Assim prevalece, infelizmente, em alguns casos, “o cinismo ou dissimulação afetiva (...). O professor começa a desenvolver atitudes negativas, críticas em relação aos alunos”. É muito comum na sala dos professores, ouvirmos relatos negativos a respeito de alguns alunos ou turmas, quando profesores comparam o desempenho das turmas e criam certa rejeição àquelas consideradas difíceis. É possível observar a insatisfação e o desgaste emocional dos professores – talvez já adoecidos – quando estes atribuem sempre aos próprios alunos ou à gestão da escola o motivo do fracasso.Os EDs da PE3 e do PE4,

tratam do mal-estar como resultado da desvalorização que sofrem como professores. Não apenas da desvalorização econômica, mas também do trabalho em si que desenvolvem. Queixam-se de trabalhos longos e exaustivos que realizam e da pouca e quase nenhuma valorização por parte do seu chefe imediato, a falta de elogio ou incentivo.

A esse respeito, Santos et al (2008) comentam da necessidade que tem o ser humano de ser valorizado e reconhecido pelos outros quanto àquilo que realizam, Quando essa necessidade é satisfeita, que seja com um elogio, um sorriso de consentimento ou outra manifestação qualquer, aparecem os sentimentos de acolhimento, de confiança e de autovalor. A falta disso origina-se a baixa autoestima, sentimentos de inferioridade e às vezes de revolta e desejo de abandonar a profissão.

Nesse sentimento de desvalorização, não se pode deixar de relatar também a questão salarial. Odelius e Ramos usam uma expressão interessante ao tratar da questão da desvalorização salarial do professor. Segundo elas:

“O professor vive uma situação de iniquidade salarial não apenas quando olha para outras categorias, como mesmo nível de exigência, responsabilidade e esforço, mas também quando [...] compara o seu salário com a de outos funcionários públicos do Estado e constata que está entre os que ganham pior para o seu nível de formação e responsabilidade.” (Odelius e Ramos, 1999, p. 384)

Essa constação é mais um fator responsável pelo mal-estar tão presente na vida de tantos professores. Não conseguir dar conta de suas responsabilidades econômicas quanto ao seu sustento e da sua familia, vendo dia a dia dimimuir seu poder aquisitivo e a sua qualidade de vida, tem adoecido e maltratado a muitos professores brasileiros.

6.3. APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DAS ENTREVISTAS

No documento Sirlande Rodrigues final (páginas 112-115)