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Há, de fato, cultura surda?

cultura surda

3.1. LITERATURA SURDA CONECTANDO A CULTURA E A IDENTIDADE

3.1.2. Há, de fato, cultura surda?

Karin Strobel, intelectual surda brasileira, tem realizado interessantes análises sobre Cultura Surda. A cultura é um termo em evolução, que sempre muda, em dependência do tempo e do local. Por isso, atualmente existe a dificuldade na compressão do conceito, que não é fixo. Strobel (2013, p. 24) argumenta:

A cultura não vem pronta; daí porque ela sempre se modifica e se atualiza, expressando claramente que não surge com o homem sozinho e sim das produções coletivas que decorrem do desenvolvimento cultural experimentado por suas gerações passadas.

O ignificado da pala a c l a m a iado no deco e do empo. Moreira e Candau (2007) apresentaram cinco significados da palavra e sua evolução no decorrer da história, sendo o primeiro significado relacionado à agricultura; o segundo, como produção social, seguidos pelos significados de desenvolvimento social, formas de vida e práticas sociais. Cada significado é explicado abaixo.

Cultura pode significar agricultura, que tem o propósito de cultivar o solo e/ou a terra, produzir vegetais que deverão ser consumidos pelo homem e pelos animais

po ele c iado . Seg ndo Mo ei a e Canda (2007), e e ignificado da pala a c l a começou a ser utilizado no século XV. No dicionário Michaelis (on line), o primeiro ignificado do e be e c l a apa ece como a o, efei o, a e o manei a de c l i a a e a o ce a plan a , eg ido de 2 Te eno c l i ado". De fato, na época em que as populações se organizavam em vilas, com número menor de pessoas do que as que hoje habitam as cidades, os homens normalmente trocavam vegetais por carne ou por outros produtos. Era muito valorizado o ato de produzir vegetais, entre outros. Isso remete à ideia de que as práticas econômicas influenciam as práticas sociais, as formas como as pessoas se organizam. Nos dias atuais, em que os produtos agrícolas são utilizados como matérias-primas para a indústria, tende-se a produzir para exportar para o mundo um conjunto de produtos agrícolas. Muitos deles representam as diferenças locais, e a produção de alimentos pode caracterizar um determinado lugar.

A pa i do c lo XVI, a pala a c l a pa o a e ili ada como

Produção social, referindo-se à mente dos homens. Os indivíduos pertencentes aos

grupos ou às classes sociais abastadas eram considerados cultos. Essa foi a fase do pensamento pré-iluminista, em que a sociedade era dividida em grupos ou classes sociais bem demarcadas, e a referência à cultura tinha um caráter classista, ou seja, a ideia de cultura vinculava-se somente às elites, tendo como exemplos a música, a literatura, o cinema, o teatro, a pintura, a escultura, a filosofia. Nessa época, a produção individual era muito importante, e eram consideradas cultura as produções religiosas que se aliaram aos reis de poder absoluto. A cultura popular não podia participar das produções religiosas, da elite ou da aristocracia, nem fazer crítica a elas.

A pa i do c lo XX, a pala a c l a adq i i o ignificado de

desenvolvimento social, um processo pelo qual as sociedades evoluem. Esse

significado surgiu a partir do movimento do iluminismo, também conhecido como c lo da l e , o q al foi ma e ol o c l al, q e p op ma no a fo ma de entender a natureza e a sociedade. Isso significou uma transformação profunda na forma de pensar, em que a cultura popular iniciou sua participação. Tal mudança possibilitou também um novo processo de formação política

Com a ociologia, a pala a c l a pa o a ignifica forma da vida. Também no dicionário Michaelis (on-line), o e be e c l a é definido como Si ema de ideia , conhecimen o , cnica e a efa o , de pad e de compo amen o e a i de q e ca ac e i a ma de e minada ociedade . E, segundo Moreira e Candau

(2007, p. 27): ...modo de ida, alo e ignificados compartilhado por diferente os grupos (nações, classes, sociais, grupos étnicos, culturas regionais, geracionais, de g ne o, e c.) e pe odo hi ico .

Trata-se, portanto, de uma visão dos pesquisadores do grupo dos estudos culturais que consideram a cultura como o modo de vida do homem, a forma como compartilham os conhecimentos e a linguagem dentro das ações sociais da nossa vida. Pela cultura, os homens e as mulheres se identificam e realizam suas escolhas por determinados grupos sociais, incluindo-se aí as possibilidades de representações dos grupos minoritários.

