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CIRCULO QUARTO

9. Pedro Muiambo, vem publicando dentro do prisma dos contos tradicionais 10 Rogério Manjate, artista da área teatral, educador, tem escrito poesia “para todas

4.4 OS GÉMEOS E OS RAPTORES DE CRIANÇAS

(GRAÇA, 2007)132

A série Os gémeos resulta de concursos anteriores promovidos também pela Associação Progresso, em Maputo, vencidos por Machado da Graça. Tendo obtido premiações, o referido jornalista passou a investir na área e, recentemente, em parceria com a Associação, edita seus livros, assim como os de outros escritores moçambicanos, contando com seis livros da série Os gêmeos até então, e algumas reedições.

Por meio de cada narrativa percorremos algumas províncias de Maputo e conhecermos um pouco das singularidades das respectivas povoações, de certos problemas que afetam uma comunidade, um fazendeiro; enfim, uma região, no geral, ou uma família, em particular.

132 Em todas as séries, o título Os gémeos não é escrito com circunflexo, mas com o acento agudo.

As histórias abordam problemas sociais por meio das aventuras de dois protagonistas gêmeos, que desvendam mistérios locais. Estes são oriundos do extrato social médio ou alto e têm condições de viajar de avião, entre outros meios de transportes, vivenciando aventuras nas férias, no cotidiano de visita a um parente, em um passeio, e em situações nas quais eles, bons observadores e astutos, notam irregularidades e seguem pistas para desvendá-los. Uns, inclusive, passam incólumes à ação da polícia local, por ignorá-los ou por nada fazer para resolvê-los. Há, aqui, uma crítica a essa instituição, pelo desaparelhamento face aos problemas da região.

Os protagonistas Isa e Zé têm pais e parentes afetivos bem relacionados no ambiente social e pais compreensivos que se envolvem nas suas aventuras e os ajudam a desvendá-los. Aborda-se as seguintes problemáticas: (1) o tráfico de drogas “na Praia de Ponta de Ouro” (Os gémeos e os traficantes); (2) o roubo de animais no Parque Nacional do Limpopo (Os gémeos e os caçadores furtivos); (3) o roubo de gados em Gaza (os gémeos e os ladrões de gados); (4) rapto de crianças para fins de tráfico na África do Sul (Os gémeos e os raptores de crianças); (5) o roubo de relíquias e jóias em um navio náufrago na Ilha de Moçambique, situada na província de Nampula (Os

gêmeos e os ladrões de tesouros); (6) o desvendamento de um mistério, envolvendo

uma senhora acusada de feitiçaria (Os gêmeos e a feiticeira). Nesta última narrativa, quem mais pratica ação com vistas a resolver o problema é a mãe dos gêmeos, que nascera na região, e eles mais acompanham os fatos no desenvolver da trama.

Dentre as histórias, selecionamos uma cujos protagonistas não só participam de longe dos problemas detectados, como se tornam vitimas de uma ação que incide sobre eles. Referimo-nos à série Os gêmeos e os raptores de crianças, cuja história inicia-se na capital, Maputo, e o desfecho se dá na África do Sul. A história começa como as demais, os dois irmãos juntos, conversando.

O Zé e a Isa andavam todos contentes. Como os dois tinham passado de classe com boas notas, os pais tinham-lhes oferecido uma bicicletaA cada um. Novinhas. Com farolim, mudanças, campanhia, espelho, tudo.

E as bicicletas estavam a ser a grande animação daquele princípio de férias. Já tinham ido várias vezes à praia e, naquele dia, tinham resolvido ir dar uma volta até à casa da tia Maria, um pouco fora da cidade (p. 3).

Nesse primeiro parágrafo podemos perceber alguns traços dos demais episódios: 1) a dedicação de os gêmeos para com os estudos, daí a premiação do pai; 2) dados sobre as condições socioeconômicas da família, pelo tipo de presente: “uma bicicleta. A cada um. Novinhas”133; 3) a liberdade para gozar o período de férias, sob as recomendações dos pais; 4) o afastamento da cidade, já que

seguiam à direção da casa da “tia Maria”, que ficava “um pouco fora da cidade”.

A situação inicial resulta de um momento de felicidade de Isa e Zé, dentro dos ditames da normalidade, na situação de equilíbrio. Reina a paz, e o narrador, na 3ª pessoa do singular, salienta os conselhos da mãe. Então, “Antes de saírem”, ela “fartou-se de lhes recomendar que tivessem cuidado com o trânsito: - Principalmente os chapas”, que “não respeitam nada nem a ninguém”.

