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Gestão Democrática: Uma Utopia ou Uma Proposta Real?

Capítulo II A Gestão Democrática na Escola Pública Estadual

2.3. Gestão Democrática: Uma Utopia ou Uma Proposta Real?

A gestão democrática como utopia se refere à aspiração que se tem por uma gestão que seja democrática e possua mecanismo que insiram seus atores numa cooperação mútua em prol da escola, do aluno, da educação e da sociedade como um todo.

Nesse sentido, uma administração utópica seria uma administração voltada para atividades integradoras com vistas a uma gerência democrática e ordenada, onde profissionais educadores e profissionais do âmbito da escola, além de entidades de associação de pais e outras, conseguissem se articular promovendo ações que trouxessem respostas aos vários anseios que perpassam o contexto democrático da gestão democrática da escola pública.

Assim, a gestão democrática escolar deixa de ser uma utopia e passa a ser uma proposta real que vem sendo discutida ao longo do tempo; e todas as vezes que se propõe uma gestão democrática “(...) na escola pública de 1º e 2º graus que tenha efetiva participação de pais, educadores, alunos e funcionários da escola isso acaba sendo considerado como coisa utópica” (PARO, 1998, p. 9).

Por outro lado, uma gestão democrática que tenha como alvo as escolas públicas não pode deixar de ser pensada pelos órgãos responsáveis pela educação no Brasil. Muito embora, a gestão democrática abra espaços para novos participantes na administração, que podem inclusive dificultá-la, ainda assim, torna-se uma administração transparente e participativa onde os gestores devem cumprir seus papéis; uma vez, que estão propensos à vigilância dos vários sujeitos que passam a participar nessa nova forma de administração.

No contexto que envolve a proposta real da gestão democrática na escola pública existem os interesses que geram conflitos, já que numa escola de gestão democrática a classe educadora, bem como a comunidade, passa a interferir de forma significativa na sua gestão, fato que tende a por de lados práticas dominadoras que interessam a algumas

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esferas da sociedade. Tem-se que a gestão democrática possibilita uma descentralização do poder, deixando esse, de ficar concentrado nas mãos de alguns partícipes do processo e, passando agora, a ser exercido por todos de forma igualitária. É o que afirmam Bordignon e Gracindo (2002):

O poder não se situa em níveis hierárquicos, mas nas diferentes esferas de responsabilidade, garantindo relações interpessoais entre sujeitos iguais e ao mesmo tempo diferentes. Essa diferença dos sujeitos, no entanto, não significa que um seja mais que o outro, ou pior, ou melhor, mais ou menos importante, nem concebe espaços para a dominação e a subserviência, pois estas são atitudes que negam radicalmente a cidadania. As relações de poder não se realizam na particularidade, mas na intersubjetividade da comunicação entre os atores sociais. Nesse sentido, o poder decisório necessita ser desenvolvido com base em colegiados consultivos e deliberativos (BORDIGNON e GRACINDO, 2002, p. 151-152).

Todavia, há que se cuidar para o desenvolvimento da gestão democrática da escola pública, uma vez que, com o acirramento da indiferença da classe dominante, a gestão democrática não venha essa a tornar apenas uma aspiração, pois da indiferença criada pelas classes dominantes, pode acontecer que ela passe a manipular de forma velada a legislação educacional tornando-a estratagema ideológico, prometendo exatamente o que não pretendem conceder.

Assim, os grupos que possuem interesses voltados para uma gestão democrática da escola pública, devem lutar por esses objectivos, servindo-se também da própria legislação como um instrumento de garantia desses direitos. Pois é fato recorrente o abuso das classes dominantes com relação à instrumentalização das leis em benefício próprio e em detrimento do restante da sociedade. Desse modo, é que, diante da crítica da possibilidade da gestão democrática da escola pública, devem existir propostas de nível democrático com vistas a objectivos transformadores que visem articulações de interesses dos seus vários participantes. Sendo assim, a gestão democrática deve ser vista como uma ferramenta que visa alavancar a estrutura da escola pública, contribuindo para a real democratização dessa instituição como bem destaca Mendonça, quando diz que:

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A luta pela democratização dos processos de gestão da educação no Brasil está relacionada aos movimentos mais amplos de redemocratização do país e aos movimentos sociais reivindicatórios de participação. Na sua especificidade, porém, esta luta está também e particularmente vinculada a uma crítica ao excessivo centralismo administrativo, à rigidez hierárquica de papéis nos sistemas de ensino, ao superdimensionamento de estruturas centrais e intermediárias, com o consequente enfraquecimento da autonomia da escola como unidade da ponta do sistema. (MENDONÇA, 2000, p. 475).

Essa luta pela democratização do espaço educacional também é corroborada por Antunes (2002), quando afirma que esse processo é visto “como uma das formas de superação do caráter centralizador, hierárquico e autoritário que a escola vem assumindo ao longo dos anos...”.

