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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

EM EDUCAÇÃO BÁSICA

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

No planeamento e desenvolvimento deste estudo exploratório adotámos a definição de PC expressa por Ennis (1985, 1996) que entende que o PC significa, usualmente, uma atividade prática, reflexiva cuja meta é uma crença ou uma ação sensata, focada no que decidir e no que fazer e que é utilizada num contexto de resolução de problemas ou de interações entre pessoas e que também implica avaliação.

A escolha desta definição decorre da análise que previamente elaborámos sobre os perfis gerais e específicos dos educadores de infância e dos professores do 1.º ciclo do ensino básico (Decreto-Lei n.º 240/2001 e Decreto-Lei n.º 241/2001) e do entendimento que hoje se tem sobre a profissão docente e que é socializada por autores como Alarcão (1996), Roldão (1999, 2007), Cardona (2006), Alarcão

e Roldão (2009), Trindade (2009), Marchão (2010, 2012), entre outros. No seu conjunto (perfis gerais e específicos e autores referidos) afirmam:

 o sentido ético e deontológico da profissão docente;

 o sentido da realidade, diversidade e heterogenia multicultural em que o professor exerce a sua profissão;

 o sentido da ação baseada na adequação e flexibilidade como fator de resposta a todos e a cada um dos alunos;

 o sentido da ação do professor baseada nas novas tecnologias de informação e de comunicação;

 o sentido da ação do professor numa instituição com uma cultura própria mas integrada na malha social e cultural;

 e o sentido da ação do professor como agente construtor da identidade e profissionalidade que requer o uso do conhecimento profissional reflexivo e crítico combinado com uma atitude colaborativa e questionadora.

A edificação da profissão docente, neste quadro, desenvolve-se sobre um conjunto de conhecimentos que os estudos vêm demonstrando e em que, à semelhança de Sá-Chaves (1997, 2000), apoiada em Shulman (1986, 1987), destacamos: o conhecimento do conteúdo, o conhecimento do curriculum, o conhecimento pedagógico geral, o conhecimento dos fins, dos objetivos e valores educacionais, o conhecimento dos aprendentes, o conhecimento pedagógico do conteúdo e o conhecimento dos contextos, bem como de si próprio. Ou seja, do conhecimento profissional faz parte um conjunto de dimensões que vão desde o conhecimento de si próprio, ao conhecimento dos conteúdos a ensinar e “… inseridos num plano curricular filosófico e histórico amplo, bem como ao conhecimento mais específico de como ensinar, a cada indivíduo, determinado conteúdo em determinado contexto” (Marchão, 2010, p.142), o que lhes permite centrarem-se na gestão curricular analisando as situações, diversificando as práticas e as metodologias para que todas as crianças/alunos aprendam através de processos de crescente autonomia. A profissão docente é uma profissão complexa que se desenvolve num quadro de interações constantes que desempenham um papel mediador na construção do aluno, do seu conhecimento, da sua autonomia intelectual e moral bem como das suas atitudes de participação, de decisão e de tomada de posição crítica que decorre da estimulação aos processos cognitivos em geral e à construção crítica do pensamento em particular.

Embora defendendo que a qualidade da profissão docente é evolutiva e se constrói quotidianamente, a formação inicial constitui-se como um ponto de partida para a profissão e deve facilitar aos futuros professores a construção dos saberes profissionais antes evocados e que, postos em prática promovam a formação das crianças/alunos para uma sociedade cada vez mais diversificada

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Pensamento Crítico na Educação: Desafios Atuais

e exigente, reconhecendo a importância do PC quer para o desenvolvimento do indivíduo quer para o desenvolvimento social (Vieira, 2000).

