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Funções de distribuição para previsão de precipitação e evapotranspiração

Os elementos climáticos, as características das plantas, as práticas culturais e o conteúdo de água no solo são muito importantes para a quantificação da lâmina de irrigação requerida pelas culturas, sendo que as principais técnicas utilizadas para sua estimativa baseiam-se em dados climáticos (Soares et al., 1998), principalmente, os relacionados à precipitação pluviométrica e evapotranspiração.

Dessa forma, o estudo da distribuição e variabilidade dessas duas varáveis climáticas são importantes, pois possibilitam determinar os seus valores prováveis de ocorrência através do uso de funções de distribuição de probabilidades adequadas. Essas informações facilitam a programação das atividades agrícolas, diminuindo os riscos conseqüentes de seca, veranicos e/ou excessos de chuvas (Andrade Júnior & Bastos_,

1997a), bem como o planejamento e o manejo racional da irrigação.

Em climatologia, a maneira mais utilizada de avaliar-se a probabilidade de um determinado evento é por meio das funções de distribuição de probabilidade, as quais são estimadas com base na experimentação ou através dos eventos passados (Sousa, 1999). Entretanto, um ponto crucial nesse processo é a definição quanto à função de distribuição a ser utilizada e o número mínimo de elementos ou anos de observações necessário para uma adequada estimativa.

Segundo Assis et ai. (1996), um erro muito comum em análise de dados climatológicos é desprezar-se as características da distribuição de probabilidade mais adequada para os dados em estudo. O mais freqüente é adotar-se, a priori, a distribuição normal de probabilidades, o que pode resultar em conclusões erradas, caso os dados não obedeçam a essa distribuição. Por isso, é fundamental o uso prévio de procedimentos ou testes de aderência para determinar-se qual a distribuição de probabilidade mais adequada para um determinado conjunto de dados. Dentre esses testes, destaca-se o de Kolmogorov-Smirnov (Campos, 1979).

Quanto ao número de observações necessário, Assis et ai. ( 1996) consideram como razoável, uma amostra de dados, com no mínimo, 30 anos de observações. Entretanto, vários trabalhos utilizaram séries menores de dados, sem contudo afetar significativamente as previsões obtidas. De fato, Soares et al. (1998) efetuaram uma caracterização da evapotranspiração de referência e precipitação dependente no Estado de Minas Gerais, com dados de uma série de 1 O anos para precipitação e 5 anos para evapotranspiração.

Por outro lado, Andrade et ai. (1999b) analisando a representatividade dos dados pluviométricos totais anuais de duas estações climatológicas no Litoral (Fortaleza, com 33 anos de dados) e região Semi-árida do Ceará (Quixeramobim, com 40 anos de dados), com base na determinação do erro da média a longo prazo e da média móvel de 5 anos, verificaram que a precipitação média anual de Fortaleza e Quixeramobim podem ser estimadas pela média da amostragem com um erro de 7% e 5%, respectivamente, indicando que séries com 40 anos de dados sejam usadas nessas regiões quando se deseja uma melhor representatividade. Concluíram que séries de 30 e 40 anos de dados pluviométricos para estas regiões não foram suficientes para se determinar se a variabilidade temporal da precipitação anual apresenta uma variação definida.

Na realidade, existem poucas estações climatológicas no Brasil com dados suficientes para ajustar-se aos modelos de distribuição, o que torna necessário a busca de alternativas para a previsão de eventos climáticos futuros, dentre as quais destaca-se a técnica de simulação (Sousa, 1999).

Existem várias metodologias para a estimativa da precipitação pluviométrica provável, dentre as quais destaca-se a distribuição _gama. Apesar de mais complexa gue a distribuição normal, a distribuição gama é a que tem apresentado melhores resultados para o ajuste de totais de chuva mensais ou inferiores (Assis et ai., 1996). Entretanto, as precipitações pluviométricas de pequenos intervalos de dias são limitadas inferiormente pelo valor zero e os _parâmetros da distribuição _gama não _podem ser estimados pelo método da máxima verossimilhança, o mais geral e recomendado. Nesses casos, deve ser utilizada a função de distribuição _gama mista, uma vez que permite uma maior flexibilidade da curva e melhor ajuste aos dados pluviométricos (Castro & Leopoldo, 1996).