Nesse caso, à proporção em que se conseguir “(...) a participação de todos os setores da escola - educadores, alunos, funcionários e pais – haverá melhores condições para pressionar escalões superiores a dotar a escola de autonomia e de recursos” (PARO, 1998, p. 12).

Numa perspectiva democrática voltada para gestão da escola pública, é possível pensar uma escola administrativamente democrática, pois seu cotidiano é um lugar de inúmeras e diversificadas práticas, as quais, por sua vez não se sustentam sem uma concepção de sociedade ou de mundo. Assim, a diversidade de práticas está em permanente movimento no cotidiano da escola, seja para seu êxito seja para seu fracasso. Deve ser a escola, um espaço criador, gerador de conhecimentos úteis à sociedade, fazendo com que seus componentes (em especial, nesse caso, os alunos) sejam “explorados” em suas potencialidades e habilidades. É o que nos traz, nesse aspecto, Rios (2003) ao declarar que “é tarefa da escola desenvolver capacidades, habilidades e isso se realiza pela socialização dos conhecimentos, dos múltiplos saberes”.

Diante dessa observação, a gestão democrática da escola pública deixa de ser não apenas uma aspiração utópica, para ser compreendida como uma necessidade real dentro da sociedade contemporânea, uma vez que não é mais possível aceitar a

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interferência político-partidária na indicação de dirigentes escolares, procedimento notadamente clientelista. Devemos como frisam Santos e Avritzer (2002):

procurar levar a sério a aspiração democrática, recusando aceitar como democráticas, práticas que são caricatura da democracia e, sobretudo, recusando aceitar como fatalidade a baixa intensidade democrática a que o modelo hegemônico sujeitou a participação dos cidadãos na vida política (SANTOS e AVRITZER, 2002, p. 46).

Por outra parte, torna-se necessária a concepção de que a gestão democrática da escola pública não pode ser simples regimento vinculado à lei ou decreto, ela deve ser vivenciada dentro da escola, onde seus partícipes se tornem ativos na sua construção e sustentação. Pois, no mais das vezes, o que acontece é o apropriamento do gestor eleito, que se torna verdadeiro tirano. Nesse sentido:

Experiências concretas evidenciaram que a repetição de práticas autoritárias e de relações sociais antidemocráticas, mesmo a partir da adoção das eleições continuaram a coexistir no dia-a-dia da escola. Levantamentos empíricos constatam que a repetição de tais práticas vem resistindo, sobretudo, quando a figura do director encarna o poder, centralizando as decisões sem a participação do coletivo da escola, justamente, pela ausência de mecanismos institucionais que viabilizem o controle de sua ação gestionária (COSTA, 1998, p. 106).

Para a existência da gestão democrática na escola pública faz-se necessário remover os empecilhos que lhe travam o desenvolvimento, para que, por fim, seus representantes exerçam seus mandatos, tendo como horizonte os programas elaborados coletivamente, de modo que os eleitores possam acompanhar e fiscalizar a sua execução.

Dessa forma, é que uma gestão escolar ganha largo aspecto de administração democrática, uma vez que tem em vista a parceria com os vários atores que dão à dinâmica necessária para que a escola desempenhe seu papel dentro da sociedade. Para isso, a democratização da gestão precisa atuar como proposta concreta, permitindo, de fato, a participação de todos os envolvidos. Sobre esse assunto Schneckenberg (1999) fala que “qualquer proposta inovadora referente a políticas educacionais somente terá êxito se o gestor e os membros internos da escola estiverem efetivamente envolvidos no processo” .

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Assim, no sistema educacional, deve-se ter em vista que a eficácia da administração preocupa-se com a consecução dos objectivos intrinsecamente ligados aos aspectos pedagógicos, sendo que a capacidade administrativa será medida pelo alcance dos objectivos educacionais propostos, bem como através da participação popular.

Com relação a aspectos que envolvem conflitos e interesses na gestão democrática, como aspiração, tem-se que a identificação do seu tipo de gestão pode se tornar difícil em virtude das ações de forças exteriores como, por exemplo, a da influência política na direção da escola, o que pode dificultar ou mesmo inviabilizar a gestão, perdendo ou deixando de possuir qualquer grau de eficiência e eficácia nesse sentido. Sendo que tal fato pode repercutir na opinião do público interno (supervisores, professores e alunos) e no público externo (pais de alunos e comunidade em torno da escola).

Pensando nisso, afirma-se a aspiração da gestão democrática com a participação popular, onde a dinâmica de sua organização pode refratar qualquer investida de políticos ou demais sujeitos interessados em manipular a direcção da escola em benefício próprio, porque essa forma de gestão conta com a presença da população em seu interior, onde todos podem dar sugestões e participar democraticamente.