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PASSO 10 ENCORAJAR A FORMAÇÃO DE GRUPOS DE APOIO

5.4. A implementação da Iniciativa no Brasil

Em 1992, o Plano de Ação elaborado para implementar a Iniciativa no Brasil indicava como elementos facilitadores para o desenvolvimento da IHAC: o grande número de partos institucionalizados, a existência de alojamento conjunto em quase todos os hospitais públicos, a Declaração Conjunta OMS/UNICEF já amplamente divulgada e a adesão de importantes organizações não- governamentais e associações profissionais do país. Entretanto, outros fatores tais como a existência de um número muito grande de hospitais-maternidade, a escassa cobertura de pré-natal, formação profissional insuficiente e uso excessivo de anestésicos durante o parto foram considerados limitadores do avanço da IHAC no Brasil. As etapas previstas neste Plano de Ação incluiam uma primeira fase de divulgação maciça da situação do aleitamento materno e lançamento da idéia da Iniciativa no país. Numa segunda fase seriam criadas equipes regionais e estaduais de avaliação dos hospitais em relação aos Dez Passos, estando esta estratégia vinculada ao processo de municipalização que se iniciava. E, por fim, uma terceira etapa discutia a necessidade de criar mecanismos de estímulo não financeiro para os hospitais que viessem a ser credenciados, além do estabelecimento de indicadores para o seguimento da IHAC e do impacto das mudanças adotadas pelos

hospitais sobre as taxas de aleitamento materno (PNIAM & GRUPO DE DEFESA DA SAÚDE DA CRIANÇA, 1992).

No Brasil, a análise dos primeiros 70 questionários de auto-avaliação enviados pelos hospitais ao PNIAM apontava que os Passos 1,2 e 10 como os menos cumpridos (mais de 80% dos hospitais). A seguir vinham os Passos 3,4,5,6 e 9, não cumpridos por 50-70% dos hospitais, e, por fim, os Passos 7 e 8 não cumpridos por 30-45% dos hospitais. O que se nota através dos relatos dos primeiros hospitais amigos no país é que as dificuldades na implantação dos Dez Passos variam muito de hospital para hospital; algumas se relacionam a práticas há muito estabelecidas e ao desconhecimento dos profissionais e, outras, à estrutura organizacional. No Hospital Guilherme Álvaro, em Santos, o passo mais difícil foi o 4 (iniciar a amamentação na primeira meia hora após o parto). A retirada de mamadeiras e chupetas, Passo 9, foi difícil para o IMIP-Instituto Materno Infantil de Pernambuco e para a Maternidade Escola Assis Chateaubriand (Fortaleza). O Passo 10 merece atenção especial na medida em que, na maioria das vezes, para sua implementação é necessário uma integração com outros serviços ou grupo de mulheres. Vale a pena relatar a experiência do IMIP, que além de manter ambulatório no próprio hospital trabalha com um grupo de mães monitoras que atuam voluntariamente na sua comunidade, recebendo orientação e apoio do grupo de aleitamento materno do hospital. O Hospital Regional de Taguatinga teve dificuldade em cumprir o Passo 7 devido à inexistência de vagas no alojamento conjunto; a solução encontrada foi adaptar berços junto às macas

para que os bebês pudessem permanecer com as mães desde o nascimento. O Hospital Geral Clériston Andrade, em Feira de Santana, necessitou da intervenção do seu diretor no remanejamento das escalas de serviços para que todos os funcionários fossem treinados. Para estes cinco primeiros hospitais Amigos da Criança do Brasil, o treinamento de todos os profissionais envolvidos na atenção ao binômio mãe-filho foi um passo importante para que as mudanças ocorressem. Outro aspecto relevante foi o apoio do dirigente do hospital (BOLETIM DA INICIATIVA..., 1994a; BOLETIM DA INICIATIVA..., 1994c; BOLETIM DA INICIATIVA..., 1994d).

A partir de então, cinco centros de referência foram estabelecidos para capacitação de profissionais de saúde: Hospital Guilherme Álvaro (Santos, SP), IMIP-Instituto Materno Infantil de Pernambuco (Recife, PE), Maternidade Escola Assis Chateaubriand (Fortaleza, CE), Hospital Clériston Andrade (Feira de Santana, BA) e Hospital Regional de Taguatinga (DF). Em todo o país, 198 profissionais foram treinados para serem avaliadores da IHAC, 18 deles no Estado de São Paulo.

Informe atualizado sobre a IHAC (PNIAM, 1998) relata que o Brasil tinha 94 hospitais Amigos da Criança até dezembro de 1997, distribuídos da seguinte forma: 41 públicos, 34 filantrópicos, 10 privados e 9 universitários (também públicos). A maioria destes hospitais encontra-se localizada na região Nordeste (68 hospitais), seguido das regiões Sul (com 10), Sudeste e Centro-Oeste (cada

uma com 7) e Norte (com 2). O Estado de São Paulo tem apenas 4 hospitais credenciados.