O último significado proposto pelos autores Moreira e Candau (2007) é o de cultura como prática social. Isso significa que, ao compartilhar uma cultura, um grupo faz uso de uma linguagem comum, pela qual também troca ideias e significados, formas de vida e valores. Portanto, cultura é um conjunto de práticas pelas quais se produzem e compartilham significados em um grupo. Linguagem e cultura estão intimamente relacionadas.

Atualmente a linguagem digital, por exemplo, tem assumido grande parcela das formas de compartilhamento de significados na nossa sociedade. Segundo Hall (1997, p.17),

[...] a cultura tem assumido uma função de importância sem igual no que diz respeito à estrutura e à organização da sociedade moderna tardia, ao processo de desenvolvimento do meio ambiente global e à disposição de seus recursos econômicos e materiais. Os meios de produção, circulação e trocar cultura, em particular, têm se expandido, através das tecnologias e da revolução de informação. Uma proporção ainda maior de recursos humanos, materiais e tecnológicos no mundo inteiro são direcionados diretamente para estes setores.

Percebemos, então, nesse contexto, que a cultura não é fixa, nem está pronta; está sempre se modificando e se atualizando. A cultura tem sua importância como prática social. Retomando o conceito de Hall (1997), a cultura assume uma missão de importância sem igual no que diz respeito à estruturação e à organização tardia da sociedade moderna aos processos de desenvolvimento do meio e da ação social.

Podemos ver que os principais aspectos que incluem a cultura são: conhecimento, ensino, crenças, arte, moral, lei, costume e linguagem heranças sociais de cada grupo, que constitui uma comunidade, como, por exemplo: grupo de surdos,

grupo de ouvintes. E ainda existe uma diferença entre grupos de mulheres e homens, além de outros. Essas relações influenciam o sujeito em sua trajetória de vida.

A cultura é cultivada dentro de uma comunidade que influencia o sujeito, e esse desenvolve uma identidade própria, por isso podemos dizer que a cultura mostra os valores adquiridos em cada sujeito.

O cultivo da linguagem e da identidade são os elementos fundamentais de uma cultura. Segundo Perlin (2004, p. 77), a iden idade da o con da den o das representações possíveis da cultura surda, elas moldam-se de acordo com o maior o meno ecep i idade c l al a mida pelo jei o.

Para elucidar o conceito de cultura surda, recorremos a Lopes e Veiga-Neto (2006, p. 87), q e afi mam: c l a pode e en endida como m conj n o de p ica capazes de serem significadas por um grupo de pessoas que vivem e sentem a e pe i ncia i al, no ca o do do , de fo ma emelhan e .

Retomando Hall (1997), a cultura se caracteriza pela estrutura e pela organização social. Exemplificando, podemos encontrar diferenças nesses dois aspectos estrutural e organizacional relacionados aos grupos sociais ouvintes e surdos. As formas como os sujeitos surdos e os ouvintes desenvolvem ações sociais são distintas em muitos aspectos. Quanto à estrutura, entendemos os recursos econômicos e materiais disponibilizados em cada época e lugar. Exemplos: o povo surdo8 tem disponíveis, atualmente, diversos recursos tecnológicos desenvolvidos nas últimas décadas que permitem a comunicação entre si e com os ouvintes: aparelho celular, despertador vibratório, webcam, internet, entre outros. Todos esses recursos modificaram as práticas sociais das pessoas surdas, incorporando-se o campo da cultura.

Em relação à organização da sociedade, os movimentos sociais dos surdos mobilizaram a emergência de associações de surdos e da própria Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (FENEIS), o que refletiu em práticas sociais que influenciaram e influenciam o processo educacional das crianças e dos jovens surdos, com a implantação de escolas bilíngues, entre outras conquistas.

No livro As imagens do outro sobre a cultura surda, Strobel aprofundou o tema sobre a cultura surda, a qual pode ser definida por seus artefatos, sendo eles:

8 Segundo Strobel p o povo surdo é grupo de sujeito surdos que usam a mesma língua que

experiência visual, desenvolvimento linguístico, família, literatura surda, vida social, esportiva, artes visuais e política.

