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HISTÓRIA DO DANO MORAL

No documento UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ (páginas 43-49)

2 DO DANO MORAL

2.3 HISTÓRIA DO DANO MORAL

Desde a antiguidade, há relatos sobre a existência da reparação por danos, decorrente de ato lesivo praticado entre particulares, como pode ser observado no Código de Manu e de Hammurabi, na Grécia Antiga e no Direito Romano.162

No entanto, foi somente com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que a reparação por dano moral passou a ser expressamente admitida na órbita jurídica, sendo mais tarde, também regulamentada pelo Código Civil Brasileiro de 2002.163

2.3.1 Do código de Manu e de Hammurabi

A caracterização do dano moral pode ser encontrada desde os códigos de Manu e de Hammurabi, que dispunham em alguns artigos a configuração

160 BITTAR, Carlos Alberto. Reparação Civil por danos morais. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999, p. 255.

161 SANTOS, Antonio Jeová da Silva. Dano Moral Indenizável, p. 75-76.

162 PICCOLOTTO, Neltair. O dano moral: caracterização e reparação, p. 23.

163 CAHALI, Yussef Said. Dano moral. 3. ed. rev.,ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 53-54.

do dano moral e a sua respectiva reparação.164

Para o código de Manu o simples descumprimento de um contrato implicaria, além das verbas indenizatórias, à sujeição a pena de desterro.165

Ademais, quem seduzisse mulheres de outrem, estaria sujeito a reparação por danos morais, sob forma de desterro, após a imposição de mutilações desonrosas.166

Nessa linha, Moacir Luis Gusso discorre em sua doutrina que na Babilônia, através do código de Hammurabi já se fazia menção em relação ao dano moral, na medida em que era admitida a reparação pela ofensa moral.167

No código de Hammurabi entendia-se que a prática de bruxedo acarretaria além de uma perda econômica, também uma lesão moral ao enfeitiçado.168

Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho trazem em sua doutrina alguns exemplos que caracterizam a reparação por dano moral daquela época, como o artigo 127 do código de Hamurabi que dispõe:169

Art. 127. Se alguém “apontar o dedo” (calúnia) para uma “irmã de

Deus” ou a esposa de alguém, e n”ao puder provar o que diz, deverá ser levado perante os juízes e sua testa será marcada (cortando a pele ou talvez o cabelo).170

Observa-se, assim, que no código de Hammurabi prevalecia a lei de talião, qual seja, olho por olho e dente por dente, enquanto que no código de Manu, por tratar-se de uma civilização mais moderna, predominava como forma de

164 ZENUN, Augusto. Dano moral e sua reparação. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1995, p. 5-6.

165 SILVA, Wilson Melo da. O dano moral e sua reparação. 3. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1983, p. 12.

166 SILVA, Wilson Melo da. O dano moral e sua reparação, p. 12.

167 GUSSO, Moacir Luiz. Dano Moral. São Paulo: Editora de Direito, 2001, p. 23.

168 SILVA, Wilson Melo da. O dano moral e sua reparação, p. 13.

169 GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de Direito Civil: responsabilidade civil, p. 58.

170 HAMMURABI, O código de. Traduzido por Leonard William King; tradução para o português de Julia Vidili. São Paulo: Madras, 2004, p. 54.

reparação, o pagamento em pecúnia.171

2.3.2 Do dano moral na Grécia Antiga

As leis da Grécia Antiga permitiam a reparação por danos causados a seus habitantes somente mediante pagamento em dinheiro, não sendo possível, como forma de satisfação, a aplicação da lei de talião.172

A reparação por danos morais pode ser vista nos ensinamentos de Augusto Zenum, que assevera:

O velho e sempre novo Homero, no Odisséia, rapsódia oitava, versos de 266 a 367, refere-se a uma assembléia de deuses pagãos, pela qual se decidia sobre reparação de dano moral, decorrente de adultério, cometido por Afrodite, em flagrante, com Ares, que fora condenado a reparar àquele.173

Reconhecia-se, portanto, entre os gregos a compensação em pecúnia decorrente da ofensa moral causada à vítima.174

2.3.3 Do dano moral no direito romano

Não há dúvidas, que na antiga Roma vislumbrava-se através da Lex Aquilia a existência do dano moral, que previa, por exemplo, a reparação do dano causado pela morte de um homem ou de um animal.175

A injúria era causa de indenização, na medida em que poderia

171 GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de Direito Civil: responsabilidade civil, p. 59.

172 GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de Direito Civil: responsabilidade civil, p. 60-61.

173 ZENUN, Augusto. Dano moral e sua reparação, p. 7.

174 SILVA, Wilson Melo da. O dano moral e sua reparação, p. 18.

causar lesão física na vítima ou dano a sua personalidade.176

Conforme a Lei das XII Tábuas, havia três espécies de injúria:

membrum ruptum, quando havia a amputação de algum membro ou a inutilização de

algum órgão (utilizava-se a lei de talião); fractum, compreendia em uma indenização equivalente a 300 sestércios, e se fosse escravo, a 150 sestércios; iniuriae simples, que correspondia a lesões menores.177

Quem fosse vítima de injúria poderia utilizar-se da ação pretoriana, denominada de injuriarum aestimatoria, onde o juiz, a seu critério, fixa uma quantia a ser paga em dinheiro, como modo de reparação à ofensa moral causada ao lesado.178

Entretanto, para Gabba, não havia no direito romano indenização por danos morais, sendo que a ação proposta para a reparação do dano era de natureza penal e a sua indenização, de forma pecuniária.179

Contudo, apesar de a ação ser penal, e o seu modo de reparação ser em dinheiro, fica claro que a lesão física e psíquica corresponde a um dano moral ou extrapatrimonial.180

