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Conforme exposto em tópico anterior, compete aos municípios a obrigação de prestar, direta ou indiretamente, os serviços de iluminação pública, e, como decorrência lógica, devem possuir recursos disponíveis para o seu custeio.

Atualmente, na grande maioria dos municípios, os serviços de iluminação pública são custeados por meio da arrecadação da Contribuição para Custeio dos Serviços de Iluminação Pública - CIP224. A autorização constitucional para a cobrança da referida contribuição foi

introduzida no ordenamento jurídico pátrio pelo poder constituinte derivado, por meio da edição da Emenda Constitucional nº 39, de 19 de dezembro de 2002225.

223 É obrigatória a admissão da adjudicação por item e não por preço global nos editais das licitações para a contratação de obras, serviços, compras e alienações, cujo objeto seja divisível, desde que não haja prejuízo para o conjunto ou complexo ou perda de economia de escala, tendo em vista o objetivo de propiciar a ampla participação de licitantes que, embora não dispondo de capacidade para a execução, fornecimento ou aquisição da totalidade do objeto, possam fazê-lo com relação a itens ou unidades autônomas, devendo as exigências de habilitação adequarem-se a essa divisibilidade. In: BRASIL. Tribunal de Contas da União. Súmula 247. Acórdão nº 1783 – Plenário. Brasília, 10 nov. 2004.

224 No decorrer dos anos de 1.990, a doutrina e a jurisprudência pacificaram o entendimento de que as “taxas de iluminação pública”, instituídas pela grande maioria dos municípios, seriam inconstitucionais, por afrontarem os requisitos essenciais de especificidade e divisibilidade exigidos pelo art. 145, II, da Carta Magna. Inclusive, o extinto Tribunal de Alçada Cível do Estado do Rio de Janeiro chegou a editar a súmula 12 no sentido de que “é ilegítima a cobrança de Taxa de Iluminação Pública Municipal, porque ausentes as características da especificidade e divisibilidade”. De igual modo, o STF assentou o entendimento de que “o serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa” (Brasil. Supremo Tribunal Federal. RE 573.675. Relator: Ministro Ricardo Lewandowski. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 22 maio 2009.) Diante disso e para resolver o déficit fiscal dos Municípios para custear os serviços de iluminação pública, em 2002, o Congresso Nacional aprova a Emenda Constitucional nº 39, criando a Contribuição para Custeio dos Serviços de Iluminação Pública.

225 Art. 149-A Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 39, de 2002)

Ressalte-se que a instituição da CIP é uma faculdade atribuída exclusivamente aos Municípios e ao Distrito Federal, haja vista tratar-se a iluminação pública de serviço público local226. A sua efetiva cobrança dependerá de previsão expressa em lei municipal e se sujeita

aos princípios estabelecidos no art. 150, I e III, da Constituição Federal.

A possibilidade de cobrança da CIP para custeio do serviço de iluminação pública já foi tema de discussão pelo Supremo Tribunal Federal, que consolidou seu entendimento acerca da constitucionalidade da referida cobrança quando do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) nº 573.675-0/SC. Na ocasião, ficou assentado que a CIP apresenta uma natureza sui generis que “não se confunde com um imposto, porque sua receita se destina à finalidade específica, nem com uma taxa, por não exigir a contraprestação individualizada de um serviço ao contribuinte” 227.

Apesar de já pacificado o entendimento de que é possível a instituição de contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública, restam dúvidas quanto à extensão de sua utilização. Em outras palavras, questiona-se se a CIP somente pode ser utilizada para custear despesas com a instalação e manutenção dos serviços de iluminação pública ou se também poderia ser aplicada na expansão e no melhoramento da rede de iluminação pública municipal. A discussão acerca dos limites de utilização dos recursos da CIP é objeto do RE nº 666.404/SP, em trâmite perante o Supremo Tribunal Federal. Apesar de ter sido reconhecida a repercussão geral da matéria228, o Plenário do STF ainda não julgou o mérito do

questionamento, ou seja, ainda não restou definido se a CIP pode ser utilizada para investimentos em ampliação, extensão e modernização da rede de iluminação pública municipal.

Parágrafo único. É facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput, na fatura de consumo de energia elétrica. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 39, de 2002)

226 “O Município é, dentre todos os entes federativos, aquele que está mais próximo da população, cujas necessidades básicas conhece de perto, incumbindo-lhe, por essa precisa razão, prestar, em primeira mão, os serviços públicos essenciais [...]”. In: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 2.340. Relator: Ministro Ricardo Lewandowski. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 10 maio 2013.

227 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 573.675/SC. Relator: Ministro Ricardo

Lewandowski. Tribunal Pleno. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 21 maio 2009.

228 ILUMINAÇÃO PÚBLICA – CUSTEIO DE MELHORAMENTO E EXPANSÃO DA REDE – ARTIGO 149- A DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL – AFASTAMENTO NA ORIGEM – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui repercussão geral a controvérsia relativa à constitucionalidade da cobrança, por Municípios e Distrito Federal, de contribuição de iluminação pública visando satisfazer despesas com melhoramento e expansão da rede. In: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 666.404 RG. Relator: Ministro MARCO AURÉLIO. Diário de Justiça Eletrônico, Brasília, 17 fev. 2014.

