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2. tiPoGraFia no ProJeto eDitoriaL

2.1 Funções e domínios da tipografia

A invenção de Gutenberg1 foi um grande marco na história da humanidade

e um impulso na história da tipografia, do sistema editorial e da comuni- cação de massa. Jornais, livros e mais a frente as revistas, começaram a ser produzidos e comercializados entre a população, permitindo o acesso das pessoas as notícias e as histórias que passaram a ser impressas (FUENTES, 2006). Com esta nova demanda de publicações, aos poucos foi percebida a necessidade de estabelecer padrões para organizar a informação preo- cupando-se com a representação do conteúdo e não somente com o seu

1 Segundo Kane (2012) acredita-se que Gutenberg não tenha inventado sozinho a fundição de tipos ou a impressão, mas foi uma figura central para o desenvolvimento da tipografia ao criar a prensa tipográfica e aperfeiçoar o processo de impressão por tipos móveis. Ali (2009) e Bringhurst (2015) registram ainda que os tipos móveis surgiram na China por volta do século XI, mas disseminaram-se somente ao chegar na Europa no século XV.

registro. Gruszynsky (2008), observa que a adequação de livros e jornais para produtos de comunicação de grande consumo não se deve apenas a mudanças no conteúdo, mas também na diagramação e no estilo tipográfico. Em relação ao estilo tipográfico é importante considerar que os caracteres não representam apenas a escrita, ou seja, conteúdo textual, pois segundo Arroyo (2005) também transmitem sensações e emoções por meio de suas formas. Exercem, portanto, funções que vão além do registro do conteúdo. Para Arroyo (2005) a tipografia tem Função Comunicativa e Construtiva, mas também exerce Função Estética, Didática e Persuasiva. A seguir estas 5 funções são explicitadas:

• Função Comunicativa: os símbolos tipográficos são traduções da linguagem escrita para a linguagem falada e seu significado se efetiva por meio da leitura. A tipografia deve proporcionar condições para que os textos sejam legíveis e assim assegurem a comunicação; • Função Construtiva: a tipografia é responsável pelo desenho das letras. É a partir destas letras que palavras, frases, textos e conse- quentemente os materiais de comunicação são formados. A tipografia pode ser considerada a base desta construção;

• Função Estética: as formas das letras têm como objetivo a legibili- dade, mas também carregam aspectos estéticos como a sinuosidade dos acabamentos, a sutileza do contraste, entre outros atributos que lhe conferem beleza;

• Função Didática: a tipografia contribui para a compreensão de textos sendo legível e organizando o conteúdo. Desta forma pode-se considerar que ela ajuda na transmissão de informações e na preser- vação da cultura de geração a geração;

• Função Persuasiva: a tipografia busca persuadir o leitor a partir de um tipo adequado e aplicado em uma composição atrativa e legível (ARROYO, 2005).

Para Stöckl (2005) a tipografia também apresenta diferentes níveis, atuando como código de linguagem, como representação visual do conteúdo, trans- portando valores emocionais do conteúdo, e ainda assumindo função pictó- rica, representando objetos de realidade ou ilustrando emoções. Tanto nas funções atribuídas por Arroyo (2005) quanto nos níveis indicados por Stöckl (2005) percebe-se que a função da tipografia vai além de estabelecer um código de linguagem, mas também envolve aspectos estéticos que podem reforçar o significado da mensagem e envolver o leitor.

Em seu artigo intitulado “Typography: body and dress of a text — a signing

mode between language and image”, Stöckl (2005) estabelece outra abor-

dagem, indicando os domínios da tipografia que segundo ele dividem-se em microtipografia, mesotipografia, macrotipografia e paratipografia, que correspondem respectivamente ao design de tipos, aos blocos de texto, a estrutura gráfica geral do documento e aos materiais e técnicas usados na produção e reprodução tipográfica. Stöckl (2005) estabelece uma relação entre os domínios da tipografia, suas propriedades e a construção tipográ- fica em um quadro que denomina como Gramática Tipográfica — um instru- mento de análise. O quadro 2 apresenta esta relação.

Quadro 2: Gramática Tipográfica: um instrumento de análise

Domínios da Tipografia Blocos de Construção Tipográfica Proporções Tipográficas

MICROTIPOGRAFIA refere-se ao design de fontes e sinais gráficos individuais.

Tipo Garamond, Helvetica, etc Tamanho Pontos

Estilo Traçado, estilo, modo Cor Positivo ou negativo, colorido MESOTIPOGRAFIA

relaciona-se com a configuração de sinais gráficos em linhas e blocos de texto.

ajuste da letra padrão, espaçado, reduzido, etc. espaçamento entre palavras estreito, largo, etc.

entrelinha espaçamento duplo, simples mancha tipográfica caracteres por página alinhamento tipográfico esquerda / direita / centralizado posição / direção de linhas horizontal, vertical, diagonal, etc. mistura de fontes Caligráfica, com ou sem serifa, etc. MACROTIPOGRAFIA

relaciona-se com a estrutura gráfica geral do documento.

recuos e parágrafos tamanho de blocos de texto, distância entre os blocos.

capitulares ornamentada / colorida ênfase tipográfica sublinhado, itálico etc. dispositivos de ornamentação/

organização. hierarquias de títulos, numerações, tabelas, gráficos, índices, notas de rodapé, etc.

agrupamento de texto e imagem. relação imagem-legenda, letras figurativas. PARATIPOGRAFIA refere-se a materiais, instrumentos e técnicas de produção e reprodução tipográfica.

qualidade material do meio

(qualidade do papel) Espessura, formato, superfície, etc. práticas de escrita (produção de

signos) Grafia, desenho de caracteres, composição, molde, etc.

Fonte: Stöckl (2005 p. 82, tradução nossa)

Analisando o quadro 2 percebe-se que os domínios da tipografia estão interligados, uma vez que as características apontadas na microtipografia — tipo, tamanho, estilo — interferem diretamente na sua aplicação nos blocos de textos — mesotipografia, que por conseguinte definem a estrutura geral

usados na reprodução — paratipografia. Para esta pesquisa interessam os quatro domínios da tipografia propostos por Stöckl (2005), pois ao sele- cionar os tipos para um projeto editorial é preciso analisar as caracterís- ticas do tipo, tendo como ênfase eu comportamento em blocos de texto e compreender a estrutura do documento onde ele será aplicado e como será sua reprodução. Entretanto, cabe destacar que a meso e a macrotipografia, por tratarem da mancha tipográfica e da estrutura gráfica geral do docu- mento, são os domínios da tipografia que precisam ser observados com maior ênfase ao selecionar os tipos para um projeto editorial.

O tópico a seguir trata da terminologia e da anatomia, elementos que tem relação com o design dos tipos, correspondendo portanto à microtipografia. Compreender as partes que compõe um caractere, suas medidas e propor- ções, facilita o reconhecimento de estilos e também a análise dos tipos em relação a legibilidade, por exemplo.