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Fundo Social de Emergência e a Desvinculação de Receitas da União

3. PRINCIPAIS ALTERAÇÕES NA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA FEDERAL OCORRIDAS

3.3 Fundo Social de Emergência e a Desvinculação de Receitas da União

Conforme exposto nos tópicos acima, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, o governo federal optou por aumentar sua arrecadação através da criação de novas contribuições sociais, não partilháveis com Estados e Municípios. Contudo, o aumento na arrecadação via instituição de novas contribuições sociais não surtiria o efeito desejado pelo governo federal caso não fossem criados outros dois institutos: o Fundo Social de Emergência e a Desvinculação de Receitas da União, cujo intuito era a desvinculação de parcela da arrecadação das contribuições sociais de sua destinação constitucionalmente delineada.

O Fundo Social de Emergência foi instituído pela Emenda Constitucional de Revisão nº 1, de 1º de março de 1994, que incluiu os artigos 71, 72 e 73, transcritos abaixo, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias:

Art. 71. Fica instituído, nos exercícios financeiros de 1994 e 1995, o Fundo Social de Emergência, com o objetivo de saneamento financeiro da Fazenda

Pública Federal e de estabilização econômica, cujos recursos serão aplicados no custeio das ações dos sistemas de saúde e educação, benefícios previdenciários e auxílios assistenciais de prestação continuada, inclusive liquidação de passivo previdenciário, e outros programas de relevante interesse econômico e social.

Parágrafo único. Ao Fundo criado por este artigo não se aplica, no exercício financeiro de 1994, o disposto na parte final do inciso II do § 9.º do art. 165 da Constituição.

Art. 72. Integram o Fundo Social de Emergência:

I - o produto da arrecadação do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza incidente na fonte sobre pagamentos efetuados, a qualquer título, pela União, inclusive suas autarquias e fundações;

II - a parcela do produto da arrecadação do imposto sobre propriedade territorial rural, do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza e do imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários, decorrente das alterações produzidas pela Medida Provisória n.º 419 e pelas Leis n.ºs 8.847, 8.849 e 8.848, todas de 28 de janeiro de 1994, estendendo-se a vigência da última delas até 31 de dezembro de 1995;

III - a parcela do produto da arrecadação resultante da elevação da alíquota da contribuição social sobre o lucro dos contribuintes a que se refere o § 1.º do art. 22 da Lei n.º 8.212, de 24 de julho de 1991, a qual, nos exercícios financeiros de 1994 e 1995, passa a ser de trinta por cento, mantidas as demais normas da Lei n.º 7.689, de 15 de dezembro de 1988;

IV - vinte por cento do produto da arrecadação de todos os impostos e contribuições da União, excetuado o previsto nos incisos I, II e III;

V - a parcela do produto da arrecadação da contribuição de que trata a Lei Complementar n.º 7, de 7 de setembro de 1970, devida pelas pessoas jurídicas a que se refere o inciso III deste artigo, a qual será calculada, nos exercícios financeiros de 1994 e 1995, mediante a aplicação da alíquota de setenta e cinco centésimos por cento sobre a receita bruta operacional, como definida na legislação do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza;

VI - outras receitas previstas em lei específica.

§ 1.º As alíquotas e a base de cálculo previstas nos incisos III e V aplicar-se- ão a partir do primeiro dia do mês seguinte aos noventa dias posteriores à promulgação desta Emenda.

§ 2.º As parcelas de que tratam os incisos I, II, III e V serão previamente deduzidas da base de cálculo de qualquer vinculação ou participação constitucional ou legal, não se lhes aplicando o disposto nos arts. 158, II, 159, 212 e 239 da Constituição.

§ 3.º A parcela de que trata o inciso IV será previamente deduzida da base de cálculo das vinculações ou participações constitucionais previstas nos arts. 153, § 5.º, 157, II, 158, II, 212 e 239 da Constituição.

§ 4.º O disposto no parágrafo anterior não se aplica aos recursos previstos no art. 159 da Constituição.

