• Nenhum resultado encontrado

3.4 Desenvolvimento sustentável como novo paradigma

3.4.1 Indicadores de sustentabilidade

Uma das formas de conseguir a verificação de determinados elementos considerados imprescindíveis para a qualidade ambiental ou de vida são os indicadores. Um dos mais

conhecidos é o PIB – Produto Interno Bruto, que serve para informar sobre a riqueza produzida por uma nação. As análises sobre as condições de um país, entretanto, ganharam contornos mais humanizados, passando do PIB, que informa apenas cifras que não condizem com a realidade social de um país, para o IDH – Índice de Desenvolvimento Humano, que inclui questões como educação, saúde e renda nas suas análises.

As grandes alterações que vêm ocorrendo nos últimos dois séculos imprimiram mudanças significativas nas sociedades e no globo como um todo. Assim, o aumento populacional, as evoluções na tecnologia, a necessidade do acréscimo constante nos níveis de produção, a existência de países parceiros, a globalização das idéias, todos foram elementos que impeliram a humanidade a um processo de desenvolvimento inigualável.

Diferentemente dos períodos anteriores, a gestão das cidades e dos negócios não podem mais ser executadas por meio de estratégias e sistemas rudimentares. É necessário um amplo sistema de informações que permita inteirar governos, empresas e cidadãos de um número ilimitado de dados. Uma das formas de organizar tais dados são os indicadores.

A gênese do termo está na palavra em latim indicare, que significa descobrir, apontar, anunciar, estimar (BITTENCOURT, 2006, p. 141). Ainda para este autor, utiliza-se este termo nas ciências ambientais para designar “um organismo, uma comunidade biológica ou outro parâmetro (físico, químico ou social) que serve como medida das condições de um fator ambiental, ou um ecossistema”.

Para McQueen e Noak (1988 apud BELLEN, 2007, p. 41) um indicador seria uma medida que resume informações relevantes de um fenômeno particular ou um substituto desta medida. Compartilham da mesma compreensão Bessa Júnior e Muller (2000 apud MARANGON, 2004) que dizem ser o indicador o “meio encontrado para reduzir uma ampla quantidade de dados à sua forma mais simples, retendo o significado essencial do que está sendo perguntado”. Também a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE entende o indicador como um “parâmetro, ou valor derivado de parâmetros que apontam e fornecem informações sobre o estado de um fenômeno, com uma extensão significativa” (1993 apud BITTENCOURT, 2006, p. 141).

Em suma, todos os conceitos falam de dados que, simplificados por meio de indicadores, informarão sobre o estado do elemento pesquisado, permitindo assim o monitoramento dos sistemas analisados, e embasando a tomada de decisões por meio de dados fáticos e mensurados, como confirma Sato (2000 apud MARANGON, 2004)

os indicadores são instrumentos através dos quais torna-se possível simplificar, quantificar e analisar informações técnicas transformando-as em informações compreensíveis aos vários grupos de usuários, permitindo aos tomadores de decisões o acesso a dados relevantes para fazer e medir o progresso quanto a sustentabilidade.

Entre as outras possíveis funções da existência e adoção de indicadores, Bellen (2007, p. 58) destaca as seguintes:

• Função analítica: as medidas ajudam a interpretar os dados dentro de um sistema coerente, agrupando-os em matrizes ou índices;

• Função de comunicação: as ferramentas tornam os tomadores de decisão familiarizados com os conceitos e métodos envolvidos com a sustentabilidade. Os indicadores ajudam no estabelecimento de metas e também na avaliação do sucesso em alcançá-las;

• Função de aviso e mobilização: as medidas ajudam os administradores a colocar os mecanismos de uma forma pública, publicações anuais ou simples relatórios com indicadores-chave;

• Função de coordenação: um sistema de medidas e de relatórios deve ser factível tanto em termos de orçamento quanto em termos de recursos humanos. Deve ser aberto à população, para participação e controle. O primeiro documento oficial que veio a tratar da elaboração de indicadores foi o “Indicadores de desarrollo sostenible: marco y metodologias”, lançado em 1996 pela CDS – Comissão para o Desenvolvimento Sustentável, das Nações Unidas. Tendo como finalidade de prover informações para a tomada de decisões, o documento denominado de “Livro Azul” trazia um conjunto de 143 indicadores, que posteriormente foram reduzidos para 57 (VEIGA, 2006, p. 173). Uma grande dificuldade para a elaboração destes indicadores é conseguir traduzir em números realidades e situações tão díspares quanto as existentes no planeta. Um exemplo seria medir a qualidade de vida em países como Bélgica e Brasil. Isto se complica ainda mais caso sejam levadas em consideração reflexões como a de Amartya Sem no início do capítulo anterior: não necessariamente se poderia medir esta qualidade de vida por estatísticas econômicas. Assim, outras metodologias foram propostas na intenção de canalizar dados significativos para a elaboração de indicadores.

