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A desigualdade regio nal da renda no Brasil: análise da hipó tese de co nvergência

2 A Hipót ese da convergência

Na literatura econômica há diversos conceitos e aplicações atinentes à convergência do produto, da renda ou da produtividade dos fatores de países e regiões. Apesar de Baumol et al (1994) ter consignado sete distintos conceitos para convergência, este trabalho se restringirá a ana-

lisar apenas três, sintetizados por Sala-i-Martin (1996).

A primeira definição, denominada de βββββ-convergência absoluta, implica a existência de uma correlação negativa entre o nível da ren- da no início de um período e a taxa de crescimento da renda nesse mesmo período, ou seja, os países ou regiões pobres cresceriam a taxas mais elevadas do que os países ricos. O segundo conceito é uma extensão do primeiro e denomina-se βββββ-convergência condicional. A hipótese de que a renda per capita dos países pobres cresce mais rapi- damente do que a dos ricos persiste, desde que sejam mantidos cons- tantes os parâmetros definidores do equilíbrio de longo prazo, steady- state, de cada economia.

A terceira definição, designada de σσσσσ-convergência, ocorre quando, ao longo do tempo, verifica-se uma redução na dispersão do produto per capita. Barro e Sala-i-Martin (1991) argumentam e provam que

βββββ-convergência é uma condição necessária, mas não suficiente para a existência de σσσσσ-convergência. Dessa forma, sugerem que as análises de convergência sejam complementadas com a verificação da ocor- rência de redução da dispersão.

Baumol (1986) comprovou, para o longo período de 1870 a 1979, a existência de convergência absoluta entre dezesseis países industriali- zados. Verifica ainda, em menor intensidade, um processo de conver- gência entre os países socialistas. De Long (1988) impõe severas crí- ticas ao trabalho de Baumol. Inicialmente, alega que a seleção da amostra foi realizada ex-post. De Long incluiu na regressão de Baumol países que, em 1870, tinham grandes possibilidades de crescimento e obteve resultados que apontavam para um processo de divergência. De Long, em seu artigo, também critica a construção dos dados por meio de estimativas.

Barro (1991) realiza extenso trabalho, onde verifica a existência de convergência condicional para 98 países, no período de 1960 a 1985. As regressões de Barro rejeitam a hipótese de convergência absoluta. Barro e Sala-i-Martin (1991) verificam a existência de convergência absoluta entre os Estados Unidos da América, as prefeituras japone- sas e as regiões européias. A velocidade de convergência é próxima de dois por cento em todas as regressões. Apesar de severamente criticadas,

tanto por seus fundamentos teóricos como estatísticos, as regressões de Barro consolidaram-se na literatura econômica e são exaustiva- mente empregadas.

Friedman (1992) e Quah (1993-a) criticam as regressões desen- volvidas por Barro e Sala-i-Martin. Os dois autores apontam que o coeficiente negativo da renda per capita inicial não indica a existência de convergência, mas apenas uma tendência de regressão à média, denominada “Falácia de Galton”. Quah questiona, ainda, a hipótese heróica contida no modelo, que impõe para todas as unidades geo- gráficas a mesma velocidade de convergência.

Os modelos de crescimento endógenos, idealizados no final da dé- cada de 1980, deixaram de considerar o progresso tecnológico como exógeno. Lucas (1988) incluiu na função de produção neoclássica um novo insumo que denominou de capital humano, concebido como o estoque de conhecimento acumulado da população. Romer (1986) abandonou a hipótese de concorrência perfeita e retorno decrescente dos fatores e postulou a existência de externalidades advindas do apren- dizado adquirido no processo produtivo.

A partir desses dois importantes marcos teóricos, proliferou-se a literatura que associava o crescimento econômico ao nível educacio- nal da sociedade, que é uma proxy razoável para o estoque de capital humano ou para a capacidade da sociedade criar ou copiar novas tecnologias.

Barro e Sala-i-Martim (1991) propuseram que o processo de con- vergência ocorreria mais rapidamente entre regiões de um mesmo país do que entre países distintos. A justificativa era de que os parâmetros que definem uma economia são mais homogêneos quan- do avaliados dentro de uma mesma nação. Os autores comprovaram a hipótese empiricamente por meio de regressões cross-sections para os estados norte-americanos, regiões européias e prefeituras japonesas.

