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O YouTube começou a ter um vertiginoso crescimento como negócio depois de ser vendido ao Google. Em 2007, o processo de “monetização” começou a acontecer por meio do Programa de Parceria no qual os criadores de conteúdo deveriam ser pagos por vídeos que se tornassem muito populares74. Atualmente, além da “monetização”, a empresa oferece uma premiação em forma de reconhecimento dos canais mais influentes e estes recebem uma placa chamada de botão play. Um canal que bate a marca dos 100 mil inscritos, ganha um play de prata; ao alcançar a marca de 1 milhão, o play é de ouro; 10 milhões, play de diamante e a mais recente é de 50 milhões, o play de rubi.

Partindo do processo paulatino de remuneração na plataforma, a função mercadológica dos canais fica cada vez mais evidente, em especial, com o surgimento de vários manuais de técnicas demonstrando como angariar mais seguidores e ter um canal de sucesso. São exemplos desses manuais: Bota a cara e faz: 15 dicas para começar um canal no YouTube,

Checklist: 15 otimizações de SEO para seus vídeos brilharem no YouTube, O Manual do criador de conteúdo no YouTube para marcas.

Assim como Felipe Neto, muitos continuam apostando no YouTube como uma oportunidade de alcançar a fama, que antes parecia tão distante e, agora, parece tão próxima de se tornar realidade. Esta é a ideologia com a qual a plataforma se apresenta. Ela encarna a máxima de que o sucesso, ali, depende apenas do esforço e da criatividade de cada um. Isso faz do conteúdo dos canais, o resultado de uma instrumentalização constante do trabalho das equipes.

Como exemplo da instrumentalização do trabalho nas equipes que constroem o conteúdo de cada canal de sucesso é possível citar aquilo que está para além do ar de familiaridade e pessoalidade com que Felipe se dirige aos seus seguidores: o agenciamento da nova fase de Felipe pela empresa Take4 Content. A empresa tem como sócios o ex-executivo da Rede Globo João Pedro Paes Leme, Cassiano Scarambone e o youtuber Luccas Neto, irmão de Felipe, que, mesmo não sendo sócio, tem uma atuação importante na empresa. O foco da

74Um breve histórico de como o Youtube ganhou a internet. Gizmodo, 12 mai. 2015. Disponível em

organização é o gerenciamento e a curadoria de vídeos no YouTube para marcas e influenciadores75. No site da empresa, encontra-se a seguinte apresentação:

Aliando a experiência de profissionais renomados do mercado à ousadia de jovens talentos que surgem nas áreas de roteiro, direção, produção, computação gráfica e edição, a Take4 Content vem se destacando entre concorrentes de mesmo porte e no geral.

Atendimento personalizado, soluções criativas, rigor no cumprimento de prazos e agilidade sem comprometer a qualidade dos trabalhos. Esses são alguns dos compromissos que assumimos. E o resultado desse trabalho é refletido na sólida carteira de clientes.

Hoje, a Take4 Content é a terceira maior produtora audiovisual do Brasil. Dominamos as mídias tradicionais e apostamos nas novas plataformas digitais. Sempre atentos às tendências para desenvolver o melhor conteúdo para os clientes76.

A Take4 Content se bifurca em duas linhas de atuação. A primeira sendo a curadoria de conteúdo para o YouTube, que pode ser feita para pessoas, marcas e empresas a partir do entendimento do público e da experiência. A segunda é a inteligência digital, na qual é feito o trabalho com dados e algoritmos para alcançar maior eficácia nos resultados. Em relação a esta segunda linha, a empresa conta com a parceria de uma ferramenta, a Fan Hero – companhia especializada no desenvolvimento de aplicativos na área de entretenimento – que serviu de base para o lançamento do aplicativo Felipe Neto.

O encontro entre Felipe Neto e a Fan Hero se deu quando João Pedro, após pedir demissão das Rede Globo e passando uma temporada nos Estados Unidos, foi apresentado por um amigo aos acionistas da empresa, que queria se inserir no Brasil. Como eles precisavam de um influenciador já experiente na internet, ele lembrou de Felipe Neto, com quem tinha feito um trabalho anos antes na Globo. Exatamente esse era o momento em que Felipe tinha vendido sua produtora, a Paramaker, e não atualizava seu canal no YouTube há algum tempo. Desta forma, se firmou uma parceria e Felipe colocou seu irmão como um dos sócios da empresa77.

