• Nenhum resultado encontrado

As infecções relacionadas à assistência a saúde (IrAS) são caracterizadas por infecções adquiridas em unidades hospitalares ou em qualquer outra instituição de assistência a saúde, como por exemplo enfermarias, ambulatórios e consultórios, podendo ser diagnosticada a partir de 72 h após a internação. O termo IrAs também está relacionado às infecções que são manifestadas durante o período de internação ou após a alta do paciente (Côrrea, 2008). Cabe ressaltar que, as infecções em âmbito hospitalar podem ser adquiridas não apenas por pacientes, que apresentam maior susceptibilidade, mas também, embora menos frequentemente, por visitantes e funcionários do próprio hospital (Lipsitch et al., 2000).

As IrAS derivam da interação de vários fatores como a presença de micro-organismos no ambiente hospitalar, a presença de hospedeiros imunodeprimidos e a cadeia de transmissão existente no hospital. A presença de um dos fatores isolados aparentemente não é suficiente para que a infecção ocorra, porém a interação dos três fatores representa riscos para a aquisição do quadro infeccioso (Tortora et al., 2012).

Ainda que muitos esforços sejam realizados para eliminar ou impedir o crescimento de micro-organismos em hospitais, vale destacar que o ambiente hospitalar é um reservatório importante de uma variedade de patógenos (Tortora et al., 2012). Em Unidades de Terapia Intensiva (UTI), por exemplo, é evidenciado um alto índice de pneumonias associadas à ventilação mecânica, bem como, infecções do trato urinário e infecções da corrente sanguínea, primárias e secundárias (Olaechea et al., 2010).

Essas infecções ocorrem mundialmente e acometem países desenvolvidos, em desenvolvimento e subdesenvolvidos (Padoveze et al., 2010). De acordo com o Centers for Disease Control and Prevention dos Estados Unidos, estima-se que as IrAS representam cerca de 1,7 milhões dos casos de infecções, sendo que 99.000 mortes ocorrem em decorrência dessas infecções todos os anos somente nos Estados Unidos (CDC, 2010). Destas infecções, 32% referem-se às infecções do trato urinário, 22% são infecções de sítio cirúrgico, 15% são relativas à pneumonia (infecção pulmonar) e 14% são infecções da corrente sanguínea (CDC, 2010). Algumas espécies patogênicas causadoras destas infecções estão descritas simplificadamente na Tabela 2 onde é possível observar os patógenos e sua ocorrência na corrente sanguínea, pulmões e/ou trato urinário isolados em UTI’s de hospitais americanos (Mandigan et al., 2010).

De forma similar em hospitais irlandeses averigou-se que, as IrAS mais comuns foram infecções do trato respiratório (2,65%) e infecções de sítio cirúrgico (1,7%) (O'neill et al., 2010). Em países em desenvolvimento inúmeros casos de óbito surgem em decorrência deste cenário, o que resulta em um aumento dos custos de saúde pública e ressalva a necessidade de uma maior atenção aos procedimentos laboratoriais (Lipsitch et al., 2000; Matlow e Morris, 2009).

Tabela 2 – Número de IrAS em unidades de terapia intensiva nos Estudos Unidos por local de ocorrência e organismo. (ND): Não detectado; (*) Número total de IrAS foi de 92.454 detectadas em unidades de terapia intensiva em um período de oito anos.

Patógeno Corrente sanguínea Pulmão Trato urinário

Enterobacter spp. 1.083 4.444 1.560 Escherichia coli 514 1.725 5.393 Klebsiella pneumoniae 735 2.865 1.891 Haemophilus influenzae ND 1.738 ND Pseudomonas aeruginosa 841 6.752 3.365 Staphylococcus aureus 2.758 7.205 497 Staphylococcus spp. 8.181 ND 838 Enterococcus spp. 2.967 682 4.226 Candida albicans 1.090 1.862 4.856 Outros patógenos 3.774 12.537 8.075 Número total* 21.943 39.810 30.701 Total (%) 23,7 43,1 33,2

Fonte: Registro do Sistema Nacional de Vigilância de Infecções Relacionadas à Assistência a Saúde, Centro de Controle e Prevenção de Doenças, Atlanta, Georgia, EUA. Adaptada de Mandigan (2010)

Segundo o Ministério da Saúde, no Brasil a taxa média de infecção hospitalar é cerca de 15%, onde entre 3-15% dos pacientes infectam-se após procedimentos invasivos ou terapia imunossupressora (APECIH, 2005; ANVISA, 2007). De acordo com Rossi (2011), a infecção do trato urinário são responsáveis por aproximadamente 35% a 45% de todas as infecções contraídas em hospitais. Dentre as isolados que apresentam uma maior prevalência de resistência são S. aureus resistentes a meticilina, MRSA (60%), K. pneumoniae e E. coli β-lactamases de espectro estendido (ESBLs) com prevalências de 50 e 18%, respectivamente.

