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Modos de Capit al Social e Mecanismos de Cresciment o Todos os mecanismos mostrados na seção anterior asseveram a rela-

desenvo lvimento : o que diz a abo rdagem do capital so cial?

2 Modos de Capit al Social e Mecanismos de Cresciment o Todos os mecanismos mostrados na seção anterior asseveram a rela-

ção entre capital social e crescimento econômico. A pesquisa sobre o tema, contudo, tem percebido que os modos do capital social impor- tam para os resultados. Os efeitos de uma associação que reúna ape- nas moradores de um gueto pobre são bastante distintos de uma que reúna a elite local, ou de outra na qual pobres e ricos estejam lado a lado. Não basta haver uma associação; é preciso atentar para quem são seus membros e quais são os tipos de relações sociais que se dão. A seguir, serão examinados os modos do capital social e suas relações com o crescimento econômico.

2.1 Modos de Capital Social

D iversas taxionomias das formas do capital social podem ser efetuadas. Optou-se por uma classificação utilizada com freqüência crescente e central para os objetivos do presente trabalho (GITTEL e VID AL, 1998; NARAYAN, 1999; WO O LCO CK, 1999; PUT NAM, 2000; World BANK, 2000). O critério de distinção baseia-se na posição social dos agentes envolvidos. Desse modo, há as seguintes modalidades do capital social:

• Bonding social capital: envolve os vínculos entre agen- tes de mesma posição. São os grupos homogêneos, vol- tados “para dentro”, nos quais as identidades dos mem- bros são reforçadas. Essa “supercola sociológica”, nas palavras de PUTNAM (2000, p. 23), cria um ambien- te de lealdade e reciprocidade entre os membros, sendo útil, especialmente, para a resolução de problemas de ação coletiva e para o apoio mútuo intragrupo. Este con- ceito está relacionado com conceito de “laços fortes” de GRANOVETTER (1973 e 1974). A força de uma co- nexão social é definida como uma combinação do tem- po, intensidade emocional, intimidade e serviços recí- procos que a caracterizam (GRANOVET T ER, 1973,

p. 1361). Círculos familiares, de amizade ou de comu- nidades fechadas e voltadas para si são característicos desses strong ties.

• Bridging social capital: reporta-se aos laços fracos entre agentes de grupos sociais distintos. São as relações soci- ais mais distantes que trespassam as fronteiras sociais, e as virtudes cívicas se mostram mesmo entre pessoas com distintas situações demográficas, étnicas ou ocupacionais. Trata-se de um “óleo lubrificante social” – “a sociological

WD-40” (PUTNAM, 2000, p. 23). As informações so-

bre o comportamento de outros agentes e oportunida- des disponíveis fluem através do capital social do tipo bridging. Quando essa modalidade de capital social é abundante, tem-se uma sociedade fluida e integrada, na qual, por exemplo, a despeito das diferenças sociais, pobres e ricos confiam uns nos outros e compartilham informações.

• Linking social capital: refere-se às ligações verticais en- tre os pobres e pessoas em postos de decisão em organi- zações formais. Nas palavras de WOOLCOCK (2001): “The capacity to leverage resources, ideas and information from formal institutions beyond the community is a key function of linking social capital”. Comunidades em que há fartura desse tipo de capital têm governos permeá- veis às demandas oriundas dos estratos inferiores da pi- râmide social (WOOLCOCK, 1999 e WORLD BANK, 2000).

A literatura que relaciona capital social e redução de pobreza demar- ca, especialmente nos países atrasados, que os mais desfavorecidos têm acesso a fartos estoques de bonding social capital, pouco bridging e qua- se nenhum linking (WOOLCOCK, 1999); ou seja, a coesão entre os pobres fornece-lhes apoio mútuo, mas dificulta a fluidez social em sentido vertical; o governo costuma ser mouco às suas demandas.

Se analiticamente a distinção entre os diferentes capitais sociais é clara, em termos empíricos, a fronteira não é tão nítida. Por exemplo, as reuniões semanais de oração em uma igreja congregam pessoas que

o que diz a abo rdagem do capital so cial?

compartilham a mesma fé, mas podem incluir pessoas de origens sociais distintas. Assim, em um sentido, tem-se capital social bonding (pessoas com crenças semelhantes), enquanto, noutro entendimen- to, pode-se apontar que as reuniões religiosas compõem o capital social bridging, uma vez que transcendem as diferenças de status (PUT NAM, 2000, p. 23).

A maior parte da literatura sobre capital social foi elaborada antes que os conceitos de bridging, bonding e linking social capital fossem assimilados pela literatura. Assim, a bibliografia acerca dos mecanis- mos que levam do capital social ao crescimento econômico não os relacionou com tal tipologia. Tendo em vista os presentes objetivos, vale a pena aclarar, ao menos teoricamente, quais são as formas de capital social envolvidas em cada nexo causal com o crescimento.

