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I mplicações da t eoria de desenvolviment o para f ormu lação de polít icas regionais

A análise da estagnação de certas regiões em contraposição ao de- senvolvimento de outras, a partir da ocorrência de falhas de coorde- nação, requer a compreensão de mecanismos capazes de deslocar a economia do “equilíbrio ruim”, Pareto-inferior, para o “equilíbrio bom”; ou seja, se as economias estão sujeitas a “armadilhas de po- breza”, que tipo de intervenção é capaz de reverter tal quadro? Na verdade, o âmago da questão está em não assumir o equilíbrio Pareto- inferior como um resultado inevitável ou estável no longo prazo. É preciso, antes de tudo, compreender as viscosidades desse equilí- brio, em que medida, por exemplo, o fato de um setor tradicional ter predominado historicamente em uma economia inviabiliza o desenvolvimento de um novo setor, Pareto-superior, baseado em retornos crescentes de escala.

ria, então, um importante papel para as políticas públicas, no senti- do de quebrar o círculo vicioso da estagnação e armadilhas de equilíbrio inferior. Tais políticas agiriam, portanto, como choques externos que, dados os spillovers de demanda e a complementaridade estratégica, seriam capazes de reverter expec- tativas, quebrar a inércia da história e deslocar a economia para um novo equilíbrio, Pareto-superior.

Por outro lado, as políticas públicas não devem ter um caráter permanente ou persistente, uma vez que o resultado esperado é um equilíbrio bom na sua ausência (RAY, 2000).A idéia, portanto, é conceber e implementar políticas públicas temporárias capazes de, artificialmente, deslocar a economia do equilíbrio ruim para o bom equilíbrio. Uma vez atingindo o bom equilíbrio, a economia deve tornar-se capaz de manter-se nele quando as políticas não mais vi- gorarem, dadas as externalidades originadas e a reversão de expecta- tivas dos agentes econômicos.

Contudo, a análise do desenvolvimento sob a óptica de equilíbrios múltiplos mantém-se cercada de questões sobre a persistência de equi- líbrios ruins. Nesse sentido, muitas vezes, determinada política pú- blica pode ser capaz de levar a economia para o bom equilíbrio, mas dada a não estabilidade deste, ou a economia volta para o equilíbrio ruim na ausência da política ou torna-se refém desta, não conseguin- do ensejar um processo auto-sustentável.

Tal abordagem é de grande relevância para compreensão das desi- gualdades regionais. Retomam-se, aqui, velhas questões: por que al- gumas regiões se desenvolvem enquanto outras permanecem estag- nadas? O que fazer para que regiões excluídas se tornem atrativas para os investimentos produtivos? Como garantir a sustentabilidade dos investimentos? Em que deve consistir uma política de desenvol- vimento regional?

Embora as teorias anteriormente apresentadas, especialmente a exis- tência de equilíbrios múltiplos, não sejam capazes de responder a todas as questões, fornecem alguns insumos importantes para implementação de políticas e redução das desigualdades regionais. Primeiramente, destaca-se a necessidade de criação de mecanismos indutores de investimento, capazes de produzir economias externas,

tornando viável a exploração de retornos crescentes. De outro lado, é preciso avançar em relação à análise centrada em spillovers de deman- da para uma visão de complementaridade inter-setorial e inter-regi- onal dos investimentos.

O caso brasileiro, em virtude da grande extensão territorial e das diversidades físicas, econômicas, históricas e culturais, configura-se como um referencial empírico para o estudo das desigualdades regi- onais. É possível, então, pensar a experiência regional brasileira à luz das teorias de desenvolvimento levantadas anteriormente? Existem sim fatos que permitem alguns paralelismos.