§ 5.º A parcela dos recursos provenientes do imposto sobre propriedade territorial rural e do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza, destinada ao Fundo Social de Emergência, nos termos do inciso II deste artigo, não poderá exceder:

I - no caso do imposto sobre propriedade territorial rural, a oitenta e seis inteiros e dois décimos por cento do total do produto da sua arrecadação; II - no caso do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza, a cinco inteiros e seis décimos por cento do total do produto da sua arrecadação. Art. 73. Na regulação do Fundo Social de Emergência não poderá ser utilizado o instrumento previsto no inciso V do art. 59 da Constituição.

De acordo com LAVÍNIA BARROS DE CASTRO (2005a, p. 151-152), o Fundo Social de Emergência “era constituído pela desvinculação de algumas receitas do governo federal, cujo objetivo era atenuar a excessiva rigidez dos gastos da União ditada pela Constituição de 1988”. Extrai-se do caput do artigo 71, acima transcrito, que o Fundo Social de Emergência tinha vigência inicial somente para os anos de 1994 e 1995, daí sua natureza “emergencial”.

Dessa forma, o referido Fundo deveria representar um mecanismo temporário de ajuste das contas públicas, uma vez que a solução definitiva viria com uma reforma fiscal que promovesse a desvinculação dos recursos (REZENDE, OLIVEIRA e ARAUJO, 2007, p. 40).

Contudo, tendo em vista que a referida reforma não ocorreu, o Fundo Social de Emergência foi prorrogado pela Emenda Constitucional nº 10, de 04 de março de 1996, que, alterando o caput do artigo 71, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, determinou a vigência do referido fundo para o período de 1º de janeiro de 1996 a 30 de junho de 1997, sendo que, conforme § 2º incluído no artigo 71 da mesma Emenda, o Fundo criado por este artigo passou a denominar-se Fundo de Estabilização Fiscal (BRASIL, 1996).

A justificativa oficial para a instituição do Fundo de Estabilização Fiscal era de aumentar a arrecadação e permitir maior flexibilização do orçamento através da desvinculação de 20% das receitas federais (impostos e contribuições), que ficariam livres para serem alocadas em destinações diversas daquelas previstas em lei (BRASIL, 2003, p. 14).

O Fundo de Estabilização Fiscal teve sua vigência prorrogada pela Emenda Constitucional nº 17, de 1997, que, alterando o artigo 71, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, postergou a vigência do referido fundo até 31/12/1999.

A referida prorrogação do Fundo de Estabilização Fiscal encontrou forte resistência dos Estados e Municípios tendo em vista que este acabava por reduzir as receitas recebidas por estes entes decorrentes dos Fundos de Participação dos Estados e Municípios.

Assim, em 21 de março de 2000 foi promulgada a Emenda Constitucional nº 27 que, através da inserção do artigo 76, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, instituiu a DRU – Desvinculação das Receitas da União, nos seguintes termos:

Art. 76. É desvinculado de órgão, fundo ou despesa, no período de 2000 a 2003, vinte por cento da arrecadação de impostos e contribuições sociais da União, já instituídos ou que vierem a ser criados no referido período, seus adicionais e respectivos acréscimos legais.

§ 1º O disposto no caput deste artigo não reduzirá a base de cálculo das transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios na forma dos arts. 153, § 5º; 157, I; 158, I e II; e 159, I, "a" e "b", e II, da Constituição, bem como a base de cálculo das aplicações em programas de financiamento ao setor produtivo das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste a que se refere o art. 159, I, "c", da Constituição.

§ 2º Excetua-se da desvinculação de que trata o caput deste artigo a arrecadação da contribuição social do salário-educação a que se refere o art. 212, § 5º, da Constituição.

Conforme se nota acima, a principal diferença da DRU em relação aos fundos Social de Emergência e de Estabilização Fiscal refere-se ao fato de que as receitas destinadas aos Estados e Municípios via transferências da União foram excluídas da base de cálculo da desvinculação. Tendo sido prevista para vigorar somente entre os anos de 2000 a 2003, a DRU foi prorrogada até o ano de 2007, pela Emenda Constitucional nº 42, de 19 de dezembro de 2003, alterando-se a redação do artigo 76, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, nos seguintes termos:

Art. 76. É desvinculado de órgão, fundo ou despesa, no período de 2003 a 2007, vinte por cento da arrecadação da União de impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já instituídos ou que vierem a ser criados no referido período, seus adicionais e respectivos acréscimos legais.