Um deles foi o ESI - Environmental Sustainability Index, elaborado por pesquisadores de Yale e Columbia, e apresentado em 2002, no Fórum Econômico Mundial. A proposta era analisar 68 variáveis contidas em 20 diferentes indicadores essenciais por meio de representações gráficas multifacetadas, no lugar de utilizar um número índice (VEIGA, 2005, p. 173). Outra proposta foi a da “Pegada Ecológica” (Ecological Footprint), lançada pela ONG Redefining Progress Institute, tendo esta o objetivo avaliar o uso da natureza pelas

comunidades humanas. Em suas análises, a cada ser humano caberia o uso e usufruto de uma área produtiva equivalente a 1,86 hectares. Entretanto, a desigualdade deste uso fica patente nos dados por eles coletados, quando se verificou que cada habitante dos Estados Unidos usava, à época da pesquisa, 9,71 hectares, ou seja, mais do que o quíntuplo do número base.

O Brasil, seguindo a orientação da ONU, também criou seus indicadores. Com base nos estudos da CDS, o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística lançou o documento Indicadores Brasileiros de Desenvolvimento Sustentável em 2002, já havendo uma atualização dos dados em 2004. Para Veiga (2005, p. 174), estes indicadores estão compilados na “primeira publicação que incluiu explicitamente a dimensão ambiental ao lado da social, da econômica e da institucional”. Na parte relativa especificamente à dimensão ambiental, o documento foi organizado de forma a apresentar 17 indicadores essenciais, organizados em 5 temas específicos: atmosfera, terra, oceanos, mares e áreas costeiras, biodiversidade e saneamento (IBGE, 2002 e 2004).

É importante considerar, no entanto, que assim como o conceito de desenvolvimento sustentável está pouco definido, não se pode considerar a elaboração de indicadores como a panacéia dos problemas sócio-ambientais do mundo atual. Isto porque também estão pouco definidos. Os padrões ou parâmetros a serem analisados devem ser elaborados caso a caso, já que os diferentes ecossistemas e variados grupos sociais demandarão a produção de indicadores específicos para cada realidade.

Neste sentido, os impactos causados pela exploração de carcinicultura em uma praia do litoral nordeste do Brasil, junto a comunidades de pescadores, serão diferentes de grandes produções de soja no cerrado do centro-oeste. Os impactos e as necessidades serão diferenciadas, não apenas pelo tipo de atividade econômica analisada, como também pelas comunidades que fazem parte destas vivências. Para alguns casos, já existem parâmetros. Entretanto, para a grande maioria, avaliações e monitoramentos estão sendo feitos para a elaboração de tais indicadores. Tal déficit de informações se deve ao processo incipiente de adoção dos indicadores como forma de análise e acompanhamento do desenvolvimento.

Para Bellen (2007, p. 39), “Todas as definições e ferramentas relacionadas à sustentabilidade devem considerar o fato de que não se conhece totalmente como o sistema opera”, de forma que atualmente “pode-se apenas descobrir os impactos ambientais de atividades e a interação como o bem-estar humano, com a economia e o meio ambiente”. Tais impactos, portanto, devem ser constantemente monitorados por meio de indicadores, para a verificação dos níveis viáveis de mudança possível.

A proposta inicial do presente trabalho era estabelecer pontos prioritários para a análise de questões importantes relacionados aos impactos ambientais produzidos pelo desenvolvimento econômico na área de análise por meio de indicadores. Guardando a ressalva do parágrafo anterior, a inexistência de indicadores específicos de sustentabilidade nesta área inviabilizam um quadro comparativo que venha a comprovar que o desenvolvimento aí promovido está efetivamente sendo insustentável. Entretanto, ao agregar três técnicas diferenciadas de análise, busca-se comprovar um crescimento exacerbado e insustentável, o que refletiria na geração de impactos que serão sentidos e compartilhados por todos que aí residem, sendo este um dos pressupostos da dívida ecológica, tema que será debatido em capítulo posterior.

3.5 Impactos ambientais nas zonas costeiras: dívida para a posteridade

As zonas costeiras são áreas de grande importância para um país. Atualmente aproximadamente 45 % da população mundial reside nestas áreas. É também onde se localizam 75 % das megalópoles com mais de 10 milhões de habitantes do mundo, onde são produzidas em torno de 90 % da pesca global (INSTITUTO DO MILÊNIO, 2008). Além disto, abriga atividades das mais diversas, como aqüicultura e pesca; é fonte de recursos como petróleo; é ponto estratégico para comércio, transporte e segurança nacional; é importante reservatório de biodiversidade; abriga portos e indústrias; bem como é o um dos principais destinos turísticos mundiais.

No Brasil, a zona costeira tem tido papel de destaque na história do país desde os primórdios da colonização (FARIAS, 2002, p. 32), principalmente porque “tal espaço possui peculiaridades e vantagens locacionais que o tornaram concentrador de grande parte da população do país e, conseqüentemente, suas atividades” (ibidem, p. 34). Assim, desde o descobrimento do Brasil, os processos iniciais de ocupação, bem como as principais atividades comerciais estavam intrinsecamente ligadas às áreas litorâneas. Com o passar do tempo, e a necessidade de proteger e integrar os espaços desabitados do país, novas áreas foram sendo povoadas. Isto não impediu, no entanto, a continuidade da concentração de cidades e atividades nas áreas litorâneas. Apenas com a transferência da capital brasileira do Rio de Janeiro para Brasília, na década de 50, é que tal realidade passa por mudanças.