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Produção nacional de gás natural (mar) 2000-

3 FUNDO SOCIAL: PRINCIPAIS ASPECTOS NORMATIVOS E OPERACIONAIS

O capítulo três, a fim de expor elementos centrais do Fundo Social, é dedicado ao aprofundamento dos principais aspectos jurídicos, institucionais e funcionais do mesmo. Tal abordagem objetiva apresentar, em um maior nível de detalhamento, suas diretrizes normativas e a sua caracterização enquanto instrumento jurídico-institucional destinado à socialização das rendas oriundas da produção de óleo e gás no Pré-Sal.

Pontua-se, assim, que este capítulo, por abordar o tema de forma mais minuciosa do que a sucinta explicação feita no capítulo dois, demandará alguns esclarecimentos contextuais sobre o quadro normativo em que o FS foi concebido.

Dessa forma, a primeira subseção diz respeito ao novo marco regulatório para exploração e produção de petróleo e o regime de partilha de produção. Apesar deste trabalho não pretender realizar um exame do regime de partilha em todas suas peculiaridades, a compreensão de seu funcionamento, ao menos em linhas gerais, será necessário para que o Fundo Social e, principalmente, suas fontes de recursos, possam ser vislumbrados de modo claro.

A segunda subseção, por seu turno, detalha os principais aspectos sobre o quadro normativo e operacional do FS, buscando evidenciar, em alguma medida, as implicações econômicas e sociais subjacentes ao seu desenho institucional.

Por último, a terceira subseção visa tratar de forma mais aprofundada as questões atinentes às origens dos recursos e o seu modelo de gestão, uma vez que a proposta de verificar se o FS promove, efetivamente, a socialização dos benefícios econômicos do Pré-Sal, depende, necessariamente, de um exame de suas fontes de receita, tanto em um plano normativo, quanto prático.

3.1 O NOVO MARCO REGULATÓRIO PARA EXPLORAÇÃO E PRODUÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL: REGIME DE PARTILHA DE PRODUÇÃO

Este tópico pretende contextualizar o Fundo Social dentro do quadro normativo inaugura pela Lei 12.351/2010, buscando compreender as origens dos recursos a ele destinados.

Nesse sentido, é preciso considerar as condições que proporcionaram a consolidação de um novo marco regulatório para o supracitado setor energético no Brasil. Após o anúncio da

descoberta das novas jazidas, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) emitiu a resolução n.º 6/2007, determinando a exclusão de quarenta e um blocos da 9ª Rodada de Licitações da ANP situados nas Bacias do Espírito Santo, de Campos e de Santos. A exclusão, segundo a Exposição de Motivos Interministerial 38/2009, deu-se em razão dos blocos estarem dentro da nova província e por apresentarem um grande potencial para novas descobertas. Isso fez o Governo avaliar a pertinência e a necessidade de alterações no marco legal a fim de “contemplar este novo paradigma na exploração e produção de petróleo e gás natural, de modo a aumentar o controle e a participação da União nos futuros”.130

Esse novo contexto impeliu o Governo a buscar a consolidação de um novo marco regulatório, pois o modelo de exploração e produção definidos pela Lei 9.478/1997 (Lei do Petróleo) já não era suficiente para possibilitar um adequado aproveitamento das reservas descobertas. Pontua-se, ainda, que a referida lei decorreu diretamente da Emenda Constitucional n.º 9, de 1995, a qual disciplinou a possibilidade da União contratar empresas constituídas sob as leis brasileiras e com sede e administração no país para as atividades de pesquisa e lavra das jazidas de petróleo e gás natural por meio do regime de concessão131. Tal marco, contudo, “foi concebido de modo a contemplar as condições vigentes àquela época, quando o País tinha produção relativamente pequena, o barril de petróleo era cotado em torno de dezenove dólares e o risco exploratório era considerado elevado”. 132

Esse regime vigorava, até então, em todo o território nacional. Todavia, segundo o Governo, no caso do Pré-Sal esse modelo não era o mais adequado, visto que não havia risco

130BRASIL. Presidência da República. Exposição de Motivos Interministerial n.º 38, de 31 de agosto de 2009.

Considerações acerca da proposta de Projeto de Lei que dispõe sobre a exploração e a produção de petróleo, de gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos sob o regime de partilha de produção em áreas do Pré-Sal e em áreas estratégicas, e altera dispositivos da Lei no 9.478, de 6 de agosto de 1997. Brasília, Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Projetos/EXPMOTIV/EMI/2009/38%20-

%20MME%20MF%20MDIC%20MP%20CCIVIL.htm. Acesso em: 19 abr. 2017.