Também “O pai tinha-lhes ensinado muito bem os sinais de trânsito e as regras de prioridade, de forma que os

gémeos sentiam-se perfeitamente à vontade a percorrer as ruas em direção ao bairro onde” a tia residia ( p. 3). Ou seja, tudo flui na maior tranquilidade e todas as orientações tiveram Isa e Zé para evitar acidentes. Há, ainda, uma crítica muito comum em Maputo sobre a periculosidade do transporte urbano, os “chapas”, sempre lotados, em precárias condições e a correr, tornando-se, assim, um meio de transporte ineficiente e problemático no país, ainda nos dias atuais.

É muito comum na região, também, falar-se a palavra “animar”, conforme pronunciada por Zé, ao desejar diminuir as pedalações. Daí dizer que “- “Agora já não custa nada – animou o Zé”. Ao que responde a irmã “ – Deixa-te disso e pedala que ainda falta um bom bocado”. Assim, prosseguem os diálogos, entre uma e outra provocação de ambos:

- Então, com o que tu comes já devias ter dois metros de altura... Sempre a brincarem um com o outro, os dois irmãos continuam a pedalar. A zona por onde iam já era mais campo do que cidade. A certa altura o Zé exclamou:

- Olha ali! (p.4)

133 Mas não só a bicicleta expressa a condição socioeconômica dos gêmeos, como também, a atuação

profissional do pai, o automóvel, as férias, viajando sempre, entre outros indícios presentes nas demais séries.

Essa cena em que Zé descobre um meio de saciar a fome, ao avistar um pé de mangas, dá-se de maneira bastante provocadora. Se antes Isa o insultava, agora é a vez do Zé, que primeiro lhe diz “Pareces estúpida.” Depois, como a irmã não o entendia, pois ele tentava chamar sua atenção sobre a mangueira que estava “carregada” de mangas maduras, “fora” do quintal alheio podendo-se, com isso, retirar quantas quisesse, ele intensifica os insultos. Então consegue irritar a irmã que reage, e o chama de “parvo”. Eis a intensificação dos insultos entre os gémeos.

- Pareces que tenho que explicar tudo bem explicado. Disse como se fosse um professor na escola.

– Tu sabes que é que as mangueiras dão? - Não sejas parvo! É claro que dão mangas. - Em que data do ano?

- Agora, não vês como a árvore está carregada?

– Estás a começar a perceber alguma coisa. E esta mangueira está no quintal de quem?

A Isa olhou à volta e não viu quintal nenhum [...]

- Demorou mas chegaste lá, Isa – Comentou o irmão triunfante – Estamos perante uma mangueira, carregada de mangas maduras e sem dono (p. 5).

Apesar dos momentos de insultos, Isa e Zé são companheiros, e estão sempre juntos nas aventuras. Nas demais histórias ele não deixa de provocar Isa, por se achar mais esperto, daí as falas sobre a capacidade de percepção da irmã, subestimando-a.

Os insultos entre os gêmeos tendem a expressar o prisma das crianças e dos jovens, na fase da adolescência, em embates cotidianos, mas nem por isso isentos de afetividade. Quem os inicia é o provocador Zé, muito embora Isa não se deixe abater por suas críticas. Inclusive, reage à altura às suas investidas. Daí dizer-lhe: “Pronto, já

percebi tudo” e, de certa forma, ordena, entrando no jogo dele: “Apanha lá umas [mangas] para nós comermos” (p. 7). Eis o que faz Zé, imediatamente, “a trepar por” cima da mangueira, o que lhe possibilita a assistir, estupefato, o rapto de Isa.

A cena seguinte marca o início da situação dramática, uma vez que a ação da protagonista, de caminhar na direção de um “carro azul, que tinha parado na estrada”, para dar informações aos desconhecidos, impulsionou o inesperado perigo da força

opositora, pois

Quando a Isa chegou junto ao carro, o homem que ia ao volante, e que a tinha chamado, perguntou-lhe:

- Sabes qual é o caminho para o centro da cidade? A Isa sorriu e disse:

- O senhor está enganado. Está a ir para fora da cidade. Para o centro tem que voltar para trás e seguir sempre em frente – e esticou o braço a indicar a direção que o

carro devia seguir. Nesse momento, num gesto rápido, o condutor agarrou o braço da miúda com uma mão forte. Ao mesmo tempo a porta de trás do carro abriu-se e a empurrou para dentro do carro, que arrancou e

seguiu a grande

velocidade.

