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1.

O contexto geológico

A Oeste da cidade, localiza-se a sua bacia geológica em forma de um antigo lago, estando associada à longa falha Penacova – Régua – Verin e à confluência dos rios: Sordo, Cabril (ou Marinheira) e Corgo, que recebe os dois primeiros. O fosso geológico que lhe corresponde, situa-se na base da serra do Alvão e compreende uma relevante riqueza geológica (Batista, 1990), à qual estão associadas as argilas instaladas num corredor com cerca de 8 quilómetros de comprimento (Coêdo – Parada de Cunhos) e 2 quilómetros de largura, configurando um alinhamento N-S a NNE-SSW.

Fotografia 6: Bisalhães no primeiro plano com os seus dois núcleos primitivos

A parte mais a sul do fosso, na zona de Parada de Cunhos, apresenta uma coluna sedimentar mais impressionante onde se desenvolveram profundas galerias e minas para extracção dos barreiros e a parte norte é mais estreita e está associada a depósitos argilosos menos espessos (Idem) que se formaram ao longo de milhões de anos na falha geológica existente. Este fundamento geológico terá influenciado as diferentes características de texturas e densidades das argilas, que terão estado na base das conclusões do trabalho de Lepierre (1899), quando classifica o barro de Lordelo como

“muito ordinário” e as argilas de Parada de Cunhos abundantes e de boa qualidade.

Com efeito, os sedimentos associados aos depósitos da bacia do rio Cabril e rio da Marinheira apresentam-se em três níveis na área de Parada de Cunhos, perfazendo cerca de 50 metros de profundidade, com predominância, na base, de uma litologia

areno-argilosa-arcósica bem expressa nas análises físico-químicas das pastas analisadas (Ramos, 2005). A sua caracterização mineralógica, apresenta, deste modo, vários componentes, tais como: quartzo, caulinite, ilite, microlina, abite e montmorilonite (Batista, 2000), cuja composição físico-química se aproxima bastante das argilas da veiga de Chaves, por se inserir na mesma falha geológica e onde os oleiros se abastecem presentemente (Fernandes, 2008; Tapada, 2006). Estas semelhanças permitiram viabilizar a manutenção do sistema produtivo após o encerramento da Telheira de Parada em 1970 (Tapada, 2006), sem que tal tenha motivado comportamentos significativamente alterados, nas diversas fases do processo de produção, dos acabamentos e sobretudo no aspecto crítico das cozeduras (Campos; Carvalho, 1999), ao qual outras pastas não sobrevivem, garantindo-se, deste modo, o tradicional aspecto final das louças de Bisalhães.

2.

Bisalhães: uma aldeia na freguesia de Mondrões

A Freguesia de São Tiago de Mondrões compreende vários lugares, muitos e variados motivos de interesse e localiza-se na encosta contígua à bacia geológica a poucos quilómetros da cidade, dispondo-se os povoados em anfiteatro, desde os antigos montes de Sirarelhos (serra do Alvão), até às veigas da Almodena, às portas de Vila Real (Aires, 2007). Os vários lugares da freguesia, estendem-se pela encosta com uma variação altimétrica acentuada, que influenciou diferentes climas, recursos económicos, ecossistemas, culturas, modelos de organização da propriedade e mesmo perfis humanos muito distintos, como refere o autor das Memórias de Vila Real em 1721:

“Está esta freguesia distante desta villa meya legoa para a parte do poente. São lugares temperados, que ficam fronteiros a esta vila, excepto Sapiãos e Golpilhares, que ficam mais avezinhados à serra, distantes desta vila huma légoa, pelo que são frios e ásperos (…) Os naturais dos lugares baixos sentem seus achaques e doenças e os da serra são robustos, sadios e enxutos do corpo”.

(Sousa; Gonçalves, 1987:546)

O território compreende uma antiga presença humana associada ao megalitismo e à cultura neolítica com evidências nos castros de Gulpilhares e de Mondrões, nas antigas “mamoas” das Areias (Aires, 2007) e nas sepulturas antropomórficas da Reta e

no Castanheiro Lourenço (Parente, 2003). O seu antigo nome (MonsTelonii) evidencia etimologicamente a circunstância de ter sido ponto de paragem obrigatória e de pagamento de portagem, reforçando o seu carácter de uma verdadeira área de serviços, associada à antiga via imperial Portucale-Brigantia (Parente, 2004)10.