A concentração de hospitais amigos no Nordeste poderia ser explicada pela maior proporção de hospitais públicos nessa região, hospitais de menor complexidade organizacional, presença dos escritórios regionais do UNICEF e, talvez, governantes comprometidos com a redução da mortalidade infantil. Não pode ser descartada também a possibilidade de que estejam sendo utilizados critérios de avaliação mais flexíveis.

O lançamento da IHAC em São Paulo foi realizado em 1994 pelo Grupo de Atenção à Saúde da Criança da Secretaria de Estado da Saúde através da distribuição de material instrucional (BOLETIM DA INICIATIVA..., 1995). Entretanto, considerando os resultados do nosso estudo, esta estratégia parece ter sido insuficiente para sensibilizar os dirigentes de hospitais e coordenadores de saúde sobre a importância e as vantagens de implementar os Dez Passos. Desta forma, a baixa adesão dos hospitais do estado de São Paulo poderia ser explicada por um desconhecimento dos coordenadores municipais de saúde da criança sobre a IHAC. No caso do município de São Paulo, entretanto, há de se considerar como grande limitador ao estabelecimento de uma política de saúde que inclua a promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno, a grande cobertura de convênios médicos privados e o insucesso do processo de municipalização. Há ainda que se considerar a criação do PAS-Plano de Assistência à Saúde do município, o qual implantado à revelia dos

trabalhadores de saúde, gerou a desestruturação de equipes de excelência e descontinuidade dos programas existentes nos hospitais públicos municipais.

Os exemplos nacionais e internacionais citados mostram que é possível conseguir bons resultados, embora seja difícil estabelecer qual a sequência de atividades a serem adotadas para se obter sucesso na implementação da Iniciativa. Entretanto, uma condição que parece permear todos os programas até o momento é a sensibilização e treinamento maciço e continuado de profissionais de saúde através de cursos consistentes como o de 18 horas preconizado pela IHAC e o apoio dos dirigentes dos hospitais (BOLETIM DA INICIATIVA..., 1995).

Os resultados do nosso estudo permitem identificar três categorias de hospitais, que poderiam servir de base para o estabelecimento de prioridades e linhas de ação para implementar os Dez Passos no município de São Paulo: 1.os que dispõem de alojamento conjunto, 2.os que ainda não adotaram o alojamento conjunto e 3.os hospitais universitários.

Do ponto de vista de facilidade na adoção dos Dez Passos, o primeiro investimento poderia ser dirigido aos hospitais que têm sistema de alojamento conjunto, uma vez que o treinamento dos profissionais e o convencimento de seus dirigentes devem ser suficientes para modificar suas rotinas.

O alojamento conjunto é essencial para que se possam realizar vários dos passos, o que dificulta o início do processo na maioria dos hospitais privados. Embora medidas legislativas apenas não sejam suficientes para assegurar a prática do aleitamento materno, elas podem ser um ponto de partida. A implementação da Norma Brasileira para Comercialização de Alimentos para Lactentes, por exemplo, mostra que a existência de uma portaria do Ministério da Saúde, acompanhada de vigilância sistemática e pressão de grupos organizados tem levado a mudanças bastante positivas nas práticas de comercialização das indústrias de alimentos infantis (TOMA, 1996). O alojamento conjunto foi definido como obrigatório através de portaria do Ministério da Saúde em 1983, tendo sido referendada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1993. MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1991). Constituindo-se em direito fundamental de toda criança, o seu cumprimento pode ser exigido pelo Ministério Público.

Com relação aos hospitais universitários é necessário avançar mais na estratégia de incluir aleitamento materno nos currículos. Avaliação realizada pela OPS/OMS em 1993, para conhecer a situação no país do ensino do aleitamento materno nas escolas de graduação em Medicina, Enfermagem e Nutrição e de pós- graduação em Saúde Pública, apontou como resultados: carga horária muito reduzida, sendo os valores médios inferiores a 1% da carga horária total dos cursos, dificuldade dos alunos na obtenção de bibliografia atualizada sobre o assunto e dificuldade dos hospitais universitários no cumprimento dos Dez Passos. A referida avaliação

recomendou que o PNIAM, em conjunto com outros organismos, priorizasse os hospitais universitários para cumprimento dos Dez Passos e que, em conjunto com o Ministério da Educação e universidades, elaborasse uma proposta de programação curricular mínima em aleitamento materno para alunos de graduação em saúde (BOLETIM DA INICIATIVA..., 1994e).