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Profissionalismo e Profissionalidade Docentes

No documento Sirlande Rodrigues final (páginas 33-37)

Capítulo I: Profissão Docente: Conceitos e Contextos

1.1. Breve contextualização histórica e social da profissão docente no Brasil

1.1.2. Profissionalismo e Profissionalidade Docentes

No que se refere à metáfora acima, para sair do “lugar do morto”, apresentada por Antônio (2003) – tratando da passividade do professor diante das novas exigências que lhe lhes são impostas - o professor precisa de autonomia, que somente pode ser conquistada pela profissionalização e/ou pela profissionalidade (Contreras, 2012).

Weber (2003) presume que a profissionalização é um processo de dimensão política complexa que ultrapassa o debate sobre a docência e a educação, visto que possui marcas de luta pela construção da democracia.

Oliveira (2010, p. 19) tratando da questão da profissionalização no magistério, comenta que o “ato de buscar transformar em profissional algo que se faz de maneira amadora”, seria uma busca de sentido e reconhecimento social para a categoria. Ela continua:

“Assim, a profissionalização do magistério pode ser compreendida como um processo de construção histórica que varia com o contexto socioeconômico a que está submetida, mas que, sobretudo, tem definidos tipos de formação e especialização, de carrreira e remuneração para um determinado grupo social que vem crescendo e consolidando-se.” (Oliveira, 2010, p. 19)

A partir disso, a autora comenta que para compreender o desenvolvimento da ideia de profissionalização necessita-se compreender também a organização do Estado, que de acordo com os estudos de Marx Weber se estrutura e se mantém imparcial – conferindo-lhe eficiência e legitimidade. Os estudos escolares modernos emergem desse aparato estatal e se organizam como parte dele. Tenti Fanfani (2007 apud Oliveira) afirma que dentro desse processo os docentes ocupam um status ambíguo:

“Por una parte su actvdad era defendida como una misión cuya dignidad derivada de la elevada función social que se le asignaba a la escuela (la conformación del ciudadano de la republica moderna el transmisión de valores universales que estavan má allá de toda discusión, la construcción de la idea de Patria, etc.). Pero por la otra el maestro era también un funcionario con lugar muy preciso en una estructura jeráquica dominada por un conjunto de regulaciones y nomas que definian con precisión sus responsabilidades, tareas e incumbencias. En pocas palabras, el docente era un apóstol y al mismo tiempo un funcionario, es decir alguien a quien se le ha asignado una función claramente establecida en los marcos legales formativos y regulativos que estructuran su actividad. A su vez, el trabajo del maestro era supervisada por una serie de “superiores jerárquicos” (el vice director, el director de escuela, el supervisor, etc.). Su actividad no solo mera regulada, sino también supervisada de cerca y en forma continúa por una serie de agentes especializados.” (Tenti Fanfani, 2007, apud Oliveira, 2010, p. 19)

Os estudos sobre a profissionalização docente são oriundos de duas vertentes: uma de tradição pedagógica humanista – que foca o processo da construção do sujeito no seu processo formativo e a outra a da perspectiva sociológica, centrada na inserção desses sujeitos na divisão social do trabalho. Essa vertente traz uma abordagem da profissão a partir da matriz marxista que trata da proletarização/desvalorização que se constata na desqualificação do trabalho docente quando este perde o controle sobre o processo do seu trabalho – o que se denomina de perda de autonomia. Oliveira (2010) aponta que essa perda de autonomia é uma ameaça à carreira docente e que a profissionalização é a saída defensiva para a recuperação dessa autonomia, já que eleva o

status social e garante proteção e reserva de mercado.

Nessa perspectiva, Nóvoa registra:

“A profissionalização é um proceso do qual os trabalhadores melhoram o seu estatuto, elevam os seus rendimentos e aumentam o seu poder/autonomia. Ao invés, a proletarização provoca uma degradação do estatuto, dos rendimentos e do poder/autonomia; é útil sublinhar quatro elementos deste último processo: a separação entre a concepção e a execução, a estandartização das tarefas, a redução dos custos

necessários à aquisição da força de trabalho e a intensificação das exigências em relação à actividade laboral.” (Nóvoa, 1993, p. 23)

Dessa forma, a profissionalização é, sem dúvida, instrumento de defesa e identidade para o professor ante o caráter normativo do Estado. Weber escrevendo sobre o processo de profissionalização comenta que:

“É possível admitir que a questão da profissionalização, entendida como processo que transforma uma atividade desenvolvida no mundo do trabalho mediante a circunscrição de um domínio de conhecimentos e competências específicas como processo que, calcado nas características de profissões estabelecidas (as profissões liberais), nomeia, classifica uma ocupação como profissão, associando-lhe imagens, representações, expectativas historicamente definidas, ou como processo de reconhecimento social de uma atividade ou ocupação (...).” (Weber, 2003, p. 1127) Assim sendo, a autora admite que a formação e a adoção de um código formal para a profissão constituem-se em elementos fundamentais para a profissionalização.

