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CAPÍTULO 1 – (RE)CONHECENDO O PANO DE FUNDO

1.2 ANÁLISE DOS TRABALHOS SELECIONADOS

1.2.1. Formação inicial: desafios formativos

Os trabalhos analisados enfocam a formação inicial na perspectiva de um processo que deve dotar os futuros professores dos conhecimentos para e sobre ser professor, destacando,

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no entanto, que a aprendizagem da docência é um processo contínuo que inicia ainda na experiência como estudante e perpassa a vida e a profissão, recebendo influências dos espaços institucionais onde é exercida. Neste sentido, encontramos importantes discussões sobre a formação inicial a partir da tríade, professores universitários, professores em formação inicial e professores das escolas da Educação Básica para a qual os professores estão sendo preparados.

Nessa direção é que trabalhos como o de Voigt (2012) sinalizam a preocupação de se pensar se a formação inicial está de fato contribuindo, nos moldes como ocorre atualmente, para atuação profissional e enfrentamento do cotidiano escolar pelos futuros professores. Para tal, a autora recorre aos professores que estão trabalhando nas escolas, buscando os sentidos e significados que estes atribuem à sua formação inicial. Desde esta perspectiva, a pesquisadora salienta que, na formação inicial, o conhecimento sobre a profissão e o campo de atuação tem sido pouco explorado, assim como os saberes daqueles que já atuam na escola e que muito podem contribuir para as discussões e mudanças, as quais precisam ocorrer nos cursos de licenciatura. Mesmo disciplinas como o estágio curricular supervisionado, não conseguem oferecer condições para que os futuros professores se sintam preparados para o enfrentamento da sala de aula; alguns professores sinalizaram que, muitas vezes, o estágio curricular supervisionado só foi realmente significado quando, na escola, receberam estudantes nesta condição.

Para Voigt (2012), durante o processo de formação, são insuficientes as experiências na escola, o que agrava o distanciamento entre a formação recebida na instituição formadora e pode, além de causar dificuldades quanto à gestão de aula, ocasionar problemas na hora de relacionar os conteúdos apreendidos nas disciplinas específicas com o planejamento de aula para a escola.

A aprendizagem da docência na formação inicial é discutida por Santos (2010) a partir das expectativas de estudantes em situação de estágio curricular supervisionado. Para a autora, essa disciplina pode se tornar um importante lócus de aprendizagem docente se os alunos estiverem imersos em um processo que implique a relação entre estudo, reflexão, pesquisa, discussão e experimentação, assentada no diálogo com profissionais experientes, igualmente implicados na construção dos saberes docentes.

Calzolari Neto (2012) defendeu a tese sobre a possibilidade de construção da base de conhecimento para o ensino desde sua formação inicial, com condução dialogada baseada na ação-reflexão-ação, nos períodos de estágio supervisionado. O pesquisador trabalha com as definições de conhecimento apresentadas por Shulman e discute a histórica incoerência e

distanciamento entre o que é produzido na universidade e o que é vivenciado pelos estagiários no espaço educativo, assim como já fora enfocado em Voigt (2012). Nesse sentido, constrói sua tese na noção e no desenvolvimento do raciocínio pedagógico na formação inicial. A pesquisa de Calzolari Neto (2012) foi realizada com estudantes de licenciatura em Ciências Biológicas que, a partir da análise das interpretações de metáforas e de diálogos estabelecidos entre estudantes e pesquisador, bem como de um registro feito pelo último, foi submetida à análise de conteúdo. Os resultados apontaram que é possível, a partir de uma construção dialogada, desenvolver, nos estudantes de licenciatura, conhecimentos da base profissional, via construção do raciocínio pedagógico.

Compreender e por em ação este momento da formação inicial como um processo de construção dialógica de conhecimentos sobre a docência, mesmo que com maior expressão sobre a ação de Ensinar em comparação à ação de Ser Professor, potencializa uma fundamentação inicial consistente da base de conhecimento para o ensino, permitindo que a defendida integração teoria-prática seja evidenciada, por meio de compartilhamento de experiências transformadas em narrativas (CALZOLARI NETO, 2012, p. 100).

