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3 Caracterização do meio físico

3.3 Formas de relevo

A ciência geomorfológica, por se preocupar em estudar as formas do relevo, a partir de sua origem, estrutura, dinâmica e evolução, oferece à Geografia mecanismos indispensáveis ao estudo integrado da paisagem, fundamental ao desenvolvimento das atividades humanas numa relação de equilíbrio entre as potencialidades naturais e as necessidades de uso da terra.

De acordo com Guerra (2006, p.303) a Geomorfologia corresponde ao “[...] estudo sistemático das formas do relevo, baseando-se nas leis que lhes determinam a gênese e a evolução” elucidando, desta forma, a origem das formas, bem como as modificações manifestadas até os dias atuais.

O relevo constitui, portanto, um dos principais elementos norteadores nos trabalhos de diagnóstico do meio físico, voltados para o planejamento ambiental, plano diretor e zoneamentos, dentre outros.

Nesta perspectiva, Sobrinho (2007, p.87) reforça tal colocação quando afirma que o relevo “[...] materializa-se como palco” e destaca que “[...] o entendimento do relevo não enfoca apenas sua estrutura e forma, direciona-se como elemento norteador de tomada de decisões visando ao planejamento do uso de determinados ambientes, seja no espaço rural, seja no espaço urbano”.

Tendo em vista a importância do relevo na compreensão da paisagem foi feita a caracterização das unidades geomorfológicas do município do Crato/CE. A compartimentação geomorfológica aqui descrita apóia-se nos trabalhos desenvolvidos por Souza (1979), Souza (2000) e Souza (1988, apud CPRM, 2003).

Essa compartimentação baseou-se, também, em dois mapas considerados relevantes e complementares a elaboração do mapa das unidades geomorfológicas. Respectivamente são: o mapa contendo o modelo digital do terreno (MDT) (Mapa 05) por apresentar de forma clara a variação altimétrica da área, possibilitando a visualização da compartimentação do relevo e, com isso, elaborar subprodutos que se façam necessários à compreensão da paisagem; e o mapa de declividade (Mapa 06), apoiado no modelo digital do terreno, fundamental ao entendimento da dispersão das águas, aos processos erosivos e a morfodinâmica do relevo, potencialidades para uso agrícola, restrições para ocupação urbana, manejo e práticas conservacionistas.

Souza (1979) destaca que a compartimentação topográfica do Ceará é resultado, principalmente, dos eventos de ordem natural que aconteceram no Pleistoceno, apresentando diversas formas de relevo que se desenvolveram tanto em áreas cristalinas como em sedimentares, influenciados pela estrutura geológica, fatores paleoclimáticos, eustáticos e morfodinâmica atual.

Para Brasil (1981), o relevo que compreende o Ceará é constituído por extensas superfícies planas, trabalhadas por processos de pediplanação em litologia cristalina ou sedimentar, cuja erosão intensifica a dissecação do relevo em formas aguçadas, convexizadas e tabulares.

De acordo com a morfoestrutura, o Ceará está compartimentado em três grandes domínios: o domínio dos depósitos sedimentares cenozóicos (representado no município do Crato em pequenas extensões), domínio das bacias sedimentares paleomesozóicas e domínio dos escudos e maciços (SOUZA, 2000).

O município do Crato está inserido nos três domínios propostos por Souza (2000) e nas seguintes unidades proposta por Brasil (1981): Planaltos residuais e Chapada do Araripe.

Com base no mapeamento desenvolvido para o Crato, foram identificadas as seguintes unidades geomorfológicas: Depressão sertaneja, Maciços residuais, Chapada do Araripe, Encosta da Chapada do Araripe e Planície fluvial (Mapa 07). Essa compartimentação permite aferir o quanto é heterogênea e complexa a estrutura geomorfológica da área em questão.

No domínio das bacias sedimentares paleomesozóica, encontra-se a Chapada do Araripe. Esta unidade localiza-se na parte sul do estado, bem como do município do Crato, estendendo-se até o estado do Piauí e Pernambuco, com uma área territorial de aproximadamente 6.280 km2, evidenciando uma homogeneidade fisiográfica que reflete a estrutura geológica e o modelo de estratificação.

É um elemento de destaque na paisagem do Crato, devido a sua expressiva massa e altimetria (o topo chega atingir aproximadamente 960m) que condiciona a existência de um microclima, como também, de uma densa área rica tanto em espécies vegetais como animais.

