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5. Análise e discussão dos resultados

5.8. Influência do clube no trabalho jornalístico

O foco principal deste estudo foi descortinar a existência de um alinhamento clubista nos diários desportivos portugueses, nomeadamente na identificação de cada jornal a um determinado clube. Neste sentido, solicitou-se aos inquiridos que indicassem o grau de influência que a afinidade clubista tem no seu trabalho quotidiano.

Os resultados foram claros, no sentido em que, para 88,9% dos inquiridos, a preferência clubista não exerceu qualquer tipo de influência, tendo mesmo indicado que todos os jornalistas d’A Bola, 80% d’O Jogo e 83,3% do Record não sentem qualquer tipo de influência – apesar de 16,7% dos jornalistas do Record terem selecionado a resposta correspondente ao reconhecimento da existência de influência moderada.

Solicitou-se igualmente aos jornalistas que indicassem, dentro dos “três grandes” do futebol português, a sua preferência. Ora, os resultados foram bastante elucidativos, uma vez que 22,2% dos jornalistas não se mostraram disponíveis para responder, o que pode ser explicado pelo facto dos inquiridos não quererem que se torne público, apesar da extrema confidencialidade dos dados, a sua orientação clubista. Na verdade, é muito comum em Portugal os adeptos associarem um jornalista a um clube, por criticarem ou elogiarem um clube específico. Isto acontece porque o desporto é uma área de paixões e fanatismos e, no que toca ao futebol, em particular aos “três grandes”, a situação acentua-se drasticamente. De forma a salvaguardarem o seu trabalho, os jornalistas preferem não revelar publicamente a sua preferência por determinado clube, para não comprometerem o seu trabalho futuramente.

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Daqueles que responderam a esta questão, 57,1% são do FC Porto, 35,1% do Benfica e 7,1% do Sporting. Tendo em conta os clubes, analisou-se detalhadamente os diferentes órgãos de comunicação, tendo-se verificado no cruzamento das respostas a identificação de 75% dos jornalistas d´A Bola com o Benfica, bem como a de 80% dos jornalistas do diário O Jogo com o FC Porto, sendo que nestes é de destacar que todos os jornalistas deste especializado revelaram a sua preferência clubista, contrariamente ao apurado nos restantes media. Ainda assim, estes dois resultados corroboram a ideia generalizada de que os jornalistas d´O Jogo são do FC Porto, enquanto os d’A Bola se identificam com o Benfica. Quanto ao Record, este apresenta maiores diferenças clubísticas, já que 60% dos seus jornalistas optam pelo FC Porto e 40% pelo Benfica, contrariando a teoria popular de identificar este jornal ao Sporting ou até mesmo à região de Lisboa.

Assim, é possível concluir que a maioria dos jornalistas desportivos portugueses considera não ser influenciada no seu trabalho pela sua preferência clubista. Embora sejam uma minoria face à totalidade de jornalistas, os profissionais dos semanários desportivos regionais (40%) e do meio online (16,7%) evidenciaram moderada influência clubista.

Em suma, e no que respeita à preferência clubista, de um modo geral, os dados foram ao encontro do esperado, nomeadamente da associação dos jornalistas d’A Bola com o Benfica e dos profissionais d’O Jogo com o FC Porto. Contudo, o Record foi a exceção, visto que a identificação dos seus jornalistas com o Sporting não foi comprovada, tendo sido mesmo o único clube descurado pelos profissionais deste diário. Nesta questão, foram bastante notórias as reservas dos jornalistas quanto ao indicarem o clube preferido, de entre os “três grandes”, dado que 36% da amostra geral preferiram não responder.

5.9. Entrevistas

Conhecidos os resultados das preferências e influências clubistas para os jornalistas dos diários desportivos, surgiu a necessidade de confrontar tais perceções com as de jornalistas que trabalham nas editorias de desporto de outros media portugueses. Neste âmbito, foram entrevistados Rui Farinha, jornalista do JN, Bruno Roseiro, do semanário Expresso, José Gabriel Quaresma, jornalista da TVI, e ainda Bruno Prata, redator principal do Público e comentador desportivo na RTP e TSF.

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A identificação clubista d’A Bola com o Benfica e d’O Jogo com o FC Porto foi ressalvada e reconhecida por todos os entrevistados. Contudo, a proximidade do Record com o Sporting não foi tão evidente nem percetível. Na generalidade, reconhecem que existe uma certa benevolência do Record com o Sporting, mas essa não é tão vincada nem assumida como as anteriores.

Foi igualmente perentória a perceção desse clubismo vocacionado e direcionado para o mercado, como um negócio, e não propriamente pelas preferências individuais dos jornalistas. Recuperando as palavras de Bruno Prata, interessa ao jornal A Bola, do ponto de vista comercial, que o Benfica ganhe, “já que isso terá implicações na feitura da primeira-página e consequente número de vendas, independentemente das opções clubísticas de quem está à frente do jornal”. A mesma tendência é verificada n’O Jogo em relação ao FC Porto, e de forma menos evidenciada no Record, comparativamente ao Sporting.

José Gabriel Quaresma explica que os jornais desportivos “agarraram os nichos de mercado que mais os atraía” quando passaram de trissemanários a diários, na década de noventa, “fosse pelas ligações profissionais ou devido a estratégias editoriais”. O jornalista da TVI foi claro em afirmar que “quem produz o jornal não são os editores ou aos jornalistas” e reforça se há “clubismo” e se faz parte da linha editorial, “ele é gerido pelo topo da estrutura e os jornalistas que estão no terreno ou na redação não influenciam a esse nível”. Para sintetizar salienta que “o clubismo enquanto linha editorial, assumido, não passa disso mesmo, de uma linha editorial”.

Tal como os restantes entrevistados, Bruno Roseiro partilha da opinião corrente de que a vertente comercial e económica tem um peso fundamental na atualidade desportiva dos media. O jornalista garante ainda que há efeitos paralelos que se podem estabelecer: “se um determinado jornal tem mais tendência em fazer manchetes com determinado clube, é normal que as ligações sejam maiores, tal como a facilidade de agendar entrevistas ou mesmo transmitir determinadas notícias”. De facto, tal evidência vai ao encontro dos resultados obtidos nos inquéritos por questionário, nomeadamente no tópico que afere o relacionamento dos jornalistas com a classe desportiva, em que se apurou que é normal ter uma atitude mais positiva com as fontes de dão mais e melhores informações.

No mesmo contexto, Bruno Prata argumenta que há determinados factos que se ocultam ou que são exponenciados de uma forma artificial “para conseguir uma aproximação e uma relação mais privada e mais privilegiada com determinadas fontes, que têm muita informação

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para dar”. No ponto de vista do jornalista, isso garante uma “informação pura e dura”, que ajuda a vender o jornal, mas por outro lado adultera parte da informação.

Portanto, foi transversal que os jornalistas entrevistados legitimam que há um maior favorecimento de notícias do FC Porto no jornal O Jogo e do Benfica no diário A Bola, que para além de se prenderem com fatores regionalistas e de proximidade, resultam na orientação para o mercado e respetivo número de vendas. O caso da identificação do Record com o Sporting não foi tão explícito, o que corrobora os dados resultantes da análise dos inquéritos.

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