Um dos artefatos da cultura surda é a experiência visual, pelo fato de os sujeitos surdos terem uma forma diferente de perceber o mundo. Com a sua perda de audição, a audição é substituída pelo olho, ou seja, o sujeito surdo adquire as informações pela visão. Perlin e Miranda (2003, p.218) explicam a importância do acesso à informação visual para a constituição da subjetividade dos sujeitos surdos:

Experiência visual significa a utilização da visão (em substituição total à audição), como meio de comunicação. Desta experiência visual surge a cultura surda representada pela língua de sinais, pelo modo diferente de ser, de se expressar, de conhecer o mundo, de entrar nas artes, no conhecimento científico e acadêmico. A cultura surda comporta a língua de sinais, a necessidade do intérprete, de tecnologia de leitura.

Geralmente, as crianças surdas chegam à escola sem ter a própria língua, porém elas tiveram a experiência visual, mas ainda não encontraram um significado simbólico para suas experiências visuais. Segundo Strobel, o desenvolvimento

linguístico do bebê que nasce surdo passa por um processo diferente do ouvinte. Por

exemplo, quando chega a fase de balbucio, o bebê ouve os sons ao redor de si e tenta se comunicar pela imitação. No bebê surdo o processo ocorre de outra forma: ele não ouve os sons do ambiente, e a aquisição da língua oral se dá de forma fragmentada, dependente de um tratamento clínico. Porém, ao entrar em contato com falantes da Língua de Sinais esta se torna sua língua natural, a qual servirá como suporte para o acesso ao português, sua segunda língua, na modalidade escrita.

Os sujeitos surdos que têm acesso à língua de sinais, na participação da comunidade surda, possuem maior segurança, autoestima e identidade sadia. Por isso, é importante que as crianças surdas convivam com pessoas surdas adultas com que se identificam e tenham acesso às informações e conhecimentos no seu cotidiano. (STROBEL, 2003, p.54)

A língua de sinais transmite o conhecimento dos sujeitos surdos, essa língua está sempre presente na comunidade surda e é expressa através da experiência visual. Este é o relato de uma experiência pessoal na escola do polo bilíngue no estado São Paulo:

Eu entrei na sala de aula, tirei as coisas no meu bolso e a chave do carro deixei na mesa, para ficar mais à vontade para dar aula de Libras com meus alunos surdos, e o meu aluno viu uma chave de carro e perguntou para mim:

-Sim, por quê? Respondeu, com um sorriso, sinalizando, o professor surdo. Eu tinha notado que meus alunos tinham baixa autoestima e falta de informação e identificação. Selecionei o material para trabalhar com meus alunos;para eles poderem perceber, escolhi um livro escrito por surdos, com narrativas pessoais de superação.

Apoiamos as palavras Strobel (2003), ao dizer que os alunos surdos precisam conviver com pessoas adultas surdas, como professor surdo, para que eles possam ter acesso a informações e conhecimento, pois as crianças surdas nascem no meio de família de ouvintes. Geralmente a família recorre ao médico para pedir informação. Dessa forma, tem acesso inicialmente ao ponto de vista clínico, o qual acredita que o sujeito surdo tem um defeito, e que precisa consertar sua audição. A pe q i ado a da mo a q e h m p oblema ocial , q ando ela ela a a e pe i ncia da família de surdos.

[...] os pais surdos levam seus filhos surdos aos médicos e profissionais da área, estes os aconselham a não usarem a língua de sinais, alegando que isso provocaria atraso na aquisição da língua portuguesa e encorajando-os a colocarem aparelhos nos seus filhos, argumentando que ouvir som e aprender a falar é melhor do que nada. (STROBEL, 2003, p. 58)

Vários pesquisadores defendem o uso da língua do sujeito surdo na educação dos surdos. Na década de 1960, o pesquisador Wiliam Stokoe publicou Estrutura da língua gestual e foi coautor de Um dicionário de língua gestual americana sobre princípios linguísticos (1965). Essas publicações serviram como base para a compreensão e a defesa da língua de sinais na educação das pessoas surdas.

