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Impacto da Mundialização na Educação

CAPÍTULO 1 – CAMINHOS PARA UMA REGULAÇÃO TRANSNACIONAL

1.2 Impacto da Mundialização na Educação

Ao adentrar nos campos das discussões focalizadas e determinadas no campo político global, optei pelo termo mundialização por restringir a análise nas questões centradas na relação entre Estado/economia/desenvolvimento mundial, proposto no estudo de Carnoy3 (2002) que teve como agência de fomento a própria UNESCO. Da mesma forma a questão da origem “transnacional” aqui implicada remete a um conceito que não se restringe a definições limitatórias locais perpassando as barreiras impostas pelas ações do Estado, sendo, portanto, de origem geral e aplicável universalmente.

Nessa perceptiva a expansão das fronteiras nacionais agora centradas em um mundo com novas possibilidades de comunicação instantânea e acordos imediatos para o bom andamento da ordem internacional, as diretrizes internacionais para a tomada de decisões políticas no campo da educação colocam no Estado a possibilidade de ampliar seus recursos

provenientes do capital social e capital humano, ampliando sua margem de desenvolvimento interno.

A questão da mundialização como fator fundamental no processo de desenvolvimento envolvendo o mercado livre e o Estado, está, de acordo com Carnoy (2002), revolto em grandes polêmicas. A pluralidade de divergências sobre tal aspecto, centra-se, de um lado, na teoria de que empresas transnacionais são na verdade multinacionais. Essa alegação confere ao termo “transnacional” não uma origem única, mas uma amplitude de ingerência e atuação que transpassa qualquer origem fronteiriça baseada em territórios nacionais. Assim, o termo “multinacional” confere um espectro de atuação globalizada mundialmente, mas centrado em uma origem nacional, sendo, portanto, sujeito aos impactos nos campos político e econômico na sua origem territorial.

Baseados nessas afirmações destacam-se as crises que envolveram grandes empresas internacionais em períodos determinados da história relacionados diretamente a momentos econômicos conturbados para alguns países, com destaque para o caso da International Business Machines (IBM) nos anos 1990-1992 no momento crítico do neoliberalismo americano, e os bancos japoneses no final da década de 1980 junto à recessão nipônica do período.

O outro lado que questiona a mundialização como fator essencial, coloca a tese de que mesmo com a abertura e expansão do crédito e das transações internacionais a regulação econômica interna continua sendo a principal forma de intervenção do Estado como forma de controle das atividades desenvolvidas no país. Para Carnoy (2002) a grande regulação do Estado em áreas como saúde, educação, moradia e serviços, reforça esse argumento. Se os Estados preferem não exercer seu poder de regulamentação e redistribuição é porque estão submetidos a pressões internas, geralmente orquestradas por capitais nacionais e não transnacionais. (CARNOY, 2002, p.28)

Ainda segundo o autor, a essência da mundialização não está centrada nas cifras do comércio e do investimento, e sim numa nova redistribuição da relação espaço-tempo econômicos e sociais; essa posição reforça a tese indicativa de uma política macroeconômica que seja capaz de assegurar o investimento social e expansão do mercado, alinhando-se às concepções propostas por Giddens ao defender uma terceira via.

Essa proposição de investimento no campo social aliado a fatores de investimento no acúmulo do capital monetário é qualificada como um equilíbrio necessário para a manutenção

apropriada das funções do Estado enquanto provedor nacional. Ao comungar as ações de investimento nos campos sociais atreladas aos investimentos econômicos, tomamos como essência de análise as proposições de Colemann (1988) para o capital social, tendo como elemento chave o processo de desenvolvimento humano e interação social. No mesmo caminho Putnam (2006) e Fukuyama (1996) apresentam teses que versam sobre a linha de raciocínio que coloca a questão da confiança e reciprocidade como elementos constitutivos do progresso econômico e social de um país, todos elencando que o investimento nos campos sociais e a criação de uma rede de colaboração que vai além do poder do Estado, pode, efetivamente contribuir para o avanço.

