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2.3 O RÁDIO DE MÚLTIPLAS MEDIAÇÕES: DO RADIOTEATRO AO GENTE NOSSA

2.3.4 Formatação e estrutura do programa radiofônico de auditório itinerante

O desenvolvimento de sistemas de exploração da radiodifusão no Brasil pode ser determinado por misto, já que o processo permite o convívio, entre si, de emissoras estatais e privadas, estas exploradas comercialmente. A Rádio Venâncio Aires 910 AM configura-se como comercial, constituída como uma empresa fundamentada na lucratividade como fator essencial. Neste sentido, Ortriwano entende que “é do faturamento originado pela venda do espaço publicitário que vão surgir os recursos para manutenção tecnológica e a formação da estrutura programática”.140

Dentro da programação da emissora, o Gente Nossa configura-se como um dos programas terceirizados. Começa às 21h e se estende até as 23h, mas este intervalo de tempo não é uma regra. Por vezes, dependendo do público e do lugar onde o programa está instalado, a exibição vai até as 24h. São diversos blocos divididos pela leitura dos textos publicitários dos patrocinadores. Depois da abertura, quando toda a equipe de produção é saudada pelo apresentador, não há mais uma seqüência fixa de apresentação. Por vezes Itor Rosa anuncia uma atração musical, noutras oportunidades começa com a leitura de textos publicitários. Em meio à transmissão, acontecem brincadeiras, sorteio e distribuição de brindes ao auditório.

O programa Gente Nossa, na classificação de gêneros radiofônicos que se faz atualmente, se insere no de entretenimento, conforme explica André Barbosa Filho (2003). Segundo o pesquisador, este tipo de programa “[...] tem a possibilidade de explorar com maior profundidade a riqueza do universo da linguagem, se comparado aos outros

140 ORTRIWANO, Gisela Swettlana. A informação no rádio: os grupos de poder e a determinação dos

gêneros”.141 Os programas com formato de entretenimento possuem características e possibilidades peculiares. O Gente Nossa, em formato de auditório itinerante, pode ser considerado uma mistura de dois tipos de formatos: o musical, já que possui “conteúdo e plástica diferenciados, abre espaço para a difusão de obras musicais dos mais diferentes gêneros”142 e o formato interativo de entretenimento, que

constitui o conjunto de ações de cunho diversional, que tem como pressuposto fundamental a presença dos ouvintes, os quais participam de jogos, gincanas, programas de perguntas e respostas, brincadeiras [...] Geralmente as participações do público são contempladas com brindes e até com prêmios substanciosos.143

Ao se analisar o programa, verifica-se que o mesmo buscou ampliar seu espaço de atuação, estabelecendo uma relação mais próxima com seus ouvintes. A concepção de audiência se dá com base nos programas realizados anteriormente e no conhecimento que o apresentador possui do público. Esta situação, se analisada a partir do olhar de Ortiz e Marchamalo (1996), configura que o “comunicador elabora e crea sus mensajes pensando un

perfil de público más o menos definido [...]”.144 Os autores acreditam que

el proceso de creación y realización en radio es el resultado de una série de técnicas u operaciones relativamente complejas que implican un amplio conocimiento del mensaje radiofónico, de sus códigos expresivos, así como de los recursos y posibilidades técnicas en las que se sustenta la comunicación radiofónica.145

A estrutura do Gente Nossa comporta uma banda musical que faz o acompanhamento das atrações musicais do programa. Uma equipe de áudio fica responsável pela captação do som da banda e das atrações musicais através de microfones fixos e do microfone móvel que o apresentador carrega consigo. Caixas de som são instaladas no ambiente em que o programa está para melhor recepção por parte do auditório. O Gente Nossa também conta com um telão, onde são exibidas imagens dos patrocinadores e, por vezes, do apresentador, das atrações e do público. O equipamento de imagem é instalado de forma que seja bem visível à platéia. Um

cameraman circula no ambiente e capta as imagens.

141 BARBOSA FILHO, André. Gêneros radiofônicos: os formatos e os programas em áudio. São Paulo:

Paulinas, 2003, p. 113.

142 Ibid., p. 115. 143 Ibid., p. 122.

144 ORTIZ, Miguel Angel; MARCHAMALO, Jesús. Técnicas de comunicación en radio: la realización

radiofónica. Barcelona: Paidós, 1996, p. 23.