O troço intacto de calçada romana relacionada com a “estalagem” e o antigo “pagus” são testemunhos visíveis dessa impressionante logística romana, situada a meia encosta entre os dois castros romanizados e que terão estado nas origens dos povoados circundantes, tal como aconteceu a Mondrões e Bisalhães em cuja fronteira simbólica, se situava o castro do Calvário (Parente, 2003:85; Jorge; Tapada, 2005).Este local foi mais tarde transformado em calvário, acolheu o crescimento urbano recente devido ao incremento económico das últimas décadas, fazendo desaparecer os antigos vestígios arqueológicos e ligou em definitivo as duas localidades.

Fotografia 7 e 8: 7 – Calçada Romana 8 – Pormenor escultórico da Igreja Matriz

10Em jeito de ad laterenão é despiciendo considerar aspectos de comparação entre o período de expansão e

sedimentação do império romano e a actual situação em Portugal. Com efeito, tal como nos tempos de antanho, existe um modelo centralista com a capital longínqua que impõe as suas lógicas funcionais, o sistema viário continua a ser determinante e sujeito ao pagamento de portagens, existe uma moeda única, leis normalizadas e sistemas de vida padronizados. Acentua-se o domínio transversal de uma língua e os governos regionais estão subjugados ao domínio

Os documentos mais antigos que se conhecem relacionados com Mondrões e Bisalhães situam-se numa época anterior à fundação da nacionalidade e referem-se a 2 doações feitas por Audina à Sé de Braga, “pro remedio anime mee”, em 31 de Julho e de 4 de Dezembro de 1091, relativas a propriedades que possuía nestas localidades (Costa, 1965). Na idade média, surgem, aliás, várias referências à paróquia de Mondrões e a alguns dos seus lugares, que pagavam foros a D. Afonso II. Quanto a Bisalhães, surgem também informações da existência de reguengos, propriedade do mosteiro de Caramos, em 1258 e, aquando da atribuição do foral de D. Manuel em 1519, é referido que Mondrões“(…) estava perto de outra vila, chamada

Bisalianas”(Leal, 1875).

Mondrões desenvolveu-se à volta da sua antiga centralidade viária, emergindo na Idade Média como vila foraleira com a respectiva Câmara Municipal e onde funcionou uma histórica portagem viária, apenas cancelada em 1289, transitando para Vila Real “assim como se tirou até aqui em Mondrões e havê-la El-Rei toda” (Gonçalves, 1978). Com efeito, depois da tentativa falhada de D. Afonso III de fundar Vila Real através de outorgamento de foral de 1272 (Idem), é com D. Dinis, que esta

povoa de mil povoadores, acabada de nascer, afirmou-se como vila e cabeça

administrativa das Terras de Panóias, onde era preciso fixar residentes, captar actividades, lançar impostos, sedimentar feiras e regular o poder da justiça, o que bem se expressa no Foral Dionisino de 1289 (Sousa; Gonçalves, 1978).

A história de Bisalhães é indissociável da sede da Vila de Mondrões por razões naturais, de contínua ligação territorial e histórica. Contudo, outros aspectos devem ser considerados e que estabeleceram um vínculo multissecular entre os dois povoados, tanto pelo castro comum donde provêm, pela partilha da água de consortes da levada comunitária, pela antiquíssima tuna musical, pela igreja majestática e sobretudo pelo seu comum desígnio de lugares produtores de olarias (Dinis, 2000; Parente, 2003; Sardinha, 2005).

Além de serem tradicionalmente os aglomerados mais populosos da freguesia, situavam-se também, próximo do aludido templo de reconstrução barroca, cujo medalhão em alto-relevo granítico da frontaria é profusamente decorado com esculturas de apóstolos, de doutores da Igreja e de vários motivos naturalistas e jacobeus, exteriorizando o tradicional simbolismo da supremacia da fé católica sobre a “moirama” (Aires, 2007; Dinis, 2000). Porém, essas obras de ampliação no séc. XVIII, que tornaram o templo mais imponente e com mais espaço para responder ao significativo

aumento populacional, a que não é alheio o grande desenvolvimento da actividade olárica verificado durante aquela centúria (Dinis, 2000; Dinis, Amaral, 2003), lançaram a paróquia numa profunda crise financeira. E disso deu conta o Pe. Manuel Pereira em 1758, referindo que, “a Igreja he de abobeda com dous arcos com suas colunas em as

quais faz seu fundamento, está por acabar por estar a freguezia muito empinhada e deverem quinhentos mil reis de que pagaõ juros” Dinis, 2000)