Assim, a aplicação de recursos estatais em ações sociais acontece na medida em que o Estado prevê a necessidade de redução de índices negativos que gerem processos de exclusão econômica e social, comprometendo diretamente qualquer possibilidade de crescimento econômico e estabilidade necessários para a manutenção dos indicadores positivos de saúde governamental. Portanto, o investimento em capital humano surge como um elemento positivo para alavancar áreas de desenvolvimento econômico e social, ampliando a competitividade e a prosperidade. É nesse momento que surgem os primeiros indicativos de impacto direto da mundialização na educação.

A partir do momento em que a expansão do capital social e toda sua bagagem de possibilidades proporcionadas pela questão da confiança mútua gerada, da reciprocidade adquirida e da união nacional, assim como a expansão do capital humano, e todas as possibilidades do desenvolvimento pessoal e coletivo, acabam remetendo a uma política de Estado; temos portanto, caracterizadas possibilidades concretas do que Carnoy (2002) define como as estratégias de reformas educativas para o desenvolvimento nacional. Tais estratégias estarão alinhadas à política econômica e social adotada pelo Estado em questão, e sofrerão influências diretas de origem internacional baseadas na posição geopolítica em que o país se encontra.

Carnoy (2002), define que essas estratégias de reformas estão pautadas em 3 eixos centrais:

A . Baseadas na Competitividade:

As reformas educativas pautadas na competitividade visam aumentar a produtividade humana, contribuindo para o avanço das atividades econômicas, melhorando a mão de obra. Sua estrutura base apoia-se nas teorias do capital humano como forma de estabelecer o

sucesso individual como possibilidade para o sucesso coletivo. De acordo com o autor tais estratégias podem ramificar-se em 4 categorias.

A1. Descentralização: modalidade que assegura à escola uma maior autonomia, retirando do Estado a necessidade de tomada de decisões locais; nesse sentido uma maior flexibilização poderia conferir uma maior harmonização pedagógica. De acordo com Hannaway e Carnoy (1993) se as autoridades educativas locais se julgarem e forem julgadas, responsáveis pelos métodos de ensino, a qualidade da educação será cada vez mais aprimorada.

A2. Padrões Educativos: reformas que tem por base a obtenção de critérios mínimos definidos pelo Estado para cada nível educacional. Tais reformas tem por base a implantação de sistemas de avaliação externos como forma de mensurar o desempenho dos alunos, docentes e escolas, estimulando a competitividade entre os mesmos na tentativa de gerar um autoequilíbrio (meta), existindo a intervenção do Estado quando esse equilíbrio não é atingido. Esses padrões educativos (estabelecidos pelo poder central) têm o interesse de fornecer às escolas e pais uma ideia clara dos resultados escolares esperados com a expectativa de que a elevação dos padrões de nível estimulem a demanda dos pais e o desempenho dos estabelecimentos. (CARNOY, 2002, p.58)

A3. Gestão racionalizada dos recursos destinados à educação: nessa proposta de reforma, a elevação do rendimento escolar deve estar alinhada à racionalização de recursos como forma de otimização direta do sistema. De acordo com Carnoy (2002) a finalidade consiste em obter uma elevada taxa de sucesso com recursos e efetivos praticamente equivalentes aos de estabelecimentos com baixo desempenho. A expansão desse modelo de reforma prevê ainda a expansão centrada do ensino da educação básica, pois de acordo com o autor, a taxa social de rentabilidade aplicada a esse nível de ensino é muito maior se comparada ao ensino médio e superior.

A4. Aprimoramento da seleção e formação dos professores. Esse modelo de reforma prevê uma especial atenção aos processos de formação e seleção de professores para atuação na educação básica e ensino superior. Estudos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e da própria UNESCO, reforçam essa tese, e indicam que os resultados qualitativos do avanço educacional só são possíveis se forem acompanhados por avanços qualitativos da ação docente, que, por conseguinte, devem ser obtidos através de um processo de formação docente inicial e continuado capaz de garantir a boa formação acadêmica tendo como sustentação a indissociabilidade teoria-prática.

B. Baseadas nos imperativos financeiros

Os modelos de reformas educacionais pautados nos imperativos financeiros tomam como referência o pensamento profícuo de que a competição acirrada entre os mercados deve impactar diretamente no processo de construção e acumulação do capital humano.

