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Folha XIX Atividade Nº 35 “A TABELA COLORIDA”

Parte 2: Representação Geométrica

4.1 Para além da polêmica e da dicotomização: uma perspectiva integradora para a abordagem escolar dos Números Racionais.

4.2.1 A fração como relação parte–todo.

Já nas séries iniciais, são apresentadas aos alunos algumas frações de uso mais comum, como metade, terços, quartas partes. Pode-se dizer que eles aprendem a ler e a escrever “

2 1 ” , “ 3 1 ” e “ 4 1

”, mas isso não significa que aprenderam representar e interpretar as frações. Não há preocupação com a função dos termos, numerador e denominador. Mais tarde, no ciclo II, nas séries iniciais, o conceito de fração e sua representação são tratados de forma mais sistemática, quando são “trabalhadas” as idéias de parte-todo, apoiadas nos tradicionais diagramas circulares ou retangulares (duas dimensões) ou nas situações de pedaço de um bolo, de uma pizza, de uma barra de chocolate, ou outros exemplos oportunos.

Segundo Llinares(1992, p.55 e 56):

“A relação parte-todo e medida apresenta-se quando um “todo” (contínuo ou discreto), se divide em partes “congruentes” (equivalentes como quantidade de superfície ou quantidade de “objetos”). A fração indica a relação que existe entre o número de partes e o número total de partes (que pode estar formado por vários “todos”).

“Para uma compreensão operativa deste subconstruto se necessita previamente o desenvolvimento de algumas habilidades como:

- ter interiorizada a noção de inclusão de classes (segundo a terminologia de Piaget);

- a identificação da unidade (qual “todo” é o que se considera como unidade em cada caso concreto);

- a de realizar divisões (o todo se conserva ainda quando o dividimos em pedaços, conservação da quantidade); e

- manejar a idéia de área (no caso das representações continuas)”.

Tomemos uma fração e tentemos interpretá-la em seus múltiplos sentidos: Ex.

Que nos diz esta fração?

Um inteiro foi dividido em quatro partes iguais.

Considera-se, no momento, três destas partes. A fração é aqui usada como o nome de alguma coisa que eu tomo.

Concretizemos esta idéia através do diagrama a seguir:

É um contexto contínuo e as representações mais freqüentes para

4 3

(que geralmente aparecem nos livros didáticos) são como as ilustradas:

4

3

3

Na caracterização da relação parte-todo se fala de “partes congruentes”, o que não significa, necessariamente, partes da mesma forma. Na ilustração a figura c também pode representar a relação entre as partes sombreadas e o números de partes por

4 3

.

A fração apresentada, na qual se lê três quartos, sugere uma outra interpretação. Um “grupo de unidades

foi dividido em quatro partes iguais e não

apenas uma unidade isolada. Consideram-se três destas partes.

Estas duas primeiras idéias relacionam-se diretamente, mas são experiências diferentes. Quando procuramos

4 3

de um grupo, necessitamos conhecer o tamanho do grupo. Dividimos, então, em quatro partes iguais e tomamos três destas partes. Nosso raciocínio final, entretanto, busca saber quantas coisas inteiras há dentro de cada parte e no total das partes consideradas. Vejamos esta idéia, através do diagrama:

O sentido da fração como parte de um grupo de unidades está intimamente relacionado à divisão de números naturais (contexto discreto).

Exemplo: Tenho 12 coisas para repartir em 4 grupos iguais, coloco três

coisas em cada grupo. Cada grupo é uma parte do todo. Portanto, três serão

4 1

de 12,

4 3

de 12 serão nove “coisas”.

Os números racionais, escritos na forma decimal41, juntamente com as características de nosso sistema de numeração decimal, podem ser considerados introduzidos pela relação parte-todo.

Utilizando o modelo retângulo e a representação contínua (unidade como todo) e dividindo em 10 partes, cada uma das partes em relação ao todo será um décimo (a décima parte) e se representa como

10 1

.