Diversos estudos probabilísticos utilizando a função de distribuição gama foram realizados com o intuito de analisar as precipitações pluviométricas _prováveis em diferentes localidades e para diferentes intervalos de dias (Vivaldi, 1973; Frizzone, 1979; Pedro Neto & Silveira, 1981; Frizzone et ai., 1985; Mass�nam, 1993; Assis & Villa Nova, 1993; Rodrigues & Pruski, 1996; Rodrigues & Machado, 1996; Andrade Júnior & Bastos, 1997a; Andrade Júnior & Bastos, 1997b; Bastos et ai., 1998; Araújo et ai., 1999 e Viana et ai., 1999). Entretanto, a resposta dos modelos matemáticos aplicados à estimativa da precipitação provável devem ser reavaliados nas diferentes re__giões (Frizzone, 1979), principalmente nas que apresentam grande potencial agrícola (Rodrigues & Pruski, 1996).

Apesar de ser vasta a literatura quanto ao uso da distribuição gama para efetuar a estimativa da precipitação pluviométrica provável, raros são os trabalhos executados para as localidades contempladas nesse estudo. Destaca-se, unicamente, o trabalho de Silva ( 1997), que analisou as séries de dados mensais de precipitação pluviométrica do período de 1971 a 1992, em Parnaíba (PI), utilizando as distribuições de probabilidade empírica e _gama incompleta. Apresentou estimativas das precipitações mensais esperadas, para os níveis de probabilidade de 5 % a 99 %, durante o período chuvoso na região (janeiro a junho). Entretanto, essas informações mensais, apesar de serem úteis para o dimensionamento de sistemas de irrigação, não são adequadas para o manejo da irrigação, especialmente, das culturas de ciclo curto.

Com relação à evapotranspiração de referência, vários trabalhos mostraram que sua estimativa pode ser efetuada com a função de distribuição normal (Nixon et al., 1972; Pruitt et ai., I 972; Arruda & Barroso, 1984; Saad & Scaloppi, 1988; Saad, 1990; Silva et ai., 1998), beta (Yao, 1969; Saad & Scaloppi, 1988; Saad, 1990; Silva et ai., 1998) e Gumbel (Bastos et al., 1997). Entretanto, para que ocorra um bom ajuste há necessidade de um grande número de dados, no mínimo, 20 anos de observações.

Considerando-se eventos extremos de evapotranspiração de referência (ETo ), Bastos et ai. (1997) analisaram a distribuição de freqüência da ETo utilizando o modelo de Gumbel a partir de uma série histórica de 15 anos de dados meteorológicos de Teresina (PI). Os valores diários de ETo foram acumulados em períodos de 1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7 dias, estabelecendo-se os valores máximos para cada período e ano. Os autores apresentaram os valores máximos de ETo para períodos de 1 a 7 dias, em níveis de probabilidade variando de 5 % a 95 %, para os meses de maior demanda hídrica ( setembro e outubro), que permitem o dimensionamento e manejo de sistemas de irrigação mais criteriosos nessa região.

Para contornar a limitação quanto ao número insuficiente de observações, Sousa (1999) propõe o uso da distribuição triangular de probabilidade associada à técnica da simulação pelo método de Monte Cario para a estimativa de valores de evapotranspiração de referência diária. A utilização da distribuição trian_gular de probabilidade é bastante facilitada nessas situações, pois são necessários apenas os valores máximo, mínimo e o valor mais freqüente ou moda da distribuição.

Sousa & Frizzone ( 1998b) compararam os valores do déficit de evapotranspiração na cultura do fumo em Cruz das Almas (BA) simulados com base nas funções de distribuição triangular e normal para dois períodos do ano (verão e inverno). Concluíram que os valores simulados pelas duas funções foram estatisticamente diferentes entre si pelo teste de Tukey ao nível de 5 %. Porém, as diferenças foram pequenas, em média inferiores a 5,0 % (período de verão) e 8,5 % (período de inverno), indicando que a função triangular pode ser utilizada como uma alternativa para a simulação de valores de ETo e déficit de evapotranspiração em regiões onde os dados são insuficientes para o ajuste pela função normal.

O uso de distribuições de probabilidade mais simples, como a distribuição triangular, é particularmente indicado em situações quando se dispõe de poucas informações ou estas constituem-se apenas em probabilidades subjetivas (Anderson et al., 1977; Biserra, 1994; Dias, 1996). Como a utilização desta função muitas vezes está associado a inferências subjetivas nos valores dos parâmetros de entrada deve-se ter atenção especial nos possíveis efeitos que as variações destes parâmetros possam proporcionar nos valores calculados com essa distribuição.