§ 1º O disposto no caput deste artigo não reduzirá a base de cálculo das transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios na forma dos arts. 153, § 5º; 157, I; 158, I e II; e 159, I, a e b; e II, da Constituição, bem como a base de cálculo das destinações a que se refere o art. 159, I, c, da Constituição.

A prorrogação da DRU efetuada pela Emenda Constitucional nº 42, mantendo a exclusão da base de cálculo da desvinculação as receitas destinadas aos Estados e Municípios via transferências da União, acabou incluindo entre as receitas sujeitas à desvinculação, as contribuições de intervenção no domínio econômico.

FERNANDO ALVARES DIAS (2008, p. 6) explica que, com isso, a contribuição incidente sobre combustíveis (CIDE-Combustíveis) foi desvinculada, resultando em perdas para os estados e municípios, além das perdas referentes a vinculações de menor importância, como a da Contribuição para os Programas PIN e Proterra.

A DRU foi novamente prorrogada até 2011 pela Emenda Constitucional nº 56, de 20 de dezembro de 2007 e, por fim, até o ano de 2015, pela Emenda Constitucional nº 68, de dezembro de 2011, que, mais uma vez, alterou a redação do caput do artigo 56, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, cuja redação atual é a seguinte:

Art. 76. São desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2015, 20% (vinte por cento) da arrecadação da União de impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já instituídos ou que vierem a ser criados até a referida data, seus adicionais e respectivos acréscimos legais.

§ 1° O disposto no caput não reduzirá a base de cálculo das transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios, na forma do § 5º do art. 153, do inciso I do art. 157, dos incisos I e II do art. 158 e das alíneas a, b e d do inciso I e do inciso II do art. 159 da Constituição Federal, nem a base de cálculo das destinações a que se refere a alínea c do inciso I do art. 159 da Constituição Federal.

§ 2° Excetua-se da desvinculação de que trata o caput a arrecadação da contribuição social do salário-educação a que se refere o § 5º do art. 212 da Constituição Federal.

§ 3° Para efeito do cálculo dos recursos para manutenção e desenvolvimento do ensino de que trata o art. 212 da Constituição Federal, o percentual referido no caput será nulo.

Nota-se, assim, que a criação do Fundo Social de Emergência, visando apenas a solução para uma questão orçamentária pontual relativa aos anos de 1994 e 1995 acabou se consolidando na Constituição Federal e no processo orçamentário do país.

Ressalta-se que, a Desvinculação das Receitas da União tem previsão de encerramento no ano de 2015, ou seja, mais de vinte aos após a criação do Fundo Social de Emergência, cujas finalidades de ambos os fundos são idênticas.

A principal crítica à DRU, no caso, se refere à sua finalidade, qual seja, desvincular recursos de aplicação obrigatória para outras áreas, sem que existam regras claras quanto ao seu direcionamento.

Concordamos que exista um grande número de recursos de aplicação obrigatória, e muitas vezes desnecessária, contudo, a DRU não se mostra como o meio mais eficaz para a solução deste problema.

Isso porque a DRU, ao desvincular a aplicação de recursos à determinadas áreas, previamente instituídas, não redireciona, efetivamente, estes recursos, a qualquer outra destinação.

Entendemos, inicialmente, que a desvinculação somente é possível em caso de necessidades comprovadas da aplicação de recursos em outras áreas. Logo, ao se desvincular a aplicação de recursos em determinadas áreas, há necessidade que os recursos desvinculados sejam claramente vinculados à outras aplicações.

Na forma como operada atualmente, a DRU apenas desvincula a aplicação de recursos em determinadas áreas, sem especificar a sua destinação, diminuindo, portanto, a transparência do sistema fiscal e orçamentário nacional.