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Para este segundo encontro, ministrado no dia 23 de novembro, com carga horária de duas aulas, o ambiente da sala de aula foi organizado em círculo e iniciamos contextualizando brevemente a aula anterior, falando de alguns objetos antigos pessoais que foram levados e que estavam dentro da caixa misteriosa. Com isso, pedimos que os alunos e alunas apresentassem os seus objetos. Neste momento, percebemos que apenas 2 alunos e 4 alunas realizaram a pesquisa que foi solicitada. À medida que eles e elas apresentavam os objetos pesquisados, repassamos para que toda a turma pudesse ver melhor os objetos.

A aluna O trouxe uma telha antiga, feita de barro por seu avô, com a ajuda da sua mãe. A aluna explicou para os colegas que todas as telhas da sua casa foram produzidas pelo seu avô. A aluna P trouxe uma agulha de madeira antiga de crochê, usada para costurar, de sua avó paterna. Neste momento, ela disse que trouxe o material que pertence à avó que ela mais gosta e tem contato. A aluna afirmou, também, que se a outra avó (materna) gostasse dela, ela teria vontade de ir visitá-la, mas isso não acontece porque ela tem “preferências pelos outros netos”. De acordo com este posicionamento da estudante, observamos a importância dessa discussão, pois ela pode promover aberturas para que os alunos e alunas se expressem diante de suas próprias angústias e conflitos. O contato com uma obra literária associado ao conhecimento de mundo e à identificação do leitor ou leitora com o/a personagem favorece que posicionamentos como este possam surgir. Dessa maneira, a literatura também se constitui como ponte entre a ficção e a vida real e, através dela, o aluno ou aluna pode expor suas emoções.

A aluna L trouxe para a aula um candeeiro. Perguntamos qual a sua serventia e ela disse que “no tempo antigo usava para fazer luz porque não tinha energia”.

Questionamos se ela sabe como aquilo era usado e ela ensinou, abrindo o objeto e explicando como era o processo de ascendê-lo.

O aluno G trouxe uma carta (contendo uma oração) que foi escrita pela bisavó da sua mãe. A folha estava bem gasta e o aluno chamou a atenção dizendo que aquela escrita não tinha sido de caneta, mas de pincéis de pena, “melados” em tintas. Ao retirar a carta do envelope, o aluno nos disse: “Tenha cuidado para não rasgar, viu?! Isso é uma reza!”.

A aluna E trouxe um álbum de fotos antigas de seus familiares e ficou com vergonha, inicialmente, em mostrar o álbum para seus colegas. A aluna disse que não realizou nenhuma pesquisa. Só trouxe o material mais antigo que encontrou em casa.

A aluna C trouxe uma fotografia antiga da madrinha de sua mãe. Por não ter mais seus avós vivos, a discente realizou a pesquisa com a sua mãe. A fotografia consta, na parte posterior, a data do registro em 1959.

O aluno I trouxe moedas de Cruzeiro de sua avó. Ele disse que foi difícil a avó emprestar o objeto, pois é “ciumenta e tem muito cuidado com o que é dela”. Perguntamos como ele fez para que a avó deixasse-o trazer as moedas. O aluno disse que era para uma aula de português e afirmou que teria cuidado. Questionando sobre como a avó se refere à moeda atual. O aluno respondeu que ela se refere ao dinheiro utilizando a palavra Cruzeiro. Abaixo, estão os objetos trazidos pelos alunos. (Ver

Figura 6).

Figura 6: Objetos antigos trazidos pelos alunos e alunas

Fonte: dados da pesquisa

Durante a exposição e discussão acerca dos materiais, alguns estudantes afirmaram que tinham esquecido de trazer o objeto, ou que não puderam ir visitar os avós, e questionaram se poderiam trazê-los na aula seguinte. Sentimos que eles ficaram

decepcionados por não terem feito a atividade e quiseram recompensar com a aula seguinte. Para não desestimulá-los, permitimos que trouxessem na aula seguinte, porém explicamos que a discussão seria feita de forma breve, para não comprometer a sequência das aulas.

Após a apresentação dos objetos, questionamos acerca da relação individual que eles têm com suas bisavós e avós, já que, durante a realização da pesquisa e a discussão em sala de aula, foi perceptível o pouco ou quase nenhum contato dos discentes com seus parentes mais velhos, a exemplo das avós e dos avôs. Alguns discentes, como Q e F que são primos, têm dificuldades de se relacionar com o seu avô, pois o mesmo aparenta não gostar de demonstrar os sentimentos pelos netos, por isso, em todas as discussões os alunos retomam a fala: “meu avô não gosta que a gente vai lá”; “se eu for lá ele vem bater em mim”; “eu queria ter contato, mas ele não quer.”. Neste momento, o aluno K e a aluna J afirmaram que moram com as suas respectivas avós.

Realizamos perguntas sobre este assunto: “Vocês têm intimidade e convivência com seus avós ou bisavós? Qual a relação de vocês com os avós e bisavós?”. Algumas respostas dos estudantes afirmaram: “Minha relação com o meu avô é boa de vez em quando. Quando ele tá bem eu falo com ele igual eu falo com o meu pai, tiro brincadeira com ele. Ele é meio enjoado. Ele não gosta muito de mim porque eu chego na casa dele fazendo zoada com a moto” (Aluno F). A maioria dos alunos, pelas respostas apresentadas, não tem muito contato com os avós ou não tem muito interesse em buscar por isso.

