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4.5 Os principais desafios para a celebração de PPPs dos serviços de iluminação pública

4.5.1 A incapacidade institucional (técnica) do quadro administrativo municipal para avaliar

234 A título de exemplo, no município de Uberlândia-MG foi editada a Lei Complementar Municipal nº 657, de 02 de janeiro de 2019, autorizando o Poder Executivo Municipal a vincular as receitas provenientes da Contribuição para o Custeio de Iluminação – CIP para pagamento e garantia da contraprestação da PPP da iluminação pública.

Um dos principais desafios enfrentados pelos municípios para a celebração de contratos de PPPs dos serviços de iluminação pública é de ordem institucional e, por sua relevância, merece ser trabalhado em tópico específico. Na realidade, a maioria dos municípios carece de corpo administrativo capaz de realizar a contratação de parceria público-privada e se planejar administrativamente para a estruturação de projetos dessa natureza.

Todavia, a fase de planejamento é a principal etapa para o êxito da PPP. Para se atingir as vantagens e a atratividade oriundas das PPPs ao Poder Público, é fundamental que a Administração conheça as particularidades relacionadas à modelagem do projeto que se pretende executar. Para que uma PPP seja interessante ao Poder Público, recomenda-se que ela esteja inserida no âmbito de uma política pública abrangente, respaldada por um arcabouço jurídico e institucional adequado que permita a estruturação de projetos pertinentes e de resultados factíveis235.

Contudo, não é essa a realidade da Administração Pública brasileira, mormente no âmbito municipal. Privilegia-se a mobilização de recursos financeiros nas fases de execução contratual, em detrimento da etapa de planejamento da modelagem. Há uma cultura de que o investimento na estruturação do arcabouço institucional pode significar desperdício de tempo e de dinheiro se projetos não vierem a ser contratados, o que acaba gerando um ciclo vicioso, ou pior, a inviabilidade de concretização de contratos por meio de parcerias com a iniciativa privada que seriam plenamente possíveis. E o cidadão acaba pagando um alto preço com a ausência de infraestrutura e de serviços públicos prestados de maneira inadequada e intempestiva.

Conforme apontado por Dal Pozzo e Jatene236, quanto menos se investe nas fases de

planejamento e na estruturação necessárias para o desenvolvimento de um projeto de PPP exitoso, menos capacitadas são as instituições que as promovem, menos aptos são os servidores para conduzirem os seus processos e, por outro lado, mais custosa será a elaboração de uma política que os compreenda como atores fundamentais do processo de implantação de uma PPP. Nesse sentido, Fernando Vernalha Guimarães237 salienta a ausência de capacitação

técnica dos quadros municipais como problema comum para estruturação de projetos de PPP. 235 DAL POZZO, Augusto Neves; JATENE, Pedro. Os principais atrativos das parcerias público-privadas para o desenvolvimento de infraestrutura pública e a necessidade de planejamento adequado para sua implantação. In: JUSTEN FILHO, Marçal; SCHWIND, Rafael Wallbach, Coords.. Parcerias público privadas: reflexões sobre

os 10 anos da Lei 11.079/2004. 1ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 63.

236 DAL POZZO, Augusto Neves; JATENE, Pedro. Os principais atrativos das parcerias público-privadas para o desenvolvimento de infraestrutura pública e a necessidade de planejamento adequado para sua implantação. In: JUSTEN FILHO, Marçal; SCHWIND, Rafael Wallbach, Coords.. Parcerias público privadas: reflexões sobre

os 10 anos da Lei 11.079/2004. 1ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 64.

A incapacidade institucional limita a avaliação de levantamentos e projetos relacionados aos serviços, bem como o controle e fiscalização da execução do contrato de PPP. A capacitação do corpo administrativo é fator elementar para que os municípios criem condições suficientes para operacionalizar projetos dessa natureza, buscando diminuir a assimetria informacional e reduzir os riscos de captura do interesse público pelo interesse privado. Diante dessa realidade, os municípios acabam optando pela contratação de consultoria externa de apoio para esse fim.

Bruno Pereira ressalta que, diante de um cenário de reduzida capacidade institucional do Poder Público, para que os projetos avancem e se concretizem, a iniciativa privada acaba por fornecer informalmente todos os subsídios e estudos necessários para que uma licitação seja realizada. Essa prática, que não é incomum na realidade brasileira, induz a tomada de decisões pelos municípios de modo não transparente e pouco republicano.238

Diante desse quadro, para a estruturação de projetos de PPP de iluminação pública, há três caminhos para auxiliar os municípios na realização dos respectivos estudos de viabilidade necessários para o posterior processo licitatório: corpo administrativo, o procedimento de manifestação de interesse (PMI) e consultores externos. O primeiro exige do município capacidade de planejamento para que se conceba um quadro administrativo especializado na estruturação de projetos de PPP, o que requer a disponibilidade de servidores capacitados e engajados para esse fim. Entretanto, esse caminho leva tempo e requer uma decisão política de longo prazo, razão pela qual tem sido pouco adotada em razão da urgência dos projetos.

O PMI representa instrumento adequado à produção de estudos e estruturação de projetos de PPP de iluminação pública. É um mecanismo pelo qual os particulares formalizam seu interesse em propor estudos, projetos e soluções à Administração Pública, podendo originar-se tanto de solicitação pública, por chamamento feito pelo próprio município, quanto derivar de manifestação espontânea e independente dos particulares.

Fernando Vernalha239 ressalta que o PMI retrata a tendência de superação do dogma da

unilateralidade da Administração, transpondo o ambiente de resistência e desconfiança em relação à influência do interesse privado nas soluções estatais voltadas à execução de obras e serviços.

