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A GÊNCIAS REGULADORAS , OS SERVIÇOS PÚBLICOS E OS SERVIÇOS DE UTILIDADE

1. R EVISÃO HISTÓRICA DA RELAÇÃO E STADO MERCADO E O DESENVOLVIMENTO DOS ARRANJOS

1.1. H ISTÓRICO

1.1.5. N OVA R EPÚBLICA (1985 ATÉ HOJE ) E O PROTAGONISMO DOS AGENTES PRIVADOS

1.1.5.2. A GÊNCIAS REGULADORAS , OS SERVIÇOS PÚBLICOS E OS SERVIÇOS DE UTILIDADE

De fato, com o novo “Estado Regulador” e, em que pese não haver previsão constitucional expressa, foram editadas várias leis criando serviços de utilidade pública; sujeitos à regulação estatal por agências. Nestes casos, não se trata de concessão, haja vista que as atividades são de titularidade privada sujeita à autorização.

As agências reguladoras foram entidades criadas com prerrogativas que lhes garantiam autonomia financeira e funcional em relação ao Poder Executivo Federal para desempenhar, de forma técnica, seu papel regulador com vistas à consecução do interesse público142. Para que se possa “(...) justificar a intervenção do Poder Público, é preciso que essa utilidade pública não possa existir sozinha, sem a ajuda daquela atividade privada”143, sendo justamente nessa relação

imbricada entre interesse público dependente de execução por meio de recursos privados é que os serviços de utilidade pública se manifestam. E nele, a necessidade de regulação estatal.

A título de exemplo, encontra-se no setor de saúde suplementar um clássico caso de regulação de serviço de utilidade pública, por ser uma atividade privada altamente regulada em razão de sua relevância social. A finalidade institucional da agência é de promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, regulando operadoras de plano de saúde setoriais, inclusive quanto à sua relação com consumidores, de forma a contribuir para o desenvolvimento das ações de saúde no país por meio de uma série de escolhas regulatórias.

Enquanto a Constituição Federal estabelece que a saúde é um direito de todos e dever do Estado, tratando-se de direito fundamental de segunda geração que compõe a ordem social que pressupõe o Estado como seu garantidor, a opção constitucional manifestou-se também no sentido de deixar a assistência à saúde livre à iniciativa privada, que poderá exercê-la de maneira complementar, de forma a fazer parte do Sistema Único de Saúde (“SUS”), ou de maneira suplementar, hipótese na qual os prestadores fazem parte do mercado. Este segundo

142 Além disso, a conformação nas agências como um “insulamento burocrático” teve o condão de induzir o

afastamento de toda e qualquer influência política na realização do seu papel institucional, de modo que garantisse o efetivo atendimento ao interesse público. Neste sentido, segundo Paulo Mattos: "(...) temos a experiência da reforma do Estado realizada nos anos 1990, que procurou descentralizar o processo de formulação de políticas públicas para o desenvolvimento de setores da economia, porém adotando um regime político de insulamento das agências reguladoras dos canais de circulação de barganha político-eleitoral, visando com isso limitar a atuação dos “lobbies” clientelistas incrustados nas burocracias ministeriais". MATTOS, Paulo Todescan Lessa. A

formação do estado regulador. Novos estudos. CEBRAP, São Paulo, n. 76, p. 139-156, Nov. 2006. Disponível

em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-33002006000300007&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 10 jun. 2018.

143 VERGARA, Telmo. Serviços públicos e serviços de utilidade pública. Revista de Direito Administrativo, v.

cenário corresponde ao escopo de atuação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (“ANS”). A Lei 9.961, de 28 de janeiro de 2000, que regula a saúde suplementar, instituiu a ANS com o condão de ser o órgão regulador, normatizador, controlador e fiscalizador das atividades que garantam a assistência suplementar à saúde.

Em atenção aos setores encontrados no Banco de Dados sobre normas que o legislador entende como sendo “serviços de utilidade pública”, que será analisado em seção própria, quais sejam, energia, transporte, telecomunicações, infraestrutura urbana e mineração, pode-se destacar o papel de algumas agências reguladoras. Note-se que estas nem sempre regulam apenas serviços de utilidade pública, podendo, até mesmo concomitantemente, regular um serviço que seja, em parte, público, e, em parte, de utilidade pública.

É o caso, por exemplo, dos setores de transporte coletivo de passageiros144, portos145, aeroportos146 etc. Conforma-se nestes casos uma verdadeira assimetria regulatória, modelo que admite a coexistência de atores públicos e privados, regidos pelos seus respectivos regimes jurídicos público e privado, na prestação de um serviço que é, em parte, público e, em parte, privado. Podem conviver, neste caso, serviços públicos (concedidos ou não) e atividades privadas regulamentadas. Confira-se o papel de algumas agências a seguir.

O setor de energia perpassa, direta ou indiretamente, pelas regulações setoriais de três agências. A Agência Nacional de Águas (“ANA”), por sua vez, instituída pela Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000, foi criada “com a finalidade de implementar, em sua esfera de atribuições, a Política Nacional de Recursos Hídricos, integrante do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos”147. A Agência Nacional de Energia Elétrica (“ANEEL”), instituída pela Lei

nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996, “tem por finalidade regular e fiscalizar a produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, em conformidade com as políticas e diretrizes do governo federal”148.