Prosseguimos com a discussão perguntando sobre os idosos das famílias dos alunos e alunas: “Vocês conversam e observam os conselhos desses familiares? O que normalmente eles conversam?” Outras respostas apresentadas pelos estudantes foram: “Quando eu vou lá conversar, ela me diz que não é para eu namorar cedo. Coisas desse tipo” (Aluna O), “Eu tenho duas avós, mas é mesmo que eu ter só uma. Porque a minha avó materna não gosta de mim. A outra eu gosto, eu vou lá na casa dela. Ela fala para mim a mesma coisa da avó de ... (a Aluna O), que não é para eu arrumar namorado, que eu estou muito nova.” (Aluna P), “Ela diz que a gente tem que aproveitar mais a vida” (Aluna O). Perguntamos se as avós dão conselhos sobre os estudos e a estudante P disse que a avó pede que ela não falte às aulas. A discente O respondeu dizendo: “A minha avó diz que eu devo estudar para ter um futuro.”

Percebemos, nesse ponto, que há uma preocupação das avós em relação ao compromisso das suas netas com os estudos e com a formação de vida antes de um

possível relacionamento amoroso. Podemos supor que essas avós devem ter casado muito novas, devido a um sistema tradicional que destinava a mulher para, unicamente, viver para a família e, como consequência disto, não tiveram outras oportunidades, como frequentar a escola, por exemplo. Por isso, a possível preocupação com as suas netas em não “arranjar namorado” e “não faltar às aulas”.

Outras respostas apresentadas foram: “Dá conselhos até demais: vá para a escola, não bagunce” (Aluno K), “A minha avó manda eu arrumar um homem bonito e ela me pergunta se eu namoro, essas coisas assim” (Aluna E). Aqui, percebemos uma oposição em relação ao posicionamento das avós anteriores. Talvez, a avó da aluna E ainda possua um pensamento voltado à tradição em que ela está inserida e queira passar isso para a sua neta. Esta avó reproduz as regras do seu tempo que procuram conter o corpo feminino.

Em seguida, perguntamos para toda a turma: “Vocês acham que as avós e os avôs têm coisas importantes para nos ensinar?” A resposta da turma foi unânime: Sim. Continuamos questionando: “Qual o espaço que eles ocupam na sua vida? Qual o papel deles?” Algumas respostas apresentadas pelos discentes foram as seguintes: “É bom ter contato quando a pessoa tem, mas quando não tem... Queria que a minha avó fosse viva. Eu achava a minha avó 10 mil vezes melhor que o velho” (Aluno F), “Só não gosto quando ela fala besteira para eu sair do celular” (Aluna J), “O velho quando está caducando fica meio... perguntando se a pessoa já tá namorando” (Aluna P), “A gente fica alegre assim, dia de domingo na casa deles conversando... Eles podem ensinar a ser mais educado” (Aluno F), “Todo domingo 100 conto” (Aluno B). A discente E disse que eles fazem comentários desnecessários como: “Aaah, eu vi tu dançando...”. Perguntamos a esta aluna como ela se sentia diante dessa forma de ser questionada e ela respondeu que sentia que era crítica.

De acordo com a turma, há um conflito de gerações quando se trata dos conselhos das avós e avôs direcionados aos comportamentos adequados dos netos: usar menos o celular, questionamentos sobre a vida amorosa, ao jeito de dançar, etc. Porém, há uma menção aos domingos tradicionais nas casas dos entes idosos e o interesse pelo “presente” que os/as netos/netas estão acostumados a ganhar.

Perguntamos como poderíamos fazer para retribuir e agradar os avôs e as avós: Alguns discentes responderam o seguinte: “Dando mais atenção, carinho... Eles foram criados com muito estresse... Ela é muito importante para mim, porque ela é a minha mãe, o meu pai, avó... ela é tudo” (Aluna J), “É muito bom assistir novela com a minha

avó” (Aluna P), “É bom quando eles nos dão conselhos” (Aluno B). O estudante K afirmou que não gostava de assistir com a avó: “Porque ela só quer assistir jornal. Mas ela é muito importante. Ela e o meu avô porque eles quem cuidam de mim”.

Percebemos, neste ponto, que há demonstração de afeto, respeito e compreensão da importância dos avôs e das avós para a formação dos sujeitos, o que ficou evidente, principalmente, nas respostas daqueles que mantêm contato direto com os seus entes mais velhos.

Depois desse momento de discussão, para introduzir o vídeo12 que fala sobre a história da constituição da fotografia, retornamos à leitura da parte introdutória do livro. Pedimos que o aluno H realizasse a leitura do trecho lido na aula anterior e, em seguida, perguntamos como poderíamos fazer para retornar às memórias, conhecer parentes que não conhecíamos e a resposta da aluna D foi “por meio de fotografias”. Dessa forma, falamos brevemente sobre os recursos fotográficos atuais e explicamos um pouco sobre o documentário “História da fotografia”, a que eles assistiram em seguida.

Após a exibição do documentário, perguntamos para que serve esse mecanismo e as respostas dos alunos variavam em torno de: “guardar momentos para sempre” e “lembrar de coisas que aconteceram”, “ajudar na criação de textos”, “registrar momentos importantes”.

Assim, foi possível verificar que os alunos e alunas entenderam a importância da fotografia na nossa vida como recurso para guardar e registrar memórias, como também conseguiram fazer a associação deste mecanismo com a parte introdutória do livro, pois foi através de um retrato que se inicia a história da narrativa que iríamos ler.

4.3 NO FUNDO DE UMA CAIXINHA: EXPLORANDO O UNIVERSO DE BISA