Em cima da árvore o Zé não conseguia acreditar no que tinha visto. Tinha sido tudo tão rápido que nem deu tempo para nada. Num momento a Isa estava ali, a apontar para o caminho, e no

momento a seguir já só se via o carro a desaparecer, ao longe.

Instaura-se, assim, o desequilíbrio na narrativa, a quebra da harmonia, diante do inesperado, saindo-se da situação inicial, com o advento do conflito que incide sobre os protagonistas, desencadeado pela força opositora, os raptores, ao causar um dano: o rapto.

O fato de Isa, apesar de esperta, ir em direção dos raptores, sem o saber, demonstra ingenuidade. Nesse aspecto ela se aproxima de uma das ações abordadas por Propp (1984, p. 35), na situação inicial: o afastamento (de Isa) e o ardil (dos raptores). Este último foi o meio utilizado pelo falso herói, se entendido sob o prisma morfológico (de Propp). Equivalem, assim, aos antagonistas ou, melhor, à força opositora, que ludibria a “vítima” para “apoderar-se dela”; daí o “rapto” e a consequente carência a ser instaurada junto aos seus familiares.

Sem saber o que fazer, o Zé ficou ali parado, junto da estrada, a pensar. De repente meteu a mão no bolso e tirou o celular que a avó lhe tinha dado no Natal. Com os dedos a tremer marcou o número do pai e ficou à espera, enquanto o sinal de chamada tocava do outro lado (p. 9)

O inusitado dessa vez é que Zé e Isa não são os “investigadores” que participam do desenrolar da trama à parte, à espreita, observando e agindo, tomando providências.

Eles são as vítimas da força opositora, já que estas incidem sobre ambos, desencadeando o dano. Nisso consiste o desafio maior de resolver problemas que atingem uma região, um povoado, uma fazenda, isto é um determinado espaço social moçambicano. É o momento, portanto, de serem muito mais competentes. A diferença agora é que a vida de Isa está em perigo, gerando maiores conflitos para o protagonista. Daí a falta de uma ação, pois “ficou parado”, a princípio, mas depois reagiu: “De repente meteu a mão no bolso e tirou o celular”. E, “Com os dedos a tremer”, conseguiu ligar para “o pai” (p. 9).

Nas demais narrativas não há tanto registro das emoções do protagonista. Ele até tem receio de algo não dar certo, mas o fato de o narrador descrever os detalhes das suas sensações, o nervosismo diante do inesperado. Certamente isso se dá devido à ação da

força opositora, que incide sobre ele e o deixa vulnerável, de início. Assim, o pé de

manga carregado perde completamente o significado para Zé, inclusive a fome de outrora, pois não se faz mais alusão a esse respeito, exceto no final.

Salvar Isa é o que mobiliza única e exclusivamente o irmão. Surge, desde então, uma rede de ações que mobilizam não só os familiares dos protagonistas como a polícia local, por meio da qual observamos os caracteres dos demais personagens e, principalmente, a dinamização das ações e as funções dos seres ficcionais.

Diante da sequência de ações, destacamos algumas acrescidas, quando possível, aos caracteres dos personagens: 1) Zé, que “não se assustava facilmente”, comunica ao pai o acontecido, e enquanto o aguarda, passa “momentos terríveis” (pp. 9-10); 2). O pai de Zé, que parece ser um executivo, pois se encontrava em meio a uma reunião, “saltou da cadeira [...], pediu desculpas aos colegas e saiu a correr da sala” e a “cerca de uns 15 minutos” chegou no “sítio onde” o filho o aguardava (p. 10); 3) O pai de Zé é influente ou, no mínimo, conhecido na região, por conseguir mobilizar a “polícia” para ir ao encalço dos bandidos, através do “Inspector Siueia”; 4) As ações da polícia dependem da capacidade de observação dos gêmeos, da intervenção de ambos.

Até então o narrador onisciente não nos deixa pistas sobre o paradeiro de Isa, e isso cria certo suspense. As pistas são fornecidas por Zé que, atento, disse o tipo de automóvel que os “bandidos” conduziam.