Pedro Paes Leme acentua a estratégia totalizante que faz do aplicativo um espaço mais interessante para a empresa do que o YouTube: em entrevista, ele diz: “É como se fosse um outro YouTube, mas com uma timeline que mostra um só canal, não uma série deles”, e prossegue: “O sistema também nos dá ferramentas para gerenciar melhor os canais que

75Que tal deixar de ser executivo na Globo para empreender com influenciador de sucesso? Projeto Draft.

Disponível em <https://projetodraft.com/que-tal-deixar-de-ser-executivo-na-globo-para-empreender-com- influenciadores-digitais-e-o-que-ele-fez/>. Acessado em 24 jan. 2019.

76Take4 Content. Disponível em <http://www.take4content.com/empresa> Acessado em 24 jan. 2019.

77Que tal deixar de ser executivo na Globo para empreender com influenciador de sucesso? Projeto Draft.

Disponível em <https://projetodraft.com/que-tal-deixar-de-ser-executivo-na-globo-para-empreender-com- influenciadores-digitais-e-o-que-ele-fez/>. Acessado em 24 jan. .2019.

trabalhamos no YouTube, para entender o comportamento da audiência e, com inteligência artificial, traçar tendências claras para o futuro”. Não é à toa que Felipe, em seu vídeo ADM, faz uma forte apelação para que seus inscritos instalem seu aplicativo:

Se vocês quiserem continuar interagindo comigo tem o Twitter, tem o Instagram, tá aparecendo na tela pra vocês me seguirem. Principalmente Twitter e Instagram são as ferramentas que eu mais uso e, principalmente, acima de tudo, o meu app que você pode baixar na Apple Store, Google Play, baixa o meu aplicativo. A gente tá começando a produção de algo muito legal pro aplicativo, com certeza vocês vão gostar muito do que tá vindo por aí. Vão ter vários conteúdos exclusivos. Então, baixa o meu aplicativo que lá os comentários vão tá sempre liberados e o anunciante nunca vai mandar no meu conteúdo, no meu aplicativo. Nunca! As regras lá sou eu que faço! (Felipe Neto, 13.03.2018, Apêndice F).

Declarando que, acima de tudo, o aplicativo deve ser seu canal com os fãs, ele está dizendo que o que está acima de tudo em sua carreira é o próprio negócio no qual ela se tornou. Sob a consultoria de Take4, Felipe se propôs a ser a experiência pioneira da empresa e a primeira medida foi voltar a fazer vídeos para seu canal, porém abandonando o formato “Não faz sentido”. A partir de então, o “personagem” mal humorado, de óculos escuros e que falava mal das modas adolescentes deu o lugar para um outro Felipe. Orientado por João Pedro, parou ainda de falar palavrões em seu canal e passou a escolher os temas de seus vídeos com muito mais receio, sem esquecer o ritmo de 60 vídeos mensais.

Tudo indica que Felipe é um funcionário terceirizado da empresa de João Pedro em outra organização, o YouTube. O ex-executivo da Globo diz que os formatos para a geração de receita na Take4 são: a remuneração do próprio YouTube para os influenciadores; campanhas publicitárias e patrocínios nos canais dos irmãos; o pagamento que recebem pela gestão do canal de outras personalidades ou marcas; as receitas geradas pelo aplicativo de Felipe (parte deste público pagam uma assinatura mensal para terem acesso a conteúdo exclusivo), além do licenciamento de produtos dos irmãos78.

O talento artístico, no contexto das novas mídias digitais, seria o talento em atingir ao máximo as metas de vendas. A divisão minuciosa de cada atividade laboral, calculando cada passo de uma personalidade e sua forma de apresentação em uma plataforma, como um ciclo vicioso de estratégias mercadológicas, foi apontada por Adorno (2008b) como uma das características da indústria cultural, assim como o fato de tais estratégias se formularem com base em dados coletados do público. Destarte, os produtos culturais são oferecidos com uma

78 Idem.

aparente diversidade para supostamente atender às necessidades das massas. Assim, se fomenta um ciclo no qual as necessidades são produzidas pela mercadoria.