A hipótese de convergência do produto per capita entre os estados brasileiros foi amplamente investigada a partir da segunda metade da década de 1990. Diferentemente de outros países, os dados sobre economia regional no Brasil são insuficientes e precários para o aprofundamento da análise. Barro e Sala-i-Martin dispunham de dados de 47 estados, com observações decenais que cobriam 110

anos. No Brasil, o pequeno número de unidades federativas e a má qualidade dos dados do PIB regional, muitos baseados em estimati- vas que utilizam variáveis como a arrecadação de tributos, impõem sérias restrições aos pesquisadores.

A maioria dos trabalhos constata a existência de fraca convergência do produto per capita entre os estados. Os pesquisadores que conse- guem investigar um período mais amplo, geralmente, observam cer- ta instabilidade desse processo de convergência.

Ellery Jr. e Ferreira (1995) reconhecem que o pequeno número de observações impede resultados definitivos e verificam a existência de βββββ- convergência e σσσσσ-convergência entre os estados brasileiros no período de 1970 até 1990. Ferreira e Diniz (1995), Ferreira (1996), Ferreira (2000) e Schwartzman (1996) encontram resultados semelhantes.

Azzoni (1997) critica os trabalhos de Ferreira e Diniz (1995) e Schwartzman (1996), que apontavam convergência absoluta entre os produtos per capita dos estados. Justifica sua crítica no período pouco extenso utilizado, 1970 a 1985, alegando ser uma fase de redução acentuada de desigualdades em razão do milagre econômico da década de 1970. Azzoni (1997) propõe nova metodologia para compatibilizar as séries estaduais dos produtos per capita, apresen- tando uma série abrangendo o período de 1939 a 1985. Azzoni veri- fica ainda a instabilidade temporal do processo de convergência.

Ferreira (1999) incorpora a série de Azzoni (1997) e constata um processo de fraca convergência entre os estados brasileiros. O autor introduz nova metodologia desenvolvida por Quah (1993-b) e, por meio de matrizes de transição de Markov, para o período de 1970 a 1995, estima que no longo prazo haverá uma concentração de esta- dos no estrato de renda média.

Andrade (1997) e Zini Jr. (1998) encontram convergência con- dicional para os dados estaduais. Zini Jr. (1998) conclui, utilizan- do a série de Azzoni (1997), pela existência de fraca convergência absoluta e convergência condicional. Azzoni et al (2000) e Azzoni e Barossi (2003) utilizam, respectivamente, dados em painel e séries temporais e concluem pela fraca convergência do PIB per capita dos estados. Segundo Azzoni e Barossi (2003), cinco estados encon- tram-se em processo de convergência e três de fraca convergência, enquanto Amapá, Pará, Piauí, Santa Catarina e São Paulo não estão

convergindo.

Almeida et al (1997) detectam fraca convergência entre a produti- vidade do trabalho na indústria de transformação brasileira. Arraes (1997) conclui pela existência de βββββ e σσσσσ convergência entre o PIB per capita dos estados nordestinos no período de 1970 a 1995. As esti- mativas do autor evidenciam um rápido processo de convergência, com velocidade superior a três por cento e meia-vida2 de 19 anos.

Porto Jr. e Souza (2002) constatam polarização na distribuição da renda per capita dos estados.

Barreto e Gondim (2004) investigam a convergência entre estados, mesorregiões, microrregiões e municípios, usando estimações de den- sidade de probabilidade e de núcleo estocástico. Considerando as unidades federativas, no período de 1950 a 2000, os autores verifi- cam instabilidade no processo de convergência. A distribuição da renda per capita evolui ao longo do tempo para uma formação bimodal em todos os níveis geográficos.

Os trabalhos sobre a hipótese de convergência no Brasil indicam, apesar das diversas metodologias e períodos empregados, algumas conclusões recorrentes. Observou-se que, entre os estados brasileiros, o processo de convergência é inexistente ou instável e fraco. Percebe- se, assim, que, ao contrário dos países desenvolvidos, as desigualda- des regionais brasileiras são extremamente persistentes.