Segundo Brasil (1981, p.328), a chapada é constituída “[...] por rochas sedimentares de idade cretácea. O contato dos sedimentos cretáceos com a rocha do Pré Cambriano é feito na cota média de 480m.” Suas camadas estão dispostas horizontalmente, formando uma extensa estrutura tabuliforme, seccionada pela erosão nas bordas, com topo conservado, graças à inexpressiva drenagem decorrente da composição do solo (Latossolo vermelho amarelo), de caráter uniforme, bastante poroso e permeável, oriundo de uma litologia arenítica sob um forte intemperismo químico. Outra característica importante é a baixa declividade na extensão do topo que favorece mais ainda a absorção das águas pluviais e a lixiviação do solo.

Esta capacidade de absorção do solo que capeia todo o topo da chapada é responsável pelo surgimento de inúmeras fontes que, de acordo com a inclinação do pacote sedimentar na direção N e NE, faz da vertente setentrional, inserida no Ceará, a área que apresenta a maior quantidade de fontes. O Crato é um dos municípios privilegiados por está nesta parte da vertente, usufruindo de boas

condições hídricas. Ademais, estas fontes, além de alimentar os rios, dão ao Crato a característica de brejo de sopé de serra.

A partir desta área de escoamento das fontes, inicia-se o processo de formação dos vastos setores de planícies fluviais em decorrência do alargamento dos vales no sopé oriental da chapada.

De acordo com Ribeiro (2004, p.56) a encosta da chapada voltada para

[...] o norte-nordeste e, em especial, aquela abrangida pelo município do Crato compõe-se de duas partes. A superior é constituída por uma escarpa arenítica, abrupta de perfil acentuadamente vertical, que na região é conhecido de “talhado”, constituído basicamente pelos arenitos da Formação Exu. A inferior, abaixo do talhado, também denominado de talude, tem vertente formada por uma espécie de patamar dissecado que apresenta uma superfície de topografia irregular.

Enquanto que a estrutura do topo da chapada consegue se manter preservada, seus rebordos apresentam-se fortemente dissecados, originando escarpas erosivas, abruptas com destaque nas porções nordeste e sul. No sentindo oeste, a área da escarpa que faz contato entre a chapada e a depressão sertaneja é menos dissecada e, já no setor norte, encontramos as rampas que estabelecem contato com a depressão sertaneja e os maciços residuais (BRASIL, 1981).

Souza (2000), ao caracterizar a manutenção do topo da chapada, comenta que o arenito da Formação Exu é que dá suporte e sustentação ao topo, com feições planas e dissecação quase nula. Os folhelhos, concreções e argilitos da Formação Santana marcam os rebordos da referida estrutura, que sofre intensa morfogênese química.

Segundo DNPM (1996), a área correspondente a Bacia Sedimentar do Araripe, na qual está inserida a Chapada do Araripe, pode ser compartimentada em três zonas: chapada, talude e pediplano.

A zona de chapada, conhecida por platô oriental da chapada, é formada pelos arenitos da Formação Exu, limitada por escarpas abruptas de contornos irregulares e desníveis que podem ultrapassar 300m (DNPM, 1996). De acordo com esse trabalho, dois setores podem ser identificados: o que está localizado na área limítrofe entre Ceará e Pernambuco, com direção E-W perfazendo uma extensão de aproximadamente 180 km, com largura variando entre 30 e 50 km, constituindo-se como divisor de águas das bacias hidrográficas do São Francisco ao sul e do

Jaguaribe ao norte; e o outro que ocorre à porção mais ocidental da bacia, apresentando uma inflexão da ordem de 30 graus, alongando-se na direção N-S, atingindo uma extensão de aproximadamente 60 km com largura média de 20 km, funcionando como divisor das bacias hidrográficas do São Francisco ao leste e do Parnaíba a oeste.

A zona de talude corresponde a unidade Encosta da Chapada do Araripe, cuja área bordeja o sopé da chapada até a linha de topo, dominada pelas unidades litológicas das Formações Arajara (siltitos e arenitos argilosos e/ou caulínicos) e Santana (margas, folhelhos e calcários, com níveis intercalados de gipsita) (DNPM, 1996). É nesta zona que surgem as nascentes, condicionadas pela composição litológica das Formações Exu (na base da escarpa) e Arajara, bem como pelo mergulho dos estratos sedimentares nas direções norte e leste.

