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A Geografia Enquanto Ciência

A Geografia, que tem no espaço o seu campo de estudo, tem no estudo do espaço, diversos modos de conceber e buscar os fragmentos do mesmo. Essa maneira de a Geografia atuar não nos permite entender que existam várias Geografias. A Geografia é uma só, pois pensar fisicamente ou politicamente a Geografia não faz dela duas ciências.

Com o processo de globalização acelerado, a partir da década de 1990, a Geografia assumiu um novo papel, uma nova postura. Faz-se uma leitura do mundo a partir da produção e do fluxo, afirma Santos (2006, p. 181):

Como, no processo global da produção, a circulação prevalece sobre a produção propriamente dita, os fluxos se tornam mais importantes ainda para a explicação de uma determinada situação. O próprio padrão geográfico é definido pela circulação, já que esta, mais numerosa, mais densa, mais extensa, detém o comando das mudanças de valor no espaço.

Hoje, de modo muito exigente, somos impelidos a conhecer, pois o mundo se apresenta de forma globalizada. Não se pode e não se consegue mais ficar distante das muitas novidades que a cada dia se fazem realidades.

Nessas rápidas e competitivas mudanças provocadas pela globalização, os países não se inserem de forma homogênea no processo econômico. O modo de produção capitalista cresceu de tal forma que “ser competitivo neste mundo globalizado dos nossos dias também

passa por conhecer Geografia, conhecer o mundo, os demais países, continentes e mercados regionais, e até mesmo os nossos problemas e potenciais” (VESENTINI, 2009, p. 72). A Geografia não trata só do social, mas também do cultural, econômico que compõem o espaço e se faz presente na construção e formação. O espaço é a sociedade em movimento.

Na sociedade contemporânea plural e diferenciada, as aprendizagens exigidas pela concidadania responsável assumem na escola forma explicita, proposital e sistemática, institucionalizada pela esfera política em se articulam, mediadas pelo Estado, a família e a sociedade civil, e determinada, em seus aspectos criadores próprios, pela compreensão e atuação combinadas de seus instituintes internos, sujeitos coletivos organizados: os educadores e educandos juntamente com a comunidade especifica interessada. Desta forma os saberes gerados nos destinos lugares sociais assumem, pela mediação da escola, peculiares formas de organicidade e sistematização que só se podem imprimir num sistema formal de educação proposital (MARQUES, 1996, p. 101).

Nesses muitos conhecimentos na sociedade plural e diferente, insere os conhecimentos geográficos. A sociedade opera no espaço geográfico por meio dos sistemas de comunicação, transporte e da circulação das pessoas. À medida que o tempo passa, a sociedade atinge níveis cada vez maiores de complexidade. Isso exige de todos os setores profissionais uma formação contínua e atenta às transformações presentes no espaço social.

Sabe-se que o domínio dos sistemas tecnológicos é importante na condução de todas as nossas atividades. Logo “o homem, esse fazedor de paisagem, somente existe porque ele é membro de um grupo que em si mesmo é um tecido de técnicas” (SANTOS, 1997, p. 28). É o homem que inventou a técnica, que melhora a sua vivência e convivência, mas não a técnica inventora do homem que a usa para modificar o meio. Mas não esqueçamos que a técnica é também produtora do homem e da humanidade.

Hoje se reconhece a pertinência dos conhecimentos geográficos para compreender e reorganizar os espaços. O que leva setores da educação de alguns países desenvolvidos a investirem no ensino da Geografia. Segundo Vesentini (2009, p. 72-73):

Além do exemplo norte-americano, podemos ainda lembrar a constante preocupação das autoridades educacionais do Japão ou da Coreia, além de mais recentemente da China, que realizaram vários intercâmbios e trocas de experiências no tocante ao ensino da Geografia com inúmeros países (até com o Brasil!), seja pagando milhares de bolsistas para realizarem estudos in loco6, seja convidando profissionais do resto

do mundo para dar palestras ou cursos com novas ideias. Isso sem falar dos inúmeros programas (softwares) educativos voltados para renovar ou auxiliar o ensino de Geografia, que foram criados.

