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Mapa 3 Mapa representando o número de cursos superiores oferecidos (1998-

2.2 O governo de FHC

A Reforma Agrária no governo FHC iniciou-se baseada na premissa do declínio da população rural, reforçando políticas anteriores que não sustentavam um projeto social que desse sentido concreto à reforma. Para Martins (2003, p.175), “naquele momento, havia setores no governo que ainda não tinham entendido a necessidade da reforma e a viam como um paliativo para a agressividade dos movimentos sociais”.

Em 1994, FHC foi eleito presidente e realizou a mais ampla política de assentamentos já vista no país, porém, defendia a tese de que não existiam mais latifúndios no Brasil e de que o número de sem terras se limitava aos que estavam acampados. Portanto, o número de acampados quadriplicou ainda no primeiro mandato de FHC, causando grandes tensões territoriais que culminariam em massacres dos trabalhadores sem terra.

Os massacres de Corumbiara (RO) e Eldorado dos Carajás (PA) foram propulsores para a tomada de atitude do governo FHC. Portanto, o governo acreditava que assentando

famílias acampadas daria fim ao problema da reforma agrária, ignorando as questões estruturais da questão fundiária (COELHO, 2016).

No seu segundo mandato o governo de FHC mudou a estratégia e passou a atuar de forma repressiva com os movimentos de luta pela terra, criminalizando a luta. Iniciou-se uma política de mercantilização da terra e o governo passou a investir na Reforma Agrária de mercado, que se tratava do financiamento de terras pelo Estado e que contrariou os movimentos de luta pela terra (FERNANDES, 2010).

A ampla política de assentamentos realizada pelo governo de FHC pode ser atribuída à pressão dos movimentos sociais e de alguns intelectuais que aderiram à causa da Reforma Agrária. A ampliação dessa política de assentamentos refletiu nos números de famílias assentadas em todo pais, como é possível analisar por meio dos dados apresentados pelo DATALUTA (2008).

De acordo com os dados do DATALUTA (2008), no primeiro governo de FHC, entre o período de 1995 a 1998, foram assentadas 299.863 famílias. Essa representação pode ser vista a seguir, através da comparação dos mapas da questão agrária dos anos de 1995 e 1999, que retrata o número de famílias assentadas, registrando o crescimento quantitativo em todo território nacional ao final do primeiro mandato de FHC.

Mapa 1 - Representação comparativa do número de famílias assentadas 1995-1999

Ao final do primeiro mandato de FHC, no ano de 1998, foi realizado o maior número de assentamentos por desapropriações, registrando um número de 605 desapropriações. Em seu segundo mandato houve um declínio dessa modalidade, tendo uma retomada no crescimento somente nos anos de 2004 e 2005, primeiros anos do primeiro mandato do presidente Lula. (LEITE, 2019)

No Quadro 3, construído por Carter e Carvalho (2010), é possível identificar o crescimento do número de famílias assentadas no primeiro governo de FHC entre os anos de 1995-1998 e, posteriormente, no primeiro governo Lula, de 2003 a 2006.

Quadro 3 - Reforma Agrária no Brasil (1979-2006) por período presidencial

Fonte: Carter e Carvalho (2010, p. 296).

Para Carter e Carvalho (2010), de 1985 a 2006, apesar de períodos com expressivo crescimento no número de famílias assentadas, todos os governos tinham características de uma reforma agrária conservadora, pautados em uma “repartição de terras sob pressão social, processos administrativos lentos e complicados, violações frequentes de direitos humanos com ampla impunidade, distribuição residual de terras, e escasso apoio aos assentamentos” (CARTER; CARVALHO, 2010).

Para Fernandes (2010), apesar do número de assentamentos criados durante o governo de FHC, houve uma precarização dos assentamentos por não se garantir infraestrutura básica e crédito agrícola e de investimento, o que descapitalizou as famílias. Tal realidade nos leva a afirmar que de fato o governo de FHC não tinha um projeto de Reforma Agrária no início do primeiro mandato, ao passo que não interveio na injustiça fundiária no país, combatendo os meios de obtenção ilegal de terras.

A precariedade dos assentamentos trouxe a necessidade de que os sujeitos da reforma se reinventassem, criando sua própria identidade, capaz de ocupar o protagonismo na história e, de certa forma, ganhar reconhecimento social. Neste contexto, para Martins (2003, p. 176), a “Agricultura Familiar surge como sujeito social de uma reforma agrária, e de acesso a terra, e um direito alternativo ao uso da terra”. Para o autor, os conflitos por terra dos movimentos sociais foram capazes de desocultar a agricultura familiar que estava “embutida na grande propriedade ou na sua periferia, ou nas áreas abandonadas ou desprezadas pela agricultura” (MARTINS, 2003, p. 176).

Na segunda metade do primeiro mandato, FHC inicia uma política de Reforma Agrária, nomeando Raul Jungmann para o Ministério Extraordinário de Reforma Agrária e, depois, Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). A crença de que o Brasil já não era um país agrícola foi colocada em dúvida a partir dos conflitos no campo que aconteceram mesmo após o grande número de assentamentos, deixando à mostra que não havia um projeto de Estado para a Questão Agrária no país e que era emergencial um projeto que fosse capaz de atender à demanda dos trabalhadores rurais. O governo e a própria sociedade ficaram alertas ao fato de que as tensões no campo refletiam a realidade de um país com um grande número de trabalhadores rurais e sérios problemas fundiários a serem resolvidos (MARTINS, 2003).

No Quadro 4 apresentamos as principais ações do governo FHC em relação à Reforma Agrária e aos seus desdobramentos.

Quadro 4 - Conjuntura da Reforma Agrária no Governo FHC (1995-2002)

1995 Criação do Gabinete Extraordinário de Política Fundiária, que depois se tornou o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).

1995 Massacre de Corumbiara. 1996 Massacre de Eldorado dos Carajás. 1997 Aconteceu a Marcha Nacional do MST.

No primeiro governo houve uma ampla política de assentamentos. Assentando famílias que estavam acampadas. No segundo governo houve a reforma agrária de mercado, que era o financiamento das terras pelo estado.

1998 Criação do PRONERA com o objetivo de:

“fortalecer a educação nas áreas da Reforma Agrária, estimulando, propondo, criando, desenvolvendo e coordenando projetos educacionais, utilizando metodologias voltadas para a promoção do desenvolvimento sustentável”.

2001 Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo.

Organizado por Castro Paula (2019). Fonte: CPT, Dataluta, Fernandes (2010), Medeiros (1989), Coelho (2016), MEC.

No quadro é possível visualizar pautas importantes que culminariam em programas e políticas voltadas para o campo e para a Educação do Campo. Ao pensarmos nos problemas

fundiários presentes no país, havia uma moção dos movimentos sociais, algumas organizações e intelectuais de que a Educação deveria fazer parte da pauta da Reforma Agrária, o que pressionaria para a criação de uma política pública para a Educação do Campo. No ano de 1997, ainda no primeiro mandato de FHC, mais de 700 educadores do meio rural, em sua maioria professores do primeiro grau2, reuniram-se em um evento na Universidade de Brasília (UNB) para debaterem as questões educacionais dos sujeitos da Reforma Agrária. O Encontro Nacional de Educadores da Reforma Agrária fazia parte da proposta do MST para divulgar suas preocupações que estavam além da posse da terra.

No ano de 1998, ao final do primeiro mandato de FHC, após amplo debate entre o governo, movimentos sociais, organizações sociais e intelectuais, foi aprovada a criação do Programa Nacional da Reforma Agrária (PRONERA). Em 2004, no início do governo Lula, os movimentos sociais conseguiram aprovar as Diretrizes Operacionais para a Educação do Campo, um importante documento que partiu da premissa de que a Educação do Campo era um projeto coletivo do movimento camponês incorporado ao processo de luta pela terra de trabalho e que era um modelo que estava na contramão do modelo de educação rural vigente (RIBEIRO, 2012).

Podemos destacar marcos normativos dentro do governo de FHC que impulsionaram de forma qualitativa a educação para os povos do campo, incluindo desde a implantação do PRONERA, a elaboração e a implementação das Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo.

A Educação do Campo passa a ter reconhecimento como uma educação que transcendia a educação rural, apenas vista como um perímetro não urbano; ela se apresenta dentro de um “campo de possibilidades que dinamizam a ligação dos seres humanos com a própria produção das condições de existência social” (BRASIL, 2001).