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Império – O Código Criminal do Império

No documento MESTRADO EM DIREITO SÃO PAULO (páginas 70-74)

CAPÍTULO 2 − ORIGENS HISTÓRICAS DO INSTITUTO

2.5 Evolução histórica no Brasil

2.5.2 Império – O Código Criminal do Império

No desenvolvimento histórico do Direito Penal brasileiro, importante marco foi o Código Criminal de 1830. Antonio José da Costa e Silva assim se manifestou em relação ao primeiro Código Penal brasileiro: “O codigo de 1830, o primeiro que tivemos, era reconhecidamente um dos mais notaveis de seu

82 PINHO, Ruy Rebello. História do direito penal brasileiro: período colonial. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1973. v. 1, p. 101-102.

tempo e constituia um padrão de gloria que attestava a cultura juridica dos legisladores da infancia da monarchia. Promulgado após as duas codificações penaes que, no começo do seculo XIX, mais larga repercussão alcançaram – a francesa, de 1810 e a bávara, de 1813 – elle soube mostrar-se independente e, em varios assumptos, de marcada originalidade. Foi nas idéas utilitaristas de Bentham que se inspirou essa magnifica obra legislativa.”83

Roberto Lyra bem resumiu as principais inovações e conquistas trazidas pelo Código Criminal do Império, que tantos elogios e louvores recebeu dos penalistas de seu tempo: “1°) no esbôço da indeterminação relativa e de individualização da pena, contemplando, já, os motivos do crime, só meio século depois tentado na Holanda e, depois, na Itália e na Noruega; 2°) na fórmula da cumplicidade (co-delinqüência como agravante) com traços do que viria a ser a teoria positiva a respeito; 3°) na previsão da circunstância atenuante da menoridade, desconhecida, até então, das legislações francesa, napolitana e adotada muito tempo após; 4°) no arbítrio judicial no julgamento dos menores de 14 anos; 5°) na responsabilidade sucessiva nos crimes por meio da imprensa antes da lei belga, e portanto, esse sistema é brasileiro e não belga, como é conhecido; 6°) a indenização do dano ex-delicto como instituto de direito público, também antevisão positivista; 7°) na imprescritibilidade da condenação.”84

O Código Criminal do Império foi festejado entre os juristas da época pelos avanços que trazia. Registra Basileu Garcia uma das únicas matérias nele tratadas que deu margem a dissidências no parlamento, a questão da pena de morte: “Nas porfias parlamentares sobre o extremo suplício, o grupo

83 SILVA, Antonio José da Costa e. Código Penal dos Estados Unidos do Brasil commentado. Ed. fac- similar. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2004. v. 1, p. I.

84 LYRA, Roberto. Introdução ao estudo do direito criminal. Rio de Janeiro: Editora Nacional do Direito, 1946. p. 89.

75 conservador propugnava-lhe a admissão no Código; outro grupo, dos liberais, se opunha. Venceram os conservadores por pequena maioria. O seu argumento principal era a criminalidade do elemento servil, muito difundida. Entendiam que, sem a aludida pena, não se manteria a ordem entre os escravos, os quais, pelo seu teor de existência, seriam indiferentes a outros castigos. Entretanto, a terrível providência punitiva, aplicada muitas vezes no Brasil, foi mais tarde tàcitamente revogada por D. Pedro II. Conta-se que um erro judiciário o impressionou profundamente. Decorreu em Macaé um processo de que resultou a pena capital imposta ao réu, chamado Manuel da Mota Coqueiro. Tal sentença foi depois tida como deplorável injustiça. De tal modo se consternou o magnânimo Imperador, que resolveu jamais efetivar a pena máxima. Passou a comutá-la sistemàticamente em galés perpétuas.”85

Inicialmente, as medidas de segurança foram previstas esparsamente na legislação brasileira, sem contudo contarem com essa denominação. Elas eram tratadas como pena. Tal fato ocorreu antes mesmo da sistematização trazida pelo Anteprojeto do Código Penal suíço de 1893.

Assim, podemos citar como exemplo disso o artigo 12 do Código Criminal do Império vazado nos seguintes termos:

“Artigo 12 - Os loucos que tiverem commettido crimes serão recolhidos ás casas para elles destinadas, ou entregues ás suas famílias, como ao juiz parecer mais conveniente.”

O Código Penal do Império tratava da inimputabilidade em seu artigo 10, nos seguintes termos:

“Artigo 10 - Tambem não se julgarão criminosos: § 1° - Os menores de quatorze anos.

§ 2° - Os loucos de todo o genero, salvo se tiverem lucidos intervallos e nelles commetterem o crime.

§ 3° - Os que commetterem crimes violentados, por força ou por medo irresistiveis.

§ 4° - Os que commetterem crimes casualmente no exercicio ou pratica de qualquer acto licito, feito com atenção ordinaria.”

Já em 1886, a expressão “loucos de todo o gênero” utilizada no Código mereceu a crítica de Tobias Barreto: “Mas a mesma expressão synthetica –

loucos de todo genero, comquanto simples e clara, larga e fecunda em sua simplicidade, não é todavia bastante comprehensiva para abranger a totalidade não só dos que padecem de qualquer desarranjo no mecanismo da consciencia, como tambem dos que deixaram de attingir, por algum vicio organico, o desenvolvimento normal das funcções, ditas espirituaes, sendo uns e outros isemptos de imputação juridica. Por mais que se estenda o conceito da loucura, por mais que se diminua e simplifique a sua comprehensão, a ponto mesmo de reduzi-lo a uma quantidade negativa, á méra ausencia do seu contrario, como fez Regnault, para quem la folie n’est que l’absence de la raison − definição legitimamente franceza, que aliás tem tanto valor e é tão cheia de senso, como dizer, porventura, que a velhice não é mais do que a ausencia da mocidade, ou que a razão não é mais do que a ausencia da loucura − em uma palavra, por maiores esforços que se faça para conferir ao Codigo a honra de ter dito pouco e subentendido muito, não é possivel inscrever no circulo da disposição do § 2° do art. 10 todos os casos de perturbação de espirito, ou de anomalia mental, todos

77 os affectos, desvarios e psychoses que devem juridicamente excluir a responsabilidade criminal.”86

O mesmo autor, ao analisar o fundamento do direito de punir, já advertia, à luz do Código Criminal do Império: “A theoria romantica do crime-doença, que quer fazer da cadeia um simples appendice do hospital, e reclama para o delinquente, em vez da pena o remedio, não póde crear raizes no terreno das soluções acceitaveis. Porquanto, admitindo mesmo que o crime seja sempre um phenomeno psychopathico, e o criminoso simplesmente um infeliz, substituida a indignação contra o delicto pela compaixão da doença, o poder publico não ficaria por isso tolhido em seu direito de fazer applicação do salus populi

suprema lex esto e segregar o doente do seio da comunhão.”87

No documento MESTRADO EM DIREITO SÃO PAULO (páginas 70-74)