No contexto da rápida circulação de informações, a geografia é fundamental para a compreensão social, com meio técnico e meio técnico cientifico que são responsáveis diretos pelo aumento e movimento dos capitais produzidos. A geografia vem sendo valorizada, considerada necessária e importante, tanto para os que estão à margem socialmente quanto para os que estão em uma situação de privilégio econômico.

Para Santos (2008, p. 19) a globalização tem um lado perverso que precisa mudar por meio da compreensão. Compreensão que vem acontecendo na escola, pois segundo Vesentini (2009, p. 73): “A Geografia, assim, voltou a ser valorizada enquanto disciplina escolar”. Mostra que conteúdos e temas da Geografia se tornaram temas de todo o planeta, isto é,

ficou evidente a importância de se estudar nos dias de hoje temas normalmente identificados nesta disciplina: globalização e mercados regionais, relações de gênero, migrações e o novo tipo de racismo, geopolítica mundial, desenvolvimento e subdesenvolvimento, organizações internacionais, a urbanização da humanidade (e de nosso país) e seus problemas, agricultura e fome, mudanças climáticas, a água potável no planeta (e em nossa região), os recursos naturais renováveis e os não renováveis etc. (Idem).

Na exploração dos recursos naturais a Geografia que sempre esteve presente na expansão e na organização do espaço pelo homem, na ampliação das fronteiras, no aumento dos territórios, deve e pode ser uma disciplina que na escola ajuda a pensar e organizar o espaço no contexto atual, mas especialmente, deve contribuir para a sua compreensão, e também para a ação social.

O profissional de Geografia, pesquisador ou professor da área escolar ou acadêmica, tem como objeto de estudo a espacialidade dos fenômenos no contexto histórico/cultural. Nesta perspectiva, a Geografia deve inserir-se de forma interdisciplinar, mas sem perder o seu modo de operar para não correr o risco de ser apenas uma ferramenta e assim sucumbir como fim utilitarista para a exploração e o desenvolvimento.

Um estudo dedicado aos conceitos geográficos, utilizando estratégias didáticas e pedagógicas, possibilitará uma melhor compreensão dos temas da Geografia desenvolvidos a partir dos conteúdos escolares. Portanto, a Geografia pode “levar o aluno a compreender o mundo em que vivemos em suas diversas escalas geográficas – não confundir com escala cartográfica, assim como não se deve confundir processo histórico com cronologia” (VESENTINI, 2009, p. 73).

O trabalho com a Geografia deve ser a partir da presença da mesma como instrumento de pesquisa ou como disciplina escolar ou acadêmica, sem deixar de levar em conta sua

abrangência interdisciplinar. Assim, o trabalho da Geografia como disciplina aumentou em alguns países, por exemplo: Estados Unidos, e diminuiu em outros como França, em se tratando de carga horária mesmo sendo responsável pelo estudo da interação entre sociedade e natureza.

Conforme Vesentini (2009, p. 73), “em alguns países, ocorreu um aumento no número de aulas de Geografia por semana - por exemplo, nos Estados Unidos a partir de 1994” (Idem). Diferente, porém, “em outros, ocorreu até mesmo uma diminuição nessa carga horária – na França, por exemplo, desde os anos 1980” (Ibidem). A motivação das nações na implantação da Geografia tem caráter político e econômico, a tal ponto que segundo Vesentini (2009, p. 74):

É ilustrativo, a esse respeito, comparar os exemplos dos Estados Unidos e da França. Naquele primeiro Estado, tem ocorrido um aumento na carga horária semanal da disciplina escolar Geografia, ao invés da diminuição como na França, onde se introduziu “novas disciplinas” para abordar determinados temas – a Terra e seus movimentos, estações do ano, placas tectônicas, vulcanismo e abalos sísmicos, mudanças climáticas, comércio internacional, desenvolvimento econômico e social etc. – que antes eram identificados com a Geografia.