Por fim, a zona de pediplano, formando a Depressão sertaneja que recobre grande parte da área em estudo. Está bem representada na porção cearense da Bacia Sedimentar do Araripe, cobrindo uma área de aproximadamente 1.500 km2, costurada ao sul pelas escarpas da Chapada do Araripe e ao Norte- nordeste pela cuesta dos arenitos siluro-devonianos da Formação Mauriti (Ponte, 1991, apud DNPM, 1996).

Com uma altimetria média de 400m, essa forma visível pelo modelo digital do terreno, possui morros alongados entremeados por vales amplos de fundo plano. Observa-se uma exceção quando se constata a serra da Mãozinha (altitude máxima entre 800 e 900m) que para DNPM (1996, p.18) “[...] é uma saliência no âmbito da zona de pediplano, de chapada e talude” que corresponde a um testemunho da Chapada do Araripe. A composição litológica desta zona está relacionada às formações Brejo Santo e Missão Velha (Jurássico), Abaiara e Rio da Batateira (Cretáceo), delimitados pelos arenitos da Formação Mauriti (Siluro Devoniano) ou pelas rochas do embasamento cristalino (Pré-cambriano).

A Depressão sertaneja corresponde ao Domínio dos Escudos e Maciços Antigos na classificação de Souza (2000). Em termos de extensão geográfica se apresenta como a unidade de maior expressão tanto em nível de Ceará como de Crato, indo desde a encosta até a área de pediplanação contígua.

Conforme Souza (1979) representa uma superfície situada entre planaltos cristalinos e/ou sedimentares, com topografia expressivamente aplainada ou

ligeiramente ondulada, recoberta por caatingas de porte e flora bastante diferenciadas, bem como acentuadas mudanças de natureza litológica e edáfica. Deriva-se então, de processos denudacionais que traduzem a estreita relação entre a morfologia, às condições climáticas e a composição litológica. Verifica-se a elaboração de vasto aplainamento resultante dos processos de pediplanação, condicionados pela semi-aridez e, consequentemente, pelo desenvolvimento de uma superfície de erosão que trunca as mais diferentes composições litológicas.

A altitude desta unidade diminui adentrando o interior do município atingindo, portanto, uma altitude aproximada de 400m. A homogeneidade do relevo plano a ondulado é rompida pela existência dos maciços residuais, com relevo dissecado em formas aguçadas, côncavas e, por vezes, convexizadas.

A capacidade de incisão da drenagem é fraca, o que favorece a pequena amplitude entre os interflúvios e fundos de vale. Quando a drenagem ganha maior densidade e as rochas tenras conseguem resistir, desenvolvem condições para que o relevo se forme mais dissecado com interflúvios convexizados. Esta unidade é cortada por rios e riachos que nascem em sua maioria na chapada, descem a encosta e se juntam no interior da depressão formando a bacia do Salgado, sub bacia do Jaguaribe. O poder de talhe da drenagem é maior na área de encosta, em decorrência da declividade e também da existência de fontes. Assim, temos um aprofundamento dos canais e a formação de uma maior quantidade de interflúvios com vales pequenos e úmidos, que se alargam ao percorrem a área de planície denominada Vale do Cariri (a área urbana do Crato e adjacência estão inseridas nesse vale).

Adentrando a porção mais central da Depressão sertaneja em contato com os Maciços residuais, a drenagem, condicionada pela semi-aridez, tem caráter temporário e, com isso, fraca incisão. Isto possibilita a existência de vales rasos e secos, com baixa amplitude em relação à altimetria dos interflúvios, dando um caráter monótono à paisagem, típico de uma superfície de aplainamento. Podem ser citados alguns rios e riachos que drenam essa unidade no município do Crato, como os rios Batateira, Grangeiro, Cariús, Saco Lobo e Carás, além de muitos riachos como Jardim e Piabas.

Outra unidade que se encontra representada na área de estudo são os Maciços e cristas residuais. A denominação de maciços residuais corresponde à

classificação de Brasil (1981) de planaltos residuais. Segundo Brasil (1981, p.325), os “Planaltos residuais evidenciam-se como conjunto de relevos montanhosos compartimentados em blocos isolados, separados entre si pelas depressões sertanejas.” Trata-se dos “[...] maciços antigos constituídos por rochas metamórficas ou intrusivas revestidos primariamente por florestas perenifólicas ou subperenifólicas com morfogênese química e evolução associada com os processos de dissecação do relevo” (SOUZA, 1979, p.83).