Esse pensamento provém do estreitamento das relações em nível global aliado a uma política econômica que deve ter como origem a capacidade de captação de recursos estrangeiros e/ou segurar o capital financeiro interno no próprio país, evitando fuga de capital, ou seja, o chamado ajuste estrutural. Nessa perspectiva a conjuntura econômica de um país pode determinar em que medida as reformas educacionais terão impactos imediatos, profundos ou superficiais.

As reformas educacionais pautadas nesse modelo obedecem ao preceito de um sistema liberal concorrencial; isso significa desafogar o custo financeiro do Estado, abrindo progressivamente as suas áreas vitais de desenvolvimento social (saúde e educação, por exemplo) para a expansão da iniciativa privada.

Dessa forma, as reformas fundadas nos imperativos financeiros, antes de tudo, visam reduzir os gastos públicos com a educação. Como seu supremo objetivo é semelhante ao das reformas motivadas pela competitividade (aumentar a produtividade dos funcionários), elas empenham-se também em aprimorar a eficácia da exploração dos recursos disponíveis e a qualidade da educação. (CARNOY, 2002, p.61-62)

Na execução de tais reformas mundo afora, encontram-se como cérebros dessas operações as agências internacionais, dentre elas o FMI (Fundo Monetário Internacional), o Banco Mundial, os bancos regionais e a própria UNESCO. Como pontos nevrálgicos dessas reformas são apontados os seguintes mandamentos:

B1. Inversão do financiamento da educação baseado nos níveis prioritários. Nesse modelo propõe-se que o investimento financeiro direto do Estado concentre-se na educação básica, realocando recursos que seriam destinados ao ensino superior. Segundo esse modelo proposto, o investimento no ensino superior é alto, dispendioso e possui um alcance populacional restrito, devendo então ser direcionado para a iniciativa privada, mais apta e preparada para formar frentes de trabalho altamente capacitadas para lidar com a lógica do mercado global.

B2. Privatização do ensino superior e secundário. Seguindo a linha de raciocínio do proposto nas bases de financiamento da educação, esse modelo amplia o processo de

privatização alcançando o ensino secundário. A justificativa pauta-se na crescente demanda por acesso a esses níveis educacionais que se amplia ano após ano aliado à incapacidade do Estado de suprir essa carência.

B3. Redução do custo por aluno. A base central dessa proposta consiste na ampliação do número de alunos por turma, uma forma simplista e irracional de redução de custos diretos em detrimento de um serviço educacional de qualidade. Segundo Carnoy (2002) os economistas do Banco Mundial concluíram que, na faixa dos 20 a 45 alunos por professor, a relação alunos/professor não tem nenhum efeito sobre os resultados escolares.

C. Baseadas na equidade

As reformas baseadas na equidade sofrem grandes pressões externas por serem consideradas longitudinais e com resultados não imediatos. Seu conceito é definido como reformas que visam dar acesso de oportunidades iguais a todos os cidadãos, seja ele tanto de vaga quanto de qualidade.

Nesse caminho tais proposições pretendem gerar um nivelamento educacional qualitativo que pode impactar diretamente na qualidade de vida dos sujeitos, bem como na qualidade da mão-de-obra disponível no mercado. Toma-se como referência de análise na construção de tais reformas o discurso oriundo da teoria do capital humano na qual a elevação do nível educacional impacta positivamente na determinação dos salários. Segundo Carnoy (2002), as reformas educacionais desse modelo tendem a objetivar determinados grupos ou pontos específicos de ação, dentre eles:

• Atingir as categorias mais desfavorecidas da população.

• Focar determinados grupos, como mulheres ou população rural.

• Ampliar a taxa de sucesso escolar em grupos considerados mais vulneráveis.

O conjunto de medidas de reforma da educação apresentados pelos três eixos centrais (A,B,C) constituem-se como ferramenta política para o direcionamento do Estado quanto à qualidade, quantidade e desdobramentos que podem ser obtidos no plano econômico. Do ponto de vista geral, tais reformas ainda podem ser alinhadas a partir de diretrizes externas que não se relacionam com a dinâmica interna dos conflitos e anseios de cada país.