144 BINEMBOJM, G. (2017). Assimetria regulatória no setor de transporte coletivo de passageiros: a

constitucionalidade do art 3º da lei 12.996/2014/Regulatory assimetry in the colletive transportation of passengers: the constitucionality of art. 3º of law 12.996/2014. Revista de Direito da Cidade, 9 (3), 1268-1285.

145 JUCÁ, Paulo Renato. A concorrência em regime assimétrico no marco regulatório dos portos: o caso dos

terminais de contêineres de Itajaí e Navegantes. Dissertação (Mestrado em Direito da Regulação) – Escola de

Direito do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2019.

146 MARQUES NETO, Floriano de Azevedo; ZAGO, Marina Fontão. Limites das assimetrias regulatórias e

contratuais: o caso dos aeroportos. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 277, n. 1, p. 175-201,

mai. 2018.

147 Art. 3º, Lei no 9.984, de 17 de julho de 2000. BRASIL. Lei no 9.984, de 17 de julho de 2000. Brasília, DF:

Presidência da República, [2000]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9984.htm>. Acesso em: 08 jun. 2019.

148 Art. 2º, Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996. BRASIL. Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996. Brasília,

DF: Presidência da República, [1996]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9427cons.htm>. Acesso em: 08 jun. 2019.

Complementarmente, no que se refere à energia produzida a partir do petróleo, gás e biocombustíveis, atua a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (“ANP”), criada pela Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997, tem a finalidade de “promover a regulação, a contratação e a fiscalização das atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis”149.

Os setores de transporte, considerados em sua totalidade, sofrem regulação da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (“ANTAQ”) e Agência Nacional de Transportes Terrestres (“ANTT”), criadas pela Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001, são responsáveis, respectivamente: “por regular, supervisionar e fiscalizar as atividades de prestação de serviços de transporte aquaviário e de exploração da infraestrutura portuária e aquaviária”150; e regular

o transporte ferroviário de cargas e passageiros do Sistema Nacional de Viação; o transporte rodoviário de cargas e passageiros interestadual e internacional e o arrendamento dos ativos operacionais; o transporte de cargas perigosas e especiais em ferrovias e rodovias e o transporte multimodal (aquele que utiliza mais de um tipo de veículo para fazer a mercadoria chegar ao destino correto)151.

O setor de transportes aéreos também sofre influxos da regulação da Agência Nacional de Aviação Civil (“ANAC”), criada pela Lei nº 11.182, de 27 de setembro de 2005 e responsável por “regular e fiscalizar as atividades de aviação civil e da infraestrutura aeronáutica e aeroportuária”152.

No setor de telecomunicações, vige a intensa regulação da Agência Nacional de Telecomunicações (“ANATEL”), criada pela Lei Geral de Telecomunicações (Lei 9.472, de 16 de julho de 1997) e responsável por “adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento das telecomunicações brasileiras, atuando com independência, imparcialidade, legalidade, impessoalidade e publicidade”153.

149 Art. 8º, Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997. BRASIL. Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997. Brasília, DF:

Presidência da República, [1997]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9478.htm>. Acesso em: 08 jun. 2019.

150 A ANTAQ. Disponível em: <http://portal.antaq.gov.br/index.php/institucional/a-antaq/>. Acesso em: 08 nov.

2019.

151 ANTT – você sabe qual a função da Agência Nacional de Transportes Terrestres?. Disponível em:

<https://nacionaltransportes.com/blog/estradas-brasileiras/antt-voce-sabe-qual-funcao-da-agencia-nacional-de- transportes-terrestres/>. Acesso em: 08 nov. 2019.

152 Art. 2º, Lei nº 11.182, de 27 de setembro de 2005. BRASIL. Lei nº 11.182, de 27 de setembro de 2005. Cria

a Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC, e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República, [2005]. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11182.htm>. Acesso em: 08 jun. 2019.

Complementarmente, a Agência Nacional de Cinema (“ANCINE”), criada pela Medida Provisória nº 2.228-1, de 6 de setembro de 2001, “tem como atribuições o fomento, a regulação e a fiscalização do mercado do cinema e do audiovisual no Brasil”154.

A última Agência Reguladora criada no Brasil para regular um setor no qual é prestado um serviço de utilidade pública (mineração) é a Agência Nacional de Mineração (“ANM”), criada pela Lei nº 13.575, de 26 de dezembro de 2017 com o fito de “promover o planejamento e o fomento da exploração mineral e do aproveitamento dos recursos minerais (...) bem como assegurar, controlar e fiscalizar o exercício das atividades de mineração em todo o território nacional”155.

As agências reguladoras de serviços públicos e serviços de utilidade pública foram criadas para desempenhar a função regulatória156, marcada prela predominância técnica de suas atividades157, realizadas em todo o território nacional com o intuito de garantir uma prestação adequada destes serviços, mediante justa remuneração do prestador e a um preço módico para seus usuários.