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PARTE II – O ESTUDO (SEGUNDO ESTÁGIO)

5.2 História Descritiva

“Uma vez que o pesquisador tenha escrito algumas frases descritivas sobre o que é a pesquisa, ele está pronto para avançar para a integração das principais categorias ou temas dentro de uma explicação teórica unificada. Integração significa escolher uma categoria central, em seguida, recontar a história em torno dessa categoria, utilizando outras categorias e conceitos derivados durante a pesquisa.”

(CORBIN, STRAUSS, 2008, p.107)

Quando os sindicatos, a Câmara Regional do Grande ABC e o SEBRAE efetuaram o diagnóstico do setor moveleiro da região metropolitana de São Paulo, e propuseram aos empresários a criação de um Arranjo Produtivo Local (APL) em 2004, a idéia foi bem aceita. As experiências anteriores dos empresários de dificuldades de acesso e falta de informação, isolamento, perda de mercado e iniciativas malsucedidas na formação de associações reforçou o desejo de construir uma APL diferenciada. A primeira ação tomada foi o treinamento Comportamental do Sebrae, com foco no Empreendedorismo e Associativismo, que é considerado pelos entrevistados como o marco que forneceu o conhecimento necessário para viabilizar o desejo do grupo.

Figura 11 – Movelaria Paulista na linha do tempo

Fonte: Elaboração própria

A Movelaria Paulista pode ter a sua história dividida em três períodos: o primeiro período vai da sua formação em 2004 até 2007, com a elaboração do projeto para o segundo ciclo de investimento; o período de 2008-2010, que é para a execução do projeto; e o terceiro período, que inicia em 2011. O primeiro período eu chamei de formação, onde o desejo do grupo era montar a APL. As iniciativas, ou projetos do grupo, visavam estabelecer práticas para o compartilhamento e troca de conhecimento e a interação entre os membros. Como foi o caso das visitas entre as empresas e o benchmarking em grupo, participando em eventos, feiras e formação de comitivas para visitar outras redes moveleiras. À medida que a confiança mútua aumenta, maior é a importância dos relacionamentos para o grupo, que se torna um ativo valioso. O isolamento e a falta de informação já não faziam mais parte do cotidiano dos empresários da Movelaria Paulista. O papel dos sindicatos neste período foi de mediar e apresentar os empresários, introduzindo o Sebrae, que atuou como um provedor de treinamentos e consultoria, funcionando como um catalisador na formação inicial do grupo.

O segundo período chamei de consolidação, pois o desejo do grupo está em fortalecer o APL com iniciativas para a criação e divulgação de uma identidade, projetos técnicos para aumentar a competitividade ou ações de cunho social e voltadas para a melhoria do setor paulista. Num processo natural de evolução, alguns projetos são mais complexos, requisitando

novos conhecimentos e gerando situações novas, nas quais as experiências anteriores não contribuem para um encaminhamento eficiente. Além disso, o contexto macroeconômico ter demandado atenção redobrada do pequeno empresário, demonstrando ser bastante impactado pelas turbulências do mercado. Este período é marcado por demandas de novos conhecimentos, necessidade de experiências que nem sempre estão disponíveis no grupo e em algumas situações não há um consenso do posicionamento a ser tomado. A Movelaria exercita um processo de aprendizagem, tentando novas alternativas, experimentando novas fontes de conhecimento, construindo novas experiências e identificando aquelas nas quais se ajusta e se sente satisfeita com a sua condução e desempenho.

Desta forma, ela procura criar condições de vivenciar um terceiro período, que eu chamo de pós-consolidação caracterizado, espero, por um crescimento orgânico: uma fase em que o grupo já aprendeu a endereçar suas questões, incorporar as experiências, buscar novos conhecimentos e evoluir suas competências, continuando a manter únicos seus valores para crescer de forma sustentável. Este período iniciou em setembro/2010 com as reuniões de planejamento para o biênio 2011-2012, contou com a presença de trinta empresários, dos quais cinco novos empresários, as expectativas foram expostas e um balanço dos projetos anteriores foi feito: a interação foi a tônica do encontro.

Três aspectos me chamaram a atenção durante a investigação desta rede: (1) a entrada na Movelaria Paulista é considerado um marco divisor na história das organizações entrevistadas; (2) a existência de um valor comum; e (3) a demanda por mudanças, derivadas das dificuldades enfrentadas por determinados projetos. A iniciativa promovida pelos sindicatos e pelo Sebrae para a constituição de um Arranjo Produtivo Local (APL) ocorre num contexto em que as indústrias de móveis da região metropolitana de São Paulo sofriam com a concorrência das empresas do sul, altamente industrializadas e coesas, em oposição a um setor paulista desintegrado e carente de informações. Os empresários relatam experiências

malsucedidas na constituição de associações para exportação, projetos em parceria, dificuldades na obtenção de informações e até na operacionalização de maquinários adquiridos. Essas experiências negativas fortaleceram o desejo inicial de fazer com que a APL funcionasse como uma central de troca de informações, compartilhamento de experiências e de boas práticas.