Além disto, é possível observar uma endemia de isolados resistentes a diversos antibióticos em ambiente hospitalar. Com base nos levantamentos realizados em hospitais da região sul, observou-se que 13% dos pacientes internados na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Rio Grande do Sul apresentavam infecções proeminentes de S. aureus multi-droga resist ent es (MDR), das quais 46% apresentam colonização por MRSA em diversos tecidos e 51% dos não-pacientes são colonizados ou portadores de isolados de MRSA, demonstrando que as

medidas gerais de controle de infecção são ineficientes (Dos Santos et al., 2010). Já, em Caxias do Sul, também no Rio Grande do Sul, averigou-se uma alta prevalência (43,7%) de K. pneumoniae produtoras de β-lactamase de espectro estendido presentes em ambientes hospitalares e, especialmente, em pacientes pediátricos da UTI neonatal do Hospital Geral de Caxias do Sul (Wollheim et al., 2011). De acordo com o autor, a alta prevalência de K. pneumoniae ES B L em hospit ais ocorre em virt ude de m utações no gene blaCTX-M (82,8%), blaSHV (42,2%) e blaTEM (11,1%).

Em Curitiba, no Paraná, somente no primeiro semestre de 2011 mais da metade dos casos de infecções foram adquiridos em ambiente hospitalar, dentre os quais 1% eram causadas por bactérias multirresistentes (Toledo et al., 2012). A probabilidade de compli cações graves nestes casos devi do a estas infecções é alta uma vez que, os pacientes encontram-se enfermos (Pita et al., 2012).

De um modo geral, vários fatores podem contribuir para o aparecimento de infecções em pacientes hospitalizados incluindo: idade e imunodepressão dos pacientes, aumento na variedade de procedimentos médicos utilizados, uso de técnicas invasivas que propiciam uma potencial rota para a infecção e a própria terapia antimicrobiana utilizada que associada às práticas ineficazes ou insuficientes de prevenção e controle da infecção. Esses fatores contribuem também como facilitadores de disseminação e propagação da IrAS (WHO, 2009).

Nesse cenário, é imprescindível a implementação de programas destinados a reduzir as IrAS. Os primeiros esforços para o controle dessas infecções começaram com o médico húngaro Ignaz Semmelwels em 1840 que demonstrou a falta de assepsia das mãos por médicos. Em alguns casos, as infecções eram tão graves que o paciente vinha a óbito. Essa mortalidade foi diminuída com o simples processo de lavagem das mãos (Newsom, 1993; Best e Neuhauser, 2004). Anos mais tarde, Joseph Lister começou a usar fenol (ácido carbólico) para tratar as feridas cirúrgicas (Tortora et al., 2012).

Desta forma trabalhos pioneiros em técnicas assépticas reduziram a taxa de ocorrência de infecções. Todavia, ainda que sejam realizadas técnicas de esterilização e uso de materiais descartáveis, as taxas de infecções aumentaram aproximadamente 36% nos últimos 20 anos. Nos EUA, 2 milhões de pessoas adquirem infecções todos os anos e aproximadamente 20.000 pessoas morrem em decorrência delas o que representa a oitava causa de morte nesse país (Tortora et al., 2012).

Alguns gêneros bacterianos têm sido relatados como importantes causadores de infecções relacionadas à assistência a saúde. A principal causa para explicar o fato das bactérias serem os principais patógenos relacionados às IrAS refere-se à rapidez de crescimento destes patógenos que dependendo das características específicas de cada espécie podem produzir até 5 x 108 bactérias/indivíduo em apenas 50 min (Hancock e Diamond, 2000; Mandigan et al., 2010).

