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O risco e a incerteza são os grandes pilares da definição de Frank Knight do empreendedorismo, como sugere Philipsen (1998). As grandes contribuições de Frank Knight, economista americano nascido no final do século XIX, à teoria do empreendedorismo estão explanadas na sua tese de doutoramento Risk, Uncertainty and

Profit, publicada em 1921 e onde é feita a distinção de forma explícita, pela primeira

vez, entre risco e incerteza (Monteiro, 2010; Praag, 1999).

Sumariamente, o risco pode ser calculado, a incerteza não (Ripsas, 1998). Para Knight (1921) o empreendedor é portador de incerteza (ou risco, segundo a teoria de Cantillon), que não é mensurável através de percentagens, enquanto o risco envolve mais do que mera arbitragem. Esta (verdadeira) incerteza é a base da teoria do lucro, da concorrência e do empreendedorismo de Knight. Praag (1999) e Zinga (2007) apontam que Knight generalizou a teoria de Cantillon ao afirmar que o empreendedor suporta incertezas, ou riscos na terminologia de Cantillon, e que o empreendedorismo envolve mais do que mera arbitragem. Assim, podemos afirmar que, segundo Knight, a função económica do empreendedor passa pela aceitação do risco e incerteza.

Quer isto dizer que, de acordo com Praag, (1999), a incerteza bem como o risco, é composta por um tipo de probabilidade para a qual não há nenhuma base válida para classificar exemplos, porque se trata de um evento único. Assim, deve ser feito um julgamento tanto para a formação de uma estimativa como para uma estimação do seu valor – cabe ao empreendedor este papel de decisor. Segundo o mesmo autor, as decisões incluem o planeamento de onde, quando e que tipo de produtos a criar. O trabalho do empreendedor restringe-se à direção e controlo, bem como lidar com a incerteza associada às mudanças nas necessidades dos consumidores e no poder de compra, enquanto todos os outros elementos se devem dedicar ao sistema produtivo, para o qual recebem uma remuneração fixa.

26 Assim, constata-se que na definição de empreendedorismo de Knight, a incerteza é o seu elemento base e ponto de partida. Neste aspeto, segundo Philipsen (1998), Schumpeter e Knight estão em desacordo, na medida em que Schumpeter criticou Knight por este não distinguir entre empreendedor e proprietário, já que para Schumpeter o risco não é um elemento vital para a compreensão do empreendedor, a não ser, é claro, se o empreendedor também for proprietário dos recursos.

Além disso, Knight contribuiu com uma análise mais profunda das motivações e características necessárias para se tornar um empreendedor de sucesso: não só são necessárias as capacidades empreendedoras, como também (boa) sorte e crença nela, já que a capacidade empreendedora depende fortemente de sua capacidade de lidar efetivamente com as incertezas que uma atividade empreendedora acarreta (Praag, 1999; Zinga, 2007). Por sua vez, lidar de forma eficaz com a incerteza requer um alto grau de autoconfiança, um poder de autoavaliação comparativamente aos concorrentes, ou uma predisposição de agir em conformidade com as suas próprias opiniões (Zinga, 2007). Assim, a capacidade empreendedora inclui também o que Knight refere de: “o poder de controlo efetivo sobre os outros homens, bem como a capacidade intelectual para decidir o que deve ser feito” (cit. por Praag, 1999). O sucesso como empreendedor depende ainda da disponibilidade de capital suficiente para garantir a remuneração de fatores fixos; tal é especialmente relevante se o empreendedor tiver que recorrer a apoio financeiro externo (Praag, 1999).

O empreendedor Knightiano não só é remunerado com lucro ou renda residual, como também com o prestígio do empreendedorismo e a satisfação resultante de ser o seu próprio patrão (Praag, 1999). Outra mais-valia resultante da redução da incerteza refere-se à hipótese das respetivas poupanças poderem reverter para a sociedade, criando valor adicional, pelo que é fundamental e lucrativo haver uma seleção rigorosa dos indivíduos mais aptos para cada cargo empresarial (Knight, 1921, 1927, cit. por Praag, 1999).

Knight (1921, cit. por Praag, 1999) afirma que o empreendedorismo envolve:

(a) a capacidade empreendedora, com os vários elementos nela compreendida, (b) a vontade, (c) o poder de dar garantias satisfatórias, e (d) a coincidência destes fatores… a mera disposição, mais o poder de dar garantias, não apoiados pela capacidade, vai evidentemente levar a uma dissipação de recursos, enquanto a capacidade sem os outros dois fatores será apenas desperdiçada.

