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A filtração pelos solos, adsorção nas partículas minerais, diluição em grandes volumes de água, e o longo tempo de residência podem assegurar usualmente, uma relativa limpeza para a água subterrânea (White, 1988).

Entretanto, apesar da característica intrinsecamente depuradora dos solos, verifica-se a significativa contaminação de águas superficiais e subterrâneas, por atividades agrícolas praticadas intensivamente, em escala comercial, em muitos países com tradição agrícola, quer sejam industrializados, ou não.

Em relação às ações humanas deletérias, e aos efeitos destas sobre os recursos hídricos, pode- se admitir que os sistemas aqüíferos subterrâneos, à primeira vista, estão em vantagem com relação ao sistema hídrico superficial, pelo fato de que, para alcançar a zona saturada, os poluentes precisam atravessar o solo (Filho, 1997). Os solos no bioma Cerrado, são

caracterizados predominantemente por Latossolos, em geral são espessos e bem desenvolvidos (Santos et al., 2006). Nas partes baixas da área do estudo, ou seja, nos terrenos de sopé e de meia encosta os solos são bem desenvolvidos, predominando Latossolos Vermelhos (Sans, 1973). A área do estudo assemelha-se ao cenário investigado por Pessoa (2005), ou seja, um geoambiente em que o sistema aqüífero cárstico, em princípio, pode estar coberto por um ―espesso capeamento de solos‖, e situado semelhantemente, ―em uma faixa representativa da borda da plataforma sedimentar Bambuí‖.

Assim, conforme expõem Fritzons e colaboradores, (2001), a remoção de poluentes e a purificação da água subterrânea podem ocorrer durante a percolação no solo, devido aos processos de precipitação, retenção por filtração, troca iônica, adsorção e decomposição aeróbica, tanto na zona saturada quanto não saturada.

Os aqüíferos cársticos são particularmente vulneráveis à contaminação, devido ao capeamento de solos pouco espessos, fluxos no epicarste, e pontos de recarga através de sumidouros e dolinas, facilitando o alcance da água subterrânea pelos contaminantes, quando poderiam ser transportados rapidamente, nos condutos cársticos, a grandes distâncias. Assim, no solo, o tempo de residência dos contaminantes deve ser curto e os processos de atenuação natural, da contaminação, não se efetivariam no sistema cárstico, acarretando a necessidade de proteção especial desses sistemas (Andreo et al., 2006).

Como em aqüíferos cársticos a água pode mover-se, por grandes extensões, em canais e condutos, que se comunicam com a superfície, as águas cársticas podem ser tão susceptíveis à poluição quanto as águas superficiais.

Esta questão pode parecer um tanto paradoxal, pois ao mesmo tempo em que solos bem desenvolvidos podem proteger as águas subterrâneas, em particular dos ambientes aqüíferos cársticos que ocorrem no domínio hidrogeológico do Bambuí (região onde predominam solos bem desenvolvidos), estes podem estar sujeitos à contaminação nas áreas de exposição do aqüífero, como sumidouros, dolinas, afloramentos, e outras feições, que de alguma forma os colocam em comunicação com a superfície.

Logo, a zona não saturada do solo pode constituir a primeira linha de defesa do aqüífero, portanto é importante o seu monitoramento (Falkenmark e Allard, 1991). Assim, deve-se

definir possíveis medidas de prevenção, mitigação, proteção ou controle. Neste contexto, aspectos pedológicos, geológicos e de ocupação da bacia precisam ser considerados, para se avaliar a vulnerabilidade do manancial subterrâneo (Benetti e Bidone, 1993).

Os solos diferem significativamente em relação ao seu poder depurador, Cadillon e Portier, (1977), em trabalho realizado com diferentes tipos de solos, consideraram que a espessura, a textura e a estrutura influenciam diretamente no poder de filtração, na capacidade de retenção de água e na permeabilidade.

Ora, é fato que no caso de calcários, em geral, os sistemas aqüíferos são devidos a um conjunto de fraturas, fissuras e cavidades nas rochas carbonáticas, que podem se estender regionalmente, intercomunicando-se em subsuperfície, em diferentes locais e por grandes extensões. Na Figura 5.9 está representado, esquematicamente, um sistema aqüífero em carste, na qual estão apontadas algumas estruturas que ocorrem no carste calcário.

Figura 5.9  Representação esquemática do ambiente cárstico

Fonte: Kaufmann, G. 2011.