131“No contrato de concessão, há a outorga do direito de exercer a atividade econômica (art. 5º, Lei n. 9.478/97),

e não de qualquer direito real ou pessoal sobre o bloco. Nesse modelo contratual, a exploração é feita por conta e risco do concessionário e a ele é atribuída a propriedade do produto da lavra após extração. A contrapartida consiste no pagamento dos tributos, bônus de assinatura, royalties e participações governamentais. O

concessionário paga o bônus de assinatura para explorar o bloco, sem a certeza de que ali existe petróleo. Se ele o encontra, o produto da lavra é seu. Se ele não encontrar nada, o Estado terá ganho o bônus de assinatura sem ter tido risco algum. Daí a assertiva de que o risco é integralmente alocado na esfera do particular.”. VIANA, Camila Rocha Cunha. A EVOLUÇÃO DO MONOPÓLIO DO PETRÓLEO E O NOVO MARCO

REGULATÓRIO DO PRÉ-SAL. Revista Brasileira de Direito do Petróleo, Gás e Energia, Rio de Janeiro, v. 3, n. 1, p.165-196, dez. 2012. CEDPETRO - Centro de Estudos Avançados e Pesquisas em Direito do Petróleo. p. 171-172. Disponível em: http://www.e-publicacoes_teste.uerj.br/index.php/rbdp/article/view/5788/4206 Acesso em: 17 jan. 2017.

132 BRASIL. Presidência da República. Exposição de Motivos Interministerial n.º 38, de 31 de agosto de 2009

exploratório para o concessionário – principal elemento caracterizador e justificador do regime de concessão.

6. [...] a legislação atualmente vigente não prevê outras possibilidades de contratação das atividades de pesquisa e lavra de hidrocarbonetos de forma diversa do modelo de concessão. De acordo com este modelo, o concessionário exerce, por sua conta e risco, as atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural, adquirindo, após a extração, a propriedade de todos os hidrocarbonetos produzidos. Em compensação, paga ao poder concedente bônus de assinatura, royalties e participações especiais, cujos valores, nos dois últimos casos, dependem, em regra, do volume de produção do petróleo e do gás natural extraídos.

7. Esse modelo, em que cabe ao concessionário a totalidade do risco e dos rendimentos obtidos com a exploração, mostra-se incompatível com a natureza da área do Pré-Sal. [...] Testes indicaram a existência de grandes volumes de óleo leve de alto valor comercial (30 graus API), com grande quantidade de gás natural associado. Trata-se de áreas nas quais são estimados riscos exploratórios extremamente baixos e grandes rentabilidades, o que determina a necessidade de marco regulatório coerente com a preservação do interesse nacional, mediante maior participação nos resultados e maior controle da riqueza potencial pela União e em benefício da sociedade. 133

A nova forma contratual, segundo a Exposição de Motivos, apresentava-se como um imperativo em razão do baixo risco geológico e à geração de vultuosos volumes de excedentes de rendas que deveriam ser “maximizados [...] e revertidos para a sociedade sob a forma de ações de combate à pobreza e de desenvolvimento da educação, da cultura, da ciência e tecnologia e da sustentabilidade ambiental”.134

Assim, a Lei 12.351/2010, que inaugurou um novo marco regulatório aplicado à área do Pré-Sal e a outras definidas como estratégicas (regime de partilha de produção), foi concebida com os seguintes propósitos: a) permitir o exercício do monopólio da União de forma apropriada, tendo em vista o elevado potencial petrolífero do Pré-Sal; b) introduzir uma nova concepção de gestão dos recursos petrolíferos pelo Estado; c) otimizar o ritmo de exploração dos recursos do Pré-Sal; d) aumentar a apropriação da renda petrolífera pela sociedade; e) manter atrativa a atividade de exploração e produção no País; f) contribuir para o fortalecimento da posição internacional; g) contribuir para a ampliação das bases econômica e industrial brasileira; h) garantir o fornecimento de petróleo e gás natural; e i) evitar distorções macroeconômicas resultantes da entrada de elevados volumes de recursos relacionados à exportação dos hidrocarbonetos produzidos no Pré-Sal. 135

133Ibidem. 134Ibidem. 135 Ibidem.