Logo percebi que o termo inovação não fazia parte do vocabulário das empresas e que o termo usado para nomear as melhorias, iniciativas diversas e oportunidades identificadas no grupo eram chamadas de projeto; e, segundo o conceito de inovação adotado para esta pesquisa, as iniciativas implantadas com sucesso são inovações, portanto acabei adotando o termo projeto para referenciá-las (projeto implantado com sucesso na MP = inovação).

Algum dos projetos apareciam de forma recorrente nos dados analisados, como o LeoEduca, que é uma parceria da MP com o Instituto Leo para formar e empregar jovens aprendizes, e o projeto de Resíduos que envolve a coleta dos resíduos e a sua separação, em parceria com a associação de catadores. Numa das visitas à fábricas deparei com a visita dos jovens formandos do Instituto Leo e presenciei in loco a interação „fascinante‟ entre empresário e aprendizes, o que facilitou o entendimento do significado deste projeto para o grupo. A MP tem outros exemplos de iniciativas voltadas para o bem-estar social, do setor como um todo e para a melhoria da rede, apoiando a evolução de cada integrante. Esse comportamento, que nominei de orientação pró coletivo, contribui para aumentar a percepção de ganhos de estar na rede, além de facilitar a inclusão e integração dos membros.

Os diferentes tipos de projetos conduzidos na MP usam as experiências do grupo como fonte de conhecimento e serve de meio para a interação/integração dos membros. Os projetos concluídos com sucesso, além de gerarem resultados diretos para os empresários, fortaleceram os laços e a confiança de que a empresa é mais forte com o grupo do que

sozinha; e, os projetos que não foram concluídos geraram experiências e lições que o grupo busca incorporar como aprendizado para projetos futuros.

Nominei de ambiente transformador o desejo dos empresários de fazer a Movelaria dar certo por meio do associativismo e de contribuição para a construção de uma sociedade melhor. É um ciclo virtuoso construído pela MP caracterizado pela orientação pró coletivo que inclui e integra os membros, gera resultados e aumenta a percepção de ganhos. O comportamento e a colaboração no grupo inspiram os seus integrantes a promoverem mudança internas na própria organização, que envolve e influencia os seus funcionários, afetando positivamente a comunidade ao redor.

INOVAÇÃO NA REDE MP: Para os envolvidos na rede, o ambiente transformador

da MP associado às experiências do grupo gera resulstados diretos (maturidade, inovações) e indiretos (sociedade), além de atrair novos parceiros.

A dinâmica da MP propicia um ambiente transformador que gera como resultados, além das inovações (projetos implantados com sucesso), melhorias internas em cada organização (↑ maturidade), ganhos para a sociedade e para os demais envolvidos, além de atrair novos parceiros. A evolução dos projetos e da maturidade das empresas influi à medida que a diversidade dos projetos realizados pela MP gera resultados tangíveis (aumento de competitividade e retorno financeiro) e também agrega um valor intangível, ao apoiar projetos de cunho social, como o LeoEduca (treinamento e emprego de jovens aprendizes de comunidades carentes).

Proposição 1: Ações voltadas para a melhoria coletiva (rede, setor ou sociedade)

aumentam a percepção de ganhos, facilita a inclusão e integração dos membros e fortalece o grupo.

Proposição 2: Iniciativas e ações não egoístas, voltadas para o coletivo, como projetos

sociais despertam a consciência coletiva, produzindo ganhos diretos (maturidade) e indiretos (sociedade) e atraindo mais parceiros (oportunidades).

Proposição 3: Quanto maior a experiência dos integrantes da rede, maiores as chances

de conduzir os projetos com sucesso, incluindo e integrando os membros e gerando resultados.

O comportamento, os resultados e a exposição da MP acabam atraindo novos parceiros e instituições interessadas em contribuir com a rede, o que aumenta o espaço criativo e as possibilidades de inovação. Novos atores podem possibilitar “pontes” para encurtar o acesso a novos conhecimentos, favorecendo a continuidade do ciclo virtuoso da MP (+ experiência; + conhecimento + oportunidade). Porém, a rede também enfrenta desafios: primeiro, lidar com os problemas (questões) que surgem nos projetos à medida que aumenta a complexidade, ou o mercado que gera novas demandas de ordem gerencial ou técnica que interferem no desempenho dos projetos; e, segundo a comunicação fluída e integração entre os membros, parceiros e novos integrantes (empresários ou parceiros), incentivando a busca de soluções para não afetar os resultados.

No restante deste capítulo descrevo o processo de coleta-análise para construir as categorias principais que compõem a teoria substantiva, apresentada nesta seção e usada para contar o fenômeno da colaboração que gera inovação na MP.