A função da Geografia na sociedade não é mais ser expansionista, nem somente compreender situações econômicas. O serviço da Geografia é formar o cidadão no que se refere à presença do homem no espaço. “E também passa, principalmente nos dias de hoje, pelo estudo da questão ambiental, que não pode prescindir da dinâmica da natureza (e suas alterações/reações diante da ação humana)” (VESENTINI, 2004, p. 228-229).

Se em um determinado contexto histórico a geografia serviu para fins militares e expansionistas. Também se apresenta com outra proposta, para além do militarismo e expansionismo. Como afirma Santos (2006), a ciência geografia pode contribuir para construção de uma outra sociedade e de outra globalização.

Não se pode abandonar a Geografia ou um modo de conceber a Geografia, no Brasil ou em qualquer outra parte do mundo, só por que, em outro contexto histórico, a ciência geográfica foi “usada para guerra”. O modo de conceber a Geografia não perde a sua funcionalidade por causa de uma intencionalidade histórica. Fica difícil para a Geografia ou qualquer outra disciplina ser fazer presente no processo global sendo entendida de forma inadequada. “A globalização afeta a praticamente a todos na atualidade, com maior ou menor intensidade” (VESENTINI, 2009, p. 79). E continua, “não existe mais nenhum lugar ou

região que não dependa do mundial, do global, sendo este último mais do que a mera soma dos inúmeros lugares” (Idem).

Compreender o espaço tecnicamente, localizando-se e orientando-se não fere a possibilidade de se pensar o espaço de forma política, econômica, social e cultural. Daí não ser preciso brigar sobre a posição da Geografia como ciência social ou da natureza.

A Geografia no Brasil, assim como muitas ciências, deve ter uma ampla compreensão dos ramos que a compõem para que não haja divergências desnecessárias para o crescimento dessa ciência do mundo, das licenciaturas e dos bacharelados. Na França, associações de geógrafos e professores, “se encaram como inimigas e possuem concepções diversas do que seria Geografia: ora uma ciência humana, ora uma geociência (logo, uma ciência natural), ou às vezes até uma espécie de ramo das matemáticas ou das engenharias (para algumas mais ligadas aos SIGs7 e à cartografia)” (VESENTINI, 2009, p. 76).

A explicitação da prática das associações de geógrafos e de professores na França, “as que representam o chamado ‘geógrafo profissional’ (aquele que trabalha em planejamento, análise ambiental ou SIGs), frequentemente revelam um profundo e explícito desprezo pela atividade educativa” (VESENTINI, 2009, p. 76). Acentuada por intensas disputas, a Geografia corre o risco no Brasil, e em qualquer parte do mundo, de ficar desarticulada. Assim, ela transmite “para a sociedade a imagem de uma ciência e de uma disciplina escolar que não sabe ao certo o que é ou qual é a sua utilidade, que não conseguem, enfim, ter um mínimo de coesão ou mesmo de coerência” (Idem). Nesse sentido, uma formação para o ensino qualificado da geografia na escola.

Para compreender o espaço, sem o risco de apresentarmos uma leitura espacial fragmentada, é necessário fazer leituras contextualizadas para uma compreensão ampla na organização e transformação do espaço. Como afirma Vesentini (2009, p. 76) “Conhecer Geografia também é importante para os negócios, para a guerra e para a paz, para as relações internacionais enfim”.

Qualquer relação social, política e econômica exige uma boa informação e formação de Geografia para ser bem sucedida. Os descasos com a ciência geografia, bem como, com a formação do professor de geografia pode produzir o fenômeno do analfabetismo geográfico. Nos exemplos a seguir Vesentini (2009, p. 80-81) ilustra as consequências deste.