Silva e Penido (2010), abordando as dificuldades encontradas no período da formação inicial, em especial, na destinada aos estágios curriculares, apontam que um dos desafios da formação inicial é promover, nos licenciandos, concepções que aproximem as práticas às teorias de ensino. Parece que está implicada a ideia dos blocos de conhecimento, e que no período destinado ao estágio, a tarefa de unir estes dois blocos fica a cargo do professor orientador. Essa concepção, segundo os autores, contraria a LDBEN 9394/96, já que esta prevê o desenvolvimento das habilidades de ensino por parte dos estudantes de licenciatura, inclusive em relação mais estreita entre universidade e escola, durante o curso de formação inicial.

Os trabalhos sobre a formação inicial parecem dar uma atenção especial para o momento da realização das disciplinas de estágio, e isso tem algumas implicações significativas tanto na formação quanto nas produções científicas. Assim como as publicações têm indicado, o estágio tem sido em muitos casos, o único contato do futuro professor com o campo de atuação, o que dificulta a percepção dos futuros profissionais sobre o trabalho docente. Neste sentido, conforme Gentil (2010), há um problema sério a ser enfrentado nos cursos que preparam futuros profissionais que atuarão nas escolas, é romper com a separação entre pesquisadores, formadores e professores, o que mobilizará a ruptura de uma lógica disciplinar aplicacionista para instaurar uma lógica profissional.

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A tese de Pesce (2012) traz uma importante contribuição à formação inicial e também ao estágio curricular supervisionado ao se propor a compreender como o professor formador considera formar o professor pesquisador no curso de licenciatura. Esta pesquisa contou com a participação de orientadores de estágio, professores universitários de quatro licenciaturas, e também alunos que estavam no último ano dos cursos. Pautado na discussão sobre formação inicial e desenvolvimento profissional, a pesquisa aparece no estágio supervisionado como importante processo na formação inicial possibilitada pelo contato efetivo com a escola e apropriação de saberes que são próprios à atividade da docência.

Neste sentido, o trabalho de Pesce (2012, p. 16) está assentado no pressuposto de que “a forma como o professor formador entende a pesquisa e ensina a fazê-la são afetadas tanto pelas experiências pessoais com a pesquisa como pela cultura (voz) institucional, da mesma forma que sua voz afeta as concepções dos seus alunos (professores em formação inicial)”. A pesquisa revelou que os professores formadores reconhecem a existência de duas concepções de pesquisa, a acadêmica e a do professor. Enfocamos, neste espaço, apenas o que diz respeito à pesquisa do professor, por compreender que esta perspectiva dialoga com as intenções investigativas que temos.

De acordo com Pesce (2012), a pesquisa do professor é produto de uma prática pedagógica desenvolvida na sala de aula. Nessa direção, o estágio curricular supervisionado aparece como possibilidade institucional de ensinar e realizar pesquisa, na qual o modelo pedagógico aplicado parece ser o mesmo utilizado pelos formadores com alunos dos cursos de pós-graduação ou iniciação científica. Assim, a autora da pesquisa destaca que tanto os professores formadores quanto os futuros professores salientaram a importância do aprender a fazer pesquisa na graduação, mas os formadores afirmaram ser difícil formar pesquisadores. Tal afirmativa, para autora do estudo, está relacionada à falta de clareza destes formadores quanto aos procedimentos pedagógicos utilizados no processo de ensino da pesquisa. A pesquisa é um importante elemento formativo no processo de formação inicial do professor, em especial, no que diz respeito à pesquisa do professor, tendo em vista que é um mobilizador do pensar sobre sua prática docente. O viés investigativo pode desenvolver a capacidade de pensar sobre o porquê se faz ou se tomam determinadas atitudes didático-pedagógicas em detrimento de outras.