Para Silva, (2003), muitas atividades humanas podem afetar os sistemas aqüíferos cársticos em grande extensão, especialmente, quando considerado um conjunto de atividades como mineração de calcário; indústria siderúrgica e frigorífica; e, em particular, a exploração agropecuária em região de influência de calcários. Soma-se a isso o fato de que as águas de

infiltração podem conter uma diversidade de contaminantes carreados por enxurradas e inundações.

Evidências de contaminação de águas superficiais, em região de agricultura intensiva, no domínio hidrogeológico do sistema aqüífero Paracatú-Areado por contaminantes originados de reflorestamentos de eucaliptos e de pastagens artificiais foram apontados como as principais fontes de degradação da qualidade da água superficial na região, por Viana (2006).

Viana (2006) observou que no verão, intensificava-se o uso de agroquímicos, devido ao odor nas águas das veredas, também detectou presença de cobre e de zinco, nas proximidades das plantações de grãos e dos reflorestamentos, e degradação mais intensa das veredas nas áreas cultivadas, nas pastagens e nas áreas de reflorestamento. De acordo com o autor, as veredas constituem um geoecossistema de particular importância, no domínio hidrogeológico do Bambuí, nas áreas do Cerrado ao norte e noroeste de Minas Gerais.

Na Tabela 5.5 apresenta-se uma matriz que relaciona diversos poluentes com suas fontes, alguns dos quais podem afetar mais os aqüíferos cársticos, conforme White (1988).

Tabela 5.5  Fontes de poluentes da água subterrânea Fonte de Poluição DBO Nitrogênio

e Fosfatos

Cloretos Metais Hidrocarbonetos e Orgânicos

Bactérias e Vírus Resíduos domésticos e urbanos

- fossas sépticas - sanitários - redes de esgotos - aterros sanitários XXX XXX XX XXX XX XX X X X X XX XX XXX XXX X XX Atividades agrícolas - resíduos da pecuária - fertilizantes - Inseticidas e herbicidas XXX XXX XXX XXX XX

Construção civil e mineração - enxurrada de rodovias e

estacionamentos

- pilhas de estéreis e de minério

X XX X Atividades industriais - refinarias, armazenamento e distribuição de combustíveis - aterros e botas-fora industriais - aterros químicos, barragens de rejeitos

X XXX XXX XXX XXX XXX

X = importância para a contaminação Fonte: White, 1988.

Conforme reportado na Tabela 5.5 nas atividades agrícolas estão situadas importantes fontes, em potencial, de contaminação dos aqüíferos cársticos. Assim, a exploração agropecuária

nitrato e sulfato, originados de corretivos agrícolas e fertilizantes, de agrotóxicos e de seus resíduos.

5.5.1 Espécies constituintes de águas cársticas

A paisagem desenvolvida nos terrenos calcários, através do processo de intemperismo químico, é bem peculiar. Conforme White (1988), ela está relacionada ao equilíbrio heterogêneo (ou desequilíbrio) entre os pequenos conjuntos minerais na fase sólida, ou seja, os minerais das rochas calcárias, a água, que é uma solução contendo uma variedade de espécies dissolvidas, e a fase gasosa, isto é, a atmosfera, cujo principal componente ativo é o dióxido de carbono. As espécies acessórias presentes são: o íon sulfato, originado dos veios de gesso ou de sulfetos minerais intemperizados; o íon cloreto proveniente de águas de circulação profunda, ou mesmo do mar; além dos íons sódio e potássio, de fontes semelhantes.

Organismos aquáticos que podem habitar as águas subterrâneas dos ambientes cársticos podem acarretar maior variedade e quantidade de espécies dissolvidas e em suspensão, nessas águas. Se sobre os terrenos cársticos estão assentadas populações humanas, a variedade e quantidade de espécies dissolvidas e em suspensão podem aumentar ainda mais, nessas águas, podendo ser acrescida de poluentes originados da exploração agropecuária, dos resíduos e efluentes industriais, de esgotos sanitários e de fossas, além de outras fontes (White, 1998).

Na Tabela 5.6 estão sumarizadas as espécies naturais governantes das reações químicas que podem ocorrer no ambiente cárstico.

Tabela 5.6  Substâncias inorgânicas em reações químicas no ambiente cárstico

Espécies Fase sólida Fase aquosa Fase gasosa

CaCO3 Ca 2+ H2O CO2 CaCO3.MgCO3 Mg2+ CO2 Essenciais H+ H2CO3  3 HCO e 2- 3 CO OH- Ca SO4.2H2O Na+ SO2-4 H2S Acessórias SiO2 K + Cl- O2 O2(aq) H4SiO4 + 4 NH - 3 NO NH3 Contaminantes Metais - 2 NO CH4 3- 4 PO Fonte: White 1988