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Proteasomo 26S ATPase

3.1.1.2. A protease ClpP

O conhecimento que se detém hoje sobre a proteína ClpP provém, principalmente, de estudos bioquímicos e estruturais nos últimos anos sobre a proteína ClpP de E.coli. A proteína ClpP de E.coli é sintetizada inicialmente como uma pró-proteína de 207 resíduos que é auto-proteolíticamente processada durante o enovelamento da cadeia para produzir uma proteína madura com 193 resíduos (MAURIZI et al., 1990b; WANG et al., 1997).

A estrutura cristalina de ClpP revelou uma nova família estrutural dentro da superfamília de serina-proteases e definiu um novo enovelamento do tipo α/β (WANG et al., 1997; SZYK e MAURIZI, 2006). Cada subunidade da proteína ClpP consiste de seis unidades repetidas de uma unidade α/β com uma unidade α/β adicional protuberante.

Em uma projeção, o monômero ClpP assemelha-se a uma larga cabeça de um machado (domínio “cabeça”) que possui um pequeno cabo (domínio “cabo”). Os resíduos 28 a 120 e 160 a 188 formam o domínio “cabeça” enquanto o domínio “cabo” é formado pelos resíduos 125 a 130 e 132 a 157 (WANG et al., 1997; SZYK e

MAURIZI, 2006). Os resíduos amino (11 a 27) e carboxiterminais (189 a 193) encontram-se em extremos opostos do domínio “cabeça”, projetando-se para fora deste domínio (vide Figura 14 A).

O sítio ativo desta serina-protease compreende a tríade catalítica formada pelos resíduos Ser-97, His-122 e Asp-171 e está localizado em uma reentrância na junção entre os domínios “cabeça” e “cabo” (WOO et al., 1989; WANG et al., 1997; SZYK e MAURIZI, 2006). Esta disposição define uma nova família de serina- proteases que é estruturalmente distinta das demais serina-proteases anteriormente descritas (famílias da quimotripsina, tripsina, substilisina e proteases de citomagalovirus) porém as características essenciais da arquitetura da tríade catalítica Ser-Asp-His da proteína ClpP mantêm-se em relação às demais serinas- proteases.

Na proteína ClpP nativa, 14 monômeros idênticos da cadeia de ClpP de 193 resíduos juntam-se para formar um tetradecâmero estável de aproximadamente 294 kDa composto por dois anéis heptaméricos sobrepostos e intercalados (FLANAGAN et al., 1995; WANG et al., 1997; SZYK e MAURIZI, 2006) (Figura 14). O

tetradecâmero de ClpP tem um formato cilíndrico medindo aproximadamente 90Å em altura e 50Å de diâmetro e possuindo um canal central oco (KESSEL et al., 1995; WANG et al., 1997; WANG et al., 1998). No oligômero, o amino-terminal de cada subunidade de ClpP está localizado dentro desta cavidade perto do eixo de simetria enquanto o carboxi-terminal está localizado na periferia do cilindro. A interface monômero-monômero em cada anel heptamérico é predominantemente hidrofóbica e dá-se através de interações entre os domínios “cabeça” dos vários monômeros. O tetradecâmero é formado pela intercalação dos dois anéis heptaméricos via os seus domínios “cabo” (WANG et al., 1997).

A

B

C

Figura 14. Estrutura tridimensional da proteína ClpP.

A. O monômero de ClpP apresenta um enovelamento do tipo α/β. Hélices e fitas estão representadas do amino terminal para o carboxi-terminal em uma coloração do tipo arco íris. Hélices estão identificadas com letras de A a G enquanto fitas estão numeradas de 1 a 8. Os resíduos que formam

a tríade catalítica estão representados como círculos nas cores magenta (S97), verde (H122) e vermelho (D171). Em círculos verde claros estão representados os resíduos que estabilizam o

intermediário oxianión (G68 e M98) (WANG et al., 1997).

B. Representação tridimensional do tetradecâmero da proteína ClpP visto pelo eixo da junção dos dois anéis heptaméricos. No anel superior cada monômero apresenta uma coloração distinta. No anel inferior todos os monômeros estão coloridos em amarelo (PORANKIEWICZ et al., 1999).

C. Representação tridimensional do de um anel hexamérico da proteína ClpP visto pelo eixo da cavidade central mostrando os sete centros catalítico como pequenas aberturas circulares (WANG, 1998).

Os 14 sítios ativos proteolíticos estão localizados no interior do cilindro do tetradecâmero numa câmara esférica de 51Å formada pela associação dos dois anéis heptaméricos (KESSEL et al., 1995). Desta forma, os sítios ativos encontram- se inacessíveis a proteínas enoveladas presentes no ambiente celular.

O acesso ao centro catalítico dá-se por meio de dois poros de 12Å de diâmetro em lados opostos do anel (WANG et al., 1997; SZYK e MAURIZI, 2006). O tamanho de entrada dos poros permite a passagem apenas de uma fita β ou de uma hélice α implicando que os substratos protéicos entram na câmara proteolítica em uma conformação essencialmente desenovelada (WANG et al., 1998). Na câmara proteolítica as tríades catalíticas estão espaçadas a cada 26Å, de forma que um substrato hepta ou octapeptídeo pode facilmente ser estendido entre dois sítios ativos.

Desta forma, os substratos desenovelados podem estender-se simultaneamente por vários sítios ativos, permitindo a clivagem simultânea e rápida da cadeia polipeptídica em segmentos de 8 a 10 resíduos de amino ácidos (WANG et al., 1998). Além disso, a arquitetura do tetradecâmero permite que as vastas

superfícies hidrofóbicas da câmara proteolítica, que são essenciais para manter o substrato desenovelado facilitando a degradação do mesmo, permanecem protegidas das substâncias hidrofílicas do meio celular (SZYK e MAURIZI, 2006).

Assim, a compartimentalização dos sítios ativos no interior da câmara proteolítica provavelmente serve pelo menos três funções (WANG et al., 1998). Primeiramente, uma vez que os poros de entrada na câmara são pequenos (aproximadamente 12Å) excluindo a maioria das proteínas citoplásmicas enoveladas, a compartimentalização dos sítios ativos fornece um controle espacial e temporal da proteólise. Em segundo lugar, a compartimentalização cria uma

concentração local elevada de sítios ativos permitindo uma velocidade de clivagem de ligações peptídicas também elevada. Por último, a compartimentalização fornece uma forma adequada de tornar acessíveis ao substrato vastas superfícies hidrofóbicas (WANG et al., 1997; KESSEL et al, 1995).

A arquitetura do oligômero ClpP (tamanho de poro, distribuição dos sítios ativos, e a superfície externa final de conservação) fornece uma base estrutural para se entender o mecanismo de ação da ClpP sozinha e na protease ClpP (WANG e col, 1997; SZYK e MAURIZI, 2006). A proteína ClpP possuí em sua estrutura primária os elementos necessários para catalisar a clivagem de uma ligação peptídica. No entanto, a proteína ClpP sozinha demonstra atividade proteolítica limitada pois é capaz de hidrolisar apenas peptídeos de até 30 resíduos de amino ácidos (WOO et al., 1989; THOMPSON e MAURIZI, 1994). De fato, para se obter uma atividade proteolítica completa de ClpP, é necessária a presença de componentes reguladores dependentes de ATP que desenovelam o substrato e conseqüentemente ativam a atividade proteolítica de ClpP (GOTTESMANN et al., 1997; MOGK et al., 2004). Além disso, estes componentes regulam a especificidade de ClpP que sozinha possui atividade proteolítica para uma vasta gama de substratos (GOTTESMANN et al., 1997).