A partir de estudos desenvolvidos por Larson (1977) sobre profissionalismo como ideologia, Contreras salienta que esse tipo de profissionalismo em que se encontra ligada à capacidade de impor um conhecimento como exclusivo, em relação ao professor “pode resultar em estratégias discutíveis quanto a sua eficácia”, visto que “[...] se o profissionalismo como idelologia se encontra ligado à capacidade de impor um conhecimento como exclusivo, despolitizando e tornando tecnocrata a atuação social, está longe de ficar claro que isso seja uma conquista social.” (Contreras, 2012; p. 67-68)

Fica patente que negar a participação social na educação seria negar a própria essência do ensino: o seu caráter social. Portanto, esse tipo de profissionalismo não seria garantia de autonomia ao professor. Ao contrário, seria uma verdadeira armadilha, em nome da qual “os professores são usados por parte do Estado em época de reforma, para assegurar a colaboração do professor e anular possíveis resistências à redefinição de sua função”. Ou seja, em nome desse “profissionalismo”, professores comprometem-se a fazer mais sem qualquer remuneração adicional, somente para em nome desse “altruísmo profissional”, que é interiorizado pelos profissionais do ensino. Os que não o fazem, são, inclusive, considerados “maus profissionais” (Contreras, 2012, p. 68).

Diante do exposto, o autor prefere tratar da ideia docente como profissional a partir dos conceitos da profissionalidade, que segundo ele, não somente melhor descreve “o desempenho do trabalho de ensinar, mas também de expressar valores e pretensões que se deseja alcançar e desenvolver nessa profissão.” (Contreras, 2012; p. 82)

Penin (2009) conclui que quando escolhemos uma profissão, quando escolhemos aquilo que vamos fazer em nossa vida, estamos também determinando como vamos viver e como vamos agir, porque é isso que vai nos identificar mais tarde, na profissão. Aqui ela aponta também a questão da nossa subjetividade – aquilo que somos, as emoções, a afetividade, os valores que carregamos - que é transferida para a nossa profissão, para aquilo que escolhemos fazer. Dessa forma, profissão associada à personalidade dá origem a profissionalidade.

Profissionalidade, portanto é o exercício de uma profissão sem a negação do eu, pelo contrário, na qual a subjetividade de um eu envolve-se, mescla-se ao ofício exercido. Portanto, é demasiado complexa a profissionalidade docente, cuja ação cotidiana assenta na subjetividade do

outro, que é o objeto do seu trabalho.

A vivência de uma profissão, de uma instituição e principalmente de um cotidiano com um grupo de pares e outras pessoas que o constituem (no caso do professor, uma escola, os alunos e seus pais, os servidores, a comunidade, os representantes e superiores da instituição etc.) em geral interfere de maneira vigorosa no desenvolvimento da própria identidade ou a “identidade do eu”. Nesse sentido é possível entender a palavra profissionalidade como a fusão dos termos profissão e personalidade (Penin, 2009, P. 24-25).

Estrela defende uma dimensão ética da profissão docente dizendo que:

“A profissão docente exerce-se por delegação social e assenta num conjunto articulado de saberes, saberes-fazer e atitudes (que podemos designar de profissionlidade) e um ideal de serviço que lhe confere significado e lhe remete para o conceito de profissionalismo. Esse ideal consubstancia o exercício ético da competência profissional e os fins e valores que uma sociedade acha dignos de serem transmitidos e exemplificados através do processo educativo.” (Estrela, 2010, p. 67)

Desse modo, pode-se explicar a relação entre os conceitos de profissionalidade e profissionalismo: o profissionalismo como o domínio e o exercício correto e orientado da profissionalidade.

Para Sácristan profissionalidade “[...] é o conjunto de comportamentos, conhecimentos, destrezas, atitudes e valores que constituem a especificidade de ser professor.” (Sácristan, 1999; p.70)

Como podemos constatar, tanto Estrela (2010) quanto Sacristán (1999), concordam que profissionalidade não é uma palavra de definição fácil ou definitiva. O conceito de profisisonalidade está sempre sendo elaborado, construído. Depende de uma contextualidade, das mudanças sociais, das exigências novas que se vão fazendo ao campo educativo.

Sacristán (1999, p. 71) explica ainda que compreender a profisisonalidade docente implica relacioná-la com os contextos da ação educativa de cada professor.

O docente não define a prática, mas sim o papel que aí ocupa; é através da sua atuação que se difundem e concretizam as múltiplas determinações provenientes dos contextos em que participa. A essência de sua profissionalidade reside nesta relação dalética entre tudo o que, através dele, se pode difundir – conhecimentos, destrezas profissionais, etc. – e os diferentes contextos práticos.

Portanto, concordamos com Arroyo (2011) quando fala que ser professor é muito mais ser um profissional de prática do que de discursos, apesar de dar-se tanto valor aos discursos em sala de aula.

No documento Sirlande Rodrigues final (páginas 33-37)