238 PEREIRA, Bruno. Procedimento de Manifestação de Interesse (PMI) e assimetria de informação entre o

setor público e o setor privado: monólogo ou diálogo público privado? PPP Brasil – O Observatório das Parcerias

Público-Privadas. [s/d]. p. 05. Disponível em: <

https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/2227494/mod_resource/content/1/PMI%20e%20assimetria%20de%20i nforma%C3%A7%C3%A3o%20-%20PPP%20Brasil.pdf>. Acesso em 02 set. 2019.

Atualmente, reconhece-se que a troca preliminar de informações, estudos e projetos com empresas privadas pode ser um instrumento importante para o aperfeiçoamento das soluções de interesse público, sem representar ofensa à isonomia ou à moralidade administrativa. O PMI caracteriza-se como um canal de concepção e aperfeiçoamento dos projetos por quem titulariza a tecnologia e a expertise para tal, que é o empresário privado. Todavia, os municípios continuam obrigados a estar preparados e capacitados para as respectivas avaliações, reduzindo a assimetria de informações que se verifica nesse domínio entre os setores público e privados.240

Entretanto, o PMI apresenta certas limitações ao Poder Público, tais como em relação à qualidade e isenção dos estudos entregues, os quais, em geral, são tecnicamente incompletos, com base de custos inexata, baixo nível de profundidade, utilizam premissas incoerentes com a realidade pública e possuem uma matriz de riscos inadequada, com claro desequilíbrio desfavorável ao Poder Concedente. Ademais, o PMI pode acarretar um retrabalho na seleção e adequação dos estudos recebidos, bem como baixo comprometimento com o projeto, tendo em vista que não há obrigatoriedade para que o Poder Público dê seguimento ao processo licitatório.241

Com a realização de um PMI para a estruturação de um projeto de PPP de iluminação pública, o Poder Público receberá uma gama de informação muito grande nas áreas de engenharia, jurídica e econômico-financeira. Diante desse material, o Poder Público pode-se ver assoberbado de estudos que precisam ser analisados, avaliados e eventualmente combinados entre si, para, aí sim, transformarem-se em documentos aptos a inaugurarem o processo licitatório. Para isso, é inevitável a capacitação do quadro administrativo que fará a avaliação e seleção desses estudos. Destarte, é necessário que o Poder Público busque estruturar-se de maneira mais adequada para enfrentar as etapas críticas do processo de um PMI, otimizando a sua utilização.

O terceiro caminho será a contratação pelo município de consultores externos especializados para o desenvolvimento de estudos de viabilidade e estruturação do projeto de PPP de iluminação pública. Sob o aspecto da agilidade na entrega dos resultados, poderia representar a melhor alternativa; entretanto, esbarra nos grandes custos envolvidos na transação e na disponibilidade financeira do Município. É uma medida paliativa, pois mantém a assimetria

240 GUIMARÃES, Fernando Vernalha. Parceria público-privada. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 416. 241 VIEIRA, Heldo Matos Monteiro. As limitações do Procedimento de Manifestação de Interesse como ferramenta para a estruturação de projetos de Parceria Público-Privada. Revista de Direito Público da Economia – RDPE,

de informação entre o setor público e o privado, e o Município ficará à mercê dos serviços prestados por esses profissionais.

Por isso, quando se pensa em boa administração pública, como desenvolvido no capítulo 1, impõe-se um planejamento e políticas públicas de longo prazo, com a implementação de ações progressivas, o estabelecimento de metas e de resultados mensuráveis no decorrer do tempo. Com isso, entre as alternativas acima apresentadas, a que se mostra mais eficiente ao Município é a opção pela capacitação e especialização do próprio quadro de pessoal da Administração, mesmo diante de toda a complexidade dada a diversidade de matérias e das várias áreas do conhecimento que envolve projetos dessa natureza. O direito fundamental à boa administração pública não autoriza decisões precipitadas, descontextualizadas e sem planejamento.

Assim, um projeto de PPP de iluminação pública deve estar inserido dentro de uma política pública mais ampla de parcerias público-privadas. Superada a fase licitatória e de assinatura do contrato, o Município assumirá a obrigação de gestão e fiscalização do respectivo contrato. Ora, se não teve capacidade institucional (capacidade técnica) para a estruturação do projeto inicial, certamente não o terá para a fase de execução do contrato. E, considerando o longo prazo desses contratos o prejuízo ao interesse público pode ser inevitável.

As chances de sucesso de um projeto de PPP aumentam de acordo com o nível de engajamento do Poder Público em cada etapa. Por isso, desde o início do projeto, é importante que a sua estrutura de governança esteja bem definida. O planejamento das equipes envolvidas deve ser feito com antecedência, os recursos humanos devem ser devidamente alocados e a matriz de responsabilidade e os processos de comunicação e de tomada de decisões devem ser claros e objetivos.242

Portanto, imperioso é o desenvolvimento de competências internas nos municípios que pretendam formalizar contratos de PPP de iluminação pública, o que significa preparar e capacitar tecnicamente o quadro administrativo específico para que se diminua a assimetria informacional em relação aos particulares, seja para estruturar de per si o projeto de PPP, seja para que tenha condições de avaliar os projetos e estudos apresentados mediante PMI. Essa é a maneira para que o contrato de PPP tenha êxito em sua execução e possa efetivamente representar uma melhoria nos serviços de iluminação pública.

242 VIEIRA, Heldo Matos Monteiro. As limitações do Procedimento de Manifestação de Interesse como ferramenta para a estruturação de projetos de Parceria Público-Privada. Revista de Direito Público da Economia – RDPE,