41

*

Uma quantidade é dita discreta quando possui uma identidade definida (ou individualizada), constituindo uma entidade, isto sé, consta de unidades separadas umas das outra, como as árvores de um parque, as pessoas de uma festa, os grãos de uma espiga, as tampas de garrafa de uma coleção etc...Uma quantidade dita contínua quando é dividida em partes sempre divisíveis e que, portanto, não pode resultar de elementos indivisíveis. Consta de unidade ou parte que não estão separadas (individualizadas) uma das outra, como o comprimento de um fio, a área de uma superfície, o volume de um sólido, a capacidade de um recipiente etc” .(Lima,1986, p.90).

Dividindo-se cada décima parte em dez obtém-se a centésima parte. Um centésimo representa-se como

100 1

.

Fica claro, então, que os decimais42 estão vinculados à relação parte-todo, concebidos como uma extensão dos números naturais.

Outro caso particular da relação parte-todo é o de frações como pontos de uma reta numérica, como na ilustração seguinte:

A representação da fração na reta numérica, como modelo de comparação parte-todo, apresenta dificuldades especiais para a compreensão dos alunos, principalmente quando no segmento da reta, representado no papel, figuram duas ou mais unidades. Neste caso, muito deles tendem a considerar como unidade a totalidade do segmento desenhado e não o segmento unitário. Eles não

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compreendem que o ponto que, na reta numérica, representa

5 3

é justamente o ponto que está a

5 3

de distância do ponto zero. É a interpretação da associação de um ponto a uma fração.

Observa-se que nesse caso a fração não se associa a uma parte de uma figura ou ainda a um subconjunto de objetos, mas se reduz a um número abstrato e como ilustra a figura acima

5 3 é um número entre o 0 e 1 e 2 3 é um número entre o 1 e 2.

Para Llinares (1988, p.60), apesar dessa forma de representar os números racionais na forma fracionária provocar dificuldades em alguns alunos (8-12 anos), também apresenta algumas vantagens e cita que essa representação:

• Faz com que se possa pensar nas frações como números parecidos aos 1,2,3,4,..., e que se podem colocar entre eles.

• Faz com que as frações impróprias (frações maiores que a unidade) apareçam de forma muito mais natural, assim como a notação dos números mistos;

• Dá oportunidade de se insistir no fato de que o conjunto das frações forma uma extensão do conjunto dos números naturais (as frações enchem o “vazio” entre os naturais);

• Tem conexões com a idéia de medida (uso de escalas).

Llinares (1988) comenta resultados de investigações, acerca da dificuldade dos alunos em interpretar frações expressas em reta numérica. Pondera que um dos problemas que surge é a identificação do segmento unidade quando a reta numérica se estende além do um:

Pedem-se aos alunos para assinalarem

5 3

na reta representada. Eles costumam indicar o ponto onde está o 3, quando deveriam indicar um ponto entre 0 e 1. Entender a representação como uma grandeza contínua pode ser a

hipótese que os conduziu ao erro. Não relativizaram a reta a cada sinalização numérica.

Esta dificuldade não permanece na representação seguinte:

Provavelmente, a evidência do juízo tornou-se mais fácil, porque o espaço sugerido era mais simples, pois estava circunscrito entre o 0 e o 1, apenas.

Os alunos voltam a incidir no erro quando o segmento unidade está subdividido em um múltiplo do denominador, como na reta a seguir:

As repostas são diversas, demonstrando que o conceito de números racionais está construídos rudimentarmente, insuficientes para interpretar de representações.

A reta numérica serve também como uma boa representação das frações como medida.

Ao considerarmos os números racionais na interpretação de medida, proporcionamos o contexto natural para a soma (união de duas medidas) e para a introdução dos decimais.

Llinares recomenda os "Números em Cores" ou as regüinhas de Cuisenaire43 como recurso adequado para desenvolver as idéias que relacionam as frações e a idéia de medida. Esse material citado no livro de Llinares, foi muito

43

É um material formado por regüinhas de madeira de diferentes cores e comprimentos. 5 , 3 5 , 0 3 2 1 3 2 1 3+ = = + =

recomendado pela SEE44, para uso nas escolas, principalmente na época das divulgações dos Subsídios para Implementação dos Guias Curriculares, dos Multimeios e das Propostas Curriculares de Matemática.