Para a realização da transmissão do programa ao vivo, técnicos da Rádio Venâncio Aires 910 AM acompanham o programa onde quer que ele vá. No local da apresentação são instalados os respectivos equipamentos capazes de dar as condições de transmissão. Há duas possibilidades de efetuar o processo de transmissão: via conexão de linha telefônica ou unidade móvel. Esta última modalidade apenas não é possibilitada em determinados pontos onde não há boa captação de sinal de transmissão. Já a conexão telefônica, quando é direta, sem sistema de ramais, se dá de maneira simples, com o uso da linha pertencente ao local onde o programa se exibe. No caso de sistema de ramais, comum em comunidades de zona rural na região, o programa só pode ir ao ar com permissão das associações telefônicas. O uso da tecnologia acarreta a impossibilidade de utilização dos terminais telefônicos, por parte da população, enquanto o programa é transmitido.

Em relação à equipe que acompanha a produção do Gente Nossa, além dos técnicos de som e vídeo, o apresentador conta com o auxílio de duas secretárias. Estas assessoram na distribuição de brindes; na escolha dos participantes das brincadeiras; na seleção de algumas atrações que se dispõem à apresentação e no levar alguns “recados” ao apresentador no desenrolar do programa. Rafaela Wenzel146, coordena a ordem das atrações que sobem no palco minutos antes do programa ir ao ar. O Gente Nossa funciona como um meio de agregar renda à atriz, que também é professora de teatro. A organização do programa só ocorre pouco antes do início por causa das atrações locais. Alguns desistem antes da hora de começar e a produção apela às atrações que sempre acompanham o programa. A produção se encarrega de facilitar a presença dos artistas convidados, assim como de providenciar os meios técnicos para que possam fazer suas apresentações.

Para garantir a qualidade musical, Itor Rosa conta com algumas atrações consideradas fixas, e que se mesclam nas apresentações de auditório itinerante. Ele acredita que a possibilidade de contar com uma “equipe facilita muito o trabalho e dá possibilidade de oferecer um programa melhor, mais organizado”.147 Neste sentido, Ortiz e Marchamalo entendem que “el equipo del programa es, indudablemente, otra de las claves en las que se

apoya un espacio radiofónico y tiene que ver directamente con su concepción y proceso creativo”.148 Um total, em média, de 25 pessoas forma a equipe de produção do Gente Nossa,

tudo custeado pelos recursos vindos dos patrocinadores. Os valores também servem para o apresentador manter em dia os honorários que deve à emissora, já que o programa é

146 WENZEL, 2006. Entrevista realizada no dia 29 de jul. 2006. 147 ROSA, 2006. Entrevista realizada no dia 30 jun. 2006. 148 ORTIZ; MARCHAMALO, 1996, p. 102.

terceirizado.

Analisando-se a estrutura do programa, percebe-se que, apesar das tendências de evolução do rádio, da própria emissora na qual o programa é transmitido, o Gente Nossa, mesmo incorporando alguns aspectos da tecnologia atual, ainda mantém uma estrutura parecida com os programas de auditório que eram a coqueluche na primeira metade do século passado. Ainda pode se dizer que sua formatação mantém algumas características parecidas com o radioteatro argentino no início do século 20. A apresentação do programa de auditório itinerante não acarreta custos para o requisitante de sua apresentação. O apresentador, inclusive, anuncia durantes os programas que “[...] você sabe, né, o programa Gente Nossa não cobra nada. Nós temos o maior prazer de visitar a sua comunidade”.149

Mas o programa, assim como o telão, terceiriza o serviço de sonorização e este cobra pelo serviço. A sonorização é o único custo de quem vai contratar o programa. A equipe responsável pela sonorização do programa radiofônico busca o apoio de patrocinadores locais para custear o deslocamento da equipe de som e seus serviços no local. O valor é de um salário mínimo, atualizado, para cada programa. Otávio Botelho150, proprietário da Fox Som, acompanha o programa Gente Nossa desde a primeira edição.

Mesmo com a despesa atribuída à instalação da aparelhagem de som, a entidade ou comunidade que convida o Gente Nossa para apresentação também objetiva lucro. O programa reúne centenas de pessoas que, por sua vez, são consumidoras dos produtos disponibilizados no local, como bebidas, cigarros e lanches em geral.