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Os canteiros: o caminho da pesquisa

5 CUIDANDO DOS BROTOS

5.1. Galhos em Suspensão

Os ramos que dão fruto, ele os poda para que deem mais frutos ainda. João 15-2

Para que a planta se fortifique são necessárias as podas que retiram todo o excesso de ramos e fortificam as plantas para que novos frutos surjam. Dessa forma observamos que a JMJ semeou, cultivou e também teve seu momento de podas, não no sentido de tirar excessos, mas, de conflitos, ausências, omissões e ocorrências.

Nesta perspectiva, as situações incômodas se revelaram na JMJ desde a falta de recursos para o deslocamento relatados por nossos peregrinos sergipanos até o ―fechamento‖ com a informação de uma dívida milionária. Foram muitas notícias e situações desagradáveis!

O Papa que estava no comando de sua organização, Bento XVI, renunciou seu pontificado em 2013. Desde a idade média esse fato não acontecia na igreja e assim, foi um momento histórico. Junto a esse fato somou-se a corrupção de um dos membros da cúria romana, com o escândalo do "vatileaks".34 O Papa Francisco foi eleito e a JMJ do Rio de Janeiro foi seu primeiro compromisso internacional. Em poucos meses o Papa se popularizou e tinha conseguido a simpatia de seu rebanho e da mídia internacional.

Já na abertura da JMJ, após acolhida, o Papa pediu silêncio em memória da peregrina francesa de 21 anos que viria para a JMJ e faleceu em um acidente na cidade de Mana, Guiana Francesa. De acordo com informações do jornal on-line France-Guyane mais 5 jovens ficaram feridos. Esta jovem viajou de Paris para Guiana para passar uma semana com amigos e o ônibus que estava colidiu com um caminhão.

Houve o cancelamento do local que abarcava grande parte da programação após um grande investimento, foi uma mega estrutura. Com este cancelamento houve, pois, rescisão de contratos, e surgiram novos contratos. Isso causou

34"vatileaks" é um escândalo envolvendo documentos secretos que vazaram do Vaticano,

que revelam a existência de uma ampla rede de corrupção. <https://pracadesales.wordpress.com/.../documentos-vazam> postado em 18/03/2016

enormes prejuízos para comerciantes das localidades que iriam comercializar e o cancelamento com poucas horas de antecedência não foi possível reorganizar novos espaços para eles. Devido a esses fatores, as estimativas das dívidas da JMJ ultrapassaram os R$ 140 milhões. A Arquidiocese vendeu um prédio e reduziu a dívida para cerca de R$ 90 milhões. O Papa Francisco fez uma doação de R$ 11,7 milhões, deixando os números abaixo dos R$ 30 milhões. A Arquidiocese do Rio de Janeiro também fez uma campanha de arrecadação nos folhetos distribuídos nas missas, além de buscar ajuda em contato direto com empresários cariocas35. A Canção Nova fez uma campanha simultaneamente com todas as outras Tvs e rádios católicos para arrecadação de recursos para quitar a dívida e criar o Instituto da Juventude. De acordo com o vice-presidente da entidade e um dos coordenadores do evento, Márcio Queiroz, o Instituto ―será um espaço para ouvir e para discutir as questões da juventude.‖

Neste quesito, quando perguntamos aos peregrinos sergipanos o que teria gerado a dívida da JMJ as opiniões se dividiram, pois, para dezesseis (16) foi ―não sei o que gerou‖ ou ainda ―nem sabia que existia dívida‖. Outro item que foi destacado pelos peregrinos foi a falta de apoio do governo com oito (8) opiniões que alegaram que ―o governo se aproximou e depois se afastou‖. Neste quesito, tive acesso a algumas reportagens que publicaram os gastos do governo com a JMJ, dando conta de que os recursos se aplicaram principalmente em segurança, limpeza de rios e passagem para agentes. Neste quesito nossos peregrinos se manifestaram:

Eu acredito que o Estado deveria estar mais presente, como esteve presente na Copa nem todo mundo joga futebol no Brasil, mas nem por isso o Estado estava ausente. (M.A.22 anos Estudante de Geografia)

A falta de planejamento dos organizadores da igreja foi outro item abordado com cinco (5) opiniões que disseram que ―a igreja deveria ter escolhido melhor o local do evento junto a profissionais e encontrar um local adequado.‖ Dez (10) disseram que ―foi o desejo de dar o melhor para o peregrino, com um som bom, kit com produtos conhecidos, palco muito bem produzido, participação de cantores e atores.‖ Outras dez (10) pessoas atribuíram à dívida ―devido à mudança de local,

35 Notícias publicada no site: < http://noticias.terra.com.br/brasil/papa-francisco-no-brasil/ publicada em

surgindo assim novos contratos e rescisões.‖ Seis (06) disseram que ―foi o fator climático que obrigou a mudança e gerou a dívida.‖

Outros incômodos que ocorreram na JMJ foram; a interrupção do metrô nas primeiras horas da programação, sem sinalização e sem balcões de informação, o que foi providenciado somente nos últimos dias; os restaurantes não tinham pessoas suficientes para atender, muitas pessoas esperando e somente um caixa para atender. As filas eram imensas, no primeiro dia estávamos num grupo de vinte pessoas e demoramos 3 horas para almoçar; ainda convivemos com banheiros com o lixo transbordando.

Quando perguntei aos peregrinos sobre as dificuldades, o mais comentado foi o transporte, ônibus sempre lotados e as pessoas se perdiam do grupo devido ao tumulto. Os alojamentos também estavam super lotados e os banheiros coletivos deixaram muitas pessoas constrangidas. A organização dos kits foi outra reclamação devido às filas inacabáveis. Reproduzimos essas situações por meio de tirinhas Figura (63);

Figura 63 – Tirinha: que os peregrinos enfrentaram na JMJ

VASCONCELOS, C. E. D. ORG: SILVA, E.F.C, 2013

Essas situações foram relatadas pelos peregrinos sergipanos mostrando os problemas enfrentados. O mais interessante de tudo isso foi que essas experiências vividas em grupo serviram para fortificar as relações, pois as pessoas expuseram suas dificuldades e mostraram um sorriso confirmando: ―mas foi bom e eu faria tudo de novo, tudo mesmo‖. Conforme depoimentos:

Eu fui pegar meu kit no sambódromo aí eu fiquei 8h na fila, nesse tempo eu conheci as pessoas que estavam ao meu redor, tenho um grupo no whatsapp que são os amigos da fila tem gente de São Luís do Maranhão de São Bernardo dos Campos, de Brasília e de Sergipe.(V.C,P,S 18 anos, estudante de Geografia)

Chegamos ao metrô com todo mundo de mãos dadas. Foi uma luta para entrar, quando entramos alguém diz: tá faltando uma menina. “chegue desce todo mundo”, procura, procura, graças a Deus deu certo. ( A. P. S. B. 25 anos funcionaria publica)

Eu não esperava no Rio de Janeiro a dificuldade (pausa) do evento em si. Isso nos levou a um grande aprendizado; a gente esperou muito e a gente teve que esperar e confiar. Eu acho que a confiança em Deus foi o que nos moveu na Jornada. (M. A , 35 anos missionária da Obra de Maria)

Quem acolheu a gente foi o pessoal de Niterói. Tinha umas 30 pessoas no quarto [...], o banheiro quente era coletivo o que para mim era a morte! Aí as meninas começaram a jogar água pra cima e acabou queimando o chuveiro. No fundo tinha uns banheiros fechados com água gelada, achei melhor que o coletivo. Mas a gente não ligava não a gente queria só beber da graça. ( A. P. S. B. 25 anos funcionaria publica)

Os obstáculos encontrados pelos peregrinos, Figuras (66 e 67) foram vistos como estímulo para a caminhada. Houve uma predisposição de aceitar os desafios porque carregaram o sentido de peregrinar, que exige sacrifício e penitência. Os peregrinos que entrevistamos demonstraram ciência desse sentido da JMJ; eles estavam muito calmos nas esperas; não presenciamos, nem foi relatado nenhum momento ou ato de violência física ou verbal.