Diversos estudos têm mostrado que de 60 a 70% das bactérias isoladas em hospitais, são representadas por bactérias pertencentes à família Enterobacteriaceae. Dentre essas, Escherichia coli e Proteus sp. são predominantemente causadoras de IrAS, essas bactérias causam frequentemente infecções do trato urinário (ITU), além destas as espécies Klebsiel la sp. e Ent erobacter sp., são import antes na ocorrênci a de pneumonias e infecções intestinais. Entretanto, as Enterobacteriaceae têm sido isoladas de infecções sanguíneas, peritonites, colites e outras infecções intra-abdominais. Adicionalmente, organismos como Salmonella sp. produzem gastroenterites e, subsequentemente, em alguns pacientes podem causar infecções invasivas (Levy, 2004; Hujer et al., 2006).

2.7. ENTEROBACTER

Em se tratando de bactérias Gram-negativas as espécies de Enterobacter vêm se destacando por serem patógenos humanos oportunistas responsáveis por infecções no trato respiratório e urinário bem como, osteomelite, infecções intra-abdominais e artrite séptica (Lin, X. M. et al., 2010a).

Seis espécies deste gênero compõem o complexo E. cloacae que apresenta 61 a 67% de identidade sendo estas E. absuriae, E. cloacae, E. homaechei , E. kobei , E. l udwiguii e E. nimipressurialis (Mellm ann et al., 2009). O aumento do número de estudos epidemiológicos em decorrência dos severos casos de bacteremia causados pelo complexo E. cloacae, refletem a importância destes micro-organismos como patógenos clínicos (Kremer e Hoffmann, 2012).

Entre as bactérias deste complexo, E. cloacae é um importante agente patogênico, causador de infecções no aparelho respiratório e urinário, na pele, nos tecidos cardíacos, nos órgãos intra-abdominais e olhos (He, Zhang, et al., 2011).

De acordo com Dalben e cols (2008) infeccões neonatais causadas por E. cloacae tem em ergi do nos últimos anos. De acordo com o autor, 52% dos recém-nascidos, internados em UTIs neonatais do estado de São Paulo, apresentavam E. cloacae na corrente sangüínea, dos quais 12,5% estavam relacionados a isolados multiresistentes.

Atualmente têm-se descrito resistência à cefalosporinas, penicilinas e carbapenem (Heller et al., 2012; Yang et al., 2012), mediante a presença de AmpC B-lactamase, bem como, resistência à quinolonas (Hornsey, M. et al., 2010; He, Thorpe, et al., 2011) por alteração do sítio ativo da enzima DNA girase e topoisomerase IV que diminuem a permeabilidade da membrana e também a exclusão do antibiótico via bomba de efluxo (Chmelnitsky et al., 2008; Khalaf et al., 2009). Além disso, têm sido descrito que E. cloacae

possui habilidade para desenvolver resistência ao aztreonam (Panopoulou et al., 2010) e as sul fonamidas (Ni gro e Hall , 2011).

Os fatores determinantes para a virulência da E. cloacae incluem o antígeno O somático e antígeno R (tabela 3).

Tabela 3 – Distribuição dos diferentes sorotipos de E. cloacae e seus padrões de resistência a agentes antimicrobianos. Abreviações: NT (não tipado); multiresistante (resistente a ampicilina (AP, 10 µg), cefalotina (CF, 30 µg), gentamicina (GN, 10 µg), e cefalexina (CX, 30 µg). GONÇALVEZ et al, 2000.

Fonte Biotipo Sorotipo Ribotipo Resistência Antimicrobiana

Sangue 26 O3 E1B1 CX,CF,AP,GN

66 NT E4B4 MULTIRESISTENTE

Solução de Nutrição

Parenteral

26 O19 E2B2 MULTIRESISTENTE

26 O14 NT CX,CF,AP

26 O3 E1B1 CX,CF,AP,GN

NT NT E5B5 CX,CF,AP

Cabe ressaltar que, a multiresistência de E. cloacae aos antibióticos juntamente com a alta incidência de mortalidade causada por esta espécie resulta na necessidade de empregar a colistina como o único agente disponível um vez que, esta vem se tornando uma das principais escolhas em infecções mais graves onde os demais antibióticos já não possuem uma ação tão efetiva (Zhanel et al., 2008).

Documentos relacionados