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3. Doença Degenerativa Crónica da Válvula Mitral

3.6. Sinais Clínicos

3.7.4.1. Identificação de lesões valvulares

A vista paraesternal direita com uma imagem em eixo longo de 4 câmaras é excelente para observar a VM e pesquisar possíveis lesões na mesma. A identificação ecocardiográfica das lesões existentes na VM depende do ganho e da profundidade, que por sua vez são definições dependentes do transdutor, pelo que pode ser melhor comparar os folhetos da válvula com outras estruturas que estejam a uma profundidade aproximada (Boon, 2011a). As primeiras alterações valvulares macroscópicas que podem ser identificadas em ecocardiografia bidimensional ou em modo-M são nódulos pequenos e regulares nas pontas das cúspides e CT espessadas (ver figura 10). Estas deformações nodulares são geralmente maiores no folheto

anterior e tornam-se mais espessas e irregulares com a progressão da doença (Chetboul & Tissier, 2012). Deve destacar-se que as lesões valvulares observadas em casos de endocardite bacteriana podem parecer idênticas às presentes na DDCVM, pelo que a distinção entre estas duas doenças muitas vezes não pode ser feita baseada num exame ecocardiográfico. Contudo, as lesões de endocardite bacteriana podem ser solitárias, mais ecogénicas e podem oscilar (Kittleson, 1998). Além do mais, como resultado da inserção de múltiplas CT na extremidade e superfície ventricular das cúspides mitrais, por vezes pode ser difícil distinguir lesões de espessamento das ditas inserções de CT, especialmente quando as alterações na VM são ligeiras (Kíbar, Toker & Öztürk, 2005). As alterações dos folhetos, como referido, são um processo contínuo que leva a que estes eventualmente adoptem o aspecto de “tacos de basebol”, devido ao espessamento mais pronunciado nas extremidades livres. Contudo, é importante observar sempre a totalidade da válvula pois as lesões muitas vezes estão distribuídas de forma desigual (Häggström et al., 2005). O movimento da VM espessada em modo-M é definido por linhas irregulares e emaranhadas e, apesar de não ser comum, pode também haver um movimento de vibração sistólico da válvula quando o jacto regurgitante a atravessa. No entanto, quando as lesões são extensas, a espessura da VM na imagem mascara o dito movimento de vibração (Boon, 2011a).

Figura 10. Ecocardiografias obtidas de 3 cães com DDCVM (A e B, vista bidimensional paraesternal direita de 5 e 4 câmaras respectivamente; C, modo-M gravado ao nível da válvula mitral) (adaptado de Chetboul & Tissier, 2012).

Legenda. A – as setas indicam lesões nodulares nas extremidades dos folhetos, a lesão é maior no folheto anterior; B - pode-se observar espessamento das cordas tendíneas, como indicado pelas duplas setas; C – A seta amarela aponta para um folheto anterior da válvula mitral espessado e irregular. Ao: Aorta; LV: Ventrículo Esquerdo; LA: Átrio Esquerdo; IVS: Septo Interventricular; LVFW: Parede Livre do Ventrículo Esquerdo.

Um aplanamento sistólico anómalo de um ou ambos os folhetos valvulares e posteriormente PVM são achados ecocardiográficos igualmente comuns (Chetboul & Tissier, 2012). O annulus mitral pode ser identificado de duas formas, ou traçando uma linha da base da válvula aórtica até ao ponto de inserção do folheto posterior da VM na vista paraesternal direita com imagem em eixo longo do tracto de saída do VE, ou por uma linha que une os pontos de inserção de ambos os folhetos mitrais na vista de 4 câmaras. Em qualquer dos casos, considera-se haver PVM quando um ou ambos os folhetos se estendem na direcção do átrio esquerdo para além dessa linha durante a sístole (ver figuras 11 e 12) (Boon, 2011a). Durante a fase isovolumétrica da sístole, a condição do VE é coincidente com o momento imediatamente anterior ao início da fase de ejecção, dando assim a sensação que o movimento cardíaco faz uma pausa. Assim, nesse momento, é possível identificar claramente as cúspides e o annulus mitral (Kíbar, Toker & Öztürk, 2005). Diversos estudos, como os conduzidos por Pedersen et al (1999), Olsen, Pedersen e Martinussen (2003) e Terzo et al (2009) encontraram uma correlação significativa entre o grau de PVM e a gravidade de RM, bem como um valor preditivo significativo entre este achado e o grau de progressão da doença, avaliado pelo aumento do diâmetro do átrio esquerdo e do diâmetro interno do ventrículo esquerdo no final da diástole (LVEDD).

Figura 11. Ilustração do critério utilizado para identificar prolapso da válvula mitral em cães através da vista paraesternal direita com uma imagem em eixo longo de 4 câmaras (adaptado de Pedersen et al., 1999).

Legenda. A linha P, traçada entre os pontos de inserção de ambos os folhetos, marca o limite entre ausência de prolapso e prolapso ligeiro. A linha T, traçada a partir da zona média da área ecogénica, frequentemente elíptica, na parte inferior do septo atrial, até à junção atrioventricular, estabelece a fronteira entre prolapso ligeiro e prolapso grave. RA: átrio direito; LA: átrio esquerdo; VS: septo interventricular; LV: ventrículo esquerdo; LVW: parede livre do ventrículo esquerdo.

A ruptura de uma ou mais CT, resultando numa cúspide ondulante, pode ser diagnosticada em imagens ecocardiográficas quando a ponta dessa cúspide está dirigida para o átrio esquerdo durante a sístole. Durante a diástole, por vezes a cúspide pode ser vista dobrada sobre si mesma no trato de saída do VE (Boon, 2011a). A ecocardiografia em 2 dimensões (2-D) tem

sido descrita como superior ao modo-M na identificação de cúspides ondulantes associadas a ruptura de CT. Um estudo que avaliou 706 cães com DDCVM diagnosticou ruptura de CT em 114 (16,1%), sendo que a maioria destes (106/114, 93%) tinham uma RM grave quando avaliada por Doppler de cor. Esse mesmo estudo preconiza o exame rotineiro em 2-D das cúspides mitrais em câmara-lenta para permitir a detecção sistemática de ruptura de CT (Serres et al., 2007a). Está também referida a observação ecocardiográfica de ruptura de MP tanto em modo-M, onde se pode ver uma massa anómala a movimentar-se dentro do VE, como em imagens em 2-D, que permitem uma visualização clara do músculo rasgado e dos seus movimentos no interior da câmara cardíaca (Boon, 2011a).

Figura 12. Imagens ecocardiográficas de prolapso da válvula mitral em vista paraesternal direita com uma imagem em eixo longo de 4 câmaras (adaptado de Terzo et al., 2009).

Legenda. (A) - Prolapso ligeiro da válvula mitral, avaliado por protrusão do folheto anterior para a linha P. (B, C, D) – Prolapso moderado da válvula mitral por protusão de um ou ambos os folhetos para o espaço entre as linhas P e T. Em (C), reparar também no espessamento das cordas tendíneas. (E) – Prolapso grave da válvula mitral por protrusão de ambos os folhetos para além da linha T.