O capital social do tipo bonding, apesar de ter um alcance mais restrito, cumpre funções relevantes para o bem-estar de uma socieda- de. Nas palavras de Putnam (2000, p. 22):

Bonding social capital is good for undergirding specific reciprocity and mobilizing solidarity. Dense networks in ethnic enclaves, for example, provide crucial social and psychological support for less fortunate members of the community, while furnishing start-up financing, markets, and reliable labor for local entrepreneurs.

As associações de crédito rotativo se apóiam nesses laços fortes (BESLEY; COATE; LOURY, 1993). É a extrema confiança que os membros de uma comunidade coesa depositam uns nos outros que garante o seu funcionamento, evitando o comportamento oportunis- ta. O grau de proximidade entre os sócios faz com que eles contribuam porque esperam retribuição em um momento posterior. Grupos fe- chados podem resolver outros problemas de ação coletiva, como, por exemplo, compartilhar máquina e equipamentos ou gerenciar recur- sos comuns.

Apesar desses efeitos benéficos, contudo, os resultados do capital

bonding sobre o desempenho econômico têm alcance limitado. A

ralizada, dá-se apenas pelos membros do grupo. Muitas vezes, os recursos necessários podem estar em agentes que não fazem parte dos strong ties. Ainda pior, a intensidade desses vínculos pode levar ao isolamento de seus membros do restante da sociedade. Um gueto de agentes cooperativos é melhor do que um de agentes isolados, mas não deixa de ser um gueto. Woolcock (1999), baseado em estudos empíricos, argumenta que, para comunidades de imigrantes, o capi- tal social bonding tem forte importância inicial para o recém-chega- do, mas, a partir um certo momento, incrementos de bem-estar ten- dem a ocorrer para aqueles membros que se distanciam de sua comu- nidade étnica e formam contatos com grupos diferentes.

Quanto à formação de capital humano, os efeitos do capital social

bonding também são limitados. Havendo discriminação entre os

membros do grupo no restante da sociedade, perdem-se os incenti- vos para o investimento em educação, uma vez que os retornos futu- ros serão limitados. É fácil perceber, no mesmo sentido, que o isola- mento de um grupo social intensamente conectado em seu interior cerceia uma alocação eficiente de recursos e a difusão de novas tecnologias.

Muitas das críticas à pesquisa sobre capital social decorreram de estudos que mostravam as conseqüências perversas que certas redes sociais poderiam originar para os seus membros, ou mesmo para os que estão fora da rede (RUBIO, 1997; PORT ES e LANDOLT , 1996). A maior parte desses bem fundamentados ataques estava direcionada para certas modalidades e intensidades do que hoje se considera capital social bonding. Afinal, até mesmo o “familismo amoral” identificado por Banfield (1958) poderia ser entendido como um tipo patológico do capital social do tipo bonding3. Enfim, paro-

diando Granovetter, evidencia-se, assim, a fraqueza dos laços fortes4.

O capital social bridging não é alvo das ambigüidades do capital

3 Banfield define o familismo amo ral co mo a seguinte regra de co nduta: “ Maximize the

mate rial, sho rt-run advantage of the nucle ar family, assume that all o the r will do like wise” ( BANFIELD, 1958, p. 85) .

4 Putnam ( 2000, p. 362) questio na se o bonding social capital seria um second-best do

bridging e reflete so bre o s risco s de uma ênfase excessiva no primeiro tipo levar a uma so ciedade mais dividida.

o que diz a abo rdagem do capital so cial?

social do tipo bonding. Seus reflexos são sociedades em que reina a reciprocidade generalizada e a confiança é mais geral. Além disso, emergem todas as vantagens econômicas decorrentes de um fluxo mais fluido de informações. A distinção entre os efeitos do capital social bridging (laços fracos) e do bonding (laços fortes) em uma esfera micro é sintetizada por Putnam:

Strong ties with intimate friends may ensure chicken soup when you’re sick , b ut weak ties with distant acquaintances are more likely to produce leads for a new job. (2000, p. 363).

Em termos mais macro, também é fácil perceber que os mecanis- mos que tornam o capital social produtivo são mais efetivos na pre- sença do tipo bridging do que na do tipo bonding. No tocante ao capital social linking, por sua própria natureza, seus efeitos benéficos se dão mediante as melhorias da qualidade das políticas públicas. Interpretando-se as contribuições de Putnam (1993) à luz da tipologia em questão, pode-se afirmar que ele supõe que os capitais sociais bridging e bonding promoveriam o linking. As virtudes cívicas desen- volvidas pela sociedade fariam com que os cidadãos demandassem uma atuação estatal melhor.