Inicialmente, deve-se destacar a forma concentrada em que ocorre- ram o nascimento e a consolidação da indústria nacional, o que origi- nou uma dicotomia do tipo centro-periferia entre regiões ricas do País (Sudeste e Sul) e regiões pobres, subdesenvolvidas (Norte e Nor- deste)4. Tem-se, nesse sentido, uma situação típica de equilíbrios

múltiplos em que o Sudeste, especialmente São Paulo, e o Sul logra- ram êxito em atingir o equilíbrio bom enquanto que o Norte e o Nordeste tornaram-se reféns de uma “armadilha da pobreza”.

Foi esse quadro de desequilíbrios regionais que levou o Governo Federal a intervir diretamente do desenvolvimento. Embora não hou- vesse, de fato, uma percepção da situação como resultado da ocorrên- cia de falhas de coordenação, toda a atuação do Governo Federal é guiada pela tentativa de tornar as regiões menos desenvolvidas atrati- vas para os investimentos, o que foi feito mediante a instituição de incentivos fiscais e financeiros para os agentes econômicos que apli- cassem recursos produtivos nessas regiões, bem como pela realização direta de grandes investimentos públicos em setores de aço, petró- leo, fosfato, potássio, papel, petroquímica, carvão, mineração, entre outros (toma-se, como exemplo, a construção do Pólo Petroquímico de Camaçari, na Bahia, viabilizada, por investimentos públicos via Petroquisa e Norquisa).

As intervenções públicas, contudo, não foram capazes de deslocar as regiões menos desenvolvidas para um equilíbrio bom e estável.

4 O Centro -Oeste, histo ricamente, po de ser co nsiderado uma região intermediária, meno s de se nvo lvida.

Isso porque os investimentos não foram capazes de produzir o big push tampouco de estabelecer encadeamentos para trás e para frente, não foram gerados spillovers de demanda nem houve propagação ver- tical de economias externas via investimentos induzidos.

Entender o fracasso das políticas regionais requer, pelo menos, duas observações. Primeiro, é preciso lembrar que o processo de desenvol- vimento acontece como resultado das interações de história e expec- tativas, logo, reverter expectativas implica, muitas vezes, alterar as estruturas socioeconômicas herdadas, o que não ocorreu no caso bra- sileiro. Não foram levados em consideração, por exemplo, a estrutura desigual da sociedade nordestina, as precárias condições de vida de grande parcela da população, a estrutura ocupacional local e os bai- xos níveis de qualificação. De outro lado, parece ter havido pouca percepção sobre a natureza desigual do processo de desenvolvimen- to, ou melhor, as políticas implementadas objetivavam, em sua maio- ria, ocasional a industrialização em áreas estagnadas sem pensar a sua complementaridade com investimentos realizados em áreas mais de- senvolvidas, em que o conhecimento da demanda futura já viabilizava a exploração de retornos crescentes de escala.

Ademais, o estoque inicial de riqueza das regiões menos desenvol- vidas era bastante restrito (e ainda o é), ou seja, diante de uma popu- lação pobre e um mercado imperfeito de crédito, reforçado, inclusi- ve, pela desigualdade social, é bastante difícil conseguir produzir spillovers de demanda.

É preciso, portanto, repensar as políticas regionais, conciliando ar- gumentos do big push aos da teoria do crescimento não balanceado, pois, embora tais teorias possam parecer contraditórias, sob certo ângulo, tornam-se complementares. Nesse aspecto, é bastante factível incentivar spillovers de demanda e, ao mesmo tempo, trabalhar a complementaridade inter-setorial, induzindo investimentos em se- tores produtores de insumos intermediários. Quando se pensa um incentivo a um investimento em uma região estagnada, claramente, espera-se que este crie spillovers de demanda, contudo, para que esses venham a se realizar, é preciso propiciar que outros investimentos complementares, especialmente em setores intermediários, também se realizem, o que pode ser possível se houver uma coordenação dos

agentes econômicos para que realizem tais investimentos. Ao mesmo tempo, é preciso que haja outras políticas, não industriais, que atu- em sobre a estrutura da sociedade de forma a criar, por exemplo, a qualificação necessária para as ocupações geradas, ou acesso ao crédi- to para a população local.