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Identificação dos elementos de estrutura secundária

Proteasomo 26S ATPase

3.1.2.2. Identificação dos elementos de estrutura secundária

Uma vez obtido o assinalamento seqüencial de todos os amino ácidos presentes na molécula, e os respectivos valores de deslocamentos químicos dos vários núcleos, tem-se acesso imediato a informação estrutural muito valiosa. Há muito que é reconhecido que os valores dos deslocamentos químicos dos núcleos da cadeia principal contêm informações sobre a estrutura secundária da proteína em estudo. De fato, estruturas secundárias regulares de proteínas tais como hélices α e fitas β apresentam valores de deslocamentos químicos característicos quando comparados com estruturas randômicas. Assim, os valores dos deslocamentos químicos de certos núcleos, como 1Hα, 13Cα e 13Cβ, podem ser utilizados como um indicativo de estrutura secundária. Em estruturas helicoidais, os núcleos 1Hα e 13Cβ

apresentam deslocamentos químicos menores do que os valores esperados para um determinado aminoácido em conformação randômica, enquanto os núcleos 13Cα apresentam valores maiores. Em fitas β observa-se o fenômeno oposto. Mudanças similares são também observadas para outros núcleos, como: 13CO, 1Hβ, 1HN e 15N.

Este fenômeno possibilitou a criação do chamado Índice de Deslocamento Químico ou “Chemical Shift Index” (CSI) (WISHART, et al., 1992; WISHART e SYKES, 1994). O índice de deslocamento químico nada mais é do que a diferença entre os valores de deslocamento químico para os núcleos da cadeia principal de um dado amino ácido obtidos experimentalmente a partir do assinalamento seqüencial da proteína e os valores de deslocamento químico médios para o mesmo amino ácido em conformação randômica. Desta forma as regiões da proteína que apresentarem diferenças negativas para 1Hα e 13Cβ e, positivas para 13Cα em quatro ou mais resíduos de amino ácidos consecutivos indicam a presença de uma conformação em α-hélice. Já as regiões da proteína que apresentarem diferenças negativas para 1Hα e 13Cβ e, positivas para 13Cα em quatro ou mais resíduos de amino ácidos consecutivos indicam a presença de uma conformação de fita β. Caso o índice de deslocamento químico esteja próximo de zero para uma dada região da proteína, esta região provavelmente não apresenta estrutura secundária regular (WUTRICH, 1986). Desta forma, assim que as ressonâncias da cadeia principal de uma dada proteína estão atribuídas, é possível predizer de forma rápida e simples o conteúdo de estrutura secundária da mesma.

Um outro método freqüentemente utilizado em estudos de RMN para obter informações sobre a estrutura secundária de uma proteína envolve o cálculo da constante de acoplamento escalar 3JHNHα. O acoplamento escalar ou acoplamento

pela interação com um núcleo B ao qual A está unido por ligação química. O acoplamento escalar, é representado pela constante de acoplamento nJab, onde n é

o número de ligações covalentes separando os núcleos A e B. O acoplamento escalar pode ser evidenciado no espectro de RMN como um pico composto, denominado de multipleto (sinal dividido em dois ou mais componentes) em que os sinais estão separados por uma distância correspondente a J (Hz). Esta constante independe do campo magnético aplicado e a sua unidade é dada em Hz. Assim, a constante de acoplamento escalar 3JHNHα representa o acoplamento escalar a 3

ligações entre os núcleos 1HN e 1Hα de um dado amino ácido. Em sistemas simples, a constante de acoplamento pode ser medida pela separação de uma ressonância específica em um espectro 1D ou 2D. Para sistemas maiores, onde a largura de linha dos sinais excede o valor do acoplamento, fica difícil extrair uma medida exata utilizando esta estratégia. Para solucionar este problema, surgiram uma série de experimentos que possibilitam a realização de medidas quantitativas de diversas constantes de acoplamento tais como o experimento 3D de dupla ressonância HNHA que fornece informações sobre a constante de acoplamento escalar 3JHNHα,

nos quais o valor de J está relacionado à intensidade dos sinais em questão (VUISTER e BAX, 1993).

Uma vez obtidas as constantes de acoplamento experimentalmente, os ângulos diedros Ф e Ψ da proteína em estudo podem ser facilmente calculados através da relação de Karplus (KARPLUS, 1959) que define uma relação geométrica entre a constante de acoplamento 3JHNHα e o ângulo diedro Ф:

3

JHNHα = 6.4 cos2 (Ф – 60) - 1.4 cos (Ф - 60) +1.9 [Equação 1]

Em proteínas os ângulos diedros Ф para todos os resíduos de amino ácidos, com exceção das glicinas, estão concentrados na faixa de -30o a -180° (WÜTHRICH, 1986). Além disso, em regiões de estrutura secundária, os valores de Ф são conhecidos: 3JHNHα varia de 4-6 Hz em α-hélices e de 8-10 Hz em regiões de fita- β

(VUISTER et al., 2002).

Assim, conhecendo o valor de 3JHNHα obtido experimentalmente, é possível

identificar as estruturas secundárias regulares presentes na proteína em estudo. Segmentos de três ou mais resíduos de amino ácidos consecutivos que apresentam valores de 3JHNHα < 6,0 Hz indicam conformação em α-hélice. Os mesmos

segmentos com valores de 3JHNHα > 8,0 Hz indicam conformação em fita-β

(WÜTHRICH, 1986; VUISTER et al., 2002).

Atualmente é também possível predizer os valores de ângulos diedros, e conseqüentemente o tipo de estrutura secundária presente na proteína em estudo, baseando-se apenas nos valores de deslocamento químico dos núcleos da cadeia principal obtidos experimentalmente. Este método foi descrito por CORNILESCU e colaboradores (1999) e foi denominado TALOS (“Torsion Angle Likelihood Obtained from Shift and Sequence Similarity”). Este programa baseia-se em uma base de dados de 20 proteínas para as quais os valores de deslocamentos químicos bem como as estruturas cristalinas de alta resolução são conhecidos. Usando os deslocamentos químicos dos núcleos 13Cα, 13Cα, 13CO, 1Hα e 15N obtidos experimentalmente para a proteína em estudo, o programa procura na base de dados pelos resultados mais próximos para cada tripleto de amino ácidos baseado na similaridade dos deslocamentos químicos e da seqüência primária. Se os resíduos centrais nos dez melhores “hits” apresentarem ângulos Ф e Ψ semelhantes entre si, então a média destes valores pode ser usada como predição dos valores

dos ângulos diedros da proteína em estudo. Ângulos diedros preditos por TALOS são freqüentemente incorporados como restrições para o cálculo da estrutura da proteína (veja por exemplo KOPKE SALINAS et al., 2005; KATSUYAMA et al., 2007). Recentemente WANG e LIU (2007) descreveram um novo método muito semelhante para a predição de ângulos Ф e Ψ que também faz uso da seqüência primária e dos deslocamentos químicos dos núcleos da cadeia principal de segmentos tripeptídicos. Esta nova abordagem baseia-se na probabilidade do resíduo central apresentar uma determinada conformação, baseado nos deslocamentos químicos de segmentos tripeptídicos de estruturas conhecidas e apresenta predições tão boas quanto o programa TALOS (WANG e LIU, 2007).