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4. RESULTADOS E DISCUSSÕES

4.2 CONCEPÇÕES DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE DO NÚCLEO AMPLIADO

4.2.5 Fortalecer a AB

As questões referentes à consolidação da proposta da AB por meio da criação dos NASFs também emergiram nas falas apresentadas. Conforme ilustrado nos relatos abaixo, os profissionais identificam como umas das atribuições do NASF o resgate e o fortalecimento da AB, ampliando o cuidado para além das práticas com base no modelo biomédico. As falas ainda versam sobre o fortalecimento do SUS, por meio do apoio do NASF ao trabalho na AB.

“Eu acho que o principal tesouro é o resgatar da atenção básica. Como o próprio nome já diz é o Apoio à Atenção Básica. Pensando, neste olhar, não é somente a questão do atendimento e da doença”.

“(...) agora que a gente virou NASF, temos que potencializar e voltar a proposta inicial da atenção básica, potencializar a própria eSF que está sob o risco de promover práticas médicas, individualistas”.

“Nós ainda não vendemos o peixe do SUS na Atenção primária. Então, eu vejo o NASF muito neste sentido, de ser um gatilho para fortalecer a atenção básica”.

É preciso reconhecer os esforços de ampliação do escopo das ações das eSFs para melhora da qualidade da AB, por meio da criação dos NASFs. Neste sentido, corrobora-se com Oliveira e Quevedo (2016) ao ressaltarem que a estruturação do trabalho do NASF deve ser norteada pela ampliação e aperfeiçoamento do trabalho na AB, promovendo o cuidado integral, numa tentativa de romper com ações norteadas pelo paradigma dominante da saúde. Entretanto, cabe ressaltar que a função de fortalecimento da AB, não cabe somente aos profissionais do Núcleo. Sabe-se que as eSFs foram implantadas visando superar os

problemas deste nível de complexidade, promovendo a melhoria do cuidado e a reestruturação do modelo de atenção em saúde (Giovanella et al., 2009; Figueiredo, 2012). Por sua vez, o NASF surge como um dispositivo potencializador das ações da eSF. Logo, o trabalho de ambas as equipes – NASF e eSF, deve ser pautado por objetivos comuns que busquem fomentar mudanças no agir em saúde na AB. Dito isto, a concepção de NASF como “gatilho”, ilustrada em uma das falas, que comparece com a conotação do Núcleo como algo certeiro, isolado e desprovido de falhas para a consolidação da AB, se mostra contraditório a proposta do trabalho compartilhado, que se apresenta como uma novidade no campo da saúde, como um pressuposto a margem da fronteira, na periferia. Ou seja, como um dos pensamentos alternativos ao centro de poder, que ainda é regido pela hegemonia do modelo biomédico. Desta forma, por possuir essa característica de margem, as práticas compartilhadas ainda carecem de ajustes, de idas e vindas, sendo desenhadas no cotidiano de trabalho por meio dos encontros marcados pelas negociações entre os paradigmas coexistentes (Sousa Santos, 2002).

Nesta mesma linha de pensamento, que ressalta os movimentos de negociação entre o paradigma dominante e o paradigma emergente, vale destacar que a mudança da composição das “equipes ampliadas” para equipes NASF, não ocorre de forma automática. Em outras palavras, não se “vira” NASF magicamente, existe um processo de incorporação com a novidade, que neste caso, se apresentada pelos princípios que norteiam o trabalho do Núcleo. Logo, e por meio deste contato com o novo, reconhecendo as diferenças e prestando atenção em tudo o que acontece ao redor da fronteira, é que ocorre o enriquecimento mútuo (Sousa Santos, 2002).

Os dados apontam ainda que a atribuição do papel de fortalecimento da AB, somente aos profissionais do Núcleo, provocou algumas inquietações nos participantes da pesquisa. Têm-se a concepção de que existem diversos fatores a serem enfrentados para a consolidação

da proposta a AB, que não competem somente ao NASF, tais como: as questões de ordem institucionais, a gestão, os processos de trabalho em equipe e a própria questão cultural que perpassa o cuidado em saúde.

“Nós estamos assustadas com o tamanho desta responsabilidade, porque tem muitas coisas aí que estão postas que não são somente do NASF. Tem questões institucionais que precisam acontecer. Então, eu acho que é uma carga muito pesada para ser exigida do NASF. Tem a questão também cultural e a questão da gestão que precisam ser resolvidas. Tem também a questão dos processos de trabalhos das equipes que pararam de ser discutidos. Então, assim, nós seremos os salvadores da pátria. É bem complicado isto”.

Verifica-se que os “velhos desafios” da AB parecem ser entendidos, por alguns, como “novos desafios” do NASF. Reforça-se com Savassi (2012) ao destacar que para a superação desses desafios torna-se imprescindível a realização de uma mudança gerencial e organizacional que promova a modificação do foco na doença e na cura, para a compreensão mais ampla sobre o fenômeno que perpassa o processo saúde-doença. Dito de outra forma, para a superação dos desafios postos para o trabalho na AB, reafirma-se a necessidade dos profissionais de saúde transitarem para a margem da fronteira, irem para o Sul, assumindo a fluidez existente nos períodos de transição paradigmática. A partir desse movimento híbrido, novas relações são estabelecidas com os conceitos do paradigma dominante da saúde e suas experiências, a fim de consolidar a mudança paradigmática que se anuncia. (Sousa Santos, 2002). Ressalta-se que neste processo de mudança, o NASF deve ser compreendido como mais um dispositivo que poderá contribuir para o enfrentamento desse cenário. Ou seja, os profissionais do Núcleo devem somar esforços com as demais equipes que compõem o trabalho neste nível de complexidade, evitando assim o surgimento da concepção, ilustrada em uma das falas, que ressalta o NASF como “o salvador da pátria”.

4.3 AS CONCEPÇÕES DOS PROFISSIONAIS SOBRE AS MUDANÇAS PRODUZIDAS NO PROCESSO DO TRABALHO DIANTE DA IMPLANTAÇÃO DOS NASFs.

Esta categoria agrupa falas que apresentam as mudanças produzidas na organização do processo de trabalho na AB, perante a implantação das equipes NASF no município de Vitória-ES. Após a análise dos dados brutos, foi possível identificar que as concepções dos profissionais de saúde acerca das mudanças no trabalho giram em torno dos seguintes temas: 1) questão de nomenclatura; 2) metodologia e ferramentas de trabalho; 3) organização do acesso da população e as agendas dos profissionais do NASF; 4) espaços de reunião de equipe; 5) corresponsabilização do cuidado.