A morfologia, dissecada em formas convexas, côncavas e aguçadas, confere aos maciços residuais a função de um forte dispersor de águas, responsável pela existência de vários canais que seguem o direcionamento da estrutura geológica, bem como das linhas resultantes da intensa dissecação do relevo favorecido pelas condições morfoclimáticas pretéritas. Os maciços residuais podem ser classificados em maciços residuais úmidos e secos. Os Maciços setentrionais do Crato é denominado por Souza (1979) como maciços residuais secos.

Os maciços residuais seco,

[...] com localização interiorizada e sem que se verifiquem pronunciadas mudanças climáticas motivadas por influencias morfológica, não tem as características de brejo referidas para os topos e vertentes de barlaventos dos maciços úmidos mais elevados. Tem um ambiente com condições análogas ao das vertentes de sotavento daquelas serras úmidas (SOUZA, 1979, p. 83).

A falha geológica, com direcionamento leste-oeste, na porção norte do município, condiciona o alinhamento de um conjunto de maciços residuais denominados, com base na carta da SUDENE (1972), de serra da Fortuna (que ao adentrar o município de Caririaçu recebe a denominação de serra de São Pedro), Caldeirão, Cruz e Verde. Além destas encontramos, nos rebordos da chapada a serra do Juá. Esta corresponde, por sua vez, a uma intrusão granítica que ao longo de milhares de anos manteve-se coberta pela chapada e que hoje aparece como resultado da evolução do pacote sedimentar, quebrando a homogeneidade fisionômica da referida estrutura. É possível perceber esse alinhamento, responsável pela formação desses maciços, pelo MDT gerado para o município do Crato.

Os rios que talham essa unidade têm cursos retilíneos, com inflexões súbitas em várias direções, seguindo ora o paralelismo das cristas, ora rompendo as

referidas cristas. Geralmente são rios encaixados que não permitem o desenvolvimento de extensas planícies. A região do Cariri constitui uma exceção, cujos vales formam fundos planos, propiciando o espraiamento da área de planície (BRASIL, 1981). Esse padrão de drenagem ramificado associado à litologia, à declividade acentuada e à semi-aridez, contribui para os processos denudacionais, originando as formas côncavas e aguçadas anteriormente comentadas.

A altimetria comum a essa unidade, como também sua posição interiorana sob a condição de clima semi-árido, confere a característica de serras secas com déficit hídrico. Isso só não acontece em alguns setores isolados, favorecidos pela posição altimétrica que permite a ocorrência de uma maior precipitação. Desenvolve-se vales com fundo plano que são, normalmente, produzidos em formas gerais côncavas.

Por fim, adentramos ao Domínio dos Depósitos Sedimentares Cenozóicos que é constituído pelas “[...] exposições Tércio-Quaternárias da Formação Barreiras, pela ocorrência sub-atual e atual das paleodunas, colúvios, sedimentos de praias e aluviões” (SOUZA, 2000, p.18). O material denominado de colúvio é responsável pela formação dos aluviões que dão origem à unidade Planície fluvial.

De acordo com a FUNCEME (2006) essa unidade é composta por sedimentos clásticos de finos a médio e, às vezes grossos, que se espraiam ao longo das calhas dos rios de vales úmidos e secos, desenvolvendo, pois, as planícies fluviais. São áreas planas sujeitas às inundações sazonais, com patamares escalonados, por vezes mantidos por cascalheiros quartzosos, formando os níveis de terraços.

A Planície fluvial corresponde à superfície de acumulação de sedimentos carreados e trabalhados pela ação dos rios, formando áreas de solos propícios à agricultura, um enclave na paisagem seca da depressão sertaneja, apesar de sua pouca expressão espacial.

Reforçando o sobredito, Souza (2000, p.20) define como sendo “[...] as formas mais características de acumulação decorrentes da ação fluvial. Constituem, em geral, áreas de diferenciação regional nos setores semi-árido por abrigarem melhores condições de solo e disponibilidade hídrica”.

Na área em estudo as planícies fluviais se distribuem espacialmente desde a área de contato da encosta com a depressão sertaneja até os setores próximos

dos maciços residuais. Temos, portanto, a formação de planície fluvial com maior extensão espacial na porção situada na proximidade do perímetro urbano (sede municipal) e pequenas porções distribuídas nas proximidades dos cursos dos rios que talham a depressão, os maciços residuais e a encosta. Correspondem, graças as suas características edáfica, áreas de maior exploração para o desenvolvimento da atividade agropecuária.