Sousa & Frizzone (1998a) conduziram estudo com o objetivo de analisar a sensibilidade às variações impostas nos valores iniciais dos parâmetros de entrada da função trial!_glllar (valores máximo, mínimo e moda) aplicada à simulação da evapotranspiração de referência (ETo) e do conseqüente déficit de evapotranspiração. As análises de sensibilidade foram efetuadas para os meses de janeiro e julho e consideraram subestimativas e superestimativas de 1 O %, 20 % e 30 % em cada uma dos parâmetros da função trian_gular. Para os dois meses, considerando uma mesma percentagem de variação imposta, o parâmetro mais sensível foi o correspondente ao valor máximo da ETo, seguida da moda e do valor mínimo. O valor mínimo de ETo mostrou-se pouco sensível, pois variações de 30 % neste parâmetro proporcionaram variações da ordem de 9% (janeiro) e de 6 % (julho) nos valores simulados de déficit de evapotranspiração.

Utilizando a distribuição triangular de probabilidade para a estimativa de ETo diária para os meses de março e julho no município de Piracicaba (SP) em comparação com a distribuição normal de probabilidades, Sousa (1999) verificou maior dispersão nos valores de ETo simulados pela função triangular, quando comparados com os simulados pela função normal, em relação ao valor médio observado. Observou, para a função trian__gular, uma variação da média simulada da ETo no mês de março inferior à 6,4 % em relação ao valor médio simulado pela função normal. No mês de julho, a função trian__gular superestimou o valor médio da ETo em 4,6 % em relação à função normal. Concluiu que a função normal proporcionou melhor ajuste quando comparada com a função trian_gular.

Verificou-se, portanto, que além das distribuições de probabilidade gama, normal e beta, tradicionalmente utilizadas para a estimativa da precipitação pluviométrica e evapotranspiração de referência, pode-se empregar a distribuição triangular de probabilidade, quando não se dispõe de uma longa série de dados. Em ambos os casos, o uso simultâneo da técnica de simulação constitui-se uma alternativa viável para contornar a limitação quanto ao tamanho insuficiente da série de dados disponível.

2.5 Simulação aplicada à previsão de eventos futuros

Simulação é a representação dinâmica de um sistema mediante um modelo, o qual é por natureza, em grande parte matemático. Por sistema entende-se um coajunto de componentes e variáveis que se interrelacionam, formando um corpo único (Frizzone & Silveira, 2000). Para a descrição do sistema é necessário que a variação de seus elementos possam ser preditos, pelo menos, em termos de distribuição de probabilidades (Hillier & Lieberman, 1988).

A simulação de dados permite o cálculo de diferentes combinações que probabilisticamente podem ocorrer, obtendo-se como resultado não um valor determinista, mas uma distribuição de freqüências, sendo o risco traduzido em números pela variância (Brunelli, 1990; Dias, 1996; Frizzone & Silveira, 2000).

Segundo Sousa (1999), a técnica de simulação pode ser adotada com a finalidade de fazer a previsão de fenômenos meteorológicos, uma vez que permite a partir de dados históricos simular a ocorrência futura de possíveis valores. Essa possibilidade é muito importante, uma vez que, na maioria dos casos, as séries de dados climáticos disponíveis para efetuar-se estudos envolvendo as inter-relações clima versus sistema agrícola são muito pequenas, o que pode levar a obtenção de resultados tendenciosos para uma determinada região (Genneville & Boock, 1983).

Alguns trabalhos foram executados com o intuito de aplicar e validar a técnica de simulação para a geração de valores de evapotranspiração de referência (Howell et al., 1975; Sousa & Frizzone, 1998a; Sousa & Frizzone, 1998b e Sousa, 1999), enquanto outros foram conduzidos visando a modelagem estocástica da ocorrência de precipitação

pluviométrica através da cadeia de Markov (Howell et al., 1975; Genneville & Boock, 1983; Azevedo & Leitão, 1990; Almeida, 1995; Sediyama et al., 1996 e Fietz et al., 1998) e de sua magnitude associada à distribuição gama (Carey & Haan, 1978; Assis, 1991; Assis & Villa Nova, 1993; Peiter, 1998; Peiter et al., 1999).