Entrevemos as minúcias da operação e, ao mesmo tempo, as medidas tomadas pelo pai para poupar a esposa e ajudar nas buscas policiais. Surgem, assim, outros seres ficcionais secundários, no papel de adjuvantes. Nesse percurso o foco narrativo vai alterando-se, descrevendo ações, sensações, curiosidades, ansiedades, etc.

Após as mobilizações policiais, o foco narrativo detém-se sobre o ambiente familiar dos protagonistas:

Em casa dos gêmeos o ambiente era de grande preocupação. A mãe dos miúdos chorava, sentada na sala, sem dizer nada. O pai andava de um lado para o outro, nervosíssimo, murmurando palavras que ninguém conseguia entender.

O Zé, embora também muito inquieto, era o que ainda tinha algumas esperanças. Ele já tinha tido várias aventuras perigosas, em companhia da irmã, e sabia que ela era uma rapariga valente que não se deixava vencer facilmente (p. 17).

O conflito instaurado expressa o temor que assola a família, após o dano. Então, enquanto o pai de Zé fica agitado, “nervosíssimo”, a mãe, também aflita, fica contida, “sentada”, em silêncio. Com o transcorrer das horas a afliçãoa se acirra, pois chega a “noite e nada sabiam de onde a Isa podia estar”. Outro problema é que, de acordo com as pistas policiais, a intenção dos raptores era levar Isa “para a África do Sul” (p. 17).

O foco narrativo passa a centrar-se, finalmente, nas ações da protagonista, que liga para o irmão e fala com o pai, dizendo-lhe sobre o ocorrido. Isa, como diz Zé, expressa ser durona e, embora raptada e receosa, não dá sinais de fragilidade, se adequa às circunstâncias e obedece às ordens dos “bandidos”. Mas, na oportunidade, estando só, desliga o celular para não ser notada, e o liga depois para se comunicar com o pai. Essa ação é fundamental para o desenrolar da trama,

desencadeia outras e as intensifica, conforme é possível observar no ambiente familiar da protagonista.

Do outro lado uma voz muito fraquinha respondeu:

- Sou eu sim, pai. Onde é que tu estás?

Não sei, pai. Os homens amarraram-me e taparam-me os olhos e vim deitada no chão do carro, atrás com uma manta a tapar- me.

- E agora onde estão os homens? - Não sei. Deixaram-me aqui fechada à chave num quarto sem janela. Disseram-me para descansar

andar muito a pé.

- Deve ser para passarem a fronteira para a África do Sul. Eles não descobriram o telefone?

- Não, pai. Logo que me apanharam eu desliguei-o [...] Só liguei agora.

Fizeste bem [...] A polícia vai tentar impedir que vocês passem a fronteira. Coragem, Isa! Vai tudo correr bem! (p. 19)

A ação da mãe de Isa não é descrita na narrativa. Fica patente, portanto, a

função do pai, de tomar decisões juntamente com o filho e com a própria Isa, ante o

desenrolar da trama. Quanto aos raptores, estes seguem o rumo pretendido, em uma “noite muito escura”, sem “lua e as nuvens nem sequer deixavam ver as estrelas”. Nesse cenário horrendo e assustador, lá estavam os dois bandidos, e Isa entre eles “por uma carreira no meio do mato. À frente ia um dos homens, com uma lanterna, no meio ia a Isa e atrás o outro homem, com uma lanterna”.

É surpreendente que Isa, em uma situação de tamanho perigo e vulnerabilidade, permaneça firme, resistente e determinada. Fica a impressão de que isso decorre do diálogo anterior com o pai e da impossibilidade de se manifestar, apesar de, em um dado momento, expressar temor, mas não tanto dos seqüestradores, como das feras da região, conforme expressa mais adiante. Mesmo assim, não deixa de ser um tanto inverossímil que a personagem não expresse medo diante da impotência e do iminente perigo. Por outro lado, isso pode passar despercebido se levarmos em consideração o fato de o narrador, onisciente não se prender ao seu universo interior. Afinal, “A Isa ia muito calada. Antes de se meterem ao caminho os homens tinham-na ameaçado: - Se dizes uma palavra, ou dás um grito, é a última coisa que fazes na vida! (p. 20). Então,

Mesmo quando uma espinhosa a arranhou num braço conseguiu aguentar a dor sem gritar. Sem deixar de andar tirou um lenço do bolso e amarrou à volta do arranhão para parar o sangue.