Noutro sentido, Wilson Melo da Silva preleciona:

Iheing é bastante explícito ao advogar, para os romanos, uma aceitabilidade, quase ilimitado, da reparação dos danos morais. Segundo ele, essa reparabilidade se verificava não apenas nos casos de culpa extracontratual, como até mesmo nos de simples culpa contratual.181

Acrescenta, de outra feita, Antônio Jeová Santos:

O reconhecimento do dano extrapatrimonial entre os romanos é dado pelos próprios romanistas, pois Max Kaser, por exemplo, ao explicar a iniuria trata-a como lesão à pessoa, ao passo que Fritz

176 SANTOS, Antonio Jeová da Silva. Dano Moral Indenizável, p. 84.

177 SANTOS, Antonio Jeová da Silva. Dano Moral Indenizável, p. 84.

178 GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de Direito Civil: responsabilidade civil, p. 62.

179 SANTOS, Antonio Jeová da Silva. Dano Moral Indenizável, p. 85.

180 SANTOS, Antonio Jeová da Silva. Dano Moral Indenizável, p. 86.

Schulz não se cansa em mencionar direitos imateriais e direitos personalíssimos. Assim sendo, já que indenizar por difamação não tem nenhum conteúdo patrimonial, é de aceitar a indenização do dano moral entre os romanos.182

Desta feita, prevalecia entre os romanos o reconhecimento do dano moral, como pode ser observado por Sistenes e Ihering ao afirmarem: “o homem tanto pode ser lesado no que é, como no que tem”.183

2.3.4 Do dano moral no direito civil brasileiro

A questão do dano moral no direito civil brasileiro já foi matéria bastante controvertida, pois num primeiro momento negava-se a reparação por lesão moral, sob o argumento de que o sofrimento do ofendido não tem valor, e num segundo momento, admitia-se a reparação como forma de compensar a vítima pelo seu sofrimento.184

Apesar de o Código Civil de 1916 não fazer menção à expressão dano moral, possui dispositivos no referido código que pode ser interpretado como sendo possível a reparação à ofensa moral.185

Deste modo, Yussef Said Cahali preceitua:

Assim, se é certo que o Código Civil se omitira quanto a inserir uma regra geral de reparação do dano moral, não era menos certo que se referia a diversas hipóteses em que o dano moral seria reparável (arts. 1.537, 1.538, 1.543, 1.547, 1.548, 1.549 e 1.550); tais hipóteses assim referidas estavam longe de constituir simples exceção à regra de que visando apenas disciplinar a “forma de liquidação do dano”, prestam-se para confirmar que está ínsita na lei civil a idéia da reparabilidade do dano moral.186

182 SANTOS, Antonio Jeová da Silva. Dano Moral Indenizável, p. 87.

183 ZENUN, Augusto. Dano moral e sua reparação, p. 10.

184 FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade civil, p. 102.

185 GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de Direito Civil: responsabilidade civil, p. 64-65.

Igualmente, o art. 856 do Projeto do Código das Obrigações de Caio Mário já previa o ressarcimento do dano, ainda que moral.187

Todavia, as jurisprudências dos nossos tribunais entendiam não ser possível a reparação por danos morais, prevalecendo a tese da corrente negativista, como abaixo exposto:

No caso de morte da vítima, a indenização do dano só abrange alimentos se ela efetivamente os prestava ao autor.

Não é indenizável o dano moral, salvo quando acarreta prejuízos materiais suscetíveis de comprovação. 188

Outrossim, somente com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, passou a admitir-se de maneira expressa a reparação por dano moral, como pode ser observado no artigo 5º, inciso V e inciso X, do referido dispositivo.189

Art. 5. [...]

V. É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além

da indenização por dano material, moral ou à imagem.190

X. São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem

das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.191

Além de a Carta Magna admitir expressamente o dano moral, diversas legislações passaram a regular sobre o assunto, como é o caso do Código de Defesa do Consumidor e do Estatuto da Criança e do adolescente.192

Ainda, a súmula 37 do Superior Tribunal de Justiça dispõe: São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato.193

187 CAHALI, Yussef Said. Dano moral, p. 51.

188 BRASIL. Revista dos Tribunais. Ano 37. vol. 176. novembro de 1948. p. 228-233.

189 FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Responsabilidade civil, p. 104.

190 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Vade Mecum RT, p. 30.

191 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Vade Mecum RT, p. 30.

192 GAGLIANO, Pablo Stolze. FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de Direito Civil: responsabilidade civil, p. 65.

Cumpre salientar, que o Código Civil Brasileiro também prevê de maneira expressa no artigo 186 o instituto dano moral, bem como a sua reparação, inserida no artigo 927 do mencionado dispositivo legal.194

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou

imprudência, violar direito ou causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.195

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a

outrem, fica obrigado a repará-lo.196

Neste sentido, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina decidiu:

EMENTA: Responsabilidade civil. Inscrição indevida em cadastro de

proteção ao crédito. Danos morais. Quantificação. Os sentimentos pessoais de contrariedade, estorvo e aborrecimento advindos da inscrição indevida do nome em cadastro de proteção ao crédito devem ser compensados a título de danos morais. Na ausência de critérios objetivos para mensuração do valor econômico da compensação pelos danos morais, deve o julgador valer-se das regras de experiência comum e bom senso, fixando essa verba de tal forma que não seja irrisória, a ponto de menosprezar a dor sofrida pela vítima, ou exagerada, tornando-se fonte de enriquecimento ilícito.197

Desta feita, com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, encontra-se pacificado na doutrina e na jurisprudência a possibilidade da reparação por danos morais.198

No documento UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ (páginas 43-49)

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