1 – Branca 2 – Vermelha 3 – Verde Claro 4 – Roxa 5 - Amarela 6 – Verde Escuro 7 – Preto 8 – Marrom 9 – Azul 10 - Laranja

Esse material criado pelo educador belga George Cuisenaire Hottelet que afirma que o ensino das frações deve iniciar-se na primeira série primária (para nós, atualmente, 1ª série do Ensino Fundamental), é constituído por prismas (regüinhas ou bastões) coloridos, de 1 cm2 de seção, com comprimentos que vão de 1 a 10 cm, isto é, por prismas retangulares de l cm2 de seção. Cada comprimento está associado a uma cor diferente e simboliza um número.

A cor segundo o autor do método foram escolhidas após uma experimentação prolongada, isto é, estabelecida cientificamente, com base em uma serie de considerações, entre outras:

a) A utilidade didática de agrupar os comprimentos das regüinhas em cinco "famílias", segundo as relações naturais que presidem à construção dos números.

b) Uma lógica de adulto, que incita, na medida do possível, a fazer coincidir as relações dos números com as relações. Por exemplo, que o amarelo (5) conduza, multiplicado pelo vermelho (2), ao alaranjado.

c) No interior de uma família dada, a regüinha menos comprida corresponde à cor menos densa. Na família dos vermelhos, o vermelho claro é de uma cor menos densa do que o roxo e este de uma coloração menos densa do que o marrom.

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A SEE enviou esse material (Escala Cuisenaire e Cuisenaire Gigante) para as escolas e posteriormente mandou verbas para que se comprasse materiais instrucionais que o incluía.

d) Os cubos unitários (1) são de madeira natural e deve poder integrar-se na construção de todas as famílias por meio da adição 1 por 1.

Criticado por dar cor aos números (número é um ente abstrato), Cuisenaire advertia que não pretendia em absoluto fundar uma teoria cromática das matemáticas.

Para o estudo de frações é interessante a associação das cores em famílias. A unidade (madeira natural) constitui uma classe singular. A série 2, 4, 8 (família vermelha) constitui uma classe binária que se obtém por duplicação sucessiva:

2 = 1x 2; 4 = 2 x 2; 8 = 2 x 4.

A série 5, 10 (família amarela) é binária e se obtém igualmente por duplicação: 2 x 5.

A série 3, 6, 9 (família verde) é uma classe mista binária -ternária: 3 = 1 x 3; 6 = 2 x 3; 9 = 3 x 3.

A classe 7 é também uma classe singular. No gráfico abaixo ilustra as famílias de cores.

Llinares (que aborda em seu texto os "Números em Cores" de Cuisenaire), explica que a pergunta: "o que a regüinha vermelha é da branca?" tem uma tradução em termos de medida que indica "que mede a regüinha vermelha tomando a branca como unidade?”.

Se a pergunta for: qual a proporção de uma regüinha branca em relação à vermelha? Quanto mede a regüinha branca, enquanto unidade, quando comparada com a vermelha? Vê-se que a parte branca é uma daquelas duas que cobrem a vermelha. Então a relação proporcional entre a branca e a vermelha é de

2 1

(b = ½ x v). Neste caso se diz que a regüinha branca é metade da vermelha. Pode-se generalizar esta situação, quando se considera a regüinha branca como unidade e se pergunta: quanto mede a amarela? Volta-se a observar a proporcionalidade da regüinha branca e em relação à amarela para se obter o que segue: cinco vezes a branca é a amarela

Cada regüinha branca equivale a uma das cinco partes necessárias para cobrir a extensão da amarela. Utilizando-se a mesma notação anterior escreve-se essa sentença (b = 1/5 x a).

Assim sendo, quando se estende a comparação de proporcionalidade à verde clara, vê-se que esta será formada por três brancas, que equivalerão a três quintos da amarela ( v = 3 x b = 3/5 x a).

Llinares (1988) finaliza o estudo dizendo que pode-se indicar que a relação parte-todo, tanto em sua representação contínua quanto na discreta, constitui fundamento da interpretação das frações como medida.