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IV. EXEMPLOS DE TRANSFERÊNCIAS INTERGOVERNAMENTAIS NO BRASIL

4.5. ICMS – Exportação

Essa forma de compensação tem sido objeto de intensos conflitos e negociações entre os entes federativos. A desoneração do ICMS em operações de exportação foi estabelecida, inicialmente, pela Lei Complementar nº 86, de 1996, a chamada Lei Kandir, que previa compensações aos Estados em seu artigo 31, fixando, em seu Anexo I, os coeficientes de participação de cada Estado no montante transferido.

Assim, ao longo dos anos, acumularam-se protestos dos Estados, que alegavam ser baixo o valor transferido anualmente pela União. Em 2003, no âmbito de negociações em torno da reforma tributária, aprovou-se a Emenda Constitucional nº 42, que transferiu para a Constituição a obrigatoriedade de compensação (art. 91 do ADCT).

O art. 91 do ADCT fixa a obrigatoriedade de compensação relativa aos produtos primários e semi elaborados e estabelece que uma lei complementar defina o montante a ser transferido e os critérios de repartição dos recursos entre os Estados:

Art. 91. A União entregará aos Estados e ao Distrito Federal o montante definido em lei complementar, de acordo com critérios, prazos e condições nela determinados, podendo considerar as exportações para o exterior de produtos primários e semi- elaborados, a relação entre as exportações e as importações, os créditos decorrentes de aquisições destinadas ao ativo permanente e a efetiva manutenção e aproveitamento do crédito do imposto a que se refere o art. 155, § 2º, X, a.

§ 1º Do montante de recursos que cabe a cada Estado, setenta e cinco por cento pertencem ao próprio Estado, e vinte e cinco por cento, aos seus Municípios, distribuídos segundo os critérios a que se refere o art. 158, parágrafo único, da Constituição.

§ 2º A entrega de recursos prevista neste artigo perdurará, conforme definido em lei complementar, até que o imposto a que se refere o art. 155, II, tenha o produto de sua arrecadação destinado predominantemente, em proporção não inferior a oitenta por cento, ao Estado onde ocorrer o consumo das mercadorias, bens ou serviços.

§ 3º Enquanto não for editada a lei complementar de que trata o caput, em substituição ao sistema de entrega de recursos nele previsto, permanecerá vigente o sistema de entrega de recursos previsto no art. 31 e Anexo da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, com a redação dada pela Lei Complementar nº 115, de 26 de dezembro de 2002.

§ 4º Os Estados e o Distrito Federal deverão apresentar à União, nos termos das instruções baixadas pelo Ministério da Fazenda, as informações relativas ao imposto de que trata o art. 155, II, declaradas pelos contribuintes que realizarem operações ou prestações com destino ao exterior.

Assim, ficou estabelecido que: (i) lei complementar definirá os critérios, prazos e condições para a transferência dos recursos; (ii) os critérios de partilha serão proporcionais, entre outros fatores, aos volumes de exportação de produtos primários e semi elaborados e aos montantes de importação e exportação; (iii) 25% dos recursos serão transferidos aos Municípios nos mesmos critérios da partilha do ICMS e (iv) enquanto não for editada a lei complementar que definirá os novos critérios e valores, valerão as regras estabelecidas na Lei Kandir.

Entretanto, como a lei complementar referida não foi editada, permanecem vigentes os critérios da Lei Kandir. Entretanto, essa lei só previa recursos líquidos e certos para essa transferência até o ano-calendário de 2003. A partir daí, ela estabelece que o montante a ser transferido depende de haver dotação orçamentária para essa finalidade.

Assim, o Poder Executivo Federal encontrou uma oportunidade para reduzir as transferências, não disponibilizando dotação orçamentária para esse repasse. Portanto, existe um permanente jogo político de pressão e barganha no Congresso Nacional que se repete todo ano, no qual se negocia não só o montante total a ser transferido, mas, também, a participação de cada Estado217.

Segundo notícias veiculadas pela imprensa218, que bem demonstram esse jogo político, o relator do Orçamento de 2010, deputado Geraldo Magela (PT-DF), tem enfrentado dificuldades para assegurar as compensações aos Estados pela Lei Kandir, calculadas em R$

217 Em 2004, a MP nº 193 (convertida na Lei nº 10.966, de 2004) alocou R$ 900 milhões com essa finalidade. Em 2005, as MP’s nº 237 e 271 (convertidas nas Leis nº 11.131, de 2005, e 11.289, de 2006) fizeram dois aportes de R$ 900 milhões. Para 2006, a MP nº 328 (convertida na Lei nº 11.452, de 2007) destinou R$ 1,95 bilhão. Para 2007, as MP’s nº 355 e 368 (convertidas nas Leis nº 11.492 e 11.512, de 2007) destinaram dois aportes de R$ 975 milhões.

218 Notícia disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u640125.shtml>. Acesso em 19 de novembro de 2009.

3,9 bilhões. Magela afirma que existe a necessidade de compensar uma perda de arrecadação de aproximadamente R$ 22 bilhões no Orçamento, o que pode ocorrer pela redução de R$ 10 milhões para R$ 8 milhões nos valores reservados para as chamadas emendas individuais, além do congelamento das emendas de bancadas e de comissões.

Assim, como forma de evitar esse desgaste institucional que se repete a cada novo orçamento, o que é prejudicial ao próprio pacto federativo, deve-se fazer um esforço político para editar a Lei Complementar a que alude o art. 91 do ADCT, de modo que os critérios, prazos e condições para a transferência dos recursos aqui tratados sejam determinados de forma clara e transparente219.

De outro lado, mesmo que haja a manutenção do atual sistema de incidência do ICMS, é questionável a necessidade de pagamento de compensação aos estados, em decorrência de uma desoneração desse imposto estadual na exportação datada de 1996 (portanto, há mais de 10 anos). Os estados são titulares de uma competência tributária que, por lei federal, não pode incidir sobre exportações e deveriam ter aprendido a conviver com essa realidade. Assim, a necessidade de receita adicional deve ser procurada dentro da sua competência tributária própria (seja o ICMS, seja outro tributo de competência estadual), interrompendo-se essa barganha sistêmica para com o governo federal, tão prejudicial aos interesses da Federação.

Ademais, no que se refere especificamente ao ICMS – Exportação, trata-se de forma repasse de receitas que não proporciona a autonomia subnacional, tendo em vista, face o quadro normativo atual, o elevado grau de incerteza dos estados quanto ao seu efetivo recebimento, bem como o momento em que se dará essa transferência, o que prejudica qualquer forma de planejamento por parte do ente recebedor dos recursos.