A cadeia de Markov é um processo em que a probabilidade do sistema estar em um determinado dia em certo estado depende basicamente do estado do sistema no dia anterior (Marouelli & Sediyama, 1988; Sousa, 1999). Essa técnica é comprovadamente eficiente para a descrição da ocorrência de dias secos e chuvosos em um determinado período de tempo e região. Contudo, por esse processo não é possível a determinação da magnitude ou quantidade de chuva observada, devendo ser utilizado em associação com uma função de distribuição de probabilidade de precipitação adequada.

No que diz respeito à estimativa de valores de precipitação pluviométrica através da modelagem estocástica, Genneville & Boock (1983) desenvolveram um modelo para a geração de séries de precipitação pluviométrica diária para a r�ão de Campo Grande (MS). O modelo foi construído usando-se basicamente duas variáveis: i) a probabilidade de ocorrência de chuva em cada dia do mês, com base na cadeia de Markov de primeira ordem e ii) a probabilidade de ocorrência dessa chuva dentro de certa magnitude, utilizando uma distribuição empírica de probabilidade em função das classes de precipitação observadas. A avaliação do modelo mostrou-se positiva tendo verificado pequenos desvios quando comparou-se as médias anuais e mensais de precipitação geradas com as da série histórica.

Nessa mesma linha de estudo, Peiter et al. (1999) efetuaram a estimativa da ocorrência e quantidade de chuva diária para a cidade de Santa Maria (RS), no período compreendido entre setembro e janeiro, através da técnica da cadeia de Markov de primeira ordem e do ajuste a uma série histórica ( 1980-1996) utilizando a distribuição gama. Os autores obtiveram séries geradas com parâmetros estatísticos aceitáveis quando comparados aos verificados nas séries históricas, demonstrando que este método pode ser recomendado para a estimativa da precipitação pluviométrica em Santa Maria

Uma técnica de simulação muito utilizada é o método de Monte Cario, que baseia-se na comparação de números randômicos com uma determinada função estatística (Peres & Mattos, 1990; Sousa, 1999), ou seja, a partir de um número aleatório e conhecendo-se a distribuição de probabilidades que descreve o evento, o método permite a _geração de outros possíveis valores para o referido evento. A literatura apresenta inúmeros trabalhos nos quais essa metodologia foi empregada com resultados satisfatórios (Howell et al., 1975; Noronha, 1982; Neves, 1984; Sá, 1985; Azevedo Filho, 1988; Latapia, 1988; Brunelli, 1990; Peres & Mattos, 1990; Biserra, 1994; Sousa e Frizzone, 1997; Sousa & Frizzone, 1998b e Sousa, 1999).

Nos estudos desenvolvidos por Sousa & Frizzone (1998b) e Sousa (1999) foi utilizada a técnica de simulação de Monte Cario para a geração de valores de ETo e déficit de evapotranspiração, os quais foram obtidos com as funções de distribuição normal e triangular. Concluíram que os valores de ETo e déficit de evapotranspiração simulados pelas funções de distribuição normal e triangular apresentaram um bom ajuste quando comparados aos valores observados, apresentando índices de concordância de Willmott acima de 0,94 e coeficientes de correlação superiores a 0,97, indicando uma elevada exatidão e precisão na estimativa do déficit de evapotranspiração com o uso destas duas funções de distribuição de probabilidade, independentemente do número de simulações utilizado. Estes resultados comprovam a viabilidade e a eficácia da aplicação dessa técnica.

A técnica de simulação de Monte Cario também tem sido empregada em estudos de análise de risco em avaliação de investimento em projetos e de custo de produção, tais como os trabalhos de Noronha (1982), Neves (1984), Sá (1985), Azevedo Filho (1988), Latapia (1988), Brunelli (1990), Biserra (1994) e Dias (1996). Em estudos econômicos, normalmente, não dispõe-se de informações suficientes quanto às variáveis a serem analisadas. Desse modo, usualmente, adota-se a distribuição triangular de probabilidade para proceder-se a estimativa das variáveis de maior relevância (Pouliquen1 citado por Biserra, 1994).

1 POULIQUEN, L. Y. Risk analysis in project appraisal. Baltimore, Johns Hapkins University Press, 1983. 79p.