À imponência civil e religiosa da sede da freguesia, contrapõe-se a humildade da capela de Santa Ana em Bisalhães, com o seu altar tríptico em talha dourada e um elegante e inusitado cruzeiro do século XVIII, de duas faces (Aires, 2007:406). Aqui também os terrenos de cultivo são escassos, embora com boa exposição solar e bem abrigados pelas cercanias do Alvão, apresentando natureza rude, na maior parte arenosos e de pouca produtividade, assentando em padrões de produção muito primitivos (Ribeiro, 1970) devido ao isolamento movido pelo cerco montanhoso transmontano (Taborda, 1987) e porque verdadeiramente nunca foi essa a vocação nem a sina daquele lugar.

Fotografia 9: Peças nas lojas na entrada de Vila Real

Poucas décadas atrás, a esmagadora maioria do casario apresentava os característicos muros enegrecidos e telhados pardos, dentro da lógica tipificada de uma

estendia-se pela encosta soalheira até aos lameiros de Rabo-de-gato. Esta pobreza generalizada ainda era evidente nos anos 70 do século passado onde a par do desconforto das habitações, “todas de telha vã, com as paredes nuas, sem cal e

argamassa, francas ao vento, ao frio e ao rigor das intempéries” (Ribeiro, 1970),

impressionava o abandono generalizado das crianças entregues à sua sorte.

Ainda que esporádicas, sobram algumas casas graníticas com bom aparelho e tradicionais espigueiros, postados na sua presença austera, como se fossem sentinelas do abandono em território ermo, esquecidos no tempo pelo desuso crescente, inerente à perda da sua vocação tradicional (Campos; Carvalho, 1999), dispostos em ruelas sinuosas onde se suspendem alpendres, escadas, varandas e a silenciosa voz das pedras, prolongando-se por outros elementos identitários, tais como: eiras, pias graníticas e fornos abandonados, afinal os testemunhos de uma antiga e pujante actividade olárica (Campos; Carvalho, 1999; Tapada, 2006). Contudo, essas antigas evidências agrícolas relacionadas com a intensa ocupação dos solos agricultáveis evidenciam na sua globalidade um complexo contexto rural onde “a agricultura é (…) o mundo da

diversidade” (Cavaco, 1999:22) e um espaço de relevante importância no contexto de

uma reserva cultural, social e ambiental de que a comunidade local é um evidente testemunho (Figueiredo, 1999) pese a sua especialização na produção olárica.

O impressionante aumento populacional da freguesia e sobretudo de Bisalhães deveu-se seguramente ao impulso das produções oláricas coincidente com a expansão e obsessão vinhateira duriense da segunda metade do séc. XVIII, visto tal não ser possível pela agricultura tradicional pois, os terrenos disponíveis, além de escassos eram insuficientes (Fernandes et al, 2008).

Aliás, já um relato de 1721 acentua o carácter deficitário de bens alimentares, referindo que as produções são: “pão medíocre (…) muita castanha, alguns legumes,

algum vinho para gasto da terra e algumas frutas de todo o tempo, nos lugares baixos”

(Sousa; Gonçalves, 1987:546), enquanto nas povoações mais altas viviam uma vida de montanha onde a prática da vezeira era corrente, reforçando o ancestral sistema de entreajuda comunitária.

Este dinamismo municipal de Mondrões, teve naturalmente repercussões no vizinho lugar de Bisalhães com quem a vila tinha que repartir a água proveniente do longo transvase do rio Sordo que depois de percorrer longos quilómetros vinha irrigar campos e abastecer as manufacturas cerâmicas e a prolífera população que atingiu número relevante em todo o séc. XVIII (Dinis, 2000). Aqui, as nascentes próprias eram

a poça da “Mãe-de-água”, a mina de cimo de “Bila” que servia o núcleo mais alto da aldeia e a velha fonte das Castelhadas, que abastecia o centro e fundo do povo (Campos; Carvalho, 1999).

