• Nenhum resultado encontrado

A IMPLANTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DE INCLUSÃO ESCOLAR : CONSTRUÇÃO DE ITINERÁRIOS LOCAIS

No documento Escolarização e deficiência (páginas 39-43)

Tendo em vista a constatação da ocorrência de uma simultaneidade de ações baseadas em diferentes paradigmas da área da educação especial sobre uma mesma política pública de inclusão escolar, pode-se depreender que a viabilidade de efetivação de tais políticas destinadas aos alunos com deiciência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/ superdotação está diretamente relacionada ao paralelo estabelecido entre os objetivos visados e a “compreensão das compreensões” das relações locais; ao considerar o contexto preexistente, é possível encontrar os nexos explicativos e estabelecer as ações a serem empreendidas, em vários níveis, âmbitos e espaços de relação, favorecendo, deste modo, os processos de tomada de decisões a respeito das políticas locais. Superado o desaio da implantação da política – “transformação” dos dilemas em estratégias de ação –, considera-se que a continuidade da ação política deve ocupar-se da elucidação de questões que são consideradas “ferramenta de aprendizagem” de todo o processo.

A implementação de políticas está atrelada aos seus executores, os quais, por sua vez, estão inscritos em um contexto histórico, social e cultural especíico e, a partir desse contexto, realizam um trabalho de interpretação e de tradução do sentido e do signiicado de um texto segundo seu próprio sistema de valores. Existe, portanto, uma lógica interpretativa da execução das políticas e uma cultura da política pública. Dessa maneira, a lógica da implementação está fundamentada nas interpretações que os executores fazem da norma: não há interpretações neutras. O que equivale a dizer que, na prática, cada executor vai interpretar a norma a partir de seus valores, proporcionando a existência de uma multiplicidade de interpretações de uma mesma norma, sendo que tal condição também implicará a existência de uma multiplicidade de implementações relacionadas com as distintas interpretações feitas. Do que foi exposto, enim, depreende-se que: 

7 O atual momento de contato com os municípios da pesquisa de doutorado busca uma relexão sobre as

políticas públicas implantadas posteriormente à adesão de cada um ao Programa Federal de educação inclusiva. Municípios envolvidos: Alegrete, Bagé, Capão da Canoa, Caxias do Sul, Cruz Alta, Gravataí, Passo Fundo, Pelotas, Porto Alegre, Santa Maria, Santo Ângelo, São Borja, Uruguaiana, Vacaria.

♦ Executar uma política pública ou uma norma é um trabalho contínuo de interpretação e de reinterpretação que depende dos atores, do número de atores, do nível de abstração da norma e da estabilidade ou não do contexto da implementação.

♦ O signiicado de uma norma se constrói pelas interações entre os decisores e os executores e entre estes e os destinatários.

♦ A interação signiica persuasão e estratégia para imposição de sua própria interpretação e destruição ou descarte das interpretações dos demais atores. O sentido de uma implementação vai depender da dinâmica das interações entre administração pública, atores paraestatais (sociedade civil) e, principalmente, os destinatários.

Portanto, com base na perspectiva cultural e no entendimento da política como um processo de aprendizagem, considerando as características das atuais políticas públicas de inclusão escolar e os contextos de implementação revelados, no caso especíico deste trabalho de parceria proposto entre a Universidade e as municipalidades envolvidas, buscar- se-ão elementos que permitam observar o movimento desenvolvido nesta trajetória, procurando aprofundar, então, as questões anteriormente já apontadas e brevemente discutidas no trabalho investigativo (BRIZOLLA, 2007), quais sejam:

♦ As ações dos sistemas de ensino se coniguram como uma política de atendimento ou uma mera prestação de serviços?

♦ As propostas implantadas têm atendido às necessidades dos alunos com deiciência?

♦ O atendimento proposto tem, consequentemente, garantido a aprendizagem destes alunos, ou [tão] somente propiciado seu convívio social?

♦ A política proposta apresenta um efetivo caráter de mudança social – emancipação – ou margeia apenas a organização/manutenção das políticas vigentes – regulação?

Concluindo, busca-se ultrapassar o dilema do determinismo e do voluntarismo na compreensão da política e da gestão da modalidade de educação especial na perspectiva inclusiva a partir de um marco de análise que combina a existência de uma certa forma de determinismo cultural (os atores políticos não são totalmente livres de suas escolhas) com uma certa forma de voluntarismo (as escolhas políticas não são totalmente determinadas pelas suas estruturas). Repousa, pois, na ideia de que uma política pública opera como um vasto processo de interpretação do mundo, ao longo do qual, pouco a pouco, uma visão do mundo vai impor-se, será aceita, depois reconhecida como “verdadeira” pela maioria dos atores do setor, porque ela permite aos atores compreender as transformações de seu contexto, oferecendo-lhes um conjunto de relações e de interpretações causais que lhes permitem decodiicar, decifrar os acontecimentos com os quais eles são confrontados (MULLER; SUREL, 2002, p.51).

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da educação. Secretaria de educação especial. Política nacional de educação especial na perspectiva da educação inclusiva. Lex. Brasília, DF: MEC/SEESP, 2008.

BRIZOLLA, F. Políticas públicas de inclusão escolar: “negociação sem im”. 2007. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2007.

HÖFLING, E. M. Estado e políticas (públicas) sociais. Caderno CEDES, Campinas, v.21, n.55, p.30-41, 2001.

MAGALHÃES, A. M.; STOER, S. “A diferença somos nós”: a gestão da mudança social e as políticas educativas e sociais. Porto: Edições Afrontamento, 2005.

MULLER, P.; SUREL, Y. A análise das políticas públicas. Pelotas: EDUCAT, 2002. OZGA, J. Investigação sobre políticas educacionais: terreno de contestação. Porto: Porto Editora, 2000.

RODRIGUES, D. Educação inclusiva: as boas notícias e as más notícias. In:

RODRIGUES, D. (Org.). Perspectivas sobre a inclusão: da educação à sociedade. Porto: Porto Editora, 2003. Colecção Educação Especial, 14.

SANFELICE, J. L. Escola pública e gratuita para todos: inclusive para os “deicientes mentais”. Cadernos CEDES, São Paulo, n.23, p.29-37, 1989.

SANTOS, B. S. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. 7.ed. São Paulo: Cortez, 2000.

No documento Escolarização e deficiência (páginas 39-43)

Outline

Documentos relacionados