Segundo Cunha, o regime de partilha surgiu na década de 1960 na Indonésia, com o objetivo de reduzir os desequilíbrios dos modelos tradicionais dos contratos de concessão firmados entre as empresas petrolíferas transnacionais e os Estados hospedeiros, os quais consentiam amplos benefícios às companhias sem possuir ingerência na exploração e produção de suas reservas. Isto posto, o regime de partilha foi projetado para maximizar a participação do Estado, de modo que o óleo e o gás produzidos fossem passíveis de apropriação por parte do país hospedeiro.136

Com efeito, é uma modalidade de contratação praticada em aproximadamente quarenta países. Nesse caso, o Estado mantém a propriedade do petróleo e do gás produzidos, garantindo ao contratado, deduzidos os custos de operação, parte da produção.137

Para que se possa compreender a lógica engendrada pelos contratos de partilha, é preciso familiaridade com duas terminologias: a) custo em óleo e; b) excedente em óleo. Esses termos são apresentados pelo art. 2º, incisos II e III, da Lei 12.351/2010.

O custo em óleo corresponde à parcela da produção referente aos custos e aos investimentos realizados pelo contratado na execução de suas atividades (exploração, avaliação, desenvolvimento, produção e desativação das instalações).138 Em outras palavras, o custo em óleo caracteriza-se como um direito da empresa contratada de apropriar-se do exato volume de óleo/gás necessário para, a partir da conversão em moeda corrente, cobrir todos seus custos operacionais.

Já o excedente em óleo é a parcela da produção que deve ser repartida entre a União e o contratado, de acordo com os critérios definidos em contrato, sendo o resultado da diferença

136CUNHA, Heloisa Valença. CONTRATO DE PARTILHA DE PRODUÇÃO: UM NOVO MARCO

REGULATÓRIO NO CENÁRIO PETROLÍFERO BRASILEIRO. Revista Direito E-nergia, Natal, v. 8, n. 5, p.79-108, dez. 2013. p. 94. Disponível em: https://periodicos.ufrn.br/direitoenergia/article/view/5547/4941 Acesso em: 17 jan. 2018.

137 BRASIL. Presidência da República. Exposição de Motivos Interministerial n.º 38, de 31 de agosto de

2009. Op. cit.

138 BRASIL. Lei n.º 12.351, de 22 de dezembro de 2010. Dispõe sobre a exploração e a produção de petróleo, de

gás natural e de outros hidrocarbonetos fluidos, sob o regime de partilha de produção, em áreas do Pré-Sal e em áreas estratégicas; cria o Fundo Social - FS e dispõe sobre sua estrutura e fontes de recursos; altera dispositivos da Lei n.º 9.478, de 6 de agosto de 1997; e dá outras providências. Lei n.º 12.351, de 22 de dezembro de 2010. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/L12351.htm Acesso em: 21 jan. 2017.

entre o volume total produzido e as parcelas relativas ao custo em óleo e aos royalties139 devidos.140

Assim, como indicado pelo art. 2º, inciso I, o contratado exerce, por conta e risco, as atividades de exploração, avaliação, desenvolvimento e produção e, em caso de descoberta comercial, adquire o direito de apropriação do custo em óleo, do volume da produção correspondente aos royalties devidos, bem como de parcela do excedente em óleo, na proporção, condições e prazos estabelecidos em contrato.141 A Figura 2 ilustra a dinâmica descrita.

Figura 2 – Ilustração da dinâmica de partilha da produção

Fonte: Elaboração do autor com base na Lei n.º 12.351/2010.

Essa forma de contratação permite que a União disponha de parte do excedente de petróleo e gás extraídos que permanecem sob sua propriedade, o que lhe dá maior poder na

139“Os royalties constituem compensação financeira devida pelos concessionários de exploração e produção de

petróleo ou gás natural, e serão pagos mensalmente, com relação a cada campo, a partir do mês em que ocorrer a respectiva data de início da produção, vedadas quaisquer deduções.”. GOMES, Carlos Jacques Vieira. O MARCO REGULATÓRIO DA PROSPECÇÃO DE PETRÓLEO NO BRASIL: O REGIME DE CONCESSÃO E O CONTRATO DE PARTILHA DE PRODUÇÃO. Centro de Estudos da Consultoria do Senado Federal, Brasília, v. 1, n. 55, p.1-69, mar. 2009. p.18. Disponível em:

http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/150159/texto55carlosjacques.pdf Acesso em: 17 jan. 2017.

140 BRASIL. Lei n.º 12.351, de 22 de dezembro de 2010. Op. cit. 141 Ibidem.

PRODUÇÃO

CUSTO EM ÓLEO

ROYALTIES

EXCEDENTE EM

ÓLEO

LUCRO DA