A situação geográfica das duas localidades favoreceu em muito o dinamismo artesanal das localidades, por estarem próximas de Vila Real (importante mercado para venda dos seus produtos), dos barreiros de Parada de Cunhos, de várias vias de comunicação e finalmente dos limites da Demarcação Pombalina a partir de 1756 (Fernandes et al., 2008).

Por contraponto ao carácter monumental da sede da vila, onde se acentuava o edificado secular da burguesia rural local, Bisalhães evoluiu para um generalizado bairro oleiro periférico e acentuou a sua quase exclusividade produtiva de cerâmicas. Captou então novos artífices e estruturou o seu operariado em células familiares, adquirindo centralidade face aos outros centros produtores de Vila Real, mas também de S. Pedro de Paus, de Córdoba e de Barrô na margem sul do Douro e ainda de forma mais vincada com o centro oleiro de Gondar em Amarante (Dinis et al. 2000).

O Douro iniciava então uma espiral de atracção vinhateira onde se surribaram ermos, se edificaram quintas e novos povoados, se acolheram fluxos migratórios e se engrandeceram as cidades e vilas durienses (Barreto, 1993) e a terra dos louceiros liderou o negócio dos barros na região, durante quase 3 séculos.

3.

Incertezas e omissões

A variada investigação que se tem vindo a desenvolver, há mais de cem anos, sobre a louça negra de Bisalhães, assenta por norma numa sólida fonte, que vem reafirmar a existência de produções e que legitima historicamente a ancestralidade da produção de artefactos de barro nesta freguesia. Ela sustenta-se na “Relação de Vila

Real e seu termo”, datada de 1721 que, ao referir-se a Mondrões, atesta que “nos ditos lugares baixos, se fabrica loiça de cozinha, que trazem a vender a esta vila, e pelos lugares do termo” (Sousa; Gonçalves, 1987). Enquanto a primeira referência à

produção de loiça na freguesia de Mondrões surge nesta data, o pároco da vizinha freguesia de Lordelo já refere a sua produção nesta localidade em 1706, dizendo que aí

“se faz muita louça de que se provê toda esta comarca” (Costa, 1868).

A instalação das primeiras oficinas em Mondrões, remontarão pelo menos na segunda metade do século XVII, suportando esta convicção nalguns indicadores, em

especial fontes setecentistas (Dinis, 2000:107; Fernandes, 2008), através das quais foram detectadas duas dezenas de artífices, designados como oleiros ou paneleiros, distribuídos pela sede da freguesia e por Bisalhães.

Porém, a tradicional referência a esta última como denominação mais conhecida, associada ao local de produção deste tipo de louça, atestará, não só a relevância do centro olárico existente neste lugar, como também a persistência dos respectivos oleiros, que souberam acompanhar as mudanças dos tempos e fazer com que a produção sobrevivesse até ao presente (Campos; Carvalho, 1999; Tapada, 2005; Fernandes, 2008).

Tais aspectos da identidade do lugar, sustentam-se no elevado, ainda que parcial, número de artífices que já trabalhavam os barros no século XVIII nestas duas localidades como atestam as diferentes fontes documentais e Dinis (2000 e 2003) e Fernandes (1996 e 2008) bem demonstram e na afirmação crescente de Bisalhães como símbolo deste modelo produtivo e largamente referenciado no território.11Contudo, esta afirmação nem sempre é linear nas fontes apresentadas como se evidencia no facto de, no inquérito paroquial de Lordelo de 1796, constar a existência de 8 louceiros nesta localidade (Mendes, 1995: 499), não sendo no entanto plasmados neste mesmo inquérito, para a freguesia de Mondrões, os oleiros aqui existentes, sendo a mesma ausência inexplicavelmente verificada noutra inquirição de 1758 da responsabilidade do Padre Manuel Pereira, Cura Coadjutor de São Tiago de Mondrões, quando a existência de louceiros em Bisalhães e em Mondrões deveria ser muito expressiva (Dinis, 2000).