Esse analfabetismo geográfico tinha – e, em grande parte, ainda tem – indesejáveis consequências práticas. Por exemplo: nos anos 1980, uma empresa de aviação norte- americana – a American Airlines – teve enormes prejuízos ao tentar entrar no mercado brasileiro porque servia comida mexicana nos seus aviões e treinou os seus funcionários em espanhol, imaginando que este seria o nosso idioma! E a maior rede de comércio varejista do mundo – a Wal-Mart – também conheceu um fracasso nos seus primeiros anos de negócios no Brasil, pois entulhou as suas lojas com artigos impróprios ao nosso clima e aos nossos hábitos: roupas para esquiar, agasalhos para o frio do inverno de Chicago, tacos de beisebol etc. E, na recente invasão do Iraque promovida pelo governo Bush, ficou patente que um profundo desconhecimento da Geografia local – não estamos nos referindo aqui tão somente ao relevo ou ao clima, mas, principalmente, às etnias e suas lideranças regionais – muito contribuiu para a infrutífera tentativa norte-americana de promover uma rápida e eficaz troca de governo, com vistas a manter a estabilidade no país.

Não é salutar se aproximar de uma realidade sem procurar conhecer sua condição social e cultural. Para Freire (1996, p. 76), “Outro saber fundamental à experiência educativa é o que diz respeito a sua natureza”. Continua afirmando o pesquisador: “Como professor preciso me mover com clareza na minha prática. preciso conhecer as diferentes dimensões que caracterizam a essência da prática, o que me pode tornar mais seguro no meu próprio desempenho” (Idem). Neste sentido, saber Geografia é importante, pois permite conhecer o lugar onde se vive e construir as alternativas e possibilidades, no caso da geografia escolar, ela assume sentido quando os alunos compreendem a realidade em que vivem.

Mas para conhecer o lugar na escola e fora do espaço escolar, é preciso considerar, segundo Vesentini (2004, p. 227) “que a própria Geografia tradicional conheceu várias fases e nuanças e nunca foi um bloco monolítico”, e continua dizendo que:

Existiram autores que valorizaram a explicação e combateram veementemente a descrição e a memorização (por exemplo: Delgado de Carvalho, Pierre Monbeig, Nilo Bernardes e outros) que incluíram bons textos literários nos seus manuais (exemplo: Clóvis Dottori e outros) e até mesmo, em especial na última fase da Geografia tradicional francesa, com Pierre George e sua entourage – a chamada “escola georgiana” que incorporaram novos temas (subdesenvolvimento, sistemas socioeconômicos, “explosão demográfica”, organização do espaço e planejamento, região como espaço polarizado etc.) que em alguns casos demandaram uma análise crítica do real (Idem).

Também, na análise geográfica procura-se identificar e compreender o efeito da transformação que a produção/consumo provoca no espaço. Espaço formado por uma identidade que está sujeita a transformações mediante a força transformadora da atividade tecnológica e econômica cada vez mais globalizada. No ensino da geografia isso deve estar presente. Mostra a geografia como construção histórica.

As transformações no espaço são constantes; aconteceram ontem, acontecem hoje e acontecerão amanhã. E essas transformações presentes na sucessão dos tempos estarão sempre interligadas de alguma maneira, pois os processos de transformações se sucedem. Uma transformação hoje acarretará mudança amanhã. Essas mudanças a Geografia analisa e busca compreender.

A Geografia utiliza e maneja conceitos básicos e instrumentos para explicar a abordagem que faz no espaço. Um conceito primordial para Geografia é o espaço. O espaço que não deve ser compreendido de forma filosófica ou sociológica, mas geograficamente, interpretado como movimento provocador de transformação antrópica no tempo através de instrumentos tecnológico produzidos pela humanidade.

A Geografia, como qualquer outra ciência utiliza-se de instrumentos, como: GPS, Mapas, bússola etc.; e no passado astrolábio, balhestilha e outros, para compreender as transformações provocadas no espaço. As necessidades sociais, sem dúvida, provocam os profissionais de Geografia a ser diferentes de quatro décadas atrás. Neste sentido, não há dúvida da importância do conhecimento da ciência geográfica, de suas formas de pesquisa, dos seus conceitos por parte dos professores que vão ensinar a geografia. Embora não basta isso, a estes conhecimentos somam os conhecimentos curriculares, pedagógicos, didáticos, etc., necessário na construção e afirmação da Geografia Escolar constituída enquanto disciplina.

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