Face a tal objetivo como poderá a formação inicial dotar os futuros professores de competências para a estimulação e promoção do PC das crianças/alunos? Vieira (2000), sustentada em Ennis (1987), defende que “… os futuros professores devem ser sensibilizados e preparados para o papel que podem desempenhar como facilitadores da manifestação, utilização e desenvolvimento de Pensamento Crítico dos alunos” (p.13). A mesma autora (op. cit.) salienta que as capacidades de PC devem ser integradas na formação inicial e que, em cada uma das suas áreas, se devem abrir espaços de debate sobre questões relativas às capacidades do pensamento, devendo ser instituídas oportunidades de treino dessas capacidades bem como devem ser fornecidas linhas orientadoras e instrumentos adequados ao desenvolvimento do ensino e da construção do PC. Tenreiro-Vieira e Vieira (2000) chamam a atenção para o facto do ensino do PC requerer não só o uso de capacidades de PC mas também conhecimentos e compreensão dos conteúdos em causa em cada uma das áreas de formação, salientando nós que, no caso da formação dos educadores e dos professores do 1.º ciclo do ensino básico, se trata de um conjunto alargado de áreas conjugadas e articuladas para o exercício docente do tipo generalista e em regime de monodocência; o que significa que a formação dos futuros docentes deve, no seu conjunto e de modo infundido e transversal adotar objetivos e estratégias fundadoras do PC.

Se tivermos subjacentes as disposições e as capacidades identificadas na taxonomia do PC de Ennis e, em defesa de uma formação inicial que dote os futuros docentes de conhecimento profissional e que nesse conhecimento se insere o conhecimento sobre e como usar o PC, é desejável que no conjunto das áreas de formação e das UC que as integram se encontrem objetivos vocacionados para o exercício do PC associados a metodologias ou estratégias que o promovam. É expectável, deste modo, que sejam identificadas disposições de PC, que no seu conjunto traduzem “… o que o autor [Ennis] designa de espírito crítico, isto é, uma tendência, compromisso ou inclinação para agir de forma crítica” (Tenreiro-Vieira, 2014, p.31) e capacidades “… que concorrem para decidir racionalmente o que fazer ou em que acreditar” (p.31).

Assim, e tendo como referência a taxonomia de Ennis, esperamos encontrar disposições como por exemplo: procurar razões; utilizar e mencionar fontes credíveis; tentar não se desviar do cerne da questão; ter em mente a preocupação original e/ou básica; procurar alternativas; ter abertura de espírito; considerar outros pontos de vista que não os seus; tomar uma posição e modificá-la sempre que a evidência e as razões sejam suficientes para o fazer; usar as suas próprias capacidades para pensar de forma crítica. Esperamos, no mesmo sentido, encontrar capacidades, como por exemplo: analisar

argumentos; avaliar da credibilidade de uma fonte; observar e avaliar; fazer e avaliar inferências; decidir uma ação; interatuar com os outros (Marchão, 2010, 2012).

Concomitantemente considera-se, ao nível dos objetivos, das metodologias e estratégias a identificar nas UC, o uso de termos associados ao termo “crítico”, como por exemplo: compreender, analisar, avaliar, gerir, prestar atenção, agir, refletir, interpretar, apreciar, consciencializar, ser, praticar, resolver problemas (Moon, 2008); ou seja, termos associados ao exercício do pensamento e que podemos integrar nas competências de PC, dado que através delas podemos resolver problemas com que nos defrontamos e dar resposta à construção articulada e coerente do conhecimento, bem como responder às exigências do mundo atual através de uma atitude e vivência verdadeiramente cidadã. Porém, o facto de as identificarmos numa ficha curricular do ensino superior não significa que o desenvolvimento dos conteúdos dessa mesma UC se promova em linha com o conhecimento e a prática do PC.

Perspetivadas com um sentido formativo global e holístico, as metodologias e estratégias vocacionadas para o PC devem encontrar-se em áreas e UC de pendor teórico, teórico-prático e de iniciação à prática profissional, e são incompatíveis com práticas baseadas na exposição constante do professor e de carácter transmissor. São antes compatíveis com práticas de ensino baseadas na participação, no envolvimento dos alunos em situações de busca e construção partilhada do conhecimento e em que identificamos, por exemplo: situações de questionamento e de reflexão; experiências várias de pesquisa, investigação; experiências laboratoriais; construção e utilização de instrumentos de ensino-aprendizagem (incluindo os centrados nas novas tecnologias de informação/comunicação e os que visam a agilização/ construção do PC); e resolução de problemas que permitam, ao futuro professor, apropriar-se dos conhecimentos que irá ensinar e das competências necessárias para promover entre outras, a construção do PC pelas crianças/alunos, de modo infundido e transversal quando se trate da educação pré-escolar ou do 1.º ciclo do ensino básico.