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4. Teoria de processo de mercado austríaco

I. Contextualização

A visão austríaca da economia de mercado é distinta da visão dos economistas clássicos e neoclássicos, na medida em que os pensadores neoclássicos analisam o mercado partindo do pressuposto que se encontra num equilíbrio geral, nos diferentes momentos do tempo; sendo a principal preocupação do movimento tentar explicar as razões que conduzem a esse estado de equilíbrio (Praag, 1999). O processo de mercado

austríaco (PMA), por sua vez, considera como o seu principal foco, a dinâmica da

descoberta, isto é, a identificação de oportunidades lucrativas decorrentes de erros por ignorância pura ou desconhecimento de informação básica (Praag, 1999).

Uma premissa base do PMA é a de que as decisões dos agentes económicos interagem e competem para gerar mudanças ao nível dos preços, resultados/outputs, métodos de produção e alocação de recursos (Monteiro, 2010; Murphy et al., 2006). Decorrente deste pressuposto, o PMA conjeturou (Kirzner, 1973) que as escolhas individuais dos agentes económicos contêm erros que, por sua vez, contêm planos que não chegam a ser realizados ou que são realizados mas não geram o valor esperado. Tal conceito oferece uma perspetiva mais ampla sobre a definição de objetivos, a tomada de decisão, a motivação e o estado de alerta. Esta conjetura chamou a atenção para a importância da novidade absoluta de oportunidades e circunstâncias empresariais, que carecem de recursos programáveis, ressaltando a importância da agilidade e vigilância empresariais. Assim, o PMA tornou os agentes económicos individuais como os alvos de mercado, elevando a relevância das suas intenções subjetivas e crenças. Nesta perspetiva, os conceitos nucleares que decorrem da escola austríaca incluem o conhecimento tácito e o empreendedorismo per si (Zinga, 2007).

Apesar da distribuição idiossincrática do conhecimento num sistema de mercado, o PMA explicou com sucesso a convergência do conhecimento necessário para tomar decisões corretas e descobrir oportunidades, acabando por ser amplamente reconhecido (Murphy et al., 2006). De facto, os agentes económicos têm um conhecimento imperfeito sobre as oportunidades de negócio; logo, quando uma oportunidade emerge, um perfeito conhecimento acerca dela é impossível, o que faz com que a competição por um conhecimento mais perfeito ou superior seja condição

28 base (Kirzner, 1973). Enquanto os agentes económicos ou atores de mercado competem, nova informação é gerada, através da qual eles se guiam e revêm os seus planos – tal é explicado pelo princípio rudimentar que sustenta que qualquer empreendedor tem mais ou menos opções de escolha eficazes, que, por sua vez, contextualizam a atividade empreendedora individual de forma mais eficaz do que o movimento anterior (Murphy

et al., 2006). Senão vejamos o seguinte caso, referido por Murphy et al. (2006): a partir

da perspetiva do empreendedor, a sua liberdade de escolha entre uma gama de opções como a seleção de uma estratégia de marketing específica ou a inovação, implica vários níveis de valor para essas opções; embora esse valor seja relativo, a sua variância enfatiza as ligações entre os meios empregues de um empreendedor individual (por exemplo o uso de tecnologia) e os fins desejados ou objetivos (como um novo produto ou serviço).

Com base na conceção inicial do papel de direção do empreendedor, o PMA permitiu ao empreendedorismo a inovação sem mais que o conhecimento como recurso; noutras palavras, ao invés de ser um fator de produção, é o “empreendedorismo puro” (Kirzner, 1973, cit. por Murphy et al., 2006). Seguindo a linha de pensamento de Say (1971) e Schumpeter (1934), a propriedade é distinta do empreendedorismo, isto é, o empreendedorismo não exige necessariamente a posse de recursos (Murphy et al., 2006). Seguindo este pensamento, os proponentes da escola austríaca advogam que o problema económico consiste na mobilização social do conhecimento tácito, fragmentado e disperso por definição, através da interação das atividades empreendedoras dos concorrentes (Zinga, 2007). Sendo o conhecimento um recurso intangível, não é passível de monopólio ou posse exclusiva, sendo a descoberta empreendedora um elemento competitivo inerente (Murphy et al., 2006).

Acrescenta-se ainda a ideia referida por Knight (1921) de que os empreendedores operam num contexto de incerteza e risco. A partir desta conceção geral, segundo Murphy et al. (2006), o movimento revela que cada oportunidade é única e que os conhecimentos e táticas anteriormente usados falham em prever os resultados futuros de forma fiável, uma vez que nega o princípio de que as circunstâncias são repetíveis e levam sempre aos mesmos resultados no sistema económico; pelo contrário, os empreendedores são incentivados a usar conhecimento episódico, que nunca tenha sido visto nem volte a repetir-se, para gerar valor. Os autores salientam ainda que a incerteza

29 e o risco podem ser minimizados ou geridos e o erro limitado, mas ainda assim esses elementos são imutáveis e estarão sempre presentes.