Figura 64, 65 – Problemas ocorridos na JMJ relatados pelos peregrinos sergipanos Rio de Janeiro, 2013

Foto: SILVA, E.F.C

Fonte: Trabalho de Campo 23/07/2013

Foto: VIANA, R.

Após a administração do metrô avisar que os trens não funcionariam, a multidão saiu da estação cantando e caminhando. Figura (66 e 67) Alguns para o ponto de ônibus outros para Copacabana; visivelmente animados, carregando as mochilas da JMJ Figura ( 66).

Figura 66 –Milhares de Jovens em direção à Praia de Copacabana. Rio de Janeiro, 2013

Fonte: <http://www.google.com.br/search?> disponível em 27/07/2013 consultado em 06/08/2013

Destacamos as falas dos entrevistados sobre o sentido de ser peregrino demonstrado pelos milhares de jovens que chegavam à praia de Copacabana pelo túnel, após horas de caminhada.

Outro fato que nos chamou atenção foi dentro dos ônibus. As conversas paralelas de pessoas que não eram da JMJ foram assim relatadas em meu diário de campo:

Hoje, dois ônibus pararam no semáforo e os motoristas começaram a conversar. –Rapaz que trânsito é esse? o outro respondeu; E o pior é que essas pragas vão embora só domingo. Entre risos pensei, somos uma praga maior, vamos só na quarta. Diário de campo do 1º dia 22/07/2013

Um rapaz conversando com outro aponta uma peregrina com aparência estrangeira e diz – será que se a gente chamar “para aquilo ela vai” ou só veio para correr atrás do Papa?. Diário de campo do 1º dia 22/07/2013

Um casal olha pela janela do ônibus para os peregrinos e diz -olha que idiotas estão andando de um lado para outro, nem sabem pra onde vão. Só vieram para ver o Papa. Diário de campo do 1º dia 22/07/2013

Esses diálogos desagradáveis caracterizam uma intolerância religiosa, tendo em vista que pessoas que fizeram esses comentários estavam desprovidas de informação, não conheciam a programação e acreditavam que tinha apenas uma razão: ver o Papa! A tolerância e acolhida nesse momento é muito importante para as pessoas que estão chegando em terras que não são suas. Neto (2002) explica o valor da tolerância.

Tolerância é um valor muito caro e necessário, e que está na raiz mesma da prossecução de interesses legítimos, que aporta uma palavra, com a especificidade simbólica do discurso jurídico-penal, de incentivo ao diálogo epistemológico travado no respeito pelo outro e pela diferença. Insere-se, tal discurso, num plano de ambiência cultural mais amplo, cuja ética vem sendo delineada por muitos. (WEINGARTNER NETO, 2002, p. 107)

Nesse caso do relato do diário de campo temos visivelmente um preconceito religioso36. Revelado em público, neste sentido houve peregrinos da JMJ que trouxeram consigo casos mais graves de suas localidades.

Por meio de reportagens, chegou ao nosso conhecimento o protesto, em Aparecida, do Movimento dos trabalhadores sem-teto e organização periferia ativa e resistência urbana. Teve como reivindicação o posicionamento do Papa contra os ataques que os pobres têm sofrido no Brasil, com as construções para a Copa do Mundo pessoas foram despejados, e as mortes cometidas pela polícia.

Outro protesto que chegou ao nosso conhecimento foi da ―ONG Católicas pelo Direito de Decidir‖, que organizou manifestação em diferentes locais e encaminhou uma carta aberta ao Papa pedindo mudanças a Igreja, como o fim da condenação ao aborto e a benção à união de casais do mesmo sexo.