Ao estudar a Língua de Sinais Americana (ASL), Stokoe encontra uma estrutura que, de muitos modos, se assemelha àquela das línguas orais. Argumenta que, assim como da combinação de um número restrito de sons (fonemas) cria-se um número vastíssimo de unidades dotadas de significado (palavras), com a combinação de um número restrito de unidades mínimas na dimensão gestual (queremas) pode-se produzir um grande número de unidades com significados (sinais). Propôs também em sua análise que um sinal pode ser decomposto em três parâmetros básicos: O lugar no espaço onde as mãos se movem, a configuração da(s) mão(s) ao realizar o sinal e

o movimento da( ) m o( ) ao eali a o inal, endo e e en o o a o

di in i o do inai . (LARCERDA, 1998, /p)

Os estudos da língua de sinais iniciais e outros que vieram posteriormente ao trabalho de Stokoe revelaram que as línguas de sinais eram verdadeiras línguas. Esse reconhecimento foi uma grande conquista e mobilizou várias áreas de conhecimento, como a linguística, a literatura, a educação e a política. No Brasil, a comunidade surda

conduziu o movimento para representar e defender a língua de sinais, o que culminou com a publicação da Lei nº10.436, de 24 de abril de 2002, que reconhece a Língua Brasileira de Sinais Libras como língua da comunidade surda. Segundo Strobel (2003), a cultura surda tem influência das marcas das experiências do sujeito surdo. Fazem parte também da cultura surda os modos como as comunidades surdas organizam os movimentos políticos. Perlin (1998, p. 71) e plica: o mo imen o do, contam as instâncias que afirmam a busca do direito do indivíduo surdo ser diferente nas questões sociais, políticas e econômicas que envolvem o mundo do trabalho, da saúde, da educação, do bem-e a ocial . Ci amos a seguir duas experiências vivenciadas por Strobel e Pimenta que demonstram como a surdez produz diferentes maneiras de organização da vida social.

Como moro sozinho, eu precisava ir ao aeroporto no dia seguinte, às cinco horas da madrugada, e não sabia como iria chamar um táxi. Então, mandei uma mensagem no celular para minha irmã e pedi a ela para agendar um táxi que me aguardasse na frente do meu apartamento. No dia seguinte, o táxi veio. Escrevi para o motorista num papel explicando que queria ir ao aeroporto e ele me levou sem problema. (STROBEL, 2003, p. 74)

Observe a situação demonstrada em outra experiência de Pimenta (1999, p.62 apud STROBEL, 2003, p.74, p. 75).

Aconteceu aos seis anos de idade, quando minha mãe me mandou comprar uma mamadeira para meu irmão, na época um bebê. Ela não se preocupa com o fato de eu ser surdo. Foi a primeira vez que comprei alguma coisa sozinho. Na loja, fiquei olhando, procurando nas prateleiras a mamadeira para apontar, mas não havia nenhuma à mostra. O lojista me pediu para escrever o que queria, mas aos seis anos, eu ainda não sabia escrever. Então desenhei a mamadeira no papel, o homem entendeu e eu voltei feliz da vida para casa.

As duas experiências desses sujeitos surdos revelam como é possível ser diferente e se adequar à vida social, pois é possível outra forma de comunicação com os ouvintes que não necessariamente a linguagem oral. O desejo da sociedade ouvinte é que o sujeito surdo se adapte ao ouvinte, use a fala como ouvinte e a cultura do ouvinte. O mo imen o do mo a, a a da c l a e da pol ica, a po ibilidade de e diferente, quando, por exemplo, a comunidade surda produz a literatura surda e artes

visuais que mostram as experiências vivenciadas na pele pelos sujeitos surdos

registradas de várias formas como o papel, vídeo, youtube, entre outros.

Literatura surda e arte visual são artefatos da cultura surda, expressões da comunidade surda, que, através da língua de sinais, traduzem a memória das

experiências vivenciadas pelos sujeitos do , efe em-se às várias experiências pessoais do povo surdo que, muitas vezes, expõem as dificuldades e/ou vitórias das op e e o in e (STROBEL, 2003, p.68). A e i ai o fo ma de e p e e artísticas do sujeito surdo, capazes de revelar as emoções, história, subjetividade e a experiência da cultura surda, para explorar uma nova forma de olhar.

