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As disposições do Programa Brasil sem Homofobia39 apontam para o direito à educação, à promoção dos valores de respeito à paz e à não-discriminação por orientação sexual e orientam a elaboração de diretrizes voltadas para os Sistemas de Ensino, tais como:

Fomentar e apoiar curso de formação inicial e continuada de professores na área da sexualidade;

Formar equipes multidisciplinares para avaliação dos livros didáticos, de modo a eliminar aspectos discriminatórios por orientação sexual e a superação da homofobia;

Estimular a produção de materiais educativos (filmes, vídeos e publicações) sobre orientação sexual e superação da homofobia;

Apoiar e divulgar a produção de materiais específicos para a formação de professores;

Divulgar as informações científicas sobre sexualidade humana;

Estimular a pesquisa e a difusão de conhecimentos que contribuam para o combate à violência e à discriminação de GLTB.

Criar o Subcomitê sobre Educação em Direitos Humanos no Ministério da Educação, com a participação do movimento de homossexuais, para acompanhar e avaliar as diretrizes traçadas (Brasil sem homofobia, 2004, p. 22-23).

Assim, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República passa a discutir a homofobia, com caráter de política de Estado. A 1ª Conferência LGBT foi realizada em 2008, com a participação dos poderes públicos e da sociedade civil para a produção do Plano Nacional de Promoção da Cidadania e dos Direitos Humanos LGBT, que foi lançado em 2009. Em uma de suas ações, fez nascer o Projeto Escola Sem Homofobia, que tinha como norte a formação docente, como também a produção de materiais didático-pedagógicos para as escolas.

O Projeto Escola sem Homofobia teve como sua principal ação a apresentação de um kit, formado por livro, caderno, vídeos e bolesh40, cujo material tinha como meta a formação da docência. Manteve-se então a necessidade de o Estado assumir a tarefa. No entanto, se os estudos de gênero são uma temática apenas parcialmente contemplada pela escola, as discussões sobre as sexualidades carregam ainda maiores dificuldades para o desenvolvimento do trabalho. Quando elas acontecem, são de forma incipiente, afinal, o corpo docente encontra-se despreparado ou não está em condições de abordar essas questões em sala de aula. Nessa conjuntura, devemos entender que a proposição de distribuição do kit representou um marco para os estudos de sexualidade e gênero voltados para a escola, um importante elemento, capaz de quebrar o silêncio institucional, com pretensão de recriar uma escola cidadã, capaz de discutir e se posicionar contra a homofobia.

Com o veto ao kit anti-homofobia, em 2011, em função da pressão exercida pela bancada evangélica no Congresso Nacional, não foi possível, de imediato, fazer a formação junto às escolas, mas, em compensação, propiciou uma imensa discussão pelo Brasil, tanto pelos meios de comunicação como pelas redes sociais.

40 Folhetos com temáticas para discussão.

Dessa forma, houve uma intensificação dos discursos reivindicatórios sobre a necessidade de medidas educativas para a prevenção da violência contra estudantes, ao tempo em que instigou e fez proliferar o recrudescimento de posições fundamentalistas, por parte da bancada religiosa no Congresso Nacional41.

Não se pode ignorar que, nas últimas décadas, houve algum investimento voltado para a desconstrução do modelo binário vigente, na medida em que as políticas de fomento à diversidade sexual propõem a organização de conselhos estaduais e municipais, políticas para coibir as diversas formas de violência, como a Lei Maria da Penha, o Projeto de Lei da Câmara – PEC 122 (ainda sem aprovação), que criminaliza a homofobia. Além disso, instituições governamentais, como, por exemplo, o próprio Ministério da Educação e Cultura – MEC, incentivam discussões na escola, instituem premiação de artigos e trabalhos científicos que promovam a igualdade de gênero, fazem proliferar cursos de formação continuada com as temáticas de gênero e sexualidade, tudo isso por ser o Brasil signatário de alguns acordos que buscam dirimir as diferenças entre os sexos e os gêneros.

No entanto, há outros segmentos que permanecem em posição contrária, minando os avanços conquistados. Nesse sentido, podemos citar o veto ao kit anti-homofobia pela presidenta Dilma Rousseff, ou a eleição do deputado Marcos Feliciano, também participante da bancada evangélica, para a Comissão dos Direitos Humanos, em 2013.

Além disso, o fato de algumas pautas terem sido colocadas em votação mostra a intencionalidade do atual Congresso Nacional em ser coercitivo em relação às mulheres e à comunidade homossexual, a exemplo do Estatuto da Família, que representa retrocesso para o movimento LGBT. Esse projeto propõe regras jurídicas para definição de quais grupos sociais podem ser considerados uma família perante a lei. Nesse sentido, exclui as relações entre pessoas do mesmo sexo, ao tempo que mantém a heterossexualidade como único modelo familiar.

Uma questão, no entanto, merece reflexões: a escola brasileira, mesmo que em muitos aspectos funcione de forma tradicional, está sendo convocada para se estabelecer como o espaço capaz de lidar com a diversidade, na tentativa de transformação da nossa sociedade. Mas quais seriam os instrumentos utilizados para essa ação transformadora? De onde começar? O que já foi feito nesse sentido?

41 Atualmente, o Congresso Nacional tem 73 deputados evangélicos, além de alguns com posições estratégicas, a exemplo da presidência nas mãos de Eduardo Cunha, que faz parte da bancada, o que compromete principalmente os pleitos das mulheres e da população LGBT.

Tomando as recomendações aprovadas na Conferência Nacional de Educação Básica42 realizada em 2008, no Eixo IV, que trata da Inclusão e Diversidade na Educação Básica, sugere políticas de inclusão para variados segmentos, que deverão:

1. realizar constantemente a análise de livros didáticos e paradidáticos utilizados nas escolas - conteúdos e imagens –, para evitar as discriminações de gênero e de diversidade sexual e, quando isso for constatado, retirá-los de circulação;

2. desenvolver e ampliar programas de formação inicial e continuada em sexualidade e diversidade, visando a superar preconceitos, discriminação, violência sexista e homofóbica no ambiente escolar, e assegurar que a escola seja um espaço pedagógico, livre e seguro para todos/todas, garantindo a inclusão e a qualidade de vida;

3. rever e implementar diretrizes, legislações e medidas administrativas para os sistemas de ensino promoverem a cultura do reconhecimento da diversidade de gênero, identidade de gênero e orientação sexual no cotidiano escolar;

4. garantir que a produção de todo e qualquer material didático-pedagógico incorpore a categoria “gênero” como instrumento de análise, e que não se utilize de linguagem sexista, homofóbica e discriminatória;

5. inserir os estudos de gênero e diversidade sexual no currículo das licenciaturas (2008, p. 78/79).

O documento propõe atender as especificidades da educação indígena, quilombola, afrodescendente, do campo, educação especial e das pessoas com privação de liberdade, nas quais também se incluem gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros, mulheres, jovens, adultos e idosos. No entanto, há de se pontuar que, em todas essas categorias de educação, existe a diversidade de sexualidades. Ou seja, em cada uma das categorias de diversidade existe a possibilidade de lidar com as sexualidades. Portanto, essa especificidade, por estar contida nas demais categorias, deveria estar sendo proposta como tema transversalizador.