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PARTE I – COLONIALIDADE DO SABER

CAPÍTULO 3 Grade de programação e mulher-máquina

Para começar este debate sobre a grade de programação, destacamos o filme Além do Cidadão Kane109 (1993), documentário produzido pela BBC de Londres sobre

a Rede Globo, no qual é demonstrada a construção da identidade da emissora através de depoimentos de personalidades como Leonel Brizola, Chico Buarque, Dias Gomes, Washington Olivetto etc. São exibidos trechos de algumas atrações da programação da época como o Xou da Xuxa, Fantástico, Domingão do Faustão, Cassino do Chacrinha, novelas de sucesso de público, intercalando com informações da sociedade brasileira e sua desigualdade social constitutiva. A relação com outras emissoras pela disputa de audiência, como TV Tupi, Grupo Bandeirantes e SBT também é apresentada, assim como os processos de concessão pública da Rede Globo e a aproximação da mesma com o regime militar. Vale ressaltar um determinado momento do documentário, em que o comandante Médici, ao inaugurar a televisão a cores no Brasil, diz ser muito bom acompanhar a Rede Globo pois, ao ver as notícias do mundo em outras redes, tudo parece um caos, mas com as notícias exibidas na emissora é diferente, pois a sensação que dá é parecida ao relaxamento de quando se toma um calmante.

Analisando a contemporaneidade, será que sob determinados aspectos, a situação não continua a mesma? Se pensarmos em alguns assuntos, será que tais silenciamentos não foram atualizados? Trazendo esse exemplo específico, percebemos que, através da escolha do que deve ser exibido ou não, a emissora conforma sua programação de acordo com seus interesses políticos e econômicos, mesmo que no discurso oficial o público seja colocado no lugar de honra como se o objetivo final fosse “agradar” o telespectador apenas110.

Partimos da grade como a que conforma uma programação, exibindo determinados programas em horários específicos, sempre levando em consideração o contexto político, social e econômico do país, buscando encapsular as questões, criar o

109 No original Brazil: Beyond Citizen Kane. O filme, que faz referência à Cidadão Kane (1941), de Orson Welles, passou por limitações em relação à exibição no Brasil, gerando polêmicas com outras emissoras, por trazer uma perspectiva crítica que não agradou à Rede Globo. O filme de Welles retrata a trajetória de um magnata da comunicação nos EUA. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=049U7TjOjSA> Acesso em: 12 out. 2019.

110 Sabemos que existem diferenças entre canais que são públicos, a cabo, por assinatura, universitários, dentre outros, mas estamos focando aqui especificamente nos abertos, por serem os que têm grande alcance de público e um deles, a Globo, ser o canal em que são veiculados os programas analisados nesta tese.

115 consenso e apaziguar os conflitos. Esse mapeamento da alteridade gradeada, levando em consideração que a grade da televisão é delimitada, se coloca como uma reatualização de uma prática colonial, pois estar na grade é estar preso e fixado111. Portanto, seguimos pensando tal aspecto de uma maneira menos celebratória e mais problematizadora, analisando mais os processos televisivos e menos os produtos midiáticos enquanto resultados112.

Yvana Fechine113 é uma das autoras que pensa a grade de programação e a

relação da fruição do público com o fluxo televisual, pois, ligada à temporalidade do cotidiano, faz sentido como hábito da população brasileira, que se repete diariamente (FECHINE, 2014), por mais que encontremos variações dependendo de alguns aspectos como gênero, raça, classe, territorialidade etc. Concordamos com a teórica sobre o fato da programação da tv pautar as conversas do cotidiano, os momentos de lazer, os afazeres domésticos e até mesmo o sono, moldando o ambiente familiar e suas interações (FECHINE, 2014).

Pensando a partir do contexto televisivo brasileiro ao longo de sua história, a TV Excelsior é apontada como a pioneira na divisão da programação em faixas, ampliando os turnos onde eram exibidos os programas, pois inicialmente os programas eram ao vivo, e só após a chegada do videoteipe que foi possível gravar os mesmos. Sua concessão foi extinta pelo governo da ditadura militar após alguns embates com o mesmo. A partir dos processos de modernização da televisão brasileira na década de 1970, foram sendo criadas estratégias de comercialização também, diretamente vinculadas ao mercado publicitário, o que colocou a Rede Globo como líder de audiência no país e grande formadora de opinião e de senso comum.

Considerando episódios relevantes da televisão aberta brasileira, um dos destaques que nos interessa é o debate entre os presidenciáveis da época, Fernando

111 Agradecemos a Maurício de Bragança pelas considerações acerca deste ponto na banca de qualificação.

112 Utilizamos também como referência a dissertação de Joana D’Arc de Nantes (2018) sobre a

reassistibilidade de telenovelas mexicanas no Brasil para pensar a grade de programação como ferramenta de construção de identidade de uma emissora. No caso de sua pesquisa, a autora abordou o SBT e a organização dessa grade, destacando alguns elementos específicos, dentre eles: produtos estrangeiros advindos principalmente do México, presença marcante do melodrama nas telenovelas, programas de auditório com presença de plateia, programas voltados ao público infantil em forma de desenhos animados e ficções seriadas, apelo popular visando audiência e venda de produtos, por isso muitas vezes considerada sensacionalista etc.

113 Artigo disponível em <http://www.revistas.usp.br/significacao/article/view/65593/68205> Acesso em: 28 out. 2019.

116 Collor de Mello e Luís Inácio Lula da Silva, ocorrido na Rede Globo em 1989114, que repercutiu bastante, gerando algumas polêmicas. A emissora foi criticada por ter realizado uma edição no debate entre os candidatos, que nitidamente beneficiou Collor. Essa edição, posteriormente considerada um erro pela própria emissora, se configurou como um “tiro no pé” pois demonstra claramente a manipulação de imagens por motivação político-econômica naquela época, prática que continua recorrente já que é constitutiva da indústria cultural. Percebemos, desde essa época, portanto, uma certa “virada popular e populista” da emissora após esse episódio, seguindo um projeto de popularização na televisão aberta como resposta. Esse caso é um dos mais sintomáticos acerca da relação entre mídia e política, devido ao tamanho da emissora e a consequente eleição de Collor, moldando os rumos do país através da preferência de um candidato, porém sabemos que não foi e nem será o último caso.

Trazemos então alguns elementos do discurso institucional da emissora para pensar como se dá essa linha editorial como projeto político, ressaltando os slogans da emissora ao longo das décadas e como eles indicam seu posicionamento que direciona toda a programação daquela época115, como, por exemplo, o Padrão Globo de qualidade116 e o famoso plim, plim. Ao longo de sua trajetória, a emissora teve diversos

114 No site Memória Globo, na categoria Erros, aparecem dois eventos: a cobertura das Diretas Já e o Debate Collor x Lula. Seguem trechos do texto oficial da emissora sobre este último caso: “Em 1989, os brasileiros foram às urnas para escolher o novo presidente da República. Era a primeira eleição presidencial pelo voto direto, depois de 29 anos. O pleito foi bastante disputado. Havia 23 candidatos, entre os quais estavam os líderes dos principais partidos políticos. (...) Entre o primeiro e o segundo turno da eleição, houve dois debates entre os candidatos Collor e Lula, transmitidos por um pool de emissoras. (...) No dia seguinte à sua exibição ao vivo e na íntegra, a Rede Globo apresentou duas matérias com edições do último debate: uma no Jornal Hoje e outra no Jornal Nacional. (...) As duas foram questionadas. A primeira por apresentar um equilíbrio que não houve, e a segunda por privilegiar o desempenho de Collor. Mas foi a segunda que provocou grande polêmica. A Globo foi acusada de ter favorecido o candidato do PRN tanto na seleção dos momentos como no tempo dado a cada candidato, já que Fernando Collor teve um minuto e meio a mais do que o adversário. O PT chegou a mover uma ação contra a emissora no Tribunal Superior Eleitoral. O partido queria que novos trechos do debate fossem apresentados no Jornal Nacional antes das eleições, como direito de resposta, mas o recurso foi negado. Em frente à sede da Rede Globo, no Rio de Janeiro, atores da própria emissora, junto com outros artistas e intelectuais, protestaram contra a edição. (...) Mas o episódio provocou um inequívoco dano à imagem da TV Globo. Por isso, hoje, a emissora adota como norma não editar debates políticos; eles devem ser vistos na íntegra e ao vivo. Concluiu-se que um debate não pode ser tratado como uma partida de futebol, pois, no confronto de ideias, não há elementos objetivos comparáveis àqueles que, num jogo, permitem apontar um vencedor. Ao condensá-los, necessariamente bons e maus momentos dos candidatos ficarão fora, segundo a escolha de um editor ou um grupo de editores, e sempre haverá a possibilidade de um dos candidatos questionar a escolha dos trechos e se sentir prejudicado”. Disponível em: <http://memoriaglobo.globo.com/erros/debate-collor-x-lula.htm> Acesso em: 12 out. 2019.

115 Publicação Quais foram os slogans da TV Globo desde 1970? Disponível em: <https://midiainteressante.com/2015/05/quais-foram-os-slogans-da-tv-globo-desde-1970.html> Acesso em: 30 set. 2019.

116 No site oficial do Grupo Globo, encontramos a seguinte definição para a emissora: “A TV Globo tem sua programação distribuída em quase todo o território nacional, por meio de 5 emissoras próprias,

117 enunciados que funcionavam como discurso oficial e tentativa de aproximação com o público, alguns exemplos são: Globo e você, tudo a ver; Quem tem Globo, tem tudo; Rede Globo, a gente se vê por aqui (slogan durante 7 anos); A gente se liga em você; 100 milhões de uns117. Nesse último, destacamos o enaltecimento e reconhecimento de que se fala para um público imenso, com um alcance territorial maior do que qualquer outro meio de comunicação no país. Tais aspectos demonstram um posicionamento de marca da empresa, como é feito na publicidade, que estabelece cada vez mais relações não subliminares sobre seus objetivos, parcerias e patrocínios118.

Sobre os parâmetros para uma televisão de qualidade, João Freire Filho (2004) é um dos autores que traz considerações acerca da mudança da programação televisiva brasileira em relação aos canais abertos. Segundo o pesquisador, houve uma transformação em termos de conteúdo e abordagem sensacionalistas no sentido de tornar palatável determinados programas e temas após a popularização dos aparelhos domésticos, com o objetivo de consolidar um público cativo.

Diante de frases que se pretendem fortes e de apelo ao público para ampliar sua audiência, nos questionamos: o que a gente não vê, porque foi apagado e editado? E o que a gente não ouve, porque foi silenciado? Dentro dessa programação, historicamente, a representação negra, por exemplo, sempre se dava em noticiários policiais relacionados à criminalidade, denunciando a violência cometida por pessoas negras. Nas telenovelas e programas de auditório, quando se aparecia, os personagens reforçavam determinados estereótipos, reproduzindo diversas formas de racismo119 (blackface, inclusive). Ao longo dos últimos anos, com uma mudança de contexto político, econômico, social e cultural, além da luta constante dos movimentos sociais,

em parceria com empresas afiliadas, e em mais de 100 países, pela Globo Internacional. Reconhecida pelo alto padrão de qualidade, marca que imprimiu desde a sua fundação em 1965, a TV Globo tem uma trajetória que se confunde com a história da televisão no Brasil, sempre pautada por pioneirismo e inovação”. Disponível em: <https://grupoglobo.globo.com/quem-somos/> Acesso em: 1 out. 2019. 117 Plataforma Um milhão de uns. Disponível em: <http://redeglobo.globo.com/milhoesdeuns/> Acesso em: 19 out. 2019.

118 Como episódio recente, temos a comemoração dos 50 anos do Jornal Nacional, com os parabéns dos patrocinadores do jornal pela data comemorativa, com as empresas Crefisa, Cacau Show, Banco Safra, Caoa etc. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ZVrHbNvaHEc> Acesso em: 19 out. 2019. Este é um exemplo nítido do que Adorno e Horkheimer criticavam na indústria cultural, que não dizia respeito apenas ao meio de comunicação propriamente dito, mas também a um sistema mais amplo de dominação e poder ligado a outras áreas, como a publicidade e a propaganda, desde sua criação até o produto midiático como resultado.

119 Sobre este aspecto, indicamos o trabalho de Joel Zito Araújo sobre O negro na televisão brasileira (2004), em formato de tese, livro e documentário. Filme disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=PrrR2jgSf9M&t=42s> Acesso em: 19 out. 2019.

118 a programação das emissoras, neste caso da Rede Globo, também foi sendo modificada, incluindo telenovelas, séries, atrações especiais etc. que traziam personagens antes subalternizados agora como protagonistas, mas não por isso deixando de apresentar estereótipos120.

Antes de entrar nas análises específicas do que os programas de Regina Casé representam na grade de programação da Rede Globo, é preciso fazer uma contextualização histórica de cada época e sua noção de cultura através das políticas culturais121 do país, pensando os momentos em que cada atração de sua trajetória foi

exibido, mostrando como cada contexto também possibilitou a realização dos mesmos. Separamos em dois momentos históricos para detalhar mais, o primeiro das atrações Programa Legal (1991-1992) e Brasil Legal (1995-1998); e o segundo do Central da Periferia (2006) e Esquenta! (2011-2017). Vale destacar também que os dois primeiros eram exibidos no horário noturno em dias da semana (Brasil Legal na Terça Nobre), já os dois últimos eram exibidos no horário vespertino aos finais de semana, configurando uma diferença de público-alvo na faixa de programação.

No contexto dos anos 1990, no âmbito da política cultural, diversas iniciativas alinhadas com o slogan da cultura como um bom negócio, seguindo a diretriz neoliberal da economia, foram difundidas. Uma delas foi a recuperação da legislação de incentivo fiscal através da renúncia de imposto das empresas, deixando a cargo do departamento de marketing das mesmas a decisão de qual projeto aprovado seria patrocinado. No contexto dos anos 2000, com uma nova concepção de cultura validada pelo Ministério da Cultura na gestão Gilberto Gil, abordando a dimensão antropológica da mesma, foram ampliados os projetos culturais que consideravam a diversidade e o tamanho do país, criando os pontos de cultura, por exemplo.

Enquanto no primeiro momento da década de 1990122, o foco estava nas

privatizações de vários aspectos da sociedade, inclusive o cultural, no segundo momento da década de 2000 e 2010, a atenção maior era dada a programas sociais,

120 Podemos destacar as produções com o foco nas histórias de pessoas que ascenderam socialmente via consumo para o que alguns denominavam Classe C ou nova classe média, como as empregadas domésticas, como Cheias de Charme (2012), A diarista (2003-2007) ou moradores do subúrbio como Avenida Brasil (2012), Pé na Cova (2013-2016), Suburbia (2012).

121 São diversos os autores que abordam as políticas culturais brasileiras de maneira crítica e abrangente, dentre eles, Lia Calabre, Albino Rubim e Alexandre Barbalho, que utilizamos como referências. 122 Vale destacar que foi em 1995 que o primeiro curso de Produção Cultural foi criado na Universidade Federal Fluminense, seguido pela Universidade Federal da Bahia em 1996, contribuindo para a profissionalização e o debate acerca da cultura no país.

119 ações afirmativas e incentivo à educação com abertura de novas universidades, causando impacto também na produção cultural brasileira da época. Diante do contexto, se antes os programas de Regina Casé cumpriam determinada “cota” dentro da grade da emissora elitista, após a mudança de contexto político, as atrações comandadas pela apresentadora estavam de certa maneira representando uma parcela da população que veio ascendendo socialmente via consumo. Um dos pontos a serem analisados diz respeito a esse aumento de produções com a tentativa de representar as classes populares em sua potência artística e criativa, mas que acabam reforçando alguns estereótipos.

Levantamos a hipótese da figura de Regina Casé como mulher-máquina da emissora por entender que, através de sua atuação irreverente ao abordar temas populares, a Rede Globo tanto demonstra uma preocupação em abarcar todo tipo de público quanto em representar a maioria da população brasileira em atrações que valorizem as práticas e costumes do povo, mascarando seus interesses comerciais em produtos midiáticos palatáveis, portanto, com representações ambíguas e questionáveis. Já apresentamos as definições trazidas pelos programas na introdução, agora abordaremos alguns exemplos específicos, com falas de Regina Casé e dos convidados nos programas, entrevistas e temas abordados nas atrações. Seguimos analisando a exaltação de determinados aspectos para silenciar outros, com um discurso de celebração das diferenças e do estabelecimento de pontes e diálogos entre classes sociais.

Além das informações já destacadas no primeiro capítulo sobre o programa Um pé de quê? e as performances de Regina Casé, destacamos agora alguns momentos e episódios de outras atrações da trajetória televisiva da apresentadora para ressaltar a narrativa sobre a cultura popular, a celebração da mistura e a representação de favela presentes em seus trabalhos na Rede Globo123. Ressaltamos de antemão a recuperação

de matrizes culturais carnavalizadas124, a defesa de uma visibilidade afirmativa, termo

utilizado por Sarah Nery em seu livro sobre Regina Casé, destacando seu posicionamento de mostrar o que está dando certo e o que pode dar certo na sociedade;

123 Estes pontos estarão presentes na terceira parte, porém com o foco na figura pública de Regina Casé ao pensarmos mais detidamente a colonialidade do ser.

124 Alguns desses aspectos foram trabalhados ao longo da dissertação de mestrado sobre o Esquenta!, analisado até sua quarta temporada em 2014.

120 e a consciência cada vez maior de falar para milhões de brasileiros através do alcance da televisão, conformando intencionalmente determinada identidade nacional.

Nos próximos três tópicos, dividimos alguns programas para fins metodológicos da análise crítica, mas lembramos que tais aspectos atravessam todas as atrações destacadas, a saber: a) cultura popular, focando no Brasil Legal e Esquenta! b) celebração da mistura, focando no Programa Legal e Esquenta! e c) representação de favela/cidade/Brasil, focando no Central da Periferia e Esquenta!.

a) cultura popular

Para debater esse tema complexo, apresentamos a definição da emissora de cultura popular a partir de determinados programas, a saber Brasil Legal (1995-1998) e Esquenta! (2011-2017). Nos interessa questionar que tipos de matrizes do popular são recuperadas, negociadas e reapropriadas no contexto da indústria cultural. Os embates sobre as discussões acerca da cultura popular são muitos e já foram abordados em pesquisas nossas anteriores, tanto na monografia como na dissertação, pensando como as disputas de fazeres e saberes dentro desse campo são permanentes (HALL, 2009).

Se antes trouxemos as propostas de autores do estudos culturais britânicos e latino-americanos, como, por exemplo, manifestações da produção cultural feita pelo povo e para o povo em contraposição ao que é a denominada cultura de massa e cultura de elite, agora observamos o papel de mediação desempenhado pela apresentadora no que tange a essa cultura e suas formas de representação, em uma emissora na qual esta noção de cultura é constantemente associada às festividades, ao carnaval, a uma determinada ideia de “brasilidade”, à valorização e enaltecimento de determinadas manifestações artísticas geralmente estigmatizadas, a partir, portanto, de um enaltecimento dos aspectos positivos e celebratórios dessa cultura (OLIVEIRA, 2017). Em entrevista ao site Memória Globo125, Regina relembra um especial de Natal

na emissora que deu muita audiência, em que sua equipe viajou a Portugal levando lembranças de brasileiros que tinham família por lá, dando origem ao formato do Brasil

125 Disponível em: <http://memoriaglobo.globo.com/programas/entretenimento/auditorio-e- variedades/brasil-legal/fotos-e-videos.htm> Acesso em: 03 nov. 2019.

121 Legal no ano seguinte126. Segundo a apresentadora, o formato era com 3 ou 4 pessoas anônimas pelo Brasil que eram tratadas como celebridades e, ao invés de se falar de determinado assunto, o foco ficava na vida da pessoa escolhida. De acordo com Guel Arraes, o programa era documental127. Esse aspecto de conhecer as pessoas viajando pelo país foi um dos grandes marcos dessa carreira em busca da valorização de quem em geral não aparecia na televisão de maneira positivada. Segundo Regina, não se sabia quem ela iria entrevistar exatamente, já que estavam sempre em busca de pessoas legais