- A miúda é rija – Comentou um dos homens, em voz baixa. - Cala-te que aqui perto há casas – Respondeu o outro (p. 20).

E Isa segue observando, atenta às falas, resistindo, “rija” que é, ao passarem por “um buraco [estreito] que tinha sido feito na vedação [...] mas dava para passar uma pessoa de cada vez. O primeiro homem passou à frente e iluminou o buraco” (p. 20). Nesse momento, no entanto, Isa expressa temor, quando este lhe dá uma ordem: “Passas tu agora – Disse para a Isa”.

Por fim passou o segundo homem e começaram a caminhar por uma picada que havia ali perto.

A Isa agora estava assustada. Tinha ouvido falar muitas vezes de pessoas que passavam para a África do sul, na zona do Kruger Parque e acabava por ser comidas pelos leões (p. 22).

Ganhou coragem e,

baixinho para não irritar os dois homens perguntou: - Não estamos no Kruger Parque, pois não?

Um dos homens riu-se e respondeu:

- Não, não estamos. Se tu tens medo dos leões nós também o temos. Agora cala- te.

Um pouco mais sossegada a Isa calou-se e lá foram seguindo ao longo da picada.

É importante frisar que o receio de Isa tem fundamento e aproxima a obra literária da realidade local. O Kruger National Park que faz fronteira com Moçambique e a África do Sul, e é imenso. Trata-se de uma reserva ambiental onde vivem diversos animais livremente134. O receio de Isa tem lógica, posto que dos raptores ela tem mais chance de se livrar e menos das feras. Esse é o único momento em que o narrador expressa o receio da protagonista. Afinal, diante da resposta de um dos seqüestradores, ela segue um “pouco mais sossegada” (p. 22).

O narrador prossegue focado nas ações dos raptores, os sinais durante a travessia, as cautelas, na certeza de que não foram vistos com “a miúda”, de modo a evitar falhas no plano de levá-la para a África do Sul, que é o ambiente onde se desenvolvem as ações subsequentes. Durante o diálogo “Isa percebeu que os bandidos

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E os visitantes podem vê-los ao percorrer o Parque, mas sem sair dos automóveis, mantendo todos os vidros fechados, conforme exigido pelos instrutores. Há relatos notificados na região de visitantes que se arriscaram, saíram do automóvel para tirar fotos perto de filhotes de leões e acabaram sendo devorados por leoas e/ou leões que, na realidade, estavam à espreita, atentos aos movimentos dos filhotes. Esse foi um dos relatos que o ex-ministro da comunicação de Moçambique, José Luis Cabaço, nos fez quando percorríamos o Parque, dia 12 de setembro de 2009, mesma data em que, anos atrás, o líder sul-africano Steve Biko fora assassinado.

não tinham visto o Zé em cima da árvore. E tinha certeza de que o irmão devia ter assistido a toda a cena” (p. 23).

Ao fim de algum tempo o homem que ia ao pé amarrou-lhe um lenço em cima dos olhos para ela não poder ver nada. Mas a Isa percebeu, pelo barulho das rodas do carro, que tinham saído da picada e entrado numa estrada alcatroada. A partir de certa altura, um pouco de luz que passava através do lenço deixou-a perceber que tinham estrada numa povoação.

Isa vai se detendo nas pistas, como uma investigadora, conforme evidencia o narrador onisciente. Mesmo com os olhos vedados, ela nota que saíram da “picada”, devido “ao barulho das rodas do carro”. Assim, percebe que haviam “entrado numa povoação”. Ela age com uma maturidade admirável, típica de um herói destemido, mesmo encontrando-se vulnerável diante da força opositora.

A força opositora não percebe dois detalhes importantes: 1) Zé viu o rapto e o

carro por meio do qual se cometeu tal crime; 2) Isa tinha um celular e manteve-se em contato com a família. Por outro lado, fez o jogo dos raptores, comportou-se, dominou os receios e, mesmo sendo empurrada para o “interior de uma casa”, ficando em um “quarto” escuro que “Tal como o outro, em Moçambique, não tinha janelas” (p. 23), segue o plano de informar aos familiares, com base

nas pistas apreendidas.

Outro benefício favorável à protagonista é que “por sempre ter sido boa aluna” de inglês, consegue dialogar com a outra “jovem feminina”,