Embora não haja um posicionamento definitivo da Suprema Corte acerca do alcance da CIP, essa questão já foi por ela enfrentada em algumas ocasiões.229230

Dessa forma, apesar de a matéria ainda não ter sido objeto de julgamento específico pela Suprema Corte, nota-se uma tendência de adoção de um sentido lato ao termo “custeio”, abrangendo, portanto, atividades como a instalação, manutenção e expansão da rede de iluminação pública.231

Deve-se considerar ainda que a sistemática da repercussão geral não gera efeitos jurídicos a todos no momento inicial do seu reconhecimento pelo STF, não havendo, neste momento, impedimento de utilização da CIP para o custeio dos serviços de manutenção, expansão, modernização e eficientização da rede de iluminação pública.

De qualquer modo, uma vez criada a CIP para assegurar o custeio da iluminação pública, a quantia arrecadada torna-se receita vinculada e deve ser utilizada apenas para tal finalidade. Consequentemente, havendo uma concessão do serviço de iluminação pública por meio de PPP, essa receita vinculada proveniente da CIP deve ser utilizada para o pagamento das contraprestações em favor da concessionária, cujo objeto seja os serviços de manutenção, expansão, modernização e eficientização da rede de iluminação pública.

Para viabilizar o repasse obrigatório dessa receita vinculada, é necessário autorização em lei específica, bem como de previsão no instrumento convocatório da licitação e no contrato de concessão.

Uma questão interessante que se apresenta é se a utilização da CIP para o pagamento da contraprestação no contrato de PPP entraria no limite de 5% sobre a receita corrente líquida (RCL) do Município, conforme determina o art. 28 da Lei nº 11.079/2004.

Em razão da natureza vinculada e específica da CIP, a qual somente pode ser utilizada para o custeio da iluminação pública, entende-se pela ausência de impacto na RCL. Ou seja, como a receita da CIP não pode ser aplicada em qualquer outra despesa do Município, pois a 229 Tanto é que, em voto proferido no julgamento do RE nº 662.074/SP, o Ministro Ricardo Lewandowski apresentou as seguintes considerações: “por fim, ressalto que não procede o fundamento utilizado pelo Tribunal de origem no sentido de que a contribuição ora discutida seria inconstitucional por destinar sua arrecadação para a instalação e expansão da rede de iluminação pública. Isso porque essa previsão constava, também, do art. 1º, § 1º, da Lei Municipal de São José/SC, objeto do RE 573.675-RG/SC, de minha relatoria [...]”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 662.074. Relator: Ministro Ricardo Lewandowski. Diário de Justiça

Eletrônico, Brasília, 01 fev. 2012.

230 Por ocasião do julgamento do referido recurso, são citados ainda outros julgados que seguem a mesma orientação acima transcrita, destacando-se: RE 550.421/SP e RE 660.834/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia; RE 660.843/SP, Rel. Min. Celso de Mello; RE 655.088/SP, Rel. Min. Ayres Britto; e RE 579.098/SP, Rel. Min. Joaquim Barbosa.

231 Nesse sentido, cf.: SANTA CATARINA. Ministério Público junto ao Tribunal de Contas. Parecer nº

MPTC/479/2018, proferido no âmbito do processo nº @CON 17/00651975 – TEC/SC. Relator: Adircélio de Moraes Ferreira Júnior. Florianópolis, 09 maio 2018.

sua finalidade é a de custear os serviços de iluminação pública, sua aplicação não impacta e nem prejudica as demais atividades desempenhadas pelas municipalidades. Nesse sentido, defende Mário Lima:

[...] a sua finalidade é a de custear as atividades de iluminação pública, de forma que a sua aplicação não impacta, não prejudica as demais atividades que devem ser exercidas pelas Municipalidades. Não se pode reputar, assim, que o desenvolvimento de projeto de PPP custeado, integralmente, por recursos da COSIP, comprometa a RCL municipal, especialmente para os fins do limite de 5% (cinco por cento) estabelecido no art. 28 da Lei Federal de PPPs.232

O raciocínio aqui empregado é o mesmo utilizado por alguns Tribunais de Contas, segundo os quais a arrecadação da CIP não compõe a base de cálculo dos recursos a serem transferidos ao Poder Legislativo local, em razão, justamente, da natureza vinculada dessa receita. Nesse diapasão, é o entendimento do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais:

Essa espécie de contribuição, desvinculada da receita tributária pela Lei 4.320/64, destina-se a fazer face às despesas com a iluminação pública. A finalidade constitucional da CIP, ao contrário dos demais tributos dessa natureza, é o custeio e não a prestação de um serviço, porquanto o contribuinte paga porque existe a necessidade de se manter a iluminação de sua cidade. A CIP, tributo de alçada municipal ou distrital, não pode ser desvirtuada para custear despesas estranhas à iluminação pública, porque é vinculada à finalidade certa e determinada pela própria Constituição da República.233

Portanto, os recursos oriundos da CIP poderão ser utilizados para o pagamento da contraprestação do Poder Concedente, para a realização de aportes ao longo da concessão, bem como para a constituição de garantias públicas em PPP cujo escopo seja o desenvolvimento das atividades de iluminação pública. Ademais, a utilização dessa receita sequer impactará a receita corrente líquida do Município.

4.5 Os principais desafios para a celebração de PPPs dos serviços de iluminação pública