Outros elementos acentuam a recorrente e estranha tese da “omissão”, referindo- se a esse pretexto e a título de exemplo que, em 1709, dois oleiros vindos de fora se radicaram em Bisalhães, aqui casaram e desenvolveram a sua actividade natural (Dinis, 2000: 15-25) e na sede da freguesia, um largo ostenta, em nome desse longínquo passado, o topónimo “Soenga” sem que estes factos tenham sido referidos na freguesia.

11 Dinis (2000:97/144 e 2003:62) e Fernandes (1996:11/36). Dinis (2003:61) sugere também que, considerando a matriz técnico-formal e as fontes documentais, o impulso da olaria aqui, estaria relacionado com a emigração de oleiros de São Martinho de Mouros – Resende para a região o que não parece por ora absolutamente provado, verificando-se antes um processo de atracção do cento mais poderoso.

O mesmo autor tem analisado também as relações entre as olarias de Bisalhães-Mondrões e a de Gondar (Amarante), particularmente no século XVIII, nomeadamente através das relações familiares estabelecidas com casamentos. Mas, seriam os oleiros considerados como tal apenas em Gondar e em Bisalhães seriam lavradores uma vez que a agricultura era a actividade predominante e mais valorizada socialmente? Ou seriam oleiros em Bisalhãesosrecém chegados de Gondar e ainda não detentores de terra não lhes sendo por isso conferido o título de lavrador?!

Nos registos paroquiais, aos oleiros terá sido dada uma outra classificação profissional, enquadrando-os noutras actividades e na ligação mista, entre outros, aos trabalhos da terra (Dinis, 2000; Fernandes, 2008) surgindo omissos quanto à sua actividade e integrados noutras classificações profissionais socialmente menos penalizadoras (Dinis; Amaral, 2003).

E assim continuará no decurso dos tempos. Além de trabalharem por conta própria, os oleiros, daqui naturais ou comprovadamente chegados de outros centros produtores de S. Pedro de Paus, de Gondar e da Cumieira, trabalhavam por conta de outrem, «à jorna», com ou sem comida incluída (Fernandes, 2008).

E a sina mantém-se, pois, ainda em meados do século passado Giese (1958), em visita efectuada a Bisalhães, informou não saber “ao certo quantos oleiros exercem

ainda a sua profissão, porque, curiosamente, fazem segredo do seu número …”.

Também Ribeiro (1970), informou que existiam 20 oleiros activos, “(…) na

generalidade, vivendo só da sua arte, não possuindo qualquer propriedade”, enquanto

Manuel Martins, o oleiro mais antigo, hoje com 87 anos, diz que em 1945 trabalhavam nesta actividade 32 oleiros, enquanto outros afirmam serem “60 e tal” (Campos; Carvalho, 1999). Já Cesário Martins, um dos oleiros em actividade, para evitar dúvidas, elenca os nomes de 55 oleiros que ano de 1947/1948 desenvolviam em pleno esta actividade (Tapada, 2006:53) o que vem de encontro ao que expressaram as viúvas mais idosas, dizendo que: “toda a aldeia vivia desta arte e que a aprendizagem dos jovens

começava pelos 8 anos de idade”, o que é confirmado também nos questionários

preenchidos pelos oleiros que confirmam esta iniciação precoce no trabalho dos barros, preparando-os antes do tempo, para as árduas lides do resto das suas vidas (Tapada, 2006; Fernandes, 2008).

Fotografia 10: Pormenor da louça preta

Com efeito, a actividade olárica raramente aparece descrita ou então, apresenta- se omissa e mergulhada em contradições quanto ao número de artistas a operar e aos seus impactos na região, embora estivesse profundamente enraizada na economia e na sociedade dos lugares (Costa, 1868), assente num conjunto alargado de micro empresas de base familiar, funcionando de forma autónoma e debaixo de uma competição feroz.

A produção média diária atingia cerca de 30 panelas ou de 50 alguidares, podendo atingir entre 70 a 80, quando “bem-dispostos” pois em cada dia procuravam trabalhar um modelo, tendo em vista atingir mais produção (Tapada, 2006:44). E à mulher ou ao patrão que contratava esses assalariados/oleiros, competia preparar o barro, assegurar as lenhas e cozer, vender a louça e transportar a roda que se desmontava em duas partes, facilitando o seu transporte de casa em casa, mantendo-se este costume até meados do século XX (Fernandes 1996:24; Campos e Carvalho, 1999).

Capítulo V

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