Problematizando o conceito de cultura surda, Bastos (2013) coloca em suspeita a forma como o conceito atualmente é utilizado por alguns pesquisadores da ea do e do do . A a o a de aca a fo ma biologi an e como o e mo c l a da ap e en ado, endo, em ge al, de c i o como m fen meno na ali ado, lido como algo ine en e q ele q e po em a de (BASTOS, 2013, p. 23). A a o a questiona a afirmação radical de autores que defendem a dicotomia cultura surda versus cultura ouvinte, uma vez que, para ela, há um hibridismo entre as culturas, a partir das ideia de B ke, o q al defende q e oda a c l a e o en ol ida en e si [...] nenh ma dela nica e p a, oda o h b ida e he e og nea (BURKE, 2003 ap d BASTOS, 2013, p. 29).

Dessa forma, Bastos faz uma crítica ao conceito de cultura surda proposto por Strobel, afirmando que a pesquisadora defende a ideia de homogeneidade cultural e a dicotomia surdo-ouvinte. Propõe outro modo de conceituar, utilizando a terminologia e pe i ncia c l ai da , poi , eg ndo a a o a, n o h m do ni e al, mas pessoas surdas com suas experiências e subjetividades forjadas a partir de dife en e p oce o de in e io i a o (BASTOS, 2013, p. 43).

Klein e Lunardi (2006, p.17) sugerem que se use o termo no plural c l a da e que ele não seja somente vinculado ao uso da língua de sinais. As autoras propõem:

[...] ao se traduzir as culturas surdas é necessário um descentramento da língua de sinais como única expressão autêntica dessa cultura para não

c i ali a a de a pa i de m nico eco e c l al pa a q e ela n o e

torne mais uma forma exótica e folclórica de entendimento da surdez. Entender as culturas surdas é percebê-las enquanto elementos que se deslocam, fragilizam e hibidrizam no contato com o outro, seja ele surdo ou ouvinte, é interpretá-las a partir da alteridade e da diferença.

Retornando a Strobel, podemos afirmar que sua pesquisa foi importante para a abertura da discussão sobre o conceito de cultura surda. Naquele momento, início dos anos 2000, era necessário assumir o conceito de forma radical, demarcar a existência da

comunidade surda no Brasil. Todavia, os surdos têm experiências e contatos com várias culturas. O cotidiano do sujeito surdo é permeado sempre por experiências culturais surdas e ouvintes, num hibridismo constante. No encontro entre os surdos, esse sujeito surdo sente valorizada sua posição de ser surdo. Nesses encontros, os surdos se sentem semelhantes no jeito de ser, desabafam seus problemas, frustações, entre outros sentimentos. A maioria dos sujeitos surdos nasce em meio a uma família ouvinte e vive na sociedade em geral, tendo contato com a cultura ouvinte, por isso não tem como apartar-se dela, e sempre vai haver a influência dos modos de apropriação cultural ouvinte.

A afirmação do conceito de cultura surda é uma importante estratégia de sobrevivência dos surdos na luta contra a imposição de um modo de existir no mundo de e minado pela p ica e pelo di c o o in e . Denominada de o in i mo , e a fo ma de domina o em ido comba ida pelo po o do. O o in i mo como ouvintes dominam surdos, surdos preci am copia a iden idade o in e (MARTINS; KLEIN, 2012, p. 2). Sklia (2012) di c i e ap of ndo o e mo o in i mo :

O ouvintismo as representações dos ouvintes sobre a surdez e sobre os surdos e o oralismo a forma institucionalizada do ouvintismo continuam sendo, ainda hoje, discursos hegemônicos em diferentes partes do mundo. Trata-se de um conjunto de representações dos ouvintes, a partir do qual o surdo está obrigado a olhar-se e a narrar-se como se fosse ouvinte. Além disso é nesse olhar-se, e nesse narrar-se que acontecem as percepções do ser deficiente, do não ser ouvinte; percepções que legitimam as práticas terapêuticas. (SKLIAR, 2012, p.15)

Atualmente se abrem possibilidades de diálogo sobre a diferença e a alteridade como elementos constitutivos tanto da subjetividade como do processo da significação. Os estudos surdos dentro de algumas universidades, produzindo pesquisas sobre os modos de significação dos surdos, suas especificidades linguísticas e de aprendizagem, têm produzido desdobramentos para se pensarem as práticas pedagógicas pa a e e g po e pec fico. Ne e p oce o dial gico, a defe a do e mo c l a da se